Como preservar a integridade matrimonial

Alberto R. Timm

A atração entre duas pessoas não casadas pode variar significativamente em natureza, forma e intensidade, mas é mais comum do que normalmente se admite. Uma importante pesquisa sobre vida sexual e emocional mostra que “61% das mulheres e 90% dos homens fantasiam sexualmente com pessoas que encontram”.1 Essas fantasias, contudo, podem facilmente passar de simples pensamentos a imaginação encantadora, desejos irresistíveis, decisões irreversíveis e atitudes arriscadas. Algumas pessoas optam por ter uma relação fora do casamento, independentemente das consequências que isso possa causar. Outras adotam uma abordagem mais cuidadosa, preferindo nutrir um affair emocional menos perceptível.

Vários livros abordam essa questão importante e complexa. Alguns tentam ajudar aqueles que foram feridos por uma traição.2 Outros ensinam a desenvolver relacionamentos saudáveis, capazes de resistir às tentações sedutoras.3 Este artigo analisa o tema do sexo fora do casamento sob uma perspectiva bíblica e apresenta sugestões úteis sobre como nutrir relacionamentos resistentes ao adultério.

Perspectiva bíblica

A Bíblia trata da questão do sexo fora do casamento mesclando preceitos morais com conselhos práticos sobre como viver uma vida íntegra. Quase todos eles ecoam o sétimo mandamento: “Não cometa adultério” (Êx 20:14; Dt 5:18; cf. Mt 5:27; 19:18; Rm 13:9). Carol Meyers ponderou que “esse preceito sucinto proíbe o sexo fora do casamento. Mas para quem? A proibição do adultério não especifica, e é apenas olhando para outros textos bíblicos que a variedade de comportamentos adúlteros pode ser determinada”.4

Sem dúvida, a proibição do adultério assume um alcance muito mais amplo e um significado muito mais rico se entendido à luz das demais instruções morais do Pentateuco. Por exemplo, Levítico 18 delineia os limites da sexualidade bíblica ao condenar não apenas o incesto e as relações sexuais com parentes próximos (Lv 18:6-17), mas também poligamia (Lv 18:18), adultério (Lv 18:20), homossexualidade (Lv 18:22) e bestialismo (Lv 18:23).5 Deuteronômio 22 destaca a virgindade e condena o sexo antes do casamento (Dt 22:13-21), adultério (Dt 22:22), fornicação com uma mulher comprometida (Dt 22:23, 24), estupro (Dt 22:25-29) e incesto (Dt 22:30).6

Algumas das advertências mais eloquentes contra a infidelidade física e emocional são encontradas em Provérbios 5 a 7. Nesses capítulos, a sedução está associada a olhares atraentes, beleza física, roupas e perfumes especiais e palavras persuasivas. Apesar do fascínio, o caso extraconjugal é considerado um “caminho para o abismo” (Pv 7:27). O adúltero é comparado a um boi que vai para o matadouro, “um animal que corre para a armadilha” (Pv 7:22), alguém atingido no coração por uma flecha e uma “ave que corre para dentro do alçapão” (Pv 7:23). Assim, a conclusão natural é que a pessoa que “comete adultério não tem juízo; só mesmo quem quer arruinar-se é que pratica tal coisa” (Pv 6:32).

Além desses conselhos, o sábio também recomendou pelo menos quatro estratégias para preservar a pureza moral: (1) fortalecer o amor romântico no casamento (Pv 5:18-20); (2) manter distância física da tentação (Pv 5:8; 7:25); (3) ter controle emocional (Pv 4:23; 7:25); e (4) estar sempre ciente da presença de Deus. Ele afirmou: “Porque os caminhos do homem estão diante dos olhos do Senhor, e Ele considera todas as suas veredas” (Pv 5:21).

Por sua vez, o profeta Malaquias ressaltou a fidelidade ao voto matrimonial, reconhecendo o próprio Deus como a verdadeira testemunha da aliança conjugal. Primeiro, ele declarou: “O Senhor foi testemunha da aliança entre você e a mulher da sua mocidade, a quem você foi infiel, sendo ela a sua companheira e a mulher da sua aliança” (Ml 2:14). E então advertiu: “Portanto, tenham cuidado para que ninguém seja infiel para com a mulher da sua mocidade” (Ml 2:15). Embora essa passagem admoeste o marido a ser fiel à sua esposa, o princípio também se aplica à esposa, que deve ser fiel ao marido.

