A Assembleia da Associação Geral de 1901 entrou para a história da Igreja Adventista como o início de uma grande reorganização administrativa que levou a denominação a “acomodar o crescimento do passado” e “facilitar o crescimento futuro”.1 Além dos debates acerca das mudanças estruturais, a reunião também abordou temas relacionados ao evangelismo urbano.

Em certo momento, John Corliss, pastor da igreja de São Francisco, fez uma breve apresentação sobre o trabalho na cidade e colocou-se à disposição para responder algumas perguntas dos delegados da Assembleia. A obra desempenhada era muito dinâmica. Cultos evangelísticos eram realizados para marinheiros; atendimento espiritual era oferecido a presidiários; médicos palestravam na igreja sobre doenças comuns e tratamentos naturais; uma enfermeira trabalhava no dispensário local; a assistência social da igreja era ativa na doação de alimentos e roupas; revistas e panfletos missionários eram vendidos ou distribuídos; havia vários pequenos grupos de membros que visitavam idosos, enfermos e pobres; trabalho contextualizado era feito em favor de chineses e japoneses; e os cultos de domingo eram dedicados ao estudo de Daniel e Apocalipse.2 A variedade de iniciativas e o fervor missionário não eram infrutíferos. 

Ao ser questionado por David Paulson se pessoas estavam aceitando a mensagem do sábado, Corliss respondeu: “Sim! E tivemos até três batismos em um mês. Nunca deixamos de ter batismo todo mês, de 
pessoas que conhecem a verdade.”3

De fato, o relatório de Corliss coincide com a percepção de Ellen White a respeito do trabalho desenvolvido pela igreja. Poucos meses antes da Assembleia, em novembro de 1900, ela visitou a cidade e descreveu: “Durante os últimos poucos anos a ‘colmeia’ em São Francisco tem sido, sem dúvida, uma colmeia muito ocupada. Muitos setores do trabalho cristão têm sido desenvolvidos por nossos irmãos e irmãs. Neles se incluem a visitação aos enfermos e desamparados, fundação de lares para órfãos e a obra em favor dos desempregados, o cuidado dos doentes, o ensinamento da verdade de casa em casa, distribuição de literatura e a promoção de classes sobre vida saudável e o cuidado dos enfermos.” 4

O trabalho realizado por “irmãos e irmãs” incluía também “uma escola para crianças”, “um lar para trabalhadores e uma missão médica”, “salas de tratamento que funcionavam como filiais do Sanatório Santa Helena”, “um armazém de alimentos saudáveis”, “um restaurante vegetariano”, “trabalho missionário” para os marinheiros a bordo no porto e “reuniões [evangelísticas] em grandes salões na cidade”.5

Alcançar esse nível de atividade em nossas igrejas atualmente é um grande desafio, embora a estrutura de muitas delas seja melhor do que a existente em São Francisco no início do século passado. Qual era o segredo para manter a igreja engajada daquela maneira? Um pastor de dedicação exclusiva para a congregação local e muitas pessoas contratadas pela igreja? A resposta de Corliss é surpreendente: “Não. Um homem pode circular entre a igreja e simplesmente pregar até que ela dependa inteiramente de sua pregação; mas nossa igreja não faz isso, nossa igreja está trabalhando. Tentamos fazer com que cada membro da igreja trabalhe. Contudo, o pastor precisa ter mente perspicaz ao falar com diferentes membros, a fim de saber exatamente para qual atividade aquela pessoa está apta.”6

Tão importante quanto ajudar os membros da igreja a encontrar seu lugar no corpo de Cristo é ensiná-los a trabalhar. Em sua exposição, Corliss destacou essa necessidade. Em São Francisco, isso acontecia após o culto de sábado, quando um grupo que variava entre 75 e cem pessoas permanecia na igreja para receber instruções sobre como trabalhar na obra evangelística.7

A experiência dessa “colmeia” ilustra como cada congregação adventista pode ser ativa e bem-sucedida no cumprimento da missão. É muito provável que Ellen White tivesse em mente exemplos como esse, quando escreveu em 1905: “Toda igreja deve ser uma escola missionária para obreiros cristãos. Seus membros devem ser instruídos em dar estudos bíblicos, dirigir e ensinar classes da Escola Sabatina, na melhor maneira de auxiliar os pobres e cuidar dos doentes e trabalhar pelos não convertidos. Deve haver cursos de saúde, de arte culinária, e classes em vários ramos de serviço no auxílio cristão. Não somente deve haver ensino, mas trabalho real, sob a direção de instrutores experientes. Que os mestres vão à frente no trabalho entre o povo, e outros, unindo-se a eles, aprenderão por seu exemplo. Um exemplo vale mais que muitos preceitos.”8

