O significado da palavra ordenação, aplicada ao Ministério, deve ser buscado na Bíblia, o que não é uma tarefa fácil. A versão King James, que tem influenciado durante três séculos a Igreja no mundo de fala inglesa, usa a palavra ordain para traduzir mais de 20 diferentes palavras hebraicas e gregas. Neste artigo, consideraremos o uso grego da palavra no Novo Testamento, apenas onde ela aparece relacionada com a nomeação oficial ao Ministério.

Comecemos então com o único caso encontrado, em inglês, nos Evangelhos: “Então designou (epoiesen) doze para estarem com Ele e para os enviar a pregar.” (Marcos 3:14). A palavra grega poieo significa literalmente “fez”. Na King James, ela tem o sentido de “ordenar”. Outras versões, portuguesas e espanholas, traduzem a palavra como “estabeleceu”, “escolheu”, “designou”, “destinou”.

Outra referência à palavra “ordenar” é a tradução que faz a King James de Atos 1:22, que trata da substituição de Judas: “começando no batismo de João, até ao dia em que dentre nós foi levado ao Céu, um destes seja (genésthai) testemunha conosco de Sua ressurreição.” O grego aqui é derivado de ginomai, cujo significado é “chegar a ser”. Outras traduções empregam expressões como “se associe conosco”, ou “seja escolhido alguém que seja conosco”, etc.

Uma terceira menção da palavra “ordenar” na King James é a referência que Paulo faz de si mesmo, em I Tim. 2:7: “Por isso fui designado (etétheri) pregador e apóstolo…” Aqui a palavra grega é derivada de tithemi, que quer dizer “colocar”, “fixar”, “designar”.

Uma quarta referência é Tito 1:5, onde Paulo lhe diz: “Por esta causa te deixei em Creta para que pusesses ordem nas coisas restantes, bem como, em cada cidade, constituísses (katastéses) presbíteros, conforme te prescreví.” O grego aqui é derivado de kathistemi, cujo significado é “por” ou “constituir”.

Finalmente, em Atos 14:23, é encontrada uma quinta referência: “E, promovendo-lhes em cada igreja a eleição (xeirotonesantes) de presbíteros…” A palavra grega cheirotoneo também aparece em II Cor. 8:19, traduzida pela King James como “escolher”. Cheirotoneo vem de cheiros, que quer dizer “mão” e toneo, que significa “estirar”. Portanto o sentido final é “estender a mão”. Tecnicamente, a palavra expressa aprovação ou concordância, através do ato de levantar a mão quando se vota alguma coisa.

Assim, em poucas palavras, tal é o uso da palavra “ordenar” ou ordain na versão King James, traduzida de diferentes palavras gregas. No entanto, a palavra “ordenar” possui também raiz latina. O latin ordinare significa “colocar em ordem”, “arranjar”, ou “regular”. Palavras em grego e em latin possuem conotações diferentes. “Há uma certa diferença entre o quadro cultural do cheirotonein grego e o do latin ordo ou ordinare. O uso que faz o Novo Testamento do antigo termo tem o significado secular básico de nomeação (Atos 14:23; II Cor. 8:19), o qual é, em troca, derivado de seu significado original de estender a mão, quer seja para designar uma pessoa ou para dar um voto. Ordo e ordinare, por outro lado, são termos derivados da lei romana em que se comunica a noção da posição especial de um grupo distinto da plebe, como o termo ordo clarissimus para o senado romano.”1

Como o latim tornou-se o idioma da Igreja no Oeste, e com a consolidação do episcopado monárquico, não é difícil notar como a estrutura organizacional da Igreja gradualmente seguiu a do Império. Palavras tais como ordo e ordinare, que estavam em uso na sociedade romana, realçaram o poder da hierarquia da Igreja, e com o tempo o conceito do sacerdócio dos crentes e dos dons espirituais tornou-se obsoleto. Eventualmente uma hierarquia de sacerdotes e bispos e o conceito de ordená-los entraram em moda.

Criar o conceito de ordenação sobre a base do uso da palavra “ordenar”, na versão King James, é bastante incerto. Ademais, a palavra “ordenação” não é mencionada sequer uma vez em Romanos 12, I Cor. 12, nem em Efésios 4, que são os três capítulos principais que falam a respeito dos dons especiais, outorgados à Igreja “para a edificação do corpo de Cristo” (Efés. 4:12). Paulo enumera apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres, mas não faz qualquer referência à ordenação.

No Velho Testamento

Na cerimônia de ordenação, a imposição das mãos é uma parte muito importante. Qual o fundamento bíblico para isso?

A primeira referência bíblica à imposição de mãos é encontrada em Gênesis 48:14, onde se diz que Jacó “estendeu a mão direita e a pôs sobre a cabeça de Efraim que era o mais novo, e a sua esquerda sobre a cabeça de Manassés, cruzando assim as mãos, não obstante ser Manassés o primogênito”. Aqui, a imposição das mãos representava uma bênção especial. Posterionnente, existe uma repetição do ato em conexão com o sistema dos sacrifícios, em que o significado era a transferência de culpa, do pecado e do castigo do pecador para o animal a ser sacrificado. O Velho Testamento também faz referência a duas situações nas quais as mãos foram impostas em relação a um ministério específico, como os casos de Josué e dos levitas.

