O que pensam dois filhos de pastor, um pastor e uma esposa, sobre a vocação ministerial
por Zinaldo A. Santos e Marcos Blanco
Abrangente como é, o ministério pastoral não é uma vocação que afeta somente o pastor. Esposa e filhos nunca estão à margem. De alguma forma, em algum momento, eles são alvejados pelas alegrias e tristezas, comoções e emoções desse trabalho sagrado. A propósito de mais um Dia do Pastor (último sábado de outubro), Ministério ouviu as impressões de um pastor, uma esposa e dois filhos de pastor, de regiões diferentes da Divisão Sul-Americana, a respeito do pastorado.
Nascido no Paraná, o Pastor Davi Marski é o primogênito do pioneiro Geraldo Marski. Tem mais dois irmãos pastores (Artur e Paulo), é sogro de pastor, e sua esposa, Ruth, também é formada em Teologia. Pai de dois filhos e avô de três netos, o Pastor Davi serve à Causa de Deus há 37 anos, tendo trabalhado na antiga Associação Paulista, Associação Sul-Paranaense, Associação Paulista Leste e, atualmente, pastoreia um distrito na Associação Paulista Central.
Davi Marski
Ministério: Filho de pastor, irmão de pastores e sogro de pastor. Como se sente neste ambiente?
Davi Marski: Ah, muito feliz e realizado. É um privilégio viver em uma família de pastores; podemos conversar sempre a respeito da Causa de Deus, animando-nos e aconselhando-nos mutuamente. Enquanto conversamos e analisamos as maravilhas operadas por Deus, a gente cresce na fé, na certeza de que Ele dirige Sua Obra, e no relacionamento familiar.
Ministério: Quando e em que circuns-tâncias se sentiu chamado para ser pas-tor? O fato de ser filho de pastor influen-ciou nessa direção?
Davi Marski: Acho que não houve uma circunstância específica. Desde muito cedo, eu senti que ser pastor era algo que iria acontecer naturalmente, já que, desde criança jamais pensei em ser outra coisa a não ser pastor. Sem dúvida, a influência da família foi muito importante. Meu pai sempre me falava que eu seria pastor. Como nunca ouvi meu pai ou minha mãe falarem mal de qualquer coisa do trabalho ou de líderes, para mim, a igreja era um paraíso. Assim, ser pastor era um privilégio enorme, e ainda é. Conhecendo a história do meu pai e observando a alegria com que ele realizava seu trabalho, sim, fui grandemente influenciado por ele.
Ministério: Que comparação faz entre seus sentimentos, no início do trabalho e os de agora?
Davi Marski: Concluí o curso teológico em 1968, com 22 anos, casei-me uma semana após a formatura e, passada a lua-de-mel, iniciei o trabalho em 1o de janeiro de 1969. Sentimentos de enorme empolgação, responsa-bilidade e serviço impregnavam todo o meu ser. Dou graças a Deus porque eles ainda me acompanham. Sinto a mesma alegria, o mesmo ânimo, ao trabalhar. Na infância, aprendi com meu pai a evitar críticas e expressões de desalento diante das pessoas. Vejo o resultado disso em forma de congregações fortes, animadas e dispostas a trabalhar para o Senhor.
Ministério: Que situações ou fatos do trabalho lhe produziram maior satisfação, ao longo destes anos?
Davi Marski: Estar com os irmãos, viver entre eles, é uma satisfação inexplicável. A maior satisfação é ter servido como pastor de igreja, exceto breve período como diretor de departamento. Ser pastor de igreja, para mim, é a melhor função e a que produz maior prazer. Nada se compara com viver entre os irmãos, amá-los e sentir sua resposta amorosa, participar de suas alegrias e tristezas. Batizá-los e vê-los firmes na fé ainda é o ápice do trabalho. Deus me deu o privilégio de levar ao batismo mais de duas mil pessoas, como pastor de igreja. Isso não tem preço.
Ministério: E quanto ao envolvimento da família no trabalho?
Davi Marski: A família exerce influência muito grande no pastorado de alguém. Dou graças a Deus por minha família, pelas famílias dos meus irmãos pastores e por meus pais. Um exemplo vale mais do que muitas palavras. Ninguém da minha casa jamais se queixou do fato de eu ser pastor. Meus filhos participam ativamente na igreja e minha esposa sempre me acompanhou em todas as atividades. Formamos, de fato, um casal pastoral. A união familiar em função do ministério me tem ajudado muitíssimo.
Ministério: Depois de tantos anos a serviço da Causa, que mensagem ou conselho gostaria de partilhar com os colegas?
Davi Marski: Precisamos ter sempre em mente que devemos estar a serviço da igreja, e não esperar que ela esteja a nosso serviço. À parte de Cristo, tenho em meu pai um exemplo a seguir nesse sentido. Somos pastores a serviço do Supremo Pastor, devemos ter nossa vontade submissa à dEle. É maravilhoso servi-Lo. Consagremo-nos ao Senhor dia a dia; coloquemos à disposição dEle tudo o que somos e temos.