Escola missionária

Uma avaliação objetiva, no entanto, indica que muitas igrejas adventistas estão longe de ser uma “escola missionária para obreiros cristãos”. Programações majoritariamente voltadas para os membros; investimento de grande parte dos recursos para manutenção das estruturas locais; número cada vez menor de membros envolvidos em atividades missionárias; aumento mediano e, em alguns casos, estagnação no número de batismos; evasão crescente, especialmente, de jovens; dificuldade no plantio de novas congregações e pouca relevância na comunidade são sintomas da apatia espiritual que prevalece em alguns lugares.

Em 1900, Ellen White identificou condição semelhante na igreja e afirmou: “Os pretensos seguidores de Cristo estão em prova diante de todo o universo celestial; mas a sua frieza de zelo e fragilidade dos esforços no serviço de Deus os identifica com os infiéis. […] Sabem, e o mundo também, que em alto grau perderam o espírito de abnegação e de carregar a cruz. Junto ao nome de muitos será escrito nos livros do Céu: Não produtores, porém consumidores.”9

O diagnóstico incômodo, porém, não deve desmotivar pastores e líderes de igreja, mas realçar a necessidade de compreender melhor a realidade e reagir conforme a revelação divina. Ao afirmar que “toda igreja deve ser uma escola missionária”, Ellen White apresentou o caminho pelo qual cada congregação adventista deve trilhar para alcançar o propósito do Senhor. Em síntese, a citação apresenta quatro elementos: liderança experiente, fortalecimento espiritual, ações coordenadas e evangelização ativa. Certamente, se colocado em prática, o que ela escreveu a respeito de cada ponto resultará em crescimento espiritual e numérico para o povo de Deus.

Liderança experiente

Na “escola missionária” promovida por Ellen White, “mestres” e “instrutores experientes” deveriam ir à frente dos membros, ensinando a teoria e a prática do trabalho missionário. Mas quem seriam eles? Embora a menção possa incluir discípulos maduros que não tenham um ministério formal na igreja, há razões para crer que ela esperava uma ação especial dos líderes da congregação.

Durante seu ministério, ela destacou a importância do papel do pastor e do ancião na capacitação dos membros da igreja, a fim de que pudessem cumprir a missão. Em realidade, ao que tudo indica, os ministros deveriam ser responsáveis pela instrução dos anciãos e, por sua vez, os anciãos deveriam capacitar os discípulos locais e ajudá-los a encontrar sua função no corpo de Cristo.10

Em diversas ocasiões, Ellen White destacou a importância de os anciãos dedicarem tempo para ensinar as pessoas a trabalhar em favor da expansão do reino. Por exemplo, em 1890, ela escreveu: “Os anciãos e dirigentes da igreja devem dar mais atenção aos planos para a realização do trabalho. […] É trabalhando pelos outros que esquecemos de nós mesmos. Aqueles, porém, que nada fazem por seus semelhantes se tornam tristes e egocêntricos, e o tempo pesa sobre suas mãos. É essencial que essa educação seja dada aos membros da igreja, para que se tornem obreiros altruístas, devotados e eficientes para Deus.”11

Embora o tempo tenha passado, Ellen White tenha ido para o campo missionário e voltado, sua percepção a respeito do trabalho dos anciãos não mudou. 
Em 1908, ela os orientou a “encontrar formas e meios de oferecer oportunidades a todos os membros, a fim de que tomem parte na obra de Deus. Isso nem sempre foi feito no passado. […] É necessário treinamento e educação. […] Esse trabalho 
de treinamento deve ser acompanhado de fervorosa busca do Senhor, clamando por Seu Espírito Santo”.12

O conceito se repete também em Atos dos Apóstolos, obra publicada em 1911 que traduz a visão de Ellen White acerca “do que a igreja deve ser no mundo, até a segunda vinda de Cristo”.13 Ao mencionar o trabalho dos anciãos, ela afirmou: “Os que ocupam a posição de subpastores devem exercer atento cuidado sobre o rebanho do Senhor. […] Ministrar significa mais que pregar sermões; significa trabalho zeloso e pessoal. A igreja na Terra é composta de homens e mulheres falíveis, que necessitam de esforços laboriosos e pacientes para que sejam disciplinados e educados para trabalhar de forma aceitável nesta vida e, na futura, ser coroados de glória e imortalidade”.14