De Josué é dito que Moisés “lhe impôs as mãos, e lhe deu as suas ordens, como o Senhor falara por intermédio de Moisés” (Núm. 27:23). É interessante notar vários pontos aqui. A experiência de Josué o qualificava para ser o escolhido óbvio. Era um associado muito próximo de Moisés. Foi ricamente dotado pelo Espírito Santo. O Urim e o Tumim confirmaram o chamado de Deus. Sua nomeação deveria ser pública, à vista da congregação. Assim, Moisés “lhe impôs as mãos”. Isso aconteceu em uma única ocasião para um evento histórico específico e singular, para guiar o povo à terra prometida, e não se repetiu em outras nomeações de sacerdotes, reis e profetas.

Mas então como eram consagrados e colocados em seus postos os levitas? A Moisés foi solicitado: “Farás chegar os levitas perante a tenda da congregação; e ajuntarás toda a congregação dos filhos de Israel. Quando, pois, fizeres chegar os levitas perante o Senhor, os filhos de Israel porão as mãos sobre eles.” (Núm. 8:9 e 10). O papel dos levitas como representantes do povo foi confirmado pela imposição das mãos sobre eles, pelo próprio povo.

Como no caso dos sacerdotes e os sumos sacerdotes, os levitas herdaram suas funções por nascimento, e a imposição de mãos não se repetia.

A idéia de “pôr [a mão] sobre” é uma tradução de três palavras hebraicas diferentes.No caso de uma bênção especial como na história de Jacó, s’im ou shith (sinônimos) são os termos empregados, assim como em referências ao ato de ungir enfermos. Sempre que a situação envolver oferta e consagração de alguma coisa ou pessoa, a palavra é samah. Um exemplo disso é a ocasião quando Moisés consagrou a Josué ou quando o povo impôs suas mãos sobre os levitas. S’im e shith expressam um toque leve, porém samah sugere um toque firme, com o sentido de “inclinar-se sobre” ou “em direção a”. Samah também sugere que uma pessoa transfere “algo” a outra pessoa (ou animal usado em sacrifício), que então chegava a ser o representante ou substituto. Quando a imposição de mãos está relacionada com uma bênção sacerdotal, usa-se nasa, como quando “Arão levantou as mãos para o povo e o abençoou” (Lev. 9:22). Muita confusão poderia ser eliminada se mantivéssemos estas diferenças de significado em mente.

Sacerdote, rei e profeta

Segundo Êxodo 28:41, Deus ordenou a Moisés: “E com isso vestirás a Arão, teu irmão, bem como a seus filhos; e os ungirás, consagrarás e santificarás, para que Me oficiem como sacerdotes.”

O que a versão New English Bible traduz como “instalar”, a versão King James o apresenta como “consagrar”; e as versões New American Standard Bible e Revised Standard como “ordenar”. A palavra hebraica mille’yadh significa literalmente “encher as mãos”. O significado mais aproximado é que as mãos deveriam ser cheias daqueles objetos que seriam oferecidos no templo como parte do sacrifício. “Nos países orientais, a investidura somente era feita colocando-se na mão do funcionário a insígnia de seu cargo. Aqui são usadas certas porções das ofertas para esse propósito.”3

As palavras “encher as mãos” acentuam claramente que a “instalação” é para um serviço conectado com os ritos do templo (Êxodo 29:20-28).

A primeira referência bíblica à imposição de mãos é encontrada em Gênesis 48:14, onde se diz que Jacó “estendeu a mão direita e a pôs sobre a cabeça de Efraim que era o mais novo, e a sua esquerda sobre a cabeça de Manassés… o primogênito.”

A unção de um rei simbolizava a dotação do “Espírito do Senhor” (I Sam. 10:1; 16:13). Do rei, como protetor do Livro da Lei, esperava-se que o copiasse totalmente com sua própria mão (Deut. 17:18-20). O pacto era renovado como um convênio entre Deus, o rei e o povo. Enquanto as mãos do sumo sacerdote eram cheias com ofertas, as mãos do rei eram “cheias” com a lei. Ele era também coroado e entronizado (I Reis 1:33; II Reis 11:12; I Crôn. 29:22).

Como exemplo da unção de um profeta, somente temos Elias ungindo a Eliseu (I Reis 19:16 e 19). Aparentemente “os ungidos” e os “profetas” em Salmo 105:15 são equivalentes. O servo do Senhor (Isa. 61:1) fala de si mesmo como um ungido “para pregar boas-novas”.

Ordenação rabínica

Vejamos agora a ordenação rabínica4 e sua relação, se é que existe alguma, com a Igreja primitiva. De acordo com a tradição judaica, os passos de sucessão descendiam “em linha direta de Moisés a Josué, de Josué aos anciãos, dos anciãos aos profetas, dos profetas aos homens da grande assembléia (Esdras, Neemias, e o Sinédrio criado depois do retomo do cativeiro), e outros, até que chegou aos patriarcas (os dirigentes do Sinédrio depois da destruição de Jerusalém no ano 70 d.C.) e os outros dirigentes das escolas rabínicas”.5

O Mishna e o Talmude chegaram a ser representantes do judaísmo depois do ano 70 d.C. O Mishna codificava a tradição oral rabínica e nos transmite informação do primeiro século. Os rabinos podem ter lido seus próprios conceitos teológicos nos textos bíblicos, porém isto não foi diferente do que os teólogos cristãos fizeram mais tarde. De fato, existe um paralelo entre o argumento católico para a sucessão apostólica do bispado monárquico e o papa como sucessor de Pedro, e a “prova” talmúdica para a sucessão rabínica do tempo de Moisés. Esse paralelo também inclui o assunto da ordenação.

