Firme no propósito de não fazer concessões doutrinárias, o adventismo se mantém aberto ao diálogo com outras denominações, para eliminar dúvidas e preconceitos sobre o que crê e ensina

Qualquer pessoa que tenha tido contato com a literatura adventista do sétimo dia sabe que, por sua formação histórica, a denominação desaprova tentativas de união religiosa nos moldes do moderno ecumenismo.

Alguns poucos textos de Ellen G. White são suficientes para convencer qualquer pessoa sobre tal posição. Ei-los:

“… Mundanos juntamente aceitarão a forma de piedade, destituída de sua eficácia, e verão nesta aliança um grandioso movimento para conversão do mundo, e o começo do milênio há tanto tempo esperado.”1

“Mediante dois grandes erros – a imortalidade da alma e a santidade do domingo – Satanás há de enredar o povo em suas malhas.”2

“A vasta diversidade de crenças nas igrejas protestantes é por muitos considerada como prova decisiva de que ja-mais se poderá fazer esforço algum para se conseguir uma uniformidade obrigatória. Há anos, porém, que nas igrejas protestantes se vem manifestando poderoso e crescente sentimento em favor de uma união baseada em pontos comuns de doutrinas. Para conseguir tal união, deve-se necessariamente evitar toda discussão de assuntos em que não estejam todos de acordo, independentemente de sua importância do ponto de vista bíblico.”3

“… Formarão uma confederação com o homem do pecado, e a igreja e o mundo estarão em corrupta harmonia.”4

Nesses poucos textos da escritora adventista, deduzimos alguns itens sobre a questão em apreço. Embora Ellen White não use a palavra “ecumenismo” como a conhecemos hoje, ela usa a palavra “união” para expressar uma grande reunião ecumênica nos moldes do que vemos em nossos dias. Para ela, ecumenismo, ou união, constitui-se algo contrário à palavra de Deus, por estar fundamentado sobre doutrinas não bíblicas. A base para tal união de igrejas não precisa envolver todas as doutrinas, mas reside apenas em duas: a imortalidade da alma e a santificação do domingo, com todas as implicações teológicas decorrentes.

A união será ampla, envolvendo o mundo religioso como um todo. Ora através da santidade do primeiro dia da semana, ora através do espiritualismo e sua crença na imortalidade da alma (que pode envolver religiões cristãs e não cristãs). Haverá uma cabeça dessa “união” e os demais seguirão seus postulados. Tal união trará como conseqüência a junção de Estado e religião, ocasionando a restrição da liberdade religiosa. Para White, o movimento ecumênico teria dois objetivos básicos: uma pseudo-conversão do mundo e a instalação, no mundo, de um milênio de paz. Todo esse movimento teria aparência de piedade, mas na prática negaria sua eficácia. Ou seja, aparentemente seria um movimento para o bem da humanidade, mas sua essência não seria divina.

Envolvimento adventista

Participam os adventistas do movimento ecumênico? Essa é uma boa pergunta num tempo de pluralidade religiosa e falta de compromisso. A resposta pode ser sim ou não, com explicações. Se dissermos sim, tudo vai depender de que parte do movimento ecumênico estamos falando. Por exemplo, quando o ecumenismo prega a liberdade religiosa e o respeito aos direitos humanos, combate os males do racismo, ou providencia ajuda burocrática para a entrada de missionários em lugares que ainda não foram penetrados pelo evangelho, não podemos simplesmente ignorar seu lado positivo. Ainda assim, nesses casos, recomenda-se cautela, para não incorrer-se em negação da verdadeira fé.

O Comitê Executivo da Associação Geral da Igreja Adventista do Sétimo Dia nunca tomou um voto a respeito de sua relação com o movimento ecumênico atual. O que a Igreja tem feito é tornar claro que não faz parte do movimento ecumênico no sentido de ser membro do Conselho Mundial de Igrejas nem compartilhar de seus objetivos básicos. A Igreja Adventista relaciona-se com o Conselho Mundial de Igrejas na qualidade de observer consultant, ou seja, há um representante observador que a mantém informada sobre as tendências e o desenrolar do movimento.5

Para os adventistas, ser membro de tal organização não é aconselhável porque, nos escritos de Ellen White, um movimento de união de igrejas no tempo do fim seria pernicioso e não correspondería às expectativas de Deus e de Sua Palavra. Embora não se possa dogmatizar, o atual movimento de união parece ser o início da grande confederação do mal que existirá no fim dos tempos, e que imporá um falso dia de repouso à humanidade. Tudo sob a proteção das leis do Estado.

