Saiba como se prevenir contra as principais causas de esgotamento entre pastores

S. Joseph Kidder

Jonny Wesley Moor

São frequentes as estatísticas sobre burnout e as histórias dos que abandonam o ministério devido ao esgotamento. Quando, porém, falamos a respeito do assunto, tentamos nos isolar. “Isso não vai acontecer comigo. Eu sou diferente.” Essa atitude pode ser perigosa, porque nos cega quanto aos sinais de alerta e permite que o esgotamento sutilmente tome conta de nós. Neste artigo, contamos nossas histórias, apontamos as causas do esgotamento e explicamos o processo que descobrimos para encontrar cura e esperança. A história de Moor, um pastor jovem, fornece o pano de fundo para as primeiras quatro causas, a de Kidder, um ministro veterano, para as últimas quatro.

Um jovem esgotado

Pouco tempo depois de iniciar meu ministério, deixei o trabalho pastoral para cursar o mestrado. Senti-me esgotado com menos de três anos no pastorado! Passei a fazer parte dos 33% de pastores que sofrem de burnout nos primeiros cinco anos de ministério.1 O que aconteceu?

Causa 1: Desgastei-me trabalhando sem me poupar e, bem cedo, o ministério consumiu minhas energias. Para mim, a igreja era como se eu tivesse encontrado um saco de cinco quilos de batata frita e levado para meu escritório. Isso era tudo de que eu precisava! Eu ficava até tarde da noite fazendo ligações, preparando apostilas, elaborando sermões e apresentações – eu, minhas batatas fritas e meu ministério. Quem precisa de horas de sono regular quando se está realizando a obra do Senhor? Depois de me casar, meus hábitos não mudaram muito. Mesmo às 10 da noite, se um membro da igreja estivesse ligando de novo, eu tinha que atender. Eu não podia dizer “não” para o trabalho. Meu problema era a falta de limites.

Estabelecer limites é um fator-chave na prevenção do burnout.2 Sem limites, as pessoas que exercem profissões de ajuda ao próximo podem ficar expostas a riscos perigosos.

Causa 2: As responsabilidades invadiram áreas essenciais da minha vida. Comecei a me empenhar nas demandas da igreja e da escola, aconselhando pais e alunos, ministrando estudos bíblicos, administrando ministérios e realizando outras atividades. Com todas essas responsabilidades, o tempo diário para a oração, o estudo e a reflexão foi sendo substituído pelas atividades ministeriais, e minha alma começou a sofrer. Eu estava correndo vazio, faltava a espiritualidade vibrante.

Diane Chandler denomina a renovação espiritual como um dos três principais fatores cruciais para evitar o esgotamento.3 À medida que diminuía minha conexão pessoal com Deus, as atividades desafiadoras que eu costumava realizar com o poder do Alto passaram a ser feitas com minhas próprias forças.

Causa 3: As demandas do trabalho também afetaram meu relacionamento com amigos e familiares. Meus pais moravam a menos de 10 minutos de distância, mas passavam-se meses antes que eu fosse visitá-los. Mesmo quando a igreja deles me convidava para oficiar alguma cerimônia, eu não podia atender porque “tinha” que estar sempre presente em minhas congregações. Eles não estão com raiva de mim. Eles ainda me amam. No entanto, jamais poderei corrigir minha ausência na vida deles. Eu não estava lá para apoiá-los em momentos importantes.

O relacionamento com minha esposa também sofreu. Muitas vezes, não dei a ela a atenção devida até que surgisse algum tipo de problema relacional. Geralmente, as oportunidades de ficarmos juntos eram nos eventos escolares ou da igreja. Começamos a nos isolar dos amigos, e os que poderiam ter sido nossos amigos estavam restritos aos grupos do ministério. Assumi unicamente a responsabilidade de ser pastor dos amigos e, ao fazê-lo, acabei me sentindo sozinho. Assim, tornei-me carente de relacionamentos.

Pesquisas apontam que “relacionamentos fortes, fora do ambiente do ministério, são importantes para promover a resiliência pastoral”.4 Precisamos de intimidade relacional.

Causa 4: Eu cuidava de duas igrejas que me apoiavam, mas, mesmo assim, surgiram conflitos. Um membro disse que minha pregação bloqueava o Espírito Santo, outro me insultou com palavrões por causa de uma decisão que tomei, e alguns outros sentiram que era seu dever ordenar onde e quando minha esposa e eu devíamos estar. Houve atrito entre os membros em relação ao uso da igreja, troca de desafetos, falta de amor fraternal, decisões erradas tomadas na comissão… Meu preparo era insuficiente para administrar todas aquelas questões. Muitas delas eu simplesmente deixei de resolver, e a tensão se apoderou de mim. Faltou-me capacidade para gerenciar os problemas.