O caso rabínico de ordenação estava baseado na imposição de mãos sobre Josué por Moisés (Núm. 27:22 e 23) e a escolha dos 70 anciãos (Núm. 11:16, 17, 24 e 25). Mesmo que não seja mencionada a imposição de mãos sobre os 70, a exegese rabínica aplicou um princípio de interpretação segundo o qual em dois textos análogos, uma consideração em particular de um deles pode ser estendida ao outro como um princípio geral,6 e deram como certa a imposição de mãos sobre os 70.

Baseada na Mishna, “a ordenação era um requerimento para ambos, os membros no Grande Sinédrio e os membros do Sinédrio inferior, e os colégios regulares de juízes autorizados para decidir casos legais”. O “grau mais baixo de ordenação permitia ao rabino tomar decisões sobre assuntos religiosos, enquanto que o grau mais elevado lhe permitia inspecionar as primícias, além de tomar decisões sobre assuntos religiosos e julgar os casos criminais”.7 Assim, pois, a pessoa “ordenada” chegava a ser importante, não apenas na vida religiosa, mas também na vida civil das pessoas.

Porém o imperador Adriano, durante a revolta judaica de 132-135 d.C., procurou abreviar a influência do novo Sinédrio, proibindo a ordenação. Até o terceiro século, o ato da imposição de mãos esteve suspenso, e o rabino era nomeado e dedicado ao pronunciar seu nome. A autoridade da nomeação residia sobre o profeta e não, como inicialmente, quando um mestre impunha as mãos sobre seu aluno; e mais, qualquer cerimônia de posse de um cargo efetuada pelo concilio ou pelo colégio de juízes “sem o consentimento do patriarca era inválida, enquanto que o patriarca recebia o privilégio de efetuar a cerimônia sem o consentimento do colégio”.8

Outra razão para não se impor as mãos era “o crescente papel que desempenhava a imposição na religião cristã. O nome dado ao serviço judaico de ordenação também foi mudado de semikah ou semikuta, que significa a imposição de mãos, para minnuy, que significa nomeação.9

Os eruditos sustentam três opiniões importantes sobre como a ordenação mishnaica pode ter influenciado a Igreja primitiva. Hugo Mantel distingue duas ordenações separadas durante o período do segundo templo: “Primeiro, eles ordenavam o estudante (que sentado no primeiro lugar da primeira fila recebia o título oficial de Hakam), e então o nomeavam juiz e o faziam sentar na Corte Alta.”10

Mantel acredita que “os primeiros judeus cristãos, especialmente em Jerusalém, tomaram emprestados seus costumes do judaísmo. Eles se consideravam uma seita judaica separada dos fariseus só por sua crença em Jesus. É claro que os primeiros cristãos não inventaram a imposição de mãos, nem a puderam tomar emprestada do mundo helênico”.11

Outro enfoque é o de Amold Ehrhardt que argumenta que o Mishnah não é historicamente confiável e não prova a ordenação rabínica nos tempos do Novo Testamento. Acerca de “rabino” como um título para um estudante judeu ordenado, Ehrhardt declara: “Não se pode duvidar de que nos tempos talmúdicos era ‘rabino’, porém no período anterior a 70 d.C., esse título era outorgado livremente aos estudantes judeus não ordenados, um fato que é confirmado pela evidência do Novo Testamento”.12

Ehrhardt também assinala que o título outorgado aos membros do Sinédrio foi “presbítero”, e isso não era sinônimo de escriba ou rabino. No Novo Testamento os anciãos são mencionados lado a lado como grupos separados em Mateus 26:57 e Atos 6:12, sugerindo que os anciãos não eram necessariamente escribas.

Em suas argumentações, Ehrhardt chega a três conclusões: a primeira, e a melhor fundamentada, é que o desenvolvimento da ordenação judaica confirma a declaração de que a descrição cristã dos ministros como presbíteros foi derivada do título dos membros do Sinédrio de Jerusalém. A segunda é que no assunto da ordenação, a igreja e a sinagoga aparecem não em uma relação de filho e mãe, mas como meio-irmãos, como Isaque e Ismael (Gál. 4:22), ambos, à sua maneira, apropriando-se do exemplo do Antigo Testamento. A terceira conclusão é que seria sábio, especialmente quanto aos ritos de imposição de mãos e entronização de bispos, permitir-se um período de desenvolvimento, estendendo-se até à metade do segundo século.

Um terceiro enfoque propõe uma origem que é puramente cristã, uma invenção neotestamentária singular. Everett Fergusson relaciona a imposição de mãos, não com o samah hebraico, mas com o s’im, o qual expressa a transferência de uma bênção. Está de acordo em que “na superfície parece haver uma boa razão para ligar o uso cristão com samah. Era usado para a nomeação de oficiais no Velho Testamento e chegou a ser o termo técnico para a ordenação no judaísmo”.13 Porém, o assunto decisivo é a questão sobre a qual categoria pertence a ordenação. A idéia básica na ordenação cristã antiga não era criar um substituto ou transferir autoridade, mas conceder uma bênção e suplicar a aprovação divina.

Ademais, Fergusson encontra “a confirmação de que a ordenação cristã tem sua raiz em sim e não em samah… no fato de que a imposição de mãos na Igreja somente acontece como um acompanhamento à oração. Não existe indicação de que a oração fosse parte das ordenações judaicas”.14

No Novo Testamento

Entre os numerosos versículos do Novo Testamento que tratam da imposição de mãos, somente seis estão relacionados com o Ministério: dois no livro de Atos (6:6; 13:3), e os demais em relação a Timóteo.

As referências do livro de Atos encontram-se dentro do mesmo contexto. Segundo Marjorie Warkentin, o significado dos dois eventos é achado na evidência de que Deus renovou Seu concerto. As experiências do samah de Moisés com Josué, e o povo com os levitas estão sendo repetidas. Em Atos 6:6, os apóstolos impuseram as mãos sobre os sete, assim como Moisés o fez com Josué. Em Atos 13:3, o povo impôs as mãos sobre Saulo e Barnabé, como no caso dos levitas.15

Cabe aqui uma pergunta: Quem impôs as mãos sobre os sete e por quê? A primeira parte da indagação é facilmente respondida: “Apresentaram-nos perante os apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram as mãos.” No grego diz, exatamente, “e orando lhes impuseram as mãos”, o que dá a entender que aqueles que os apresentaram poderiam ser os mesmos que impuseram as mãos. O único manuscrito grego que define bem que estes foram os apóstolos é o Codex Beza, e, também chamado Codex D, um manuscrito posterior ao quinto e sexto séculos, e que de acordo com os eruditos, assinala algumas variantes em comparação a outros.

A imposição de mãos sobre Saulo e Barnabé é claramente um serviço de consagração para uma tarefa missionária especial, embora eles fossem como qualquer outro entre o grupo de profetas e mestres em Antioquia.

A mudança em Atos 6:6 do Codex Bezae reflete um desenvolvimento histórico iniciado no terceiro século, quando somente o bispo em sucessão apostólica podia ordenar, seguido pela pretensão de que os bispos são os vigários de Cristo, uma concessão aplicada mais tarde ao papa.16 Isto não significa necessariamente que os apóstolos não poderiam haver imposto as mãos sobre os sete, pois o texto pode ser interpretado das duas maneiras. Eduard Schweitzer afirma que a imposição de mãos, em ambos os casos, tanto em Saulo como em Barnabé (Atos 13:1-3), como sobre os sete, era para um serviço especial e uma “bênção”. Ele declara: “Não é um assunto de ordenação, sendo que ambos pertenciam à companhia dos profetas e mestres. É, pois, uma instalação, isto é, a colocação numa esfera de serviço em particular, a qual difere em certos aspectos da anteriormente ocupada.”17

A imposição de mãos sobre Saulo e Barnabé é claramente um serviço de consagração para uma tarefa missionária especial. Eles eram como qualquer outro entre o grupo de profetas e mestres em Antioquia, porém enquanto o grupo se encontrava orando e jejuando, o Espírito Santo os impressionou para separar a Saulo e a Barnabé a fim de realizarem um trabalho missionário.

A linguagem utilizada aqui corresponde à consagração dos levitas. Deus ordenou a Moisés no sentido de que separasse “os levitas do meio dos filhos de Israel” (Núm. 8:6 e 14). No livro de Atos, o Espírito Santo dirigiu a igreja de Antioquia: “Separai-Me agora a Barnabé e a Saulo para a obra que os tenho chamado” (Atos 13:2). Os levitas também foram separados para uma obra especial (Núm. 8:11 e 15; a Septuaginta usa a mesma palavra – ergon – que o Novo Testamento usa para “obra”).

Torrance sugere que Saulo e Barnabé “não foram ordenados como alunos ou discípulos rabínicos, mas enviados como apóstolos ou mensageiros autorizados da comunidade, em uma missão ilimitada. … Isto parece referir-se à ordenação no sentido correto”.18

Nas cartas a Timóteo, encontramos três referências sobre a imposição das mãos. Duas falando da imposição sobre Timóteo: “Não te faças negligente para com o dom que há? em ti, o qual te foi concedido mediante profecia, com a imposição das mãos do presbitério.” (I Tim. 4:14); “Por esta razão, pois, te admoesto que reavives o dom de Deus, que há em ti pela imposição das minhas mãos.” (II Tim. 1:6).

A terceira é um conselho ao jovem colaborador: “A ninguém imponhas precipitadamente as mãos. Não te tornes cúmplice de pecados de outrem. Conserva-te a ti mesmo puro.” (II Tim. 5:22).

O significado óbvio da primeira referência é que o presbitério impôs suas mãos sobre Timóteo; na segunda, a imposição foi feita por Paulo. Outra explicação verossímil para a primeira é que o presbitério ordenou a Timóteo enquanto Paulo presidia o evento. Timóteo não era o único converso de Paulo, mas um associado ministerial próximo, por quase 20 anos.

O ato da imposição de mãos sobre Timóteo, indubitavelmente, teve lugar bem cedo em seu trabalho. Sua carreira seguiu a de Paulo e não era a de um ancião local ou bispo. O último era “nomeado”; não se menciona a imposição de mãos sobre os anciãos locais. A ideia de que Paulo tenha ordenado a Timóteo, que como bispo ordenara a outros anos mais tarde, estabelecendo a sucessão apostólica, não pode ser fiel à situação histórica.

Na situação histórica singular e o trabalho de Paulo na Igreja primitiva, na qual Timóteo estava intimamente relacionado e constantemente representava a Paulo, o apóstolo pode haver imposto as mãos sobre Timóteo, tal como o rabino faz com seu aluno (caso seja esse o costume nos dias de Paulo). Um coisa porém é certa: Timóteo representava a Paulo e à Igreja universal; o presbitério em sua totalidade havia imposto as mãos sobre ele, e Paulo seguramente encontrava-se presente, na ocasião, presidindo o ritual. Esse é o pano de fundo de I Tim. 4:14. É possível que II Tim. 1:6 esteja se referindo ao mesmo evento. Se houve imposição de mãos em uma ou duas ocasiões, não tem a menor importância. O fato significativo é que Timóteo foi escolhido pelo Espírito Santo, comissionado por Paulo e enviado como um apóstolo pelo povo.

Entre os muitos mandatos de Paulo a Timóteo, figura o que se refere a não impor precipitadamente as mãos sobre alguém (I Tim. 5:22). Essa passagem é frequentemente interpretada para dizer que Timóteo podia ordenar a outro bispo. De fato, a Igreja em anos posteriores fundamentou seus casos de ordenação sobre essa base, e outras passagens mais em Timóteo e Atos.

Algumas traduções não ajudam a esclarecer a confusão. A New English Bible, por exemplo, diz: “Não sejas demasiado rápido em impor as mãos na ordenação”; a versão The Living Bible afirma: “Nunca tenhas pressa ao ordenar a um homem impondo tuas mãos sobre ele.”

No entanto, o contexto aclara o significado. Paulo está falando sobre uma pessoa que está sob a disciplina da igreja. Kenneth S. Wuest escreve: “As palavras ‘impor as mãos precipitadamente’ têm a ver com a restauração de um membro transgressor à igreja local. No verso 19, vemos a acusação; no verso 20, a convicção e a sentença, e no verso 22, a restauração à sua condição de membro da igreja. Os exegetas afirmam que a ordem é no sentido de restringir com deliberada prudência os impulsos de ter dó. Uma reconciliação precipitada leva o transgressor a pensar que sua falta não é tão grave, depois de tudo; e suaviza assim o caminho para uma repetição do pecado. Aqueles que outorgam cartas de recomendação com muita facilidade, estão sob a condenação apostólica.”19

Assim, as passagens de Timóteo e Atos não tratam da ordenação na Igreja, como geralmente se imagina. Não podemos utilizá-las como precedente para um conceito que se desenvolveu no terceiro século, estabelecendo um bispado monárquico e seu papel ao efetuar o rito de ordenação. Como Birger A. Pearson declara: “A situação eclesiológica nas igrejas de Paulo … aparenta ser de expressão livre, carismática, e não encontramos evidência concreta de organização hierárquica, ou nada com respeito à ordenação de oficiais de igreja.”20

Desenvolvimento histórico

 A primeira descrição de um serviço de ordenação pode ser rastreada até o terceiro século, e está registrado em The Apostolic Tradition, de Hipólito (236 d.C.), um presbítero da Igreja de Roma. Sua descrição da ordenação confirma o conceito do ministério que teve lugar no terceiro século e é expresso nos escritos de Tertuliano e Cipriano.

Uma diferença entre o bispado e o presbitério é claramente estabelecida. Um novo bispo pode ser ordenado somente por outros bispos, que impõem as mãos sobre ele, observados em silêncio pelo presbitério. Na oração de ordenação, o bispo é chamado “sumo sacerdote” de Deus; a ordenação lhe outorgava “o Espírito do sumo sacerdócio” pelo qual recebia autoridade para redimir pecados.

A diferença entre o bispo e o presbítero era mais ampliada pelo fato de que somente o bispo podia ordenar os últimos. “Porém, quando o presbítero é ordenado, o bispo haverá de impor as mãos sobre sua cabeça, enquanto os presbíteros o tocam.”21

No caso da ordenação do diácono, só o bispo impõe as mãos, pois “ele não é ordenado ao sacerdócio, mas para servir ao bispo e para executar as ordens do bispo. Ele não participa no concilio do clero; ele deve realizar suas próprias tarefas e fazer saber ao bispo as coisas necessárias. Ele não recebe esse Espírito que possui o presbítero, do qual os demais presbíteros partilham; ele recebe somente o que lhe é confiado sob a autoridade do bispo. Por essa razão, somente o bispo poderá fazê-lo diácono”.22

O quarto século presenciou a aparição de um manual de igreja, a Constituição dos Santos Apóstolos, em vários volumes, a qual pretende dizer-nos o que os apóstolos ensinaram e fizeram. “Porém, conforme temos sido ensinados pelo Senhor, distribuímos as funções do sumo sacerdócio aos bispos, as do sacerdócio aos presbíteros, e a ministração dos diáconos sob a autoridade de ambos; que a divina adoração possa ser realizada com pureza. Porque não é correto que um diácono ofereça o sacrifício, batize, ou reparta quer seja a bênção maior ou a menor. Tampouco pode um presbítero efetuar a ordenação.”

As Constituições enfatizam a diferença entre o laicato e o sacerdócio: “Deixem que o leigo o honre [ao bispo], o ame, o reverencie como a seu senhor, como seu dono, como o sumo sacerdote de Deus, como um mestre da piedade. Pois quem o escuta está ouvindo a Cristo; e quem o rechaça, rechaça a Cristo.” Ademais, o bispo “é o mediador entre Deus e você, nas diversas partes de seu culto de adoração. Ele é o mestre de piedade; e, depois de Deus, ele é seu pai, o qual lhe tem privilegiado novamente com a adoção de filho, pela água e pelo Espírito. Ele é seu dirigente e governador; ele é seu rei e potentado; é, depois de Deus, seu deus terreno, que tem o direito de ser honrado por você. Deixe que o bispo presida sobre você como alguém que é honrado com a autoridade de Deus, e pela qual há de governar todo o povo”.

O bispo é ordenado “por três bispos” na presença de presbíteros, diáconos, e o povo que “dá seu consentimento”. Quando se trata de um presbítero ou diácono, eles são “ordenados por um bispo”. Também se faz provisão para a ordenação das diaconisas. Os diáconos e as diaconisas servem ao bispo.

