Incontáveis multidões, bem no íntimo, desejam profundamente a salvação e a vida eterna. E ainda que jamais tenham ouvido aquela voz que diz: “Êste é o caminho, andai nêle” (1) .. . andam contudo em busca dêle, para que, “porventura, tateando, o pudessem achar,” e a promessa é de que “não está longe de cada um de nós.” (2)

Obscurecendo e apagando a vereda que por Cristo conduz ao Céu, Satanás tem-se esforçado por apresentar uma religião falsa, de salvação pelas obras, pelos méritos pessoais, em oposição ao plano divino de salvação pelos méritos de Jesus Cristo e pela fé nÊle.

Desde o Éden perdido ao Éden restaurado a graça de Deus é revelada em Cristo. Dificilmente há na Bíblia um verso ou um capítulo que não contribua, de um ângulo ou outro, para a glória da Salvação em Cristo. Não obstante, podemos ler a Bíblia regularmente e ainda falhar em aprender-lhe as lições e discernir seus ensinos. Satanás tem mil e uma maneiras de neutralizar a mensagem do evangelho.

Nestes últimos dias Satanás redobrará seus esforços para, se possível, “enganar até os escolhidos.” Já no início do período da igreja de Laodicéia, foi êle quase bem sucedido em levar o povo de Deus à senda do legalismo estéril e mais árido do que as montanhas do deserto. Repitamos aqui, para benefício dos que não leram o artigo primeiro, algumas palavras do Espírito de Profecia:

“Há verdades há muito escondidas sob o entulho do êrro e que devem ser reveladas ao povo. Muitos que professam crer a mensagem do terceiro anjo, perderam de vista a justificação pela fé” (3); e ainda aquela espantosa revelação de que “as nossas igrejas estão morrendo por falta do ensino do assunto da justiça pela fé em Cristo.” (4)

Esta tão importante doutrina da justificação pela fé em Cristo havia sido escondida durante séculos pelo entulho das tradições romanas e seus ensinos, e foi tirada de sob os mesmos já no tempo da reforma protestante na Europa. Novamente foi ela posta em perigo, em obscuridade, no início de nossa igreja, até que Deus nos mostrou o caminho certo. E uma campanha árdua, constante, da parte de E. G. White e dos pastôres Jones e Waggoner repôs êste importante ensino em seu devido lugar central onde sempre deveria ter estado.

Parece que há uma íntima relação entre as palavras da fiel Testemunha em Apoc. 3:17: “Como dizes: Rico sou e estou enriquecido, e de nada tenho falta … ” e as repetidas advertências do Espírito de Profecia no sentido de darmos mais atenção à mensagem da justificação pela fé em Cristo Jesus. Não sugerem as palavras acima citadas que somos bons, que de nada temos falta, que Deus nos há de salvar porque guardamos o sábado, todos os 10 mandamentos, damos o dízimo, não comemos isto nem bebemos aquilo, e não nos apercebemos, como os judeus, de que há perigo de desprezarmos o mais importante: “o juízo, a misericórdia e a fé”? (5) Não nos entendam mal. Tudo isto é bom, muito bom, mesmo indispensável. Mas não é o suficiente. Não vai ao cerne do problema que é Cristo, justiça nossa.

“Há almas conscienciosas que confiam parcialmente em Deus e em parte em si mesmas. Não olham a Deus a fim de serem guardadas, pelo Seu poder, mas confiam na vigilância contra as tentações e a realização de certos deveres a fim de serem aceitáveis perante Êle. Não há vitórias nesta espécie de fé. Tais pessoas se esforçam sem nenhum resultado; suas almas estão em escravidão contínua, e não encontram descanso até que depõem seus fardos aos pés de Jesus.” (6) Mas graças a Deus por tão encorajadoras palavras como as que seguem: “A grande obra que é realizada em favor do pecador manchado pelo mal, é a justificação. Por Aquêle que fala a verdade, é declarado justo. O Senhor imputa ao crente a justiça de Cristo e o declara justo perante o universo. Êle transfere seus pecados a Cristo — o Representante do pecador, seu Substituto e Penhor. Sôbre Cristo é colocada a iniqüidade de cada alma do universo.” (7)