Chance de diálogo

O teólogo adventista Mario Veloso resumiu a posição da Igreja nos seguintes termos:

“Os adventistas nunca se opuseram à verdadeira unidade cristã. … Entendemos, porém, que o movimento ecumênico não é uma união baseada nas doutrinas bíblicas, mas na apostasia de Apocalipse 13. Os que integram a unidade separam-se cada vez mais dos ensinos da Sagrada Escritura. … A Igreja Adventista não é membro do Conselho Mundial de Igrejas, nem se integrou de forma direta no movimento ecumênico. Insistimos que isto não se verifica porque esta Igreja seja contrária à unidade do cristianismo. … Isto não impede que em alguma oportunidade algum adventista participe, como ‘observador’, de algumas reuniões do Conselho Mundial de Igrejas. Em nenhum momento, porém, em caráter de representante oficial da Igreja Adventista. Tem havido também encontros de líderes do Conselho Mundial de Igrejas e teólogos adventistas, com o propósito de estudar determinados pontos doutrinários. A Igreja Adventista está sempre interessada no esclarecimento da doutrina, e tudo o que possa fazer nesse sentido, perante qualquer tipo de público, será feito. Isto não significa adotar as doutrinas ou ensinos dos grupos com os quais estuda a Sagrada Escritura.”6

O grande problema de um movimento ecumênico, nos moldes atuais, é justamente sua falta de compromisso com as verdades básicas do cristianismo. Além disso, tende a, num sistema de concessões mútuas, distorcer a fé que “uma vez foi entregue aos santos”. A religião verdadeira não é uma mercadoria da qual seja possível se desprender para tentar conseguir uma unidade eclesiástica que, na prática, pode ser vista como plástica por não preocupar-se em elaborar um corpo doutrinário conforme os ensinos básicos da Palavra de Deus.

Podemos dizer que a Igreja Adventista do Sétimo Dia rejeita esse tipo de unidade, mas aceita unir-se àqueles que fazem da verdade bíblica a base de sua fé e prática. Isso não deve excluir o diálogo respeitoso e esclarecedor com qualquer pessoa ou religião. Aliás, a própria Ellen White instruiu os pastores adventistas a se aproximarem e dialogarem sobre pontos de fé e doutrina com pastores de outras denominações. Essa aproximação serviria para eliminar dúvidas e preconceitos em relação ao adventismo. Eis o seu conselho:

“Nossos pastores devem fazer sua obra especial o trabalhar por pastores. Não devem entrar em polêmica com eles mas, com a Bíblia na mão, insistir com eles para que estudem a Palavra. Feito isto, muitos pastores que agora pregam o erro hão de pregar a verdade para este tempo. …

“Talvez tenhais oportunidade de falar em outras igrejas. Aproveitando essas ocasiões, lembrai-vos das palavras do Salvador: ‘Portanto, sede prudentes como as serpentes e símplices como as pombas.’ Não desperteis a malignidade do inimigo com denunciadores discursos. Fechareis assim as portas à verdade.”7

É interessante observar que Ellen White não apenas recomendou o trabalho em prol daqueles que não são adventistas, mas também permitiu, com ressalvas, oradores adventistas falar em outras igrejas. Em outra situação, ela estimulou a participação e cooperação de adventistas com a União de Mulheres Cristãs Pró-Temperança, uma organização formada por protestantes e vista por alguns em sua época como parte da babilônia espiritual.8

A Igreja Adventista crê que foi estabelecida para pregar o evangelho eterno “a cada nação, e tribo, e língua e povo” (Apoc. 14:6). Isso inclui pregar, ensinar, dialogar e explicar as crenças, sem fazer concessões fora dos padrões escriturísticos. O fato de um líder adventista entregar um brinde ao líder de outra denominação, ou de um coral adventista cantar em alguma atividade religiosa não adventista, não precisa ser interpretado como envolvimento ecumênico.

Uma história que ouvi, tempos atrás, nos ensina uma lição oportuna: Um cristão e um espírita debateram durante uma noite, sobre suas convicções religiosas. No outro dia, o espírita comentou com um familiar o diálogo ocorrido e o resumiu nas seguintes palavras: “Ele não concorda com nada do que eu creio, mas ele me ama como pessoa.” Amar os que não são da nossa fé não significa concordar e aceitar suas crenças; mas respeitá-los e partilhar nosso modo de crer de maneira amorosa, gentil e cristã.                  

Referências:

  • 1 Ellen G. White, O Grande Conflito, págs. 588 e 589.
  • 2 Ibidem, pág. 588.
  • 3 Ibidem, pág. 444.
  • 4 Ellen G. White, The Seventh-Day Adventist Bible Commentary, vol. 7, pág. 975.
  • 5 Werner Vyhmeister, Misión de la Iglesia Adventista, Salt, 1981, págs. 183-188.
  • 6 Mario Veloso, A Igreja Adventista e o Ecumenismo, Revista Adventista, junho de 1984, pág. 42.
  • 7 Ellen G. White, Evangelismo, págs. 562-564.
  • 8 George Knight, Ministério, julho-agosto de 2002, págs. 21-23.