Simone Damm Zogaih Mardones é esposa do Pastor Carlos Henrique Mardones. O casal tem duas filhas e há 21 anos dedica seus talentos à Obra de Deus. Já serviram na Associação Espírito-Santense, Associação Pernambucana e Missão Sergipe-Alagoas. Ele, como diretor de Publicações e pastor de igreja, função desempenhada atualmente em Aracaju, SE. Com bacharelado em Música, graduação em Pedagogia e mestrado em Educação, Simone é professora universitária e coordena cursos de pós-graduação. Também é escritora.
Ministério: Em algum tempo, desejou ser esposa de pastor, ou simplesmente “aconteceu”?
Simone: Não, nunca pensei em ser esposa de pastor. Sempre sonhei em me casar com um homem que fosse temente a Deus, me amasse e estivesse comprometido com a nossa felicidade. E Deus me deu tudo isso empacotado em forma de um pastor. Posso dizer que, tornar-me esposa de pastor, “aconteceu”.
Ministério: Em sua opinião, a esposa do pastor também recebe um chamado divino, ou vai “de roldão” com o esposo?
Simone: Acredito que as duas coisas podem acontecer. Tenho colegas que afirmam terem discernido o chamado divino desde o início. Outras começaram a percebê-lo durante o trabalho ministerial. A percepção de que Deus tinha me chamado para uma missão especial, como esposa de pastor, veio com o tempo, à medida que as pessoas precisavam do meu auxílio e Ele me ajudava a atendê-las, com êxito. Senti, então, que fazia parte de um plano especial do Senhor em Sua Obra.
Ministério: Quais eram suas expectativas no início do trabalho, e como se sente hoje em relação à satisfação delas?
Simone: Casei-me muito jovem. Sinceramente, não sabia o que me aguardava, ao me casar com um pastor. Eu ouvira muita coisa sobre as dificuldades, mas só comecei a entender isso no quarto dia de casada. Acabávamos de chegar da lua-de-mel, e meu esposo teve que viajar para atender uma necessidade da igreja. Pela primeira vez, me vi sozinha, numa casa enorme, longe de meus pais. Percebi que meu esposo também estava “casado” com a igreja, e ela é uma “esposa” muito exigente. Hoje, sou feliz por entender que um pastor e sua família têm um privilégio e uma responsabilidade especial, ao receber uma igreja para cuidar. Sinto-me também mais tranqüila, ao compreender que, estando em um distrito longínquo ou numa função considerada de destaque na Igreja, pastores, esposas e filhos são seres humanos reais, com tentações e provas, reveses e vitórias. Essa é uma visão real e confortante, que não me obriga a demonstrar à igreja que sou uma “extraterrestre espiritual”. Não tenho mais expectativas tão grandes. Tenho, sim, um grande Deus, que tem me ajudado a enxergar meus erros e a retomar aos Seus braços, sempre que necessário.
Ministério: Que aspectos do trabalho pastoral foram mais marcantes em sua vida, e quais representaram experiências difíceis?
Simone: O trabalho pastoral é sempre marcante. Mas acredito que a maior emoção continua sendo ver meu esposo descer ao tanque batismal e conduzir pessoas a uma nova vida em Cristo Jesus. Essa é a missão da igreja, é a missão do pastor. Confesso que, depois de dezenove anos, meus olhos ainda se enchem de lágrimas quando alguém se entrega a Deus. Nesse contexto, uma das maiores experiências, para mim, foi quando ele batizou nossa filha que hoje tem 15 anos. Naquele dia, tive vontade que o relógio do tempo parasse, o Céu se abrisse e nós pudéssemos contemplar Jesus vindo buscar nossa família. Não gostaria de me deter nas experiências difíceis. Acho que elas são comuns a todas as esposas de pastor: solidão, ausência do esposo em momentos especiais, mudanças, educação dos filhos, corrida em busca das metas de trabalho, Mas, por experiência própria, sei que Deus é poderoso para suprir todas as faltas, cuidar de tudo, e consertar erros cometidos por nós e que outros cometem contra nós.
Ministério: Acha que a igreja atende adequadamente a esposa do pastor?
Simone: Penso que, no âmbito institucional, a igreja tem feito boas tentativas no sentido de ajudar a esposa do pastor. Mas parece que tocamos apenas a ponta do iceberg. Há muitos casos de baixa auto-estima, tristeza, depressão, entre outros problemas. A pressão para ser bonita, inteligente, sensual, independente e “santa”, atinge a esposa do pastor como um torpedo esmagador. Às vezes, os encontros realizados não tocam as necessidades reais. No que tange à igreja local, ainda existe um distanciamento que precisa ser vencido. Às vezes, a própria esposa do pastor se fecha em seu mundo, não permitindo maior entrosamento com a comunidade. Ou é a igreja que cobra uma vida segundo o padrão estabelecido indistintamente para todas, esquecendo que cada ser é único e pode contribuir com os talentos que Deus lhe deