O que aprendi com Jesus sobre pregação

As pessoas chamam Jesus de Comunicador Mestre. Ele ensinou multidões com mais de 10.000 pessoas, ao ar livre,1 sem nenhum tipo de amplificador de voz. Elas foram até Ele para ouvir Seus discursos memoráveis que perduraram e transformaram o mundo.

Alguns O chamam de mau comunicador, porque Seus discípulos demoraram a entendê-Lo.2 Mas Seus contemporâneos discordariam. Embora não fosse graduado em uma escola rabínica, até mesmo os rabinos o chamavam de Rabi, título reservado para os rabinos instruídos.3 “Quando Jesus acabou de proferir estas palavras, as multidões estavam maravilhadas com a Sua doutrina, porque Ele as ensinava como quem tem autoridade, e não como os escribas” (Mt 7:28, 29).4 Essa avaliação tem profundas implicações.

Embora os escribas ensinassem a Torá, eles derivavam sua autoridade de antigos rabinos.5 “A autoridade dos escribas surgiu da interpretação erudita da Torá e da citação de rabinos anteriores.”6 “O ensino dos escribas e anciãos era frio e formal, como uma lição aprendida de cor”. “Os líderes religiosos falavam duvidosos e hesitantes, como se as Escrituras pudessem ser interpretadas significando uma coisa ou exatamente o contrário.”7 A pregação eficaz, porém, não deve ser hesitante nem duvidosa. A verdade deve ser apresentada com seriedade, sinceridade, entusiasmo, paixão e convicção.8

Quando comparado até mesmo com os maiores rabinos, Jesus ensinou com uma diferença. Sua autoridade não dependia de outros.9 Ele falou em Seu próprio nome com quatro tipos distintos de autoridade.

1. Autoridade sapiencial. A autoridade sapiencial é derivada do conhecimento. Jesus conhecia a Bíblia hebraica. Quando Ele tinha 12 anos, Seu conhecimento das Escrituras surpreendeu os anciãos.10 
Os pregadores não devem apenas adquirir o melhor conhecimento, mas também se comprometer com o aprendizado ao longo da vida. Alguns pregadores gastam tempo insuficiente com as Escrituras, ocupando-se com a Obra do Senhor, mas dedicando pouco tempo ao Senhor da Obra. Consequentemente, seus sermões são superficiais ou plagiados.

Muitos pregadores leem a Bíblia “sermonicamente”, não devocionalmente. Eles têm por objetivo obter conteúdo para seus congregados, não bênçãos para si mesmos. No entanto, os sermões que surgem das leituras devocionais são mais poderosos e fornecem enormes bênçãos aos outros.

2. Autoridade moral. A beleza da vida de Jesus engrandeceu Sua pregação. Preceito e exemplo coincidiam, criando constância entre ensino e comportamento. Os pregadores precisam de altos padrões morais para si mesmos. Minha vida deve refletir o que ensino para que os outros não digam: “O que você faz grita tão alto que não consigo ouvir o que você diz”. 

Alguns justificam comportamentos questionáveis, argumentando que os pregadores são humanos e, portanto, pecadores. Embora seja verdade, essa desculpa se fundamenta em um raciocínio falho. Como os pregadores representam Deus, esperamos mais deles. “A quem muito foi dado, muito lhe será exigido”, disse Jesus (Lc 12:48). Motivar os pregadores a se manterem em padrão elevado é positivo, porque mais do que uma atividade profissional, a pregação é um chamado que convoca à santidade: “Eu sou o Senhor, o Deus de vocês; portanto, consagrem-se e sejam santos, porque Eu sou santo” (Lv 11:44).11 Lembre-se de que as pessoas aprendem mais com o que veem do que com o que ouvem.12

3. Autoridade pessoal. Quando as pessoas diziam que Jesus falava com autoridade, não como os escribas, elas também queriam dizer que Ele tinha autoridade pessoal. Aqueles que possuem autoridade sapiencial e moral obterão respeito, o que produz autoridade pessoal, algo que não pode ser comprado nem ordenado.