No Sermão do Monte, Cristo revelou as dimensões mental e emocional do sétimo mandamento. Ele declarou: “Vocês ouviram o que foi dito: ‘Não cometa adultério.’ Eu, porém, lhes digo: todo o que olhar para uma mulher com intenção impura, já cometeu adultério com ela no seu coração” (Mt 5:27, 28). Como os pensamentos geram emoções que resultam em ações, a batalha pela pureza moral deve ser travada no nível mental, para evitar que aconteçam ações pecaminosas.

Paulo afirmou que os verdadeiros cristãos são aqueles que têm “a mente de Cristo” (1Co 2:16) e O imitam (1Co 11:1). A pureza mental também está implícita em Filipenses 4:8. O apóstolo sugeriu outra perspectiva sobre os casos extraconjugais, ao se referir ao corpo humano como um “santuário do Espírito Santo” (1Co 6:19) e membro de Cristo (1Co 6:15). Reconhecendo que por meio da intimidade sexual duas pessoas se tornam uma só carne (Gn 2:24), ele explicou que o adultério não apenas une ilegalmente os corpos dos envolvidos, mas também destrói seu próprio relacionamento com o Senhor (1Co 6:15-17).

Esses conceitos fornecem uma estrutura moral útil para entender melhor histórias como o assédio da esposa de Potifar a José (Gn 39:6-18), os relacionamentos de Davi e Bate-Seba (2Sm 11) e Amnom e Tamar (2Sm 13), que “foram escritas como advertências a nós” (1Co 10:11).

Casamento à prova de traição

Vivemos em um mundo sensualizado com muitos apelos tentadores, semelhantes aos dos dias de Noé (Mt 24:37-39; Lc 17:26, 27); mas somos encorajados pela Palavra de Deus a viver acima dos padrões do mundo (Jo 17:14-16; Rm 12:2), mantendo nossas mãos limpas e nosso coração puro (Sl 24:4). Os oito princípios a seguir podem nos ajudar a construir relacionamentos fortes e resistentes ao adultério.

Reconheça sua vulnerabilidade – A mitologia grega descreve Aquiles como um herói de corpo imortalizado com um calcanhar mortal. Durante a Guerra de Troia, ele desempenhou um papel crucial, mas foi ferido fatalmente no calcanhar por uma flecha envenenada disparada por Paris e guiada ao alvo por Apolo. Esse foi o fim desse personagem “imortal”.

Todo ser humano tem seu “calcanhar de Aquiles” moral, que precisa ser bem protegido, e seu nível de vulnerabilidade, que nunca deve ser rompido. Muitas pessoas caem moralmente por se considerarem mais fortes do que realmente são. A tentação é muito sutil e persuasiva para ser subestimada. De fato, “enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto. Quem poderá entendê-lo?” (Jr 17:9).

Mantenha as emoções sob controle – Quase todo envolvimento íntimo inapropriado é precedido por infidelidade emocional, consumo de pornografia, namoro na internet, fantasias sensuais ou qualquer outra coisa que torne a pessoa emocionalmente vulnerável.

Por essa razão, a Bíblia adverte: “Acima de todas as coisas, guarde seu coração, pois ele dirige o rumo de sua vida” (Pv 4:23, NVT). Por sua vez, Ellen White aconselhou: “Vocês devem conservar-se afastados do terreno encantado de Satanás e não permitir que a mente se desvie da fidelidade para com Deus. […] Sua imaginação não lhes foi dada para que se lhe permitisse correr desenfreada de acordo com sua vontade, sem nenhum esforço para restringi-la ou discipliná-la. Se os pensamentos forem maus, maus serão também os sentimentos; e os pensamentos e os sentimentos, quando combinados, constituem o caráter moral.”7

Evite circunstâncias e lugares perigosos – Estar sozinho com alguém que parece interessante e atraente e compartilhar partes de sua vida com essa pessoa é algo muito arriscado. Isso pode incluir situações como um relacionamento próximo no local de trabalho, sair juntos para uma refeição, uma viagem de negócios, uma carona ou até mesmo um simples passeio juntos.