Os exemplos apresentados demonstram o posicionamento consistente de Ellen White, no qual um ancionato consagrado, zeloso, disposto a ensinar os membros a trabalhar e ativo na missão é fundamental para que a igreja seja “impedida de se tornar infrutífera e morta”.15

Fortalecimento espiritual

Outro ponto que se destaca na igreja ideal de Ellen White é a importância da Escola Sabatina. Anos antes, em 1885, ela reconheceu: “Muito pode ser feito pela educação e preparo moral e religioso de nossos jovens por meio de Escolas Sabatinas bem organizadas e devidamente dirigidas.”16 Tempos depois reafirmou: “Sinto um profundo interesse por nossas Escolas Sabatinas em todo o país, porque acredito que sejam instrumentos de Deus para a educação de nossos jovens nas verdades da Bíblia.”17

Uma leitura cuidadosa dos textos de Ellen White acerca da obra da Escola Sabatina indica que, para a líder, a preparação espiritual de crianças e jovens para “enfrentar e vencer os males que foram introduzidos na sociedade”,18 a partir de uma compreensão profunda das Escrituras, era um dos principais objetivos desse ministério. Assim, o compromisso da juventude com a Palavra de Deus seria uma salvaguarda para sua vida espiritual e o elemento motivador para seu engajamento na missão da igreja.

Isso, porém, não significa que os adultos deveriam ser negligenciados. “Entre os alunos da Escola Sabatina deve haver um espírito de investigação, a fim de que os que têm idade suficiente para discernir evidências sejam encorajados a buscar novos raios de luz e apreciar tudo o que Deus pode enviar a Seu povo. […] Deus chama a cada um, idosos e jovens, para examinar diligentemente Sua Palavra, a fim de que descubram os ricos tesouros da verdade. Ministros e povo, professores e alunos, todos são chamados para a obra do estudo da Bíblia.”19

Como resultado, a Escola Sabatina deve ser uma estrutura não apenas de fortalecimento espiritual dos membros da igreja, promoção do conhecimento bíblico e coesão doutrinária, mas também de conquista de pessoas para Cristo. Ellen White aconselhou que na Escola Sabatina, “por meio de viva ligação com Deus, homens e mulheres, jovens e crianças, sejam preparados para ser uma força e bênção para a igreja”.20

Ações coordenadas

Em conexão com o preparo espiritual/doutrinário dos membros proporcionado pela Escola Sabatina, a igreja-escola deveria pensar “na melhor maneira de auxiliar os pobres, cuidar dos doentes e trabalhar pelos não convertidos”. Em 1902, Ellen White apresentou um método de trabalho que amplificaria os esforços congregacionais. “A formação de pequenos grupos como base de esforço cristão foi-me apresentada por Aquele que não pode errar. 
Se há na igreja grande número de membros, convém que se organizem em pequenos grupos a fim de trabalhar não somente pelos membros da própria igreja, mas também pelos incrédulos. Se, em um lugar, houver apenas dois ou três que conheçam a verdade, organizem-se num grupo de obreiros. Mantenham intacto seu laço de união, apegando-se uns aos outros com amor e unidade, animando-se mutuamente para avançar, adquirindo cada qual estímulo e força com o auxílio dos outros.”21

De acordo com a orientação, tanto as igrejas grandes quanto as pequenas seriam beneficiadas, uma vez que a formação de grupos proporcionaria organização, direcionamento e motivação para o trabalho, favorecendo espiritualmente os membros e também os incrédulos. Nas reuniões de pequenos grupos, “o talento da palavra” deveria ser usado “para que uns aos outros se edifiquem na mais santa fé”.22 Ao exercer um papel evangelístico, os membros deveriam seguir o exemplo de Cristo, que ia “de lugar em lugar, abençoava e confortava os sofredores e curava os enfermos. […] 
Pequenos grupos devem sair para fazer a obra que Cristo indicou aos Seus discípulos. Enquanto trabalham como evangelistas, eles podem visitar os doentes, orar com eles e, se necessário, tratar deles, não com medicamentos, mas com os remédios providos pela natureza”.23

Dessa maneira, os pequenos grupos proporcionam uma estrutura de organização que serve para fortalecer os vínculos 
entre os membros, dar oportunidade para que eles cresçam em conhecimento e habilidade para o serviço e colocar em prática o que aprenderam na comunidade em que estão inseridos. Assim, onde a igreja se movimenta de maneira organizada, ativa e comprometida em fazer o bem às pessoas, conforme as necessidades delas, portas se abrem para que o evangelho seja ensinado. E os membros precisam estar preparados para apontar, por meio da Bíblia, a salvação em Cristo Jesus.