4. Autoridade carismática. Multidões foram a Jesus (Mc 3:31, 32; 1:35, 36; Jo 6:22-24). Às vezes, elas não Lhe davam tempo para comer (Mc 3:19, 20). Cristo tinha a habilidade de construir relacionamentos e atrair pessoas. Os pastores também devem desenvolver e exercer boas habilidades de relacionamento. As pessoas apreciam os ministros que as conhecem e as chamam pelo nome, amam e cuidam genuinamente. Jesus fez isso. Essas são qualidades que todo pastor deve desenvolver para pregar efetivamente.

O grande Comunicador

Evans Crawford chamou a pregação de “um evento oral”,13 enfatizando sua natureza comunitária, porque a pregação envolve a interação entre o orador e o ouvinte.14 Comunicação é a transmissão de informações do emissor para o receptor. Ela exige que emissores e receptores estejam na mesma frequência, falando a mesma língua. Assim, uma boa comunicação é um processo de duas vias que requer um ciclo completo de feedback.

Com isso em mente, o que fez de Jesus o grande Comunicador? Ele dominava a análise de Sua audiência e ajustava-Se às necessidades dela. Sabia que as pessoas aprendiam de maneiras diferentes. Alguns são aprendizes visuais, outros táteis, auditivos, conceituais ou cognitivos. O Mestre adaptou Sua mensagem para atender diversas situações. Devemos imitá-Lo e usar as ferramentas apropriadas para alcançar os diversos estilos de aprendizagem.

Parábolas

Jesus usou amplamente as parábolas. Nos evangelhos sinóticos, elas compreendem um terço de Seu ensino.15 Parábolas eram um método de discurso bem conhecido e popular. Os rabinos as usavam para confirmar os valores tradicionais. Jesus, porém, as transformou, aplicando-as de outras maneiras:16

Desafiando o senso comum.17 Os rabinos empregavam parábolas para confirmar o status quo. Jesus as usou para transtornar as ideias tradicionais. Os rabinos viam os judeus como representantes especiais de Deus, merecendo assim a maior recompensa. Eles ilustravam isso por meio de uma parábola sobre um agricultor que pagava aos que começavam o trabalho de manhã cedo mais do que aos que começavam mais tarde.

Jesus contou a mesma parábola com uma diferença (Mt 20:1-16). O fazendeiro concordou em pagar um denário para os trabalhadores contratados pela manhã. Contudo, ao longo do dia, contratou mais trabalhadores e prometeu pagar-lhes o que era “justo” (v. 4). Ao cair da tarde, cada um recebeu um denário. Aqueles que trabalharam o dia todo ficaram com raiva, alegando que mereciam mais do que os outros. O fazendeiro disse que o dinheiro era dele e poderia usá-lo como quisesse.

Jesus então salientou: “Assim, os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos” (v. 16). A parábola dos rabinos afirmava o pensamento convencional de que, como povo especial de Deus, os judeus foram chamados primeiro e, consequentemente, mereciam mais. Por outro lado, a parábola de Jesus dizia que havia oportunidades iguais e pagamento para todos, sem favoritismo nem prioridade.

Comunicando o desconhecido através do conhecido, o celestial através do terreno. Desde a queda, os seres humanos têm imaginações e pensamentos limitados. Assim, Jesus empregou o que as pessoas sabiam para ilustrar o que ainda precisavam saber. Ele usou conceitos terrenos para comunicar realidades celestiais.

Quando comparou o Reino ao fermento que uma mulher colocou na massa e misturou até que permeasse tudo (Mt 13:33), Cristo usou algo com o qual as pessoas estavam familiarizadas para ensinar a verdade essencial. Para fazer a massa crescer, um pedaço de massa velha era usado para levedá-la. Assim, mostrou a Seus ouvintes que, embora Seu Reino pudesse parecer insignificante, acabaria por transformar a sociedade. Isso os motivou a manter a fé e antecipar o cumprimento das palavras de Jesus. O cumprimento veio quando o cristianismo começou a se espalhar por todo o Império Romano. Portanto, Cristo demonstrou que a pregação deve ser contextualizada e utilizar ilustrações familiares para ensinar verdades espirituais.