Conflitos na igreja se tornam um fator significativo para o esgotamento pastoral.5 Muitas vezes, eles não são graves, mas essas pequenas feridas e tensões cobram seus tributos ao longo do tempo.6 E o ressentimento aumenta.

As lutas de um veterano

Eu atuava como pastor havia vários anos. Quando iniciei meu ministério, encontrei um sistema que parecia estar funcionando. Meu pastorado era positivo, e os administradores ficavam felizes com meu desempenho. Então, durante um feriado, minha esposa e eu fomos visitar os pais dela. Enquanto eu dirigia, meu coração começou a bater muito acelerado, tão rápido que tivemos que parar. Minha esposa me levou ao hospital, mas não havia sinais de um ataque cardíaco nem derrame. Fui diagnosticado com “estresse severo”. Recebi a notícia com tranquilidade, porque isso não parecia um problema grave de saúde. Então, no dia seguinte, aconteceu novamente. O que estava causando esse estresse? Procurei um especialista no assunto e descobri que estava esgotado, e que vários fatores eram os culpados.

Causa 5: Em minha concepção de liderança pastoral, eu tinha que estar presente em tudo. Pensava que devia ser onipresente. Trabalhava mais de 60 horas por semana e, muitas vezes, gastava tempo demasiado em atividades que não eram compatíveis com minhas habilidades. Eu achava que não precisava de nenhum dia de folga e negligenciava a prática bíblica do descanso.

Trabalhar ininterruptamente durante mais de 50 horas por semana é prejudicial aos pastores, porque tende a levá-los a sofrer “física, relacional e espiritualmente”.7 Sem descanso, a probabilidade de esgotamento aumenta dramaticamente.8 Além das longas horas de trabalho, muitos pastores não separam espaço em suas agendas para aproveitar as oportunidades dedicadas ao relaxamento.9 Pastores também se beneficiam do dia de descanso.10

Causa 6: Embora no seminário eu tivesse recebido ensino de qualidade, ainda me sentia deficiente em elaborar projetos, plantar igrejas ou resolver conflitos, entre outras coisas. Eu queria muito desenvolver essas habilidades. Certo dia, o pastor responsável pela sede administrativa a que minha igreja pertencia me ligou e disse que gostaria de levar minha esposa e eu para jantar. Imaginei que essa seria a oportunidade de obter ajuda para resolver os problemas que eu estava enfrentando no ministério. Tivemos momentos bem agradáveis, mas não ouvi nada relacionado aos meus anseios. Reunir-se com o líder, muitas vezes resulta em parte do apoio que muitos pastores recebem, mas eu precisava de mais. Como tantos outros pastores, não tive apoio profissional nem intencional.11

Pastores não sabem tudo. O apoio de instituições da igreja ou de fontes externas, como um conselheiro ou grupo de apoio, pode fornecer orientação, treinamento e incentivo essenciais. Sem isso, os pastores estagnam. A rotina ministerial pode levá-los a se sentirem vazios e oprimidos.12

Causa 7: Como pastor, cabia a mim satisfazer as expectativas das iniciativas ou projetos da sede regional e, à igreja, executar. A igreja que eu pastoreava foi líder em batismos durante cinco anos seguidos, mas, no sexto ano, isso não ocorreu. Uma tarde, recebi um telefonema de um oficial da sede regional. Ele me perguntou se havia mais algum batismo para relatar. Não tinha nenhum. Eu senti como se o tivesse decepcionado. Se os membros não apresentassem mais alguém, como líder eu me sentia na obrigação de correr atrás para que pudéssemos alcançar nossos objetivos. Eu não tinha a habilidade necessária para lidar de maneira saudável com as expectativas.

A dificuldade para encarar as expectativas é um dos fatores mais citados pelos pastores que sofrem de burnout.13 A estrutura e o sistema eclesiástico têm muitas expectativas quanto a seus ministros, e os pastores têm sido vítimas dessas expectativas.

Causa 8: As altas expectativas afetaram meu desempenho no trabalho. Elas também se tornaram o instrumento de medição para aferir minha autoestima. Se a igreja estava indo bem, eu estava bem. Se a igreja estava indo mal, eu me sentia desqualificado. Se meu sermão era raso, eu era um fracasso. Minha identidade estava ligada ao sucesso da igreja, em vez de estar centrada em Cristo.

O “sentimento de inadequação” foi identificado como um fator significativo para o burnout.14 Não importa quais sejam as causas específicas da questão de autovalorização, os complexos de inadequação acabarão com a saúde.