Sean Chandler aconselhou a “nunca andar de carro sozinho com alguém do sexo oposto”. Para ele, “passeios de carro são momentos em que tendemos a relaxar e a nos abrir. Nós nos sentimos seguros e começamos a compartilhar coisas. Você está isolado do mundo, e isso dá oportunidade para todos os tipos de problemas”.8 Muitos casos de infidelidade surgem espontaneamente de uma amizade muito próxima entre dois casais de diferentes círculos familiares. Fazendo muitas atividades juntos, o marido de um casal e a esposa do outro podem facilmente desenvolver uma atração mútua.

Estabeleça limites – O mundo está cheio de pessoas com impulsos sexuais desenfreados, mentes sensualizadas e necessidades emocionais insatisfeitas que nem sempre respeitam as fronteiras morais e os limites das relações sociais saudáveis. Essas pessoas devem ser ajudadas, não atendendo às suas expectativas e satisfazendo seus desejos, mas limitando seu comportamento invasivo e ajudando-as a desenvolver valores morais elevados. José declarou à esposa de Potifar que qualquer tipo de caso entre eles significaria trair seu senhor e cometer um pecado contra Deus (Gn 39:8, 9).

Valorize o amor maduro – Michael Lillibridge sugeriu que os casais geralmente experimentam três estágios do amor.9 O primeiro é o amor romântico (apaixonar-se), em que um casal se beija e sai para ver o pôr do sol. Durando de três a seis meses, essa fase tende a dar lugar à decepção e desilusão. Nesse estágio, que pode durar vários meses, começa-se a notar mais claramente as falhas e fraquezas da outra pessoa. O terceiro estágio é o amor maduro (estar apaixonado), que significa a aceitação integral da pessoa com suas forças e qualidades, fraquezas e defeitos.

Algumas pessoas não compreendem bem o amor maduro e o consideram como algo frio. Para piorar, elas confundem um novo amor romântico com amor genuíno. Assim, ao encontrar outra pessoa que desperte o amor romântico desaparecido de seu casamento, muitas pessoas acreditam que estão redescobrindo o amor verdadeiro e acabam substituindo o cônjuge por uma pessoa mais sedutora. Contudo, elas esquecem que o novo amor romântico também não durará para sempre! O melhor antídoto para essa ilusão é compreender, valorizar e nutrir o amor maduro no matrimônio. Como afirma Provérbios 5:18, “seja bendito o seu manancial, e alegre-se com a mulher da sua mocidade”.

Esteja atento aos sentimentos dos outros – A história provou repetidas vezes que muita liberdade para alguns significa falta de liberdade para outros. Como cristãos, somos responsáveis por aqueles que sofrem injustiças sociais (Tg 1:27; 5:4), bem como pelos sentimentos dos outros (Mt 18:6). Nunca devemos brincar com as emoções de outras pessoas. Alguns podem sair de um relacionamento extraconjugal sem culpa ou remorso, mas outros podem ser emocionalmente feridos pelo resto da vida, sentindo-se traídos por um professo cristão que deveria ter se comportado como o Mestre (Mt 10:25). Quão diferente seria nossa sociedade se desenvolvêssemos mais empatia pelos outros e cuidássemos deles como irmãos e irmãs em Cristo!

Peça a Deus que lhe dê amor genuíno – Nossa cultura competitiva gerou uma sociedade de pessoas egocêntricas; mas o verdadeiro problema resulta de nosso coração egoísta (Mt 15:19; Mc 7:21-23; Gl 5:19-21), que precisa ser transformado pelo poder de Deus (2Co 5:17; Gl 5:22-24). Somente uma experiência de conversão pode despertar em nossa vida uma nova perspectiva impulsionada pelo amor altruísta (Mt 5:43-48; Jo 13:34, 35; 1Jo 4:20). “Uma forma de ilustrar isso é por meio de um grande círculo do qual saem linhas que se dirigem todas para o centro. Quanto mais próximo do centro, mais próximas as linhas estão umas das outras. Assim é na vida cristã. Quanto mais perto estamos de Cristo, mais perto estaremos uns dos outros. Deus é glorificado quando Seu povo se une em ação harmoniosa.”10 Os cristãos genuínos estão cheios de amor altruísta. Em vez de usar as pessoas para seu próprio benefício, eles tentam elevar as pessoas para esta vida e a eternidade.