Agostinho de Hipona (396-430 d.C.) seguiu os principais dogmas da eclesiologia cipriana, porém estendeu o desenvolvimento do assim chamado sacerdócio cristão por “seu conceito sacramental do ministério no qual a Validez da ação sacramental de um clérigo era vista como independente de seu caráter pessoal”. Os católicos romanos aderem a esse princípio quando afirmam que pelo sacramento da ordenação o sacerdote é marcado por um caráter indelével. No que tange à ordenação, Agostinho a fez “inteiramente uma possessão permanente do indivíduo à parte da comunidade na qual e através da qual era conferida”.23

Para Lutero, o caráter indelével da ordenação é uma ficção. Os ministros podem ser suspensos temporalmente, ou privados permanentemente de sua posição.

O aspecto sacerdotal do novo sumo sacerdote cristão mudou o conceito no Novo Testamento do ministério e sua nomeação. Eric G. Jay bem o expressa: “Este enfoque do ministério, ao ganhar aceitação, ajudado sem dúvida pelo uso comum da terminologia sacerdotal, inevitavelmente causou uma nova eclesiologia, a qual vê a Igreja essencialmente como um corpo hierárquico. Perdeu terreno o conceito da Igreja como o conjunto total do povo de Deus, e a diferença entre o clero e o laicato foi altamente acentuada, relegando ao último o papel de dependente passivo. Essa eclesiologia viria sob um ataque formidável no século XVI. 24

Lutero e Calvino

O ataque inicial de Lutero ao sistema dos sacramentos romanos inclui sua crítica à ordenação como um sacramento. Ele declara que “a Igreja de Cristo nada sabe [acerca da ordenação como um Sacramento]; é um invento do papal. Não somente inexiste qualquer promessa de graça adicionada a ela, como não há uma só palavra dita a seu respeito em todo o Novo Testamento. Agora, é ridículo expor como sacramento de Deus algo que não está comprovado haver sido instituído por Ele”.25 Por conseguinte, para Lutero, “a ordenação nada mais é que um certo ritual no qual alguém é chamado ao ministério da Igreja. O caráter indelével da ordenação é uma ficção. Os ministros podem ser suspensos temporalmente, ou privados permanentemente de sua posição”.

Da mesma forma, Calvino ataca a ideia sacramental católica romana da ordenação, a qual, supostamente, outorga a quem a recebe o poder de “oferecer sacrifícios para apaziguar a Deus”. Conseqüentemente, “todos aqueles que são chamados sacerdotes são prejudiciais para Cristo, no sentido de oferecer vítimas expiatórias”.26

O chamado ao ministério está vinculado com a doutrina do sacerdócio dos crentes. Por meio do batismo e da fé “todo cristão possui a Palavra de Deus, sendo ensinado e ungido por Ele para ser sacerdote”, escreveu Lutero em 1523, e ele não mudou esse conceito. Em 1535, ele mesmo introduziu a ordenação cerimonial em Wittenberg, porém depois disso voltou a escrever, em 1539, afirmando que “é suficiente que você tenha sido consagrado e ungido com a sublime e santa unção de Deus, com a Palavra de Deus, com o batismo, … a partir de então, você tem altura e glória suficientes, e está investido com a indumentária sacerdotal”.

Através do batismo é assegurado a todos os cristãos “que somos todos igualmente sacerdotes, isto é, temos a mesma autoridade com respeito à Palavra e aos sacramentos”. Ninguém deve usar essa autoridade por iniciativa própria, por. que “o que é propriedade comum a todos, nenhum indivíduo pode adjudicar, a menos que tenha sido chamado”. Aqui está a ponte que Lutero estabelece entre um ministério público e um oficial.

O conceito de Lutero sobre o sacerdócio de crentes foi tirado de sua Cristologia e soterologia: “Porque todos temos um só batismo, um evangelho, uma fé, e todos somos igualmente cristãos; pois o batismo, o evangelho e a fé só nos tornam pessoas espirituais e cristãs.” Em troca, sendo que a ekklesía é o sacerdócio de crentes, o ministério oficial é um ministério representativo, ao qual também se conhece como um ministério delegado ou transferido.

O enfoque comum de todos os reformadores, com respeito ao sacerdócio dos crentes foi introduzido na prática, de modo especial, por Calvino em sua forma presbiteriana de organizar a Igreja. Calvino acentuou o fato de que como crentes “todos somos sacerdotes”. Aqui, os pastores e anciãos (que excedem em número aos pastores) exerciam uma crítica paternalista, aconselhamento e disciplina. A nomeação de um novo ministro vinha de uma sugestão por parte dos ministros, que tinham seu próprio concilio, porém seu consentimento tinha que ser obtido do corpo de crentes e finalmente das autoridades da cidade. O pastor era então instalado ou comissionado por seu povo, seus concílios de igreja e o concilio governamental.28

Para Lutero, o chamado, em lugar da cerimônia de imposição de mãos, é decisivo no ministério. Schoenleber comenta: “Lutero negou a ideia de que o ritual da ordenação em mãos de um bispo é um pré-requisito necessário para reter e exercer o ministério. Um chamado, não a ordenação ritual, é o único pré-requisito teológico para exercer o ministério. Uma cerimônia usando a oração e a imposição de mãos pode ser empregada para instalar os ministros em suas congregações (como uma afirmação pública de seu chamado), porém é opcional e repetido cada vez que o ministro muda de congregação.”29

Para Calvino, o chamado também é importante, não o rito da ordenação. “Assim pois, se alguém for julgado como verdadeiro ministro da Igreja, ele primeiro deverá ter sido chamado adequadamente”. Junto com “o chamado externo e formal, o qual se relaciona com a ordem pública da Igreja”, também temos “o chamado secreto do qual cada ministro é consciente de si mesmo diante de Deus”30

Calvino continua dizendo: “Vemos então, que os ministros são legitimamente chamados de acordo com a Palavra de Deus, quando aqueles que aparentam ser aptos são escolhidos com o consentimento e a aprovação do povo. Outros pastores, no entanto, deverão presidir a escolha, a fim de que o corpo em geral não cometa um erro, quer seja por leviandade, más paixões ou tumultos.”