Captando a atenção por meio de eventos atuais e experiências cotidianas. Jesus dominou a arte de usar eventos atuais e experiências comuns. A parábola do bom samaritano relata uma ocorrência conhecida por Seus ouvintes. Ele a usou para chamar atenção e ensinar a verdade. A pedagogia rabínica utilizava um estilo triádico. Quando Jesus apresentou os dois primeiros transeuntes como líderes religiosos, os ouvintes esperavam que o terceiro também fosse um clérigo. Em vez disso, Jesus apresentou o candidato menos provável, um samaritano, para ensinar lições sobre benevolência, orgulho, intolerância e preconceito. Isso indica que podemos empregar eventos atuais para capturar o interesse do público.

Fazendo perguntas. Jesus gostava de fazer perguntas importantes para chamar atenção e preparar os corações para verdades mais profundas. As histórias de Nicodemos (Jo 3) e da mulher samaritana (Jo 4) são exemplos disso. As perguntas que Ele fazia apontavam para lacunas no conhecimento das pessoas e as levavam a buscar mais verdades. Cristo então usava o momento de ensino para informar a mente e mover as emoções. Faça perguntas importantes nos sermões para incentivar os ouvintes a pensar mais profundamente, ponderar e tomar decisões.

Tornando Sua pregação memorável. Jesus usava elementos da vida cotidiana para ensinar. Quando Seus ouvintes os encontravam mais tarde, eles se lembravam de Suas palavras e aprendiam lições vitais mesmo em Sua ausência.18 O Mestre empregou itens como fermento, sementes, óleo, lâmpadas, sal, farinha e pão; pessoas como agricultores, pescadores, sacerdotes, levitas e samaritanos; e cerimônias como casamentos. Talvez quando Jesus contou a parábola das dez virgens, Seus ouvintes estivessem vendo uma procissão de casamento. Quando mais tarde participaram de alguma cerimônia matrimonial, a experiência tornou-se um momento de reforço do aprendizado. Essa técnica nos motiva a usar imagens memoráveis que podem ensinar mesmo em nossa ausência.

Figuras de linguagem

A forma de Jesus ter usado figuras de linguagem para ilustrar sermões fez Dele um excelente Pregador. Ele empregou hipérboles, trocadilhos, símiles, metáforas e paradoxos. Vemos hipérbole, uma afirmação um pouco exagerada para provar um ponto, ilustrada de maneira memorável no Sermão da Montanha: “Por que você vê o cisco no olho do seu irmão, mas não repara na trave que está no seu próprio? (Mt 7:3). O trocadilho, um jogo de palavras semelhantes em som, mas diferentes em significado, é exemplificado nas palavras de Cristo aos escribas e fariseus: “Guias cegos! Coam um mosquito, mas engolem um camelo!” (Mt 23:24). Em aramaico, “camelo” é gamla,19 e “mosquito” é galma.20

Um símile compara coisas semelhantes. As parábolas de Jesus eram símiles estendidos que usavam o que as pessoas já sabiam para ilustrar o que ainda precisavam aprender. As parábolas de Mateus 13 e Marcos 4 ilustram essa prática. Relacionadas aos símiles estão as metáforas. Por exemplo, Jesus disse: “Eu sou o pão da vida” (Jo 6:35); “Eu sou a porta” (Jo 10:7-10); “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8:12). 
O paradoxo, uma afirmação que apresenta um dilema ou uma aparente contradição, aparece em passagens como: “Se alguém quer ser o primeiro, será o último e servo de todos” (Mc 9:35). Ele também usou declarações concisas, contundentes e muitas vezes antitéticas que não deveriam ser tomadas literalmente, como visto em: “Quem se exaltar será humilhado; e quem se humilhar será exaltado” (Mt 23:12).

Imaginação

Se os contemporâneos de Jesus não tinham dispositivos de gravação para registrar Seus sermões, como se lembravam deles tão claramente? Exatamente por causa da Sua maneira de usar imagens, dispositivos retóricos e técnicas de apresentação.

Cristo nem sempre deu todos os detalhes do que as pessoas poderiam querer saber. Em vez disso, Ele as encorajava a usar a imaginação. Apresentou o exemplo de um cego guiando outro (Lc 6:39), mas deixou para a imaginação da audiência todos os detalhes da catástrofe resultante.

Imagens sensoriais

As pessoas aprendem mais com o que percebem por meio de seus outros sentidos do que simplesmente com a audição. Uma vez que os judeus ensinavam explorando a audição, Jesus incluiu tantos sentidos quanto possível.

