A importância do culto familiar para o enriquecimento da espiritualidade do pastor
S. Joseph Kidder
Em 2015 realizei entrevistas com 92 pastores. Vinte e três eram pastores de igrejas saudáveis e em crescimento (considerando um aumento de 3% no número de membros, de batismos e de frequência), e 69 eram pastores de igrejas estagnadas ou em declínio.1
As entrevistas destacaram certas características comuns entre os pastores das igrejas em crescimento. Embora cada uma fosse importante individualmente, foi a força conjunta delas que fez a diferença na liderança desses ministros. Eles mencionaram que o fundamento para um ministério pastoral sólido é resultado do relacionamento diário e contínuo com Cristo. Um pastor disse: “Tenho que fazer com que meu coração se aqueça com o doce fogo do Espírito, antes de me dedicar ao restante das atividades do dia.” Outro enfatizou: “Preciso sentir a forte presença de Deus na minha vida, para que eu possa influenciar outros para Jesus.”
Quando perguntado quanto tempo passavam diariamente com Deus, os pastores responderam que investiam cerca de uma hora em oração, leitura da Bíblia e louvor ao Senhor. Além disso, muitos disseram que dedicavam mais uma hora para interceder por suas igrejas, seus membros e suas comunidades. Eles também participavam de atividades como jejuns, retiros espirituais, cultos familiares e se envolviam com grupos de oração e pequenos grupos. Esses ministros se esforçavam para crescer em seu relacionamento com Cristo e motivavam suas congregações a fazer o mesmo. Eles admitiram que não podiam levar as pessoas à Fonte da Vida se primeiramente não bebessem Sua água.
Por outro lado, as entrevistas revelaram que os pastores das igrejas que estavam em declínio gastavam diariamente menos de meia hora com Deus. Eles sentiam que as responsabilidades e exigências do pastorado limitavam o tempo de comunhão com o Senhor e enfatizaram a necessidade de trabalhar com empenho e realizar uma boa gestão.
Uma das demandas com a qual a maioria das famílias pastorais tem lutado é a realização do culto familiar. De fato, esse foi um dos itens mais apontados pelas esposas de pastor. Muitas delas disseram: “Meu marido pode ser o líder espiritual da igreja, mas em casa não é bem assim!” Este artigo tem o objetivo de refletir sobre o propósito do culto familiar e como torná-lo relevante.
Basicamente, quatro componentes devem fazer parte do culto familiar: leitura, oração, louvor e comprometimento com a missão.2 Toda família cristã deveria separar tempo diariamente para essa finalidade.
Pesquisas realizadas pelo Instituto Barna dizem que 85% dos pais acreditam que são os principais responsáveis pelo desenvolvimento moral e espiritual de seus filhos.3 No entanto, entre os cristãos que frequentam a igreja, menos de 10% leem a Bíblia, oram (fora das refeições) ou participam semanalmente de algum serviço religioso com a família. Uma em cada 20 famílias realiza uma vez por mês algum tipo de culto no lar.4 Entre os membros ativos da Igreja Adventista do Sétimo Dia, 40% das famílias não realizam o culto familiar,5 27% realizam diariamente6 e 33% somente uma vez por semana.7
A adoração ao Senhor é primeiramente vertical, conectando-se com Ele por meio da oração, adoração e estudo da Bíblia. Depois, horizontal, conectando-se com pessoas por meio do testemunho, da evangelização e do serviço de acordo com os dons. Tudo deve começar no lar e envolver toda a família (Mt 22:37-39).
A seguir, desejo apresentar os propósitos do culto familiar e algumas sugestões para torná-lo mais eficaz e relevante. Essas ideias são o resultado de entrevistas que fiz com 21 famílias,8 sobre as melhores maneiras de realizá-lo.
