Pode parecer ao meu colega que a teologia da Igreja Adventista do Sétimo Dia apresenta dois pontos de vista alternativos concernentes à natureza humana de Cristo. Mas o ponto de vista de que Jesus assumiu a natureza pré-Queda, de Adão, apareceu apenas recentemente em nossa Igreja. Essa posição surgiu nos anos 50, durante uma série de acontecimentos que viram reformulados conceitos adventistas básicos. As conseqüências dessas mudanças tiveram muito o que ver com o trauma e as divisões teológicas que a Igreja experimentou nos 30 anos passados.
Sem discutir, concordo que nosso estudo da humanidade do Senhor não é “meramente bizantinismo acadêmico”; que no instante em que a natureza humana de Cristo é entendida, podemos melhor apreciar como “somente Ele pode ser nosso Salvador,… nosso Exemplo”; que “a missão de Cristo deve determinar a extensão de Sua identidade com nossa humanidade”; que Jesus “imergiu no câncer inativo e final do pecado, para trazer saúde completa e não Se infectou”; que Jesus “abriu mão do uso de Seus atributos divinos, vivendo como homem autêntico, totalmente dependente de Seu Pai do Céu”; que “apenas em Cristo somos justificados, nunca em nós mesmos”; que “as boas novas são mais do que ‘Imite-Me’; que “apenas nesta união dependente pode Jesus ser nosso Homem-modelo”; e que “a verdadeira Cristologia termina, não em debate, mas em aprazível adoração e alegre obediência.”
Não obstante, gostaria de saber por que tantas nulidades, implícitas e explícitas, foram imaginadas e usadas como argumentos. Por exemplo: (1) meu colega, diz que seu ponto de vista oferece “uma observação centralizada em Cristo e não no homem”, significando que qualquer outro ponto de vista deve ser recusado. (2) Ele diz:
“Quem Jesus é determinou a extensão de Sua identidade com nossa natureza humana.” Ao dizer isso, sugere que o milagre de Seu nascimento, em e por si mesmo, leva alguém a aceitar sua posição, que pressupõe certas diferenças constitucionais entre Cristo e os filhos e filhas de Adão. (3) Ele pergunta: “Como foi o bebê Jesus diferente, se nasceu com uma natureza pecaminosa?” Ele sugere que Jesus teria nascido egoísta, etc., se Ele tivesse nascido com a natureza do homem caído. Mas ele não faz distinção entre a bagagem humana herdada e a ação, no interior, da humanidade degenerada pelas conseqüências do pecado. (4) Ele também declara: “Necessitamos de uma escatologia cristológica, mais do que de uma Cristologia escatológica”, indicando que sua posição só começa com Cristo.
Não sei de nenhum teólogo adventista que dependa de sua escatologia para determinar a natureza de Cristo. Sistematicamente, tenho seguido o ponto de vista que meu irmão sugere. Em 1975, escrevi: “Durante séculos grandes temas bíblicos têm sido isolados de sua ligação com Jesus. A maior razão para essa irrealidade é que os pensadores cristãos se tornaram confusos a respeito de Jesus. A má compreensão de quem é Jesus, de onde Ele veio, qual foi Sua missão na Terra e como Se relacionou com todos os homens desde Sua ascenção parece desvirtuar e distorcer todos os outros assuntos da Biblia.”1
Estou confuso com duas referências que meu colega faz. Ele cita Crist Our Salvation, de Hans La Rondelle como sustentando sua posição, mas o livro citado não o faz. E se refere ao “movimento da carne santa” que atormentou a Conferência de Indiana, na passagem do século. Sua observação aqui é que, se os adventistas sempre cressem no que ele diz com respeito à natureza da humanidade de nosso Senhor, heresias como as do movimento da carne santa não teriam ocorrido. Mas a doutrina sustentada, do movimento da carne santa, era a mesma teoria da Encarnação que meu colega agora desposa. Isto é, a de que Jesus tomou a natureza pré-Queda de Adão. Os membros desse movimento criam que Jesus recebeu de Maria uma natureza física enfraquecida pelo pecado. Mas criam também que Ele recebeu, proveniente do Espírito Santo, a natureza espiritual pré-Queda de Adão e desse modo foi poupado do pleno impacto da lei da hereditariedade.
Nossos líderes de Indiana procuraram aderir a essa “nova” (para os adventistas) teologia com base no conceito adventista de que Deus espera que Seu povo seja vencedor assim como Jesus o foi. Eles raciocinavam que os cristãos sinceros só podem ter erradicada a sua natureza pecaminosa passando pela relativamente instantânea “experiência do Getsêmani”. Então eles também deveriam possuir carne sem pecado como Jesus e assim vencer como Ele o fez.
O Pastor Stephen Haskell, Ellen White e outros acertaram em cheio o coração da heresia. Eles se opuseram a essa nova e estranha doutrina de que Cristo tomou a natureza pré-Queda de Adão e de que Jesus foi exemplo da mesma lei da hereditariedade que afeta a todo filho e filha de Adão.2 A compreensão errônea da Encarnação tem resultados práticos muito infelizes, especialmente quando alguém procura harmonizar o erro com a verdade.
Os pontos seguintes carecem de nova consideração:
1. Parece permear o estudo uma inconsistência básica. Por um lado, o autor se esforça para defender o princípio de que o pecado é “um relacionamento interrompido” — o resultado de duvidar de Deus e em seguida desobedecer-Lhe. Por outro lado, o pecado parece quase substantivo. Ele está tão intimamente envolvido com a bagagem genética que Jesus não poderia ter sido “feito em todos os sentidos semelhantes aos Seus irmãos” (Heb. 2:17, R. S. V.). Nem poderia ter nascido “semelhante a todo filho de Adão”, aceitando “os resultados da operação da grande lei da hereditariedade”.3 Talvez nova apreciação da diferença entre o equipamento humano básico (aquilo com que nasce toda criança) e o desempenho espiritual de cada pessoa possa ajudar o dilema do autor. Isto é, Jesus é semelhante a nós no equipamento humano básico, mas diferente de nós no desempenho espiritual, mantendo assim separadas do pecado, as conseqüências do pecado em si.
2. Suponho que a teoria da expiação do autor lhe tenha influenciado a Cristologia. Pelo fato de Jesus Se haver tornado homem, parece-me, pode ser entendido apenas do ponto de vista do grande conflito — uma perspectiva grandemente ausente no Protestantismo “ortodoxo”, bem como no Catolicismo. Jesus não veio para satisfazer um Deus ofendido que necessitava de sangue antes de perdoar, ou para provar que Deus podia guardar as leis de Deus, ou ainda que Adão poderia ter continuado obediente. Houve várias questões, mas nenhuma mais importante do que a acusação de que os filhos e filhas de Adão não poderiam guardar as leis de Deus, de que tais leis eram irrealísticas e não no melhor interesse dos seres criados. Essas questões primárias determinaram a espécie de humanidade que nosso Senhor assumiria a fim de satisfazer a justiça e silenciar a Satanás.
3. O espaço não permite um exame dos textos bíblicos que meu amigo usa. Mas contesto sua maneira de encarar homoiōma em Romanos 8:3 e outras passagens; a interpretação de Romanos 5; sua escolha da tradução do Salmo 51:5 da The New International Version quando outras versões o traduzem com mais exatidão; sua omissão de outras referências nos Salmos, tais como 22:10 e 77:6; sua interpretação de monogenes; e a maneira como trata Hebreus 2:16 e Romanos 1:3. — H. E. Douglass
Referências:
1. Perfection (Nashville: Southern Pub. Assn.; 1975), pág. 13.
2. Ver Stephen Haskell para Ellen G. White, 25 de set. de 1900, e Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, livro 2, págs. 31-39.
3. Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, oitava edição, pág. 41.