(Continuação)

É certo que o cumprimento é uma das provas da verdadeira profecia. Embora o cumprimento de uma simples predição não prove necessariamente que um profeta é genuíno (Deut. 13:1 e 2), a falta de cumprimento demonstra que o profeta é falso (Deut. 18:20-22), a menos que haja uma condição expressa ou subentendida. É claro que esta última parte só se aplica como prova eficiente para as predições imediatas, pois as predições de longo alcance, que devem cumprir-se muito tempo depois da morte do profeta, não podem servir para seus contemporâneos decidirem se devem ou não crer nas mensagens do profeta e considerá-lo como autêntico mensageiro de Deus.

3. PROFECIAS CONDICIONAIS. – As profecias que apresentam ou envolvem promessas ou ameaças são condicionais, dependentes das ações humanas. A condicionalidade às vêzes é exposta (Êxo. 19:5 e 6); às vêzes não (Jonas 3:4). Em tais profecias podemos encontrar uma série de cumprimentos substituída por outra, de acôrdo com a atitude para com as condições, sem de maneira alguma enfraquecer a certeza da profecia (Jer. 18:7-10).

Algumas predições demoram a cumprir-se, por causa das próprias ações ou da inação do homem; por vêzes, o cumprimento é diferente da probabilidade original. Há claros exemplos de ambas as espécies.

a. Deus prometeu levar os israelitas do Egito para a terra de Canaã; expelir os habitantes pagãos e dar herança a Seu povo (Êxo. 3:8; 15:17; 23:23; etc.) Todavia, quando eles se aproximaram dos limites da terra, em Cades-Barnéia, o relatório desfavorável dos espias fê-los rebelarem-se e recusarem prosseguir. Conseqüentemente, Deus disse: “Não entrareis na terra, pela qual jurei que vos faria habitar nela” (Núm. 14:30). Deviam vaguear pelo deserto até que aquela geração perecesse. Deus chegou mesmo a chamar isso de “a quebra de Minha promessa” (verso 34—KJV), pois aparentemente era assim; a outra geração, porém, uns quarenta anos mais tarde, entrou em Canaã.

Hoje a longa demora para o segundo advento de Cristo faz com que alguns perguntem: “Onde está a promessa de Sua vinda?” O apóstolo responde: “Não retarda o Senhor a Sua promessa, como alguns a julgam demorada; pelo contrário, Êle é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento”. II Pedro 3:9.

b. Um exemplo de um cumprimento alterado foi a profecia a respeito da tribo de Levi: “Dividi-los-ei em Jacó, e os espalharei em Israel.” Gên. 49:7. Contudo, devido à lealdade dessa tribo numa crise, essa dispersão tornou-se uma bênção. Levi tornou-se a tribo do sacerdócio, não herdando portanto uma parte da terra como as outras tribos, mas Levi viveu espalhado entre tôdas as tribos, a fim de ser uma bênção para tôdas elas. (Êxo. 32:26; Núm. 18:20-24). Às vêzes profecias do Velho Testamento que originàriamente eram literais cumprem-se duma maneira figurada no Nôvo Testamento. Tal cumprimento, porém, nos deve ser indicado por inspiração; doutro modo não haveria limite para interpretações especulativas e fantasiosas.

Como se pode ver por estes exemplos, o fato de que nem sempre encontramos um cumprimento literal para cada pormenor da profecia não indica que a predição tenha falhado ou que devemos aguardar um cumprimento fantasioso ainda por manifestar-se. Como os próprios “literalistas” sabem, deve-se dar devida atenção à linguagem figurada, tanto nos escritos antigos como nos modernos; também à maneira oriental de expressar-se. Além disso, parábolas ou símbolos devem ser entendidos à luz do que o autor pretende tomar conhecido, não à luz dos irrelevantes pormenores da ilustração (como as manchas do Leopardo ou a proporção entre as cinco virgens loucas e as cinco prudentes). Quando consideramos sob que aspecto a mensagem profética é dada, procurando primeiro o significado direto e original e em seguida todo sentido secundário ou figurado que for válido, descobrimos que as profecias não são uma fantasmagoria que representa tudo o que a imaginação deseja ver nela, nem mensagens cifradas com um significado exato para cada palavra — mensagens que precisam cumprir-se em todas as minúcias, ou se não a profecia falhou.

4. DIFERENTES PONTOS DE VISTA SOBRE AS “PROFECIAS DO REINO”. – Tem havido muita má compreensão acerca da série de promessas e profecias, principalmente no Velho Testamento, concernentes à posição de Israel no plano de Deus — as assim chamadas “profecias do reino”.

pós-milenialista interpreta as “profecias do reino” como descrições inteiramente simbólicas de uma futura idade áurea para a igreja, um milênio de justiça universal, a realizar-se em grande parte pelos atuais meios de graça, não pela intervenção direta de Deus. Isto, alega-se, preparará o mundo todo para a segunda vinda de Cristo no fim do milênio, para dar início ao juízo final e à eternidade.

pré-milenialista crê que o presente reinado do mal continuará, tornando-se mesmo pior, até que a vinda pessoal de Cristo acabe com esta época, duma maneira catastrófica e sobrenatural. Êle inicia o milênio com a primeira ressurreição literal (dos “santos”) e o termina com a segunda ressurreição (dos “restantes dos mortos”), e o juízo final, seguido por um domínio eterno nos novos céus e na nova Terra.

amilenialista nega todo reino milenário; isto é, como Agostinho, êle o compara ao triunfo do cristianismo na presente era. Concorda com o pré-milenialista em que o mundo não verá uma idade áurea antes do advento, em que o trigo e o joio crescerão juntos até ser introduzida, de maneira direta e cataclísmica, uma nova era com o advento de Cristo, mas êle concorda com os pós-milenialista em que o advento não é seguido por um reino milenário, mas pelo juízo final e a eternidade.