Evangelização ativa

Ellen White afirmou que a igreja local, como “escola missionária”, deveria se empenhar em ensinar para os membros como “dar estudos bíblicos”. Ela destacou a importância desse trabalho por várias vezes. Por exemplo, em 1909, escreveu: “Entre os membros de nossas igrejas deve haver mais trabalho de casa em casa, dando estudos bíblicos e distribuindo literatura.” “O Senhor me apresentou a obra que tem de ser feita em nossas cidades. Os crentes aí devem trabalhar para Deus nas vizinhanças de sua casa. Necessitam fazê-lo quieta e humildemente, levando consigo, aonde quer que forem, a atmosfera do Céu. Se perderem de vista o próprio eu, apontando sempre para Cristo, será sentido o poder de sua influência.”24

Há, nos escritos de Ellen White, uma linha de trabalho que perpassa suas orientações. Os membros devem andar com Deus, conhecer as Escrituras, organizar-se para o serviço, envolver-se com a comunidade, suprir-lhe as necessidades e ensinar intencionalmente os princípios bíblicos. Esse processo deve ocorrer de maneira natural, na medida em que cada discípulo de Cristo age à semelhança Dele. A compartimentalização ou superênfase que ocorre em algumas abordagens não existe no modo de ação que ela recomenda.

Agindo assim, a igreja crescerá organicamente, como resultado da bênção do 
Senhor sobre os esforços humanos. “Ao irem, como fizeram os discípulos, de um lugar para outro, contando a história do amor do Salvador, vocês farão amigos e verão o fruto do seu trabalho. […] Haverá ministração aos enfermos, e os aflitos receberão oração. Haverá voz de canto e oração. As Escrituras serão abertas para testificar da verdade. E com os sinais que se seguirão, o Senhor confirmará a palavra falada.”25

O caminho para fazer da igreja uma “escola missionária” demanda consagração, esforço, perseverança, sensibilidade e foco. Se a liderança dos anciãos for afirmada; membros forem instruídos conforme as orientações da Palavra; crianças e jovens forem apoiados; pequenos grupos forem bem estruturados; a comunidade for envolvida com serviço relevante; e as Escrituras forem abertas ao povo com autoridade; o sonho se tornará realidade, e a promessa da vinda de Cristo poderá ser cumprida nesta geração. Façamos a nossa parte na obra do Senhor!  

Referências

1 Barry D. Oliver, Assembleias da Associação Geral de 1901 e 1903, em Denis Fortin e Jerry Moon (orgs.), Enciclopédia Ellen G. White (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2018), p. 675.

2 J. O. Corliss, “City work”, The General Conference Bulletin, 21/4/1901, p. 370-372.

3 Corliss, p. 372.

4 Ellen G. White, Beneficência Social (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2012), p. 112.

5 White, p. 112.

6 Corliss, p. 371.

7 Corliss, p. 370.

8 Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2015), p. 149.

9 Ellen G. White, Parábolas de Jesus (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2016), p. 303, 304.

10 Ver Wellington Barbosa, As Duas Faces do Ministério (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2020).

11 Ellen G. White, “Ye are laborers together with God”, Review and Herald, 2/9/1890.

12 Ellen G. White, An Appeal to Ministers and Church Officers (Mountain View, CA: Pacific Press, 1908), p. 6.

13 Jean-Luc Rolland, Atos dos Apóstolos, em Denis Fortin e Jerry Moon (orgs.), Enciclopédia Ellen G. White (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2018), p. 680.

14 Ellen G. White, Atos dos Apóstolos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2021), p. 334 [526].

15 White, “Ye are laborers together with God”.

16 Ellen G. White, “Sabbath-school duties in the camp-meeting and at home”, Sabbath-School Worker, 1º/7/1885.

17 Ellen G. White, “The responsabilities of parents and teachers”, Sabbath-School Worker, 1º/4/1889.

18 Ellen G. White, “Sabbath-school influences”, Sabbath-School Worker, 1º/4/1886.

19 Ellen G. White, Testimonies on Sabbath-School Work (Washington, D.C.: Review and Herald, 1900), p. 64.

20 White, p. 92.

21 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2020), v. 7, p. 21 [21, 22].

22 White, p. 22.

23 Ellen G. White, “Medical missionary work”, Review and Herald, 17/12/1914.

24 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2020), v. 9, p. 100, 101 [127, 128].

25 Ellen G. White, “Evidences of discipleship”, Review and Herald, 4/2/1904.