Mantenha em vista o grande conflito – A Bíblia declara que estamos em uma batalha espiritual na qual Deus quer que vivamos em harmonia com Seus padrões morais, e Satanás está tentando nos convencer a viver de acordo com nosso próprio coração enganoso (cf. Ef 6:10-18; Tg 4:7). O Senhor observa não apenas nosso comportamento visível, mas também nossos pensamentos e emoções mais íntimos (Sl 7:9; Jr 17:10; Rm 8:27). O apóstolo Paulo disse que “nos tornamos espetáculo para o mundo, tanto para os anjos como para os seres humanos” (1Co 4:9).

Lamentavelmente, muitos professos cristãos estão tão envolvidos e encantados com os “prazeres transitórios do pecado” (Hb 11:25) que não mais estão conscientes dessa batalha espiritual-moral. Ao manter a perspectiva de um grande conflito cósmico-histórico em mente, as tendências de traição podem perder sua sedução e seu poder. Além disso, concentrar-se em Jesus e amá-Lo como nosso Salvador motiva os crentes a fazer Sua vontade e seguir Seu exemplo de pureza.

Conclusão

A Bíblia contém preceitos morais e conselhos práticos sobre como viver de forma íntegra. Dessa perspectiva, a relação sexual deve ser restrita a casamentos monogâmicos e heterossexuais. Isso implica que relações sexuais pré-matrimoniais, homossexuais e extraconjugais contrariam os padrões divinos. A interpretação de Cristo do sétimo mandamento condena até os pensamentos sensuais que precedem o ato sexual. Tanto a pureza física quanto a mental estão implícitas no Salmo 24:3 e 4: “Quem subirá ao monte do Senhor? Quem há de permanecer no seu santo lugar? O que é limpo de mãos e puro de coração.”

Nestes últimos dias moralmente degradados da história humana (2Tm 3:1-7), somos encorajados pela Palavra de Deus a viver “de maneira santa e piedosa” (2Pe 3:11). Muitos corações estão sangrando por causa de feridas morais que se recusam a cicatrizar. No entanto, temos a maravilhosa promessa de que “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1Jo 1:9). Então, “a paz de Deus, que excede todo entendimento, guardará o coração e a mente de vocês em Cristo Jesus” (Fp 4:7). Que essa experiência salvadora se torne uma realidade em nossa vida, agora e para sempre!

Referências

1 Chrisanna Northrup, Pepper Schwartz e James Witte, The Normal Bar: The Surprising Secrets of Happy Couples and What They Reveal About Creating a New Normal in Your Relationship (Nova York: Harmony, 2013), p. 214.

2 Por exemplo, Douglas K. Snyder, Donald H. Baucom e Kristina C. Gordon, Getting Past the Affair: A Program to Help You Cope, Heal, and Move On – Together or Apart (Nova York: Guilford, 2007); Janis A. Spring e Michael Spring, After the Affair: Healing the Pain and Rebuilding Trust When a Partner Has Been Unfaithful (Nova York: William Morrow, 2012).

3 Por exemplo, J. Allan Petersen, The Myth of the Greener Grass (Wheaton, IL: Tyndale, 1983); E. Michael Lillibridge, The Love Book for Couples: Building a Healthy Relationship (Atlanta, GA: Humanics, 1984).

4 Carol Meyers, Exodus (Nova York: Cambridge University Press, 2005), p. 175.

5 Richard M. Davison, Flame of Yahweh: Sexuality in the Old Testament (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2007), p. 149-159, 174, 193-198, 200, 201, 346, 434-443.

6 Davidson, Flame of Yahweh, p. 354-361.

7 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2021), v. 5, p. 262.

8 Sean Chandler, “8 Things Married People Should Never Do… If They Want to Stay Married!”. Disponível em <www.modernministryblog.com/?s=Things+Married+People+Should+Never+Do+>, acesso em 15/6/2016.

9 Lillibridge, The Love Book for Couples, p. 7-14.

10 Ellen G. White, O Lar Adventista (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2021), p. 142.

Nota: Este artigo é uma versão condensada do capítulo intitulado “The Seduction of Forbidden Intimacy”, em Ekkehardt Mueller e Elias Brasil de Souza, eds., Sexuality: Contemporary Issues from a Biblical Perspective (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute / Review and Herald, 2022), p. 545-561. Usado com permissão.

Estamos em uma batalha espiritual na qual Deus quer que vivamos em harmonia com Seus padrões morais, e Satanás está tentando nos convencer a viver de acordo com nosso próprio coração enganoso.

Alberto R. Timm, diretor associado do Instituto de Pesquisa Bíblica da Igreja Adventista do Sétimo Dia