O pré-milenialismo, que ressurgiu no começo do século dezenove, reagiu vigorosamente contra a “espiritualização” da primeira ressurreição e das profecias do reino por parte do pós-milenialismo então dominante. Os pré-milenialistas, que se tomaram conhecidos na Inglaterra por “literalistas”, não somente salientaram a ressurreição literal, mas também um reino literal sobre a Terra durante o milênio. Isto ocorreria sob o controle direto ou indireto de Cristo e abrangeria uma aplicação literal, aos judeus, das profecias do Velho Testamento feitas ao antigo Israel. Embora a princípio fossem historicistas, alguns destes literalistas logo deram o próximo passo lógico: tomaram-se em grande parte futuristas. O cumprimento da maioria das profecias só devia ser esperado por ocasião do fim da era atual. Todas as profecias do reino que não se cumpriram completamente em todas as suas minúcias — o triunfo de Israel sobre os reinos terrestres, seu restabelecimento na Palestina com a reconstrução do Templo e a restauração dos sacrifícios animais, e até a retenção de chuva a toda nação que não comparecer em Jerusalém para a Festa dos Tabernáculos — tudo isto, e muito mais, sustentam eles, precisa cumprir-se num literal e futuro reino judaico sobre a Terra, depois do segundo advento e durante o milênio.

Na América do Norte, o forte movimento pré-milenialista em meados do século dezenove, a princípio incluía literalistas e mileritas. E como êstes eram pré-milenialistas e historicistas, uniram-se contra os aferrados pós-milenialistas. Mas, como a maioria das igrejas através dos séculos, os mileritas criam que o reino que estava profetizado devia cumprir-se com a igreja glorificada, não com os judeus. Além disso, criam que o milênio seria o início da eternidade.

Os adventistas do sétimo dia, pelo contrário, sustentam que as promessas do reino irão cumprir-se na experiência da igreja — hoje o “reino da graça” no coração dos cristãos e finalmente o “reino da glória” na eternidade. Por conseguinte, diferimos da maioria dos outros grupos cristãos, em nossos pontos de vista sôbre as profecias do reino.

II. Concepção Adventista Sôbre as Profecias do Reino

1. PROMESSAS A ABRAÃO. – O Velho Testamento torna claro que o povo hebreu, os descendentes dos doze filhos de Jacó, foram especialmente escolhidos por Deus como instrumentos para tornar conhecido Seu propósito de salvação. Através deles foram dadas as Escrituras, através deles deveria surgir o Messias, o Cristo. E por meio deles todas as nações do mundo deveriam receber as bênçãos da salvação. Entretanto, o Velho Testamento também esclarece um fato que amiúde é passado por alto — que sua posição como povo escolhido era condicional.

Deus prometeu diversas vezes a Abraão que ele seria uma bênção, que sua descendência seria numerosa e se tornaria uma grande nação, que lhes seria dada a terra de Canaã, que esta terra devia estender-se do “rio do Egito” (o Wadi el-Arish) até o rio Eufrates. (Ver Gên. 12:1-3; 13:14-17; 15:5, 7, 18-21; 18:18 e 19; 22:15-18.)

2. PROMESSAS A ISRAEL NO SINAI. -Quando Deus começou a cumprir estas promessas aos descendentes de Abraão, tirando-os do Egito para lhes dar a Terra Prometida e tomá-los uma nação, Ele fez um concerto com eles no Sinai. A natureza condicional das promessas à nova nação de Israel, como o povo escolhido, foi exposta com clareza desde o início:

“Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a Minha voz, e guardardes a Minha aliança, então sereis a Minha propriedade peculiar dentre todos os povos: porque toda a terra é Minha; vós Me sereis reino de sacerdotes e nação santa.” Êxo. 19:5 e 6.

Sua condição como povo especial de Deus dependia de um se.

Aproximadamente quarenta anos mais tarde, ao encontrar-se a segunda geração às bordas da Terra Prometida, Moisés, em seu discurso de despedida, advertiu-os minuciosamente (Deut. 7:8) de que se esperassem ver o cumprimento das promessas feitas aos seus antepassados deviam ser leais ao “Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia até mil gerações aos que O amam e cumprem os Seus mandamentos” (Deut. 7:9). Se guardassem os mandamentos, o Senhor guardaria “a aliança e a misericórdia prometida sob juramento” a seus pais (Deut. 7:11 e 12). Por outro lado, se desobedecessem a Deus, haveriam de perecer como as nações que deviam expelir (Deut. 8:1, 19 e 20). Comparar as advertências de que a terra os lançaria fora como havia acontecido com seus antecessores (Lev. 18:26-28; 20:22). Numa longa série de bênçãos e maldições (Deut. 27-30), as seguintes bênçãos são condicionais à obediência aos mandamentos de Deus: santidade, liderança e prosperidade. As maldições incluem doença, fome, pobreza, derrota, serem espalhados entre as nações — com a promessa, porém, de retornarem do exílio se se arrependessem.

As alternativas apresentadas tornam claro que o ato de Deus declarar que lhes “concederia” as várias bênçãos equivalia a “estou disposto a dar”, “pretendo dar”. Mas os israelitas não foram deixados em dúvida quanto às condições sob as quais obteriam ou perderiam as bênçãos prometidas.

Notar as declarações explícitas da natureza condicional das promessas e profecias feitas à literal nação de Israel, em conexão com todos os pontos abrangidos pelas promessas a Abraão. — Questions on Doctrine, págs. 210 a 217.