Propósitos do culto familiar
Em primeiro lugar, o culto familiar tem o objetivo de permitir que os integrantes da família adorem a Deus juntos e aprendam mais sobre Seus caminhos. As crianças devem aprender a adorar o Pai Celestial desde seus primeiros anos, para que possam ter respeito por Ele quando crescerem. Elas precisam aprender a respeitá-Lo e reconhecê-Lo como Criador, Senhor, Salvador, santo e honrado em tudo o que dizem e fazem. “E vós, pais, […] criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Ef 6:4). Adorar e reverenciar ao Senhor é benéfico para todas as idades. Isso traz unidade à família e torna seus membros mais unidos a Deus.
Em segundo lugar, o culto familiar ensina a família a honrar a Palavra de Deus, respeitá-la e colocá-la em prática em nossa vida. Tiago escreveu: “Tornai-vos, pois, praticantes da Palavra e não somente ouvintes” (Tg 1:22). O lar é um bom lugar para vivenciar essa exortação. “Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a Deus com salmos, hinos e cânticos espirituais, com gratidão em vosso coração” (Cl 3:16).
Em terceiro lugar, o culto familiar contribui para o desenvolvimento da fé dos nossos filhos. O Instituto Barna constatou que 32% dos filhos de famílias cristãs aceitam Jesus como Salvador entre 5 e 13 anos de idade; 4% entre 14 e 18 anos e 6% após os 19 anos.9 Isso torna imperativo que as famílias façam tudo que podem para ser intencionalmente ativas na educação religiosa das crianças. Barna também observou que apenas um terço dos adolescentes entrevistados desejava permanecer na igreja após se tornarem independentes.10 Por outro lado, pesquisas mostram que as crianças cujos pais se preocupam com o desenvolvimento espiritual delas têm maior probabilidade de permanecer na igreja.11
É desejo dos pais cristãos que seus filhos cresçam comprometidos com Cristo, desenvolvam padrões morais fundamentados na Palavra de Deus, deem testemunho positivo de sua fé na sociedade e que não somente levem a igreja a sério, mas tenham alegria em fazer parte dela. Paulo atestava o valor de conhecer as Escrituras desde cedo. Ele escreveu ao jovem Timóteo: “Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste e de que foste inteirado, sabendo de quem o aprendeste e que, desde a infância, sabes as sagradas letras, que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus” (2Tm 3:14, 15).
Em quarto lugar, a prática do culto familiar colabora para fundamentar a fé, as convicções pessoais e a doutrina na mente e no coração dos membros da família. Crianças, jovens e adultos precisam de convicções espirituais fundamentadas para enfrentar as lutas da vida. Precisam entender a razão de sua fé e conhecer as doutrinas bíblicas para que saibam em que acreditam e por quê. O lar deve ser a escola bíblica em que os filhos se preparam para combater a filosofia humanista e evolucionista da sociedade moderna.
Em quinto lugar, o culto familiar proporciona o momento para orar pelos problemas, necessidades e pressões que a família enfrenta, a fim de que aprenda a confiar nos planos do Senhor. Cada pessoa tem suas próprias necessidades. É muito bom quando se pode compartilhá-las e, com o apoio dos familiares, buscar o auxílio divino. Todos temos necessidades profissionais, educacionais, relacionais, entre outras, que gostaríamos de ver supridas.
Adolescentes têm necessidades de fórum íntimo e odeiam expressá-las por medo de ser mal-interpretados ou constrangidos. Para eles, os problemas são enormes, e precisamos dedicar-lhes atenção especial. Os pais podem ajudar levando essas necessidades a Deus em oração. A família precisa aprender a confiar crendo que o Senhor ouvirá e responderá segundo Sua vontade. As crianças que aprendem a orar audivelmente em casa não terão dificuldade para orar publicamente na igreja, nas reuniões ou em outros lugares e circunstâncias, à medida que crescerem.
Em sexto lugar, o culto familiar incentiva seus participantes a orar e interceder pelas necessidades e provações de outras pessoas e famílias. Além disso, motiva a interceder para que o Espírito Santo abra o coração e a mente das pessoas que precisam aceitar Jesus. Isso resultará em um desejo crescente pelo exercício do ministério e cumprimento da missão.