Paladar: Mt 5:13; 14:13-21; Mc 14:12-24.

Audição: Mt 5:21, 27, 38, 43.

Visão: Mt 5:28, 29; 6:22; Mc 8:14-21; 9:1-8; 
Lc 6:39-42; 10:23; Jo 12:44-46.

Tato: Mt 8:3; Mc 5:26-34; Lc 6:1-5.

Transformação

Ao estudar Jesus como Pregador, aprendi várias características admiráveis que melhoraram minha pregação. Compartilho uma síntese dessas descobertas:

1. Pregue para atender aos diversos estilos de aprendizado de seu público.

2. Mantenha objetivos temporais e eternos em vista usando o conhecido para ilustrar o desconhecido.

3. Seja criativo e use a imaginação para animar, ilustrar e chamar atenção.

4. Use os sentidos no conteúdo e na apresentação do sermão para se conectar aos estilos de aprendizagem.

5. Utilize objetos familiares e eventos atuais para captar o interesse e ilustrar a verdade.

6. Recorra às figuras de linguagem e outros artifícios retóricos.

7. Crie imagens mentais que pregarão em sua ausência.

8. Mantenha a consistência entre vivência e prática, porque a pregação autoritativa deriva da autoridade cognitiva, moral e pessoal.

Vamos imitar as técnicas de comunicação e pregação de Jesus. Elas vão nos ajudar a transformar nossos sermões, 
torná-los memoráveis, desenvolver membros espiritualmente maduros e expandir o reino de Deus!  

Referências

1 Os evangelhos dizem que 5 mil homens, além de mulheres e crianças, participaram da multiplicação dos pães. Como a maioria das audiências tem mais mulheres e crianças do que homens, podemos supor que entre 10 e 20 mil pessoas estivessem presentes naquele dia.

2 Bertram Melbourne, Slow to Understand: The Disciples in Synoptic Perspective (Lanham, MD: The University Press of America, 1988), p. 29, 160, 178. 

3 Ver Mt 26:25, 49; Mc 9:5; 10:51; Jo 1:38, 49; 6:25. Rainer Riesner, “Teacher,” em Dictionary of Jesus and the Gospels, eds. Joel B. Green, Scott McKnight e I. Howard Marshall (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1992). 

4 Salvo outra indicação, foi utilizada a versão NAA.

5 Robert Gundry, Matthew: A Commentary on His Literary and Theological Art (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1983), p. 137.

6 G. S. Shogren, “Authority and Power,” em Dictionary of Jesus and the Gospels.

7 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2021), p. 192.

8 “Sua voz [do pregador] deve se erguer como sonido de trombeta, nunca fazendo soar uma nota vacilante e incerta.” Ellen G. White, Obreiros Evangélicos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2007), p. 15.

9 Compare com Shogren, “Authority and Power”.

10 Ver White, O Desejado de Todas as Nações, p. 52-58.

11 “O verdadeiro ministro não fará coisa nenhuma que venha a amesquinhar seu sagrado ofício.” White, Obreiros Evangélicos, p. 17.

12 Ver Melbourne, Slow to Understand.

13 Evans E. Crawford e Thomas H. Troeger, The Hum: Call and Response in African American Preaching (Nashville, TN: Abingdon Press, 1995), p. 17.

14 M. Chartier, Preaching as Communication: An Interpersonal Perspective (Nashville, TN: Abingdon, 1981).

15 Green, McKnight e Marshall, Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 594.

16 Ver Ellen G. White, Parábolas de Jesus (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2015), p. 2-7.

17 Robert Johnston, Universidade Andrews, Berrien Springs, MI. Material não publicado.

18 Bertram Melbourne, “Still Teaching After Two Millennia: What Can We Learn From the Master Teacher?” Journal of Adventist Education 65, n. 5, 2003, p. 5-9.

19 David Noel Freedman, Gary A. Herion, David F. Graf, John David Pleins e Astrid Billes Beck (eds.), The Anchor Bible Dictionary (New Haven, CT: Yale University Press, 2008), p. 1153.

20 Michael E. Lawrence (ed.), The New Interpreter’s Bible (Nashville, TN: Abingdon Press, 1995), v. 8, p. 436.