O tratamento

Nós dois, Jonny e Joseph, chegamos à conclusão de que estávamos esgotados e precisávamos de ajuda. Independentemente do histórico, idade, experiência ou intenções, o esgotamento bate à porta de todos os pastores.15 O que fizemos? Lemos livros, procuramos conselheiros e amigos, reconhecemos as causas e começamos a fazer mudanças em nossa vida. A seguir, apresentamos uma estratégia em três passos, que resume nossa experiência e pode ajudar você a evitar ou tratar o burnout.

Cultive a autoestima bíblica. Quer nosso valor venha dos outros, da capacidade de concluir projetos ou de qualquer outra parte, essas fontes nunca nos satisfarão. Deus quer que nosso senso de valor venha Dele. Fomos criados por Ele, por isso dependemos do Criador para nossa saúde emocional. Até mesmo Jesus precisou dessa autoafirmação que deu a Ele o senso de identidade para cumprir Sua missão: “E eis que uma voz dos céus dizia: ‘Este é o Meu Filho amado, em quem Me comprazo’” (Mt 3:17).16

Reflita sobre sua identidade. Em Deus, ela é mais forte do que qualquer outra identidade. Fontes comuns de identidade, como herança, realizações, posições ou posses, podem ser tiradas de nós. Entretanto, de acordo com a Bíblia, somos príncipes e princesas de Deus. Somos filhos amados do Rei, e ninguém pode nos, tirar esse status divino. O Senhor permitiu que Seu Filho fosse oferecido como resgate pelos nossos pecados, para que pudéssemos ser parte de Sua família.

Lembre-se de que você foi transformado (2Co 3:18), e que o Espírito Santo pode renovar nossa mente (Rm 12:2). Estude diariamente as Sagradas Escrituras, ore e escute a voz de Deus.

Estabeleça as prioridades de acordo com a vontade de Deus. Quando nos identificamos como filhos e filhas de Deus, nossas prioridades começam a mudar. Essa transformação é fundamental para evitar ou lidar com o burnout, porque grande parte dele resulta da definição equivocada de prioridades. Apesar de sermos tentados a colocar uma acima das outras, a presença recorrente delas em toda a Bíblia demonstra que elas devem ser mantidas em equilíbrio. Quais são as prioridades ou os ideais divinos para Seus ministros?

Espiritualidade. O Senhor deseja manter conexão íntima conosco. Enoque andou com Deus. A finalidade do santuário terrestre era de que Deus estivesse com Seu povo (Êx 25:8). Jesus manteve comunhão íntima com o Pai (Lc 5:16). Ele também recomendou a busca do reino de Deus em primeiro lugar (Mt 6:33). O Salvador estava sempre ocupado, mas manter Sua conexão com Deus O protegeu do esgotamento.17

Relacionamentos fraternos. Deus nos criou para viver em comunidade (Gn 1:27; 2:18). Paulo foi um grande incentivador e defensor do propósito divino. “Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros” (Rm 12:10). “Pelo que exortai-vos uns aos outros e edificai-vos uns aos outros, como na verdade o estais fazendo” (1Ts 5:11).18 Relações saudáveis e fraternais protegem contra o burnout.

Descanso. Precisamos de tempo para nos revigorarmos. O dia de descanso semanal, provido pelo Criador, é uma lembrança dessa realidade (Gn 2:3; Êx 33:14). Jesus chamou Seus discípulos para descansar: “Vinde vós, à parte, para um lugar deserto, e descansai um pouco. Porque eram muitos os que vinham e iam, e não tinham tempo nem para comer” (Mc 6:31). Quando descansamos, renovamos as forças para viver e trabalhar com mais entusiasmo.19

Visão da missão. Deus tem uma missão para a igreja. Ele deseja que ela seja uma bênção no mundo, convide pecadores para trilhar o caminho da salvação e faça deles discípulos em Sua obra (Mt 28:19, 20; 1Pe 2:9). O Senhor deseja que Seus ministros causem impactos significativos na vida dos outros, em vez de simplesmente se ocuparem com as tarefas rotineiras da igreja. Ter uma visão clara e relevante de nossa missão evita o esgotamento porque nos motiva e nos ajuda a identificar quais tarefas são úteis e quais não são.

Estabeleça limites. Em Atos 6 vemos como a igreja apostólica lidou com isso. Havia necessidade de dar mais atenção ao cuidado das viúvas, mas os apóstolos estavam sobrecarregados. Se eles tivessem que se encarregar disso também, teriam prejudicado a missão para a qual foram chamados. Por isso, disseram: “Não é razoável que nós deixemos a palavra de Deus e sirvamos às mesas. Escolhei, pois, irmãos, dentre vós, sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria, aos quais encarreguemos deste serviço. Mas nós perseveraremos na oração e no ministério da Palavra” (v. 2-4).

Os apóstolos se preocuparam com as necessidades de sua comunidade. Eles reconheceram que algo devia ser feito. No entanto, priorizaram o que Cristo havia estabelecido quando os chamou e enviou, e delegaram à igreja as outras responsabilidades.