Surge, porém,

Uma pergunta

Que é justificação pela fé? Poder-se-ia defini-la como sendo “o ato ou o processo da graça de Deus pelo qual o homem é purificado de seus pecados e tornado justo aos olhos de Deus.” (8) Concorrendo com esta definição, sem dúvida correta, temos um pensamento de M. L. Andreasen, que merece nossa atenção. Ei-lo: “A obra de Cristo soo o concêrto da graça é tomar pecadores e fazer dêles santos.” (9)

É verdade que a “respeito dêste assunto” “necessitamos muito mais conhecimento” — acima de tudo, conhecimento experimental. “Devemos ser iluminados com respeito ao plano da salvação. Não há um em cem que por si entenda a verdade bíblica dêste assunto (o da justificação por fé) que é tão necessário ao nosso bem-estar presente e eterno.” (Grifo nosso.) (10) A Bíblia diz que

Somos justificados

“Gratuitamente,” “pela fé,” “pelo Seu sangue,” e isto independentemente das boas obras ou “das obras da lei,” “para que nenhuma carne se glorie.” (11) É de graça. Inteiramente de graça. Nada pode o homem fazer para merecer êste dom divino. O homem natural, não justificado, não convertido, não pode, mesmo que o queira, guardar a Lei em seu sentido amplo e espiritual, porque “a inclinação da carne é morte — é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à Lei de Deus nem em verdade o pode ser. .. . Portanto os que estão na carne, não podem agradar a Deus.” (12) Antes de poder guardar a lei, é preciso ser justificado pela fé. Mas para não ser compreendido mal no sentido de não ser necessário praticar boas obras, apresso-me a acrescentar: “Embora as boas obras não salvem ninguém, é não obstante, impossível que uma só alma seja salva sem boas obras.” (Grifo nosso.) (13) Isto é, “o pecador não pode depender de suas boas obras como meio para justificação,” (14), que é pela graça, pela fé.

O Espírito chama

O Espírito Santo chama a todos ao arrependimento. Ao contemplar o pecador o Filho de Deus na cruz, ao ver e compreender que “Deus amou o mundo de tal maneira que deu Seu Filho,” sente-se atraído ao Salvador. Arrepende-se de seus pecados e então pode dizer com o Suave Cantor em Israel: “Esperei com paciência no Senhor, e Êle . . . ouviu o meu clamor.” Mas mesmo o arrependimento é um dom de Deus. “O arrependimento não é menos um dom de Deus do que o perdão e a justificação, e não pode ser experimentado a menos que seja dado à alma por Cristo. Para sermos atraídos a Cristo, isto deve dar-se pelo Seu poder e virtude. Por Êle vem graça e contrição, e dÊle vem justificação.” (15)

Como nos é dito em Vereda de Cristo, é aqui que muitos falham em sua vida religiosa. Esperam tornar-se bons, aceitáveis, respeitáveis, antes de ir ao Mestre. “Quem deseja realmente o arrependimento? O que deve fazer? Deve ir a Jesus, justamente como é, sem tardança.” (16). “Muitos pensam que devem esperar um impulso especial a fim de poderem ir a Cristo. A única coisa necessária, porém, é ir com sinceridade de propósito, decidir aceitar as ofertas de graça e misericórdia que nos são feitas.” (17)

Como “nossa pecaminosidade, fraqueza e imperfeição humana tornam impossível aparecer diante de Deus, a não ser que sejamos vestidos pela imaculada justiça de Cristo” (18), necessário será obter o perdão dos pecados do passado. Mas “ninguém, a não ser Deus, pode subjugar o orgulho no coração humano. Não podemos regenerar-nos”; e “nas cortes celestiais não se ouvirá cantar: A mim, pois que me amei a mim mesmo, lavei-me e redimi-me, a mim pois seja glória e honra e louvor. Mas isto é a nota tônica que se ouve de muitos lábios neste mundo. .. . Todo o evangelho se resume em aprender de Cristo, de Sua mansidão e amabilidade. Que é justificação? É a obra de Deus em lançar a glória humana por terra e fazer pelo homem o que não lhe é possível fazer em seu próprio poder.” (19) (Grifo nosso.) É, neste caso, aceitar por fé o perdão, livremente oferecido, depender da justificação pela fé. Ê verdade que “Cristo perdoa sòmente ao penitente,” mas graças a Deus que “a quem perdoa, torna antes penitente.” (20)