Nos esforços de Lutero por estabelecer uma Igreja evangélica, antes de 1535, “a ordenação ritual não era um requisito para ser ministro, e nenhum método regular de ordenação foi introduzido na nova Igreja, senão até 1535. Mesmo assim, não há evidência indicando que antes de 1535 Lutero haja tentado persuadir o eleitor para que autorizasse as ordenações, ou que tenha dito que ela seria necessária para exercer o ministério”.31 Na verdade, Melancton, o sistematizador da teologia protestante, foi um teólogo leigo.

Calvino encontrou apoio bíblico para a imposição de mãos ao instalar um ministro. Lutero fez o mesmo. Entretanto, Calvino, como Lutero, o considerava como um simples ritual ou cerimônia, “conveniente à ordem e à beleza”, porém, não tendo “em si mesma força ou poder algum”.3

Ordenação formal

Na primavera de 1535, o eleitor de Saxônia estabeleceu que a ordenação formal fosse um pré-requisito para exercer o ministério em seu território. Os candidatos ao ministério deveriam ser examinados e ordenados pela Faculdade de Teologia de Wittenburg. Aparentemente o eleitor duvidava da verdadeira capacidade das pessoas não ordenadas para assumir cargos ou exercer o ministério. Ele, evidentemente, viu uma necessidade teológica da ordenação ritual, e assim, finalmente, decretou que fosse uma condição legal para exercer o ministério.

Lutero aceitou a ordem sem mudar seu conceito teológico sobre o ritual da ordenação, sempre que a pregação da Palavra pudesse ser realçada. O pragmatismo parece ter sido o motivo de Lutero. Ele encarava o mandato como uma oportunidade pela qual um ministério pudesse ser desenvolvido com uma norma moral mais elevada, uma melhor educação, salário mais razoável, e um prestígio profissional e social melhor reconhecido; uma meta digna, porém conseguida com a ajuda dos poderes seculares. No outono de 1535, Lutero pregou um sermão sobre a ordenação, no qual explicou as novas disposições. Ele notou que a Saxônia enfrentava uma forte ameaça de ensinamentos falsos em suas igrejas e que o mandato da ordenação era um passo correto para extirpá-los, uma vez que outorgava a Wittenburg o controle sobre a qualidade dos novos pastores.

Enquanto em Genebra, Calvino descobriu que era melhor abster-se da imposição de mãos. Ao regressar de Estrasburgo a Genebra, em 1541, o concilio da cidade prometera cooperar com ele, porém como François Wendel assinala, somente sob “a condição de que isto não usurpasse nenhuma das prerrogativas do poder civil, ou que não afetasse certos costumes que a igreja em Genebra mantinha junto com as igrejas de Berna, e que deveriam ser mantidos por razões políticas”. Uma dessas condições era que “a instalação de novos pastores não podia ser acompanhada da imposição de mãos, de acordo com o exemplo de Estrasburgo; eles tinham que ser simplesmente iniciados com uma oração e um sermão sobre suas funções pastorais. Depois de tudo, estes eram detalhes de menor importância, e Calvino os favoreceu”.33

Lutero introduziu o rito da imposição de mãos por causa do poder civil, enquanto Calvino o eliminou por causa do poder civil.

Dessa forma, Lutero introduziu o rito da imposição de mãos sob a influência do poder civil, enquanto Calvino o eliminou por causa do poder civil. Porém Calvino voltou ao assunto. Na última edição do livro Institutes (latim, 1559; e francês, 1560), Calvino aprovou a imposição de mãos ao fazer referência ao Novo Testamento. Ele afirmou que os pastores, professores e diáconos eram consagrados dessa maneira. Admitiu que “não há nenhum preceito fixo concernente à imposição de mãos”, porém não considerou um símbolo prático pelo qual “a dignidade do ministro deve ser recomendada às pessoas, e a quem é ordenado, lembrando-lhe que não pertence a si mesmo, mas que está ligado pelo serviço a Deus e à Igreja. Ademais, isto não resultará ser um símbolo vazio de significado, se é restaurado à sua origem genuína. Pois se o Espírito de Deus não instituiu nada inútil na Igreja, não vamos sentir que esta cerimônia aprovada por Ele é desnecessária, sempre que não seja usada supersticiosamente”.34

James L. Ainslie, em seu estudo intensivo do ministério nas igrejas reformadas dos séculos XVI e XVII, diz: “As opiniões diferem na maioria das igrejas, tanto as reformadas como as outras, a respeito do rito [imposição de mãos] sendo essencial na ordenação ou em coisas semelhantes. Alguns sustentam que deve ser absolutamente essencial, enquanto outros consideram que é melhor omiti-lo, ou pelo menos que não seja considerado essencial, sendo usado apenas como uma indicação externa da ordenação.”35

Ainslie cita vários exemplos para ilustrar diferentes conceitos. O Scottish First Book of Discipline fala contra a imposição de mãos. Em 1851, o Second Book of Discipline “definitivamente autorizou o rito, ainda que… a forma em que está escrito não indica que deva ser forçado na ordenação. E não foi imposto. Os ministros foram livremente admitidos”.