Jesus também estabeleceu limites com base nas prioridades de Seu Pai. Sua missão era buscar e salvar os perdidos (Lc 19:10). Ele estabeleceu limites para Sua vida. Não permitiu que as provações atrapalhassem Sua missão (Lc 4: 28-30). Não Se submeteu aos anseios políticos dos discípulos para Ele (Mt 16:23). Afastou-Se das multidões para descansar e revigorar-Se espiritualmente (Lc 5:16).20

Como pastores do rebanho de Cristo sabemos que precisamos seguir Seu modelo de vida. O problema é colocar isso em ação.21 Reconheça que é necessário estabelecer limites para que o ministério perdure. Eles também são benéficos para a saúde. Não precisamos nos sentir culpados por manter esses limites.22

Ministério brilhante

O burnout mina a vitalidade e o ministério. A falta de limites, espiritualidade, relacionamentos, habilidade para administrar conflitos, descanso e autoestima têm levado muitos servos do Senhor ao esgotamento. Contudo, graças a Deus podemos reavaliar nossas prioridades e superar essas causas, reacendendo a chama do ministério. O desejo divino é que tenhamos vida, e vida abundante (Jo 10:10). Você está preparado para viver essa experiência? 

Referências

1 Dados obtidos em <https://carenetnc.org/services/counseling-for-ministers/>, acesso em 07/5/2019.

2 Elizabeth Ann Jackson-Jordan, “Clergy burnout and resilience: A review of the literature”, Journal of Pastoral Care & Counseling 67, n. 1, março de 2013, p. 2, 3.

3 Diane J. Chandler, “Pastoral burnout and the impact of personal spiritual renewal, rest-taking, and support system practices”, Pastoral Psychology 58, n. 3, 2009, p. 275.

4 Jackson-Jordan, “Clergy burnout and resilience”, p. 4.

5 Barry J. Fallon, Simon Rice e Joan Wright Howie, “Factors that precipitate and mitigate crises in ministry”, Pastoral Psychology 62, n. 1, fevereiro de 2013, p. 27-40. Também reconhecido por Randy Garner, em “Interpersonal criticism and the clergy”, Journal of Pastoral Care & Counseling 67, n. 1, e comprovado nos estudos de Edgar Voltmer, Christine Thomas e Claudia Spahn, em “Psychosocial health and spirituality of theology students and pastors of the German Seventh-Day Adventist Church”, Review of Religious Research 52, n. 3.

6 H. Peter Swanson, “Pastoral stress management to maximize family function”, Ministry, março de 2013, p. 17-20.

7 Franco Vaccarino e Tony Gerritsen, “Exploring clergy self-care: A New Zealand study”, International Journal of Religion and Spirituality in Society 3, n. 2, 2013, p. 71.

8 Fallon, Rice e Howie, p. 28, 33.

9 Richard A. Swenson, Margin: Restoring emotional, physical, financial, and time reserves to overloaded lives (Colorado Springs, CO: NavPress, 2004).

10 Erik C. Carter, “The practice and experience of the sabbath among Seventh-day Adventist pastors”, Pastoral Psychology 62, n. 1, p. 25.

11 Fallon, Rice e Howie, p. 33.

12 Benjamin D. Schoun, Helping Pastors Cope: A psychosocial support system for pastors (Berrien Springs, MI: Andrews University Press, 1982), p. 191-200.

13 Fallon, Rice, and Howie, p. 273.

15 “New study of pastor attrition and pastoral ministry”, <http://lifewayresearch.com/pastorprotection/>, acesso em 07/5/2019.

16 Textos bíblicos são da Almeida Revista e Atualizada, 2ª edição.

17 John Ortberg, The Life You’ve Always Wanted: Spiritual disciplines for ordinary people (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2002), p. 84.

18 Carl F. George, Prepare Your Church for the Future (Tarrytown, NY: F. H. Revell, 1991), p. 129-131.

19 Vaccarino e Gerritsen, p. 72.

20 Bill Gaultiere, “Jesus set boundaries”, <https://www.soulshepherding.org/jesus-set-boundaries/>, acesso em 07/5/2019.

21 Henry Cloud e John Sims Townsend, Boundaries: When to say yes, how to say no to take control of your life (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1992).

22 Margarita Tartakovsky, “10 ways to build and preserve better boundaries”, Psych Central, <https://psychcentral.com/lib/10-way-to-build-and-preserve-better-boundaries/>, acesso em 07/5/2019.

S. Joseph Kidder, doutor em Ministério, é professor do Seminário Teológico da Universidade Andrews

Jonny Wesley Moor, mestre em Teologia, é pastor no estado de Oregon, Estados Unidos