Finalmente, o culto familiar ajuda a encontrar maneiras relevantes de ministrar na igreja, no lar e na sociedade. Quando uma família assume um projeto, isso contribui para sua unidade e permite que Deus use seus membros para abençoar o mundo. Por exemplo, sua família pode adotar uma família carente para orar por ela e ajudá-la durante alguns dias nas férias. Pode disponibilizar a casa para estabelecer um pequeno grupo de estudos da Palavra de Deus. Pode também prestar serviço voluntário em um asilo, orfanato ou compartilhar alimentos com os sem-teto. Pode ainda dar estudos bíblicos, visitar pessoas enfermas e outras famílias.
Culto familiar atrativo
Gostaria de sugerir algumas dicas para ajudar você a promover um culto familiar atrativo. Isso deve ser praticado em sua casa e incentivado na igreja, a fim de que os membros também fortaleçam o altar da família.
Avalie sua espiritualidade. A autenticidade e o exemplo dos pais no culto familiar fazem com que os momentos passados ali resultem em experiências marcantes para os filhos. Se os momentos de adoração em família são importantes para os pais, os filhos também entenderão como importantes para si mesmos. O culto familiar eficaz começa fazendo de Jesus a prioridade na vida. Paulo disse: “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (1Co 11:1). Como pastor, sua família vê o que é importante para você. Se você mantém forte relacionamento com Cristo e vive Seu amor, os outros vão querer imitá-lo.
Torne o culto familiar prático. Mostre a relevância das Escrituras. Demonstre como viver à luz da Palavra de Deus, como as Escrituras podem ajudar a manter princípios corretos e ter uma cosmovisão bíblica, como obter sabedoria a partir do texto sagrado, como tomar decisões para honrar a Deus e como resistir à tentação e perseverar na caminhada cristã. É assim que mudanças reais ocorrem.
Utilize métodos que sejam eficazes para todas as faixas etárias. Idades diferentes têm interesses diferentes e o que pode atrair um, não atrairá o outro. Varie o método para evitar que o culto familiar seja entediante e rotineiro. Todos devem participar e se interessar para que a monotonia não o mate. “Pais e mães, tornem a hora do culto intensamente interessante. Não há razão para que essa hora não deva ser a mais agradável e jubilosa do dia. Com um pouco de preparo, será possível torná-la cheia de interesse e proveito. De tempos a tempos, deve ser introduzida alguma mudança.”12
Torne-o interessante. Faça com que os momentos do culto familiar sejam alegres e cheios de entusiasmo, para que a família o aguarde com expectativa. Não faça dele um tempo entediante, lendo capítulos inteiros da Bíblia que estão além da compreensão dos participantes e arrastando a família ao proferir uma oração longa, vazia e rotineira. Se eles experimentarem tal amargura, certamente irão abominar o culto familiar!
“O pai e, em sua ausência, a mãe, deve dirigir o culto, buscando um trecho das Escrituras que seja interessante e de fácil compreensão. Convém que o culto seja breve. Se for lido um capítulo extenso e feita uma oração longa, o culto torna-se cansativo e, ao terminar, tem-se sensação de alívio. Deus é desonrado quando a hora da adoração se torna insípida e enfadonha, quando é tão tediosa, tão destituída de interesse que as crianças lhe têm horror.”13
Seja breve para que consiga atrair a atenção. Procure ser sucinto e prático para que os participantes, principalmente, as crianças, não se dispersem. É melhor que o culto seja curto, agradável e convidativo, para que, ao terminá-lo, fique um desejo de “quero mais”. Quanto à sua duração, 10 a 15 minutos são suficientes.
Todos devem participar e se envolver. Os que podem ler devem se revezar na leitura. Nas orações, as crianças devem ter oportunidade, ainda que seja para dizer algumas palavras. Ensine músicas que todos consigam cantar. Deixe alguns minutos para responder perguntas e tirar dúvidas. As crianças, especialmente, são curiosas e querem saber mais sobre questões bíblicas. Toda participação deve ser respeitada e precisa de atenção.
Não gaste tempo com críticas. Não existe nada pior para estragar o ambiente do que desviar-se do objetivo para fazer críticas diversas. Não é hora de falar dos problemas da igreja, exceto questões que necessitam de oração. Lembre-se de que é a hora do culto.