Deus nos torna penitentes. Vamos a Êle tal qual somos. Confessamos-Lhe os pecados, e “se confessarmos os nossos pecados, Êle é fiel e justo para nos perdoar os pecados,” (21) e o “Sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, nos purifica de todo o pecado.” (21) Aceitamos pela fé esta promessa e nossos pecados são lançados a débito de Cristo, e Sua justiça a nosso crédito. Trocamos os “trapos de imundícia” de nossa própria justiça pela “justiça branca e imaculada” de Cristo. “Se vos entregardes a Êle e O aceitardes como vosso Salvador, sereis então, por pecaminosa que tenha sido vossa vida, considerados justos por Sua causa. O caráter de Cristo substituirá o vosso caráter, e sereis aceitos diante de Deus, exatamente como se não houvésseis pecado.” (22) (Grifo nosso.) Justificação é pois “perdão completo e total dos pecados. No instante mesmo em que um pecador aceita a Cristo por fé, é êle perdoado. A jus-tiça de Cristo é imputada a êle, e não deve mais duvidar da graça perdoadora de Deus. .. . É unicamente pela fé em Seu sangue que Jesus pode justificar o crente.” (23) Se aceitamos pela fé estas providências divinas, então

Somos filhos e filhas de Deus

Não deve haver mais dúvida. Tôda esta caridade, todo êste sacrifício o Céu realizou para que “fôssemos chamados filhos de Deus.” “Amados, agora somos filhos de Deus,” (24) e o mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que

somos filhos de Deus. (Grifo nosso.) E há uma diferença enorme na religião do que é e do que não o é.

“A religião de um é obrigação, formalismo, ritualismo, simples profissão. A de outro é amor mútuo entre êle e Cristo.

“Um trabalha para alcançar recompensa e respeitabilidade, outro opera porque tem uma experiência pessoal com Cristo.

“A religião de um é como um casamento sem amor. A de outro assemelha-se a um casamento onde o amor é completo.

“Uma pessoa está profundamente preocupada em defender sua religião. A preocupação principal da outra é fazer sua fé irradiar por Cristo.

“Os esforços de um são tristemente limitados pela fraqueza humana. O outro, ainda que reconhecendo suas fraquezas, sabe que o poder da graça divina opera nêle.

“Uma pessoa olha a Jesus como um grande Mestre ou o Redentor da humanidade. O outro o vê como seu Redentor pessoal.

“Um espera ser salvo se fôr fiel. O outro espera ser salvo porque Deus é fiel.

“Uma pessoa coloca sua confiança em planos e organização. O outro reconhece a necessidade do Espírito de Cristo.” (25)

Quando pois reconhecemos tudo isto, então “o dever torna-se um deleite, e o sacrifício um prazer. O trilho que antes parecia envolvido em escuridão, torna-se brilhante, porque é iluminado pelos raios do Sol da Justiça. Isto é andar na luz como Cristo está na luz.” (26)

Bibliografia

  • 1. Isaías 30:21.
  • 2. Atos 17:27.
  • 3.  Selected Messages, Vol. I, pág. 366.
  • 4. Citado por T. G. Bunch, em Review and Herald, 28-5-54.
  • 5. S. Mateus 23:23.
  • 6. E. G. White, em By Faith Alone, pág. 76.
  • 7.  Selected Messages, Vol. I, pág. 392.
  • 8. Autor desconhecido.
  • 9. The Book of Hebrews, pág. 297.
  • 10.  Selected Messages, Vol. I, pág. 360.
  • 11. Romanos 3:24; 5:1; 5:9; 3:28; I Cor. 1:29.
  • 12. Romanos 8:5-8.
  • 13.  Selected Messages, Vol. I, pág. 377.
  • 14. SDA Bible Commentary, Vol. 6, pág. 1071.
  • 15.  Selected Messages, Vol. I, pág. 391.
  • 16. Idem, pág. 393.
  • 17. Idem, pág. 397.
  • 18. Idem, pág. 333.
  • 19. Testimonies to Gospel Workers and Ministers, pág. 456.
  • 20. Selected Messages, Vol. I, págs. 393 e 394.
  • 21. I S. João 1:9; I S. João 1:7.
  • 22. Vereda de Cristo (Ed. de Bôlso), pág. 60.
  • 23. SDA Bible Commentary, Vol. 6, pág. 1071.
  • 24. I S. João 3:1.
  • 25. By Faith Alone, págs. 75 e 76.
  • 26. Idem, pág. 77.