A Igreja Reformada na Holanda também sentiu que o rito era desnecessário. Nos canônicos de 1577 “a omissão da imposição das mãos na ordenação” foi decretada, porém no Sínodo de Dort, em 1619. a imposição de mãos foi estipulada.

Nos lugares onde se praticava a imposição de mãos existiam variantes quanto a quem devia executar o ritual: um ministro, vários ministros, ou ministros e leigos.

Esses exemplos podem nos dizer duas coisas: primeira, que o chamado e a nomeação, não o rito cerimonial, são de significado básico. E, segunda coisa, que Deus, sob circunstâncias específicas, chama as pessoas para tarefas singulares através do Espírito Santo (como Melancton e Calvino, que nunca foram ordenados).

A História nos diz que a ordenação é realizada tendo em mente diversos conceitos sobre as relações entre a Igreja e a sociedade. Como o escreve Warkentin: “A Igreja de Jesus Cristo buscou seus patronos, para os diversos postos, na sociedade na qual estava inserida, apesar das advertências de nosso Senhor de que Ele estava começando uma nova sociedade com sua própria estrutura autoritativa singular. Se estivéssemos convencidos de que o crente individual está sendo, ou pode ser transformado pelo Espírito de Deus, então a Igreja também deve demonstrar ao mundo que é a comunidade dos remidos. Suas estruturas políticas devem refletir o caráter transformado da comunidade em sua totalidade se o mundo vai receber seriamente o evangelho.”36

Referências:

  • 1. Baptism, Eucharist and Ministry, Genebra, Concilio Mundial de Igrejas, 1982, pág. 31.
  • 2. David DAube, The New Testament and Rabbinic Judaism, Londres, 1956, págs. 224 a 246.
  • 3. SDABC, vol. 1, Califórnia, EUA, pág. 665.
  • 4. Enciclopédia Judaica, vol. 14, 1972, págs. 1139 a 1147; The Jewish Encyclopedia, vol. 9, 1905, págs. 552 a 554.
  • 5. Hastings, vol. IX, pág. 553.
  • 6» Marjorie Warkentin, Ordination: A Biblical-Historical View, Grand Rapids, 1982, pág. 17.
  • 7. Enciclopédia Judaica, vol. 14, pág. 1140.
  • 8. La Enciclopédia Judia, vol. IX, pág. 429.
  • 9. Idem, idem.
  • 10. Hugo Mantel, “Ordination and Appointment in the Period of the Temple”, Harvard Theological Review 57. 1964, págs. 325 a 346.
  • 11. Idem, pág. 41.
  • 12 Amold Ehrhardt, “Jewish and Christian Ordination”, Journal of Ecclesiastical History V, 1954, pág. 131.
  • 13. Everett Ferguson, “Laying on of Hands: Its Significance in Ordination”, Journal of Theological Studies XXVI. 04/75, pág. 2.
  • 14. —————, “Jewish and Christian Ordination”, idem, pág. 15.
  • 15 Warkentin, Op. cit., págs. 109 a 152.
  • 16 H. Bum-Murdoch, The Development of the Papacy, Londres, 1954, págs. 76 e 77.
  • 17. Eduard Schewizer, Church Order in New Testament, Londres, 1961. pág. 208.
  • 18. T F. Torrance. “Consecration and Ordination”. Scottinsh Journal of Theology, 19/05/80, págs. 235 e 237.
  • 19. Kenneth S. Wuest, The Pastoral Epistles in the Greek New Testament: For the English Reader, Grand Rapids. 1953, págs. 87 e 88.
  • 20. Birger A. Pearson. Ministry and Ordination in the Early Church”, Ecclesial Lieturgia Ministerium; Helsinki, 1977. pág. 133.
  • 21. R. Newton Flew, Jesus and His Church: A Study of the Idea of the Ecclesia in the New Testament, Londres, 1938. pág. 38.
  • 22. The Apostolic Tradition of Hippolytus, 1962. pág. 38.
  • 23. George H. Williams, “Ministry in Late Patristic Period” e “The Ministry in Historical Perspectives”, Nova Iorque. 1956. págs. 74 e 75.
  • 24. Eric G. Jay, The Church : Its Changing Image Through Twenty Centuries, Atlanta, 1978, pág. 58.
  • 25. Luther’s Works, vol. 36, Saint Louis, 1958, págs. 106 e 107.
  • 26. John Calvin, Institutes of the Christian Religion, Grand Rapids, 1957, livro IV, cap. XIX, séc., XXVIII
  • 27. Luther’s Works, vol. 39, idem, pág. 309.
  • 28. Phillip Schaff. History of the Christian Church, vol. 3. Grand Rapids, 1910, págs. 480 a 484.
  • 29. Richard W. Schoenleber, The Sovereign Word: The Office of the Ministry and Ordination in the Theology of Martin Luther, Iowa, 1983, págs. 169 e 170.
  • 30. Calvino, Op. cit., X. XI. Livro IV, cap. 3, séc. X, XI.
  • 31. Richard W. Schoenleber, Op. cit. págs. 240 e 241.
  • 32. John Calvino, Commentary Upon the Acts of the Apostles, vol. 1. Grand Rapids, 1957, pág. 238.
  • 33. François Wendel, Calvin: The Origins and Development of His Religious Thought, Londres, 1963, Pág. 71.
  • 34. Calvino, institutes. Livro IV, cap. 3, séc. XVI.
  • 35. James L. Ainslie, The Doctrines of Ministerial Order in the Reformed Churches of 16th and 17th Centuries, Edimburgo, 1940. pág. 150.