Deixe as crianças dirigirem o culto ou parte dele. Deixe-as fazer e se expressarem do seu jeito. Isso despertará o interesse delas. Também é uma excelente maneira de desenvolvê-las espiritualmente e inspirar-lhes autoconfiança. Elas devem ser sempre encorajadas no que fazem ou dizem.
Faça o culto no momento em que for mais conveniente para todos. Logo pela manhã, antes do desjejum ou após a refeição da noite são os momentos mais apropriados. Ellen White aconselha: “Em cada família deve haver um tempo determinado para os cultos matutino e vespertino. Quão apropriado é reunirem os pais em redor de si os filhos, antes de quebrar o jejum, agradecer ao Pai celestial Sua proteção durante a noite e pedir-Lhe auxílio, guia e proteção para o dia! Quão adequado, também, em chegando a noite, é reunirem-se uma vez mais em Sua presença, pais e filhos, para agradecer as bênçãos do dia findo!”14
Conclusão
Procure ser intencional e consistente no culto familiar. Torne-o interessante, prático, cristocêntrico, relevante e participativo. Logicamente haverá alguns desafios como diferença de idade dos filhos, menor comprometimento por parte do pai ou da mãe, pais que não se sentem competentes para ensinar e crianças que são resistentes ao culto familiar. No entanto, quanto mais os pais demonstrarem amor e comprometimento com Cristo e viverem os ideais cristãos, mais interesse os filhos terão. Não há substituto melhor para o exemplo de vida e testemunho dos pais que possa causar impressão maior em seus filhos.
Orem e intercedam sempre pelos filhos. Coloque-os nas mãos de Deus, e Ele cuidará deles. “Pela sincera e fervorosa oração os pais devem construir um muro em torno dos filhos. Devem suplicar, com plena fé, que Deus habite entre eles, e santos anjos os guardem, a eles e aos filhos, do poder cruel de Satanás.”15
Um irmão de igreja me disse que tem o costume de orar e jejuar por seus filhos e netos e dedicar a vida deles diariamente a Deus. Pela graça divina, todos estão nos caminhos do Senhor. “A oração de um justo é poderosa e eficaz” (Tg 5:16). Creia nisso!
Referências
1 S. Joseph Kidder, Moving Your Church: Become a Spirit-Led community (Nampa, ID: Pacific Press, 2015), p. 313, 314.
2 Ver Atos 2:42-47. “Em todos os projetos de pesquisa Valuegenesis, programas de ajuda à família ou atividades altruístas têm sido vistos como fatores estatísticos significativos para a edificação de uma vida cristã frutífera e o desenvolvimento de lealdade à Igreja Adventista do Sétimo Dia.” Valuegenesis Update, n. 4, 2012, p. 5.
3 George Barna, Transforming Children Into Spiritual Champions: Why children should be your church’s #1 priority (Raleigh, NC: Regal Books, 2003), p. 77.
4 Ibid., p. 78.
5 S. Joseph Kidder, The Big Four: Secrets to a thriving church family (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2011), p. 128.
6 2009 Congregations Study for the North American Division of SDA, <https://tinyurl.com/y9m6ng5g>, acessado em 18/12/2018.
7 Kidder, p. 128.
8 Sete famílias pastorais, sete famílias de professores e sete famílias de membros locais.
9 George Barna, Grow Your Church From the Outside In: Understand the unchurched and how to reach them (Raleigh, NC: Regal Books, 2002), p. 45.
10 George Barna, Real Teens: A contemporary snapshot of youth culture (Raleigh, NC: Regal Books, 2001), p. 113.
11 Jerry W. Lee, Gail T. Rice e V. Bailey Gillespie, “Family Worship Pattern and Their Correlations with Adolescent Behavior and Beliefs”, Journal for the Scientific Study of Religion, 1997, (36) 3, p. 373-381.
12 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 7 (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2010), p. 43.
13 Ibid.
14 Ibid.
15 Ibid., p. 42, 43.
S. Joseph Kidder, doutor em Ministério, é professor do Seminário Teológico da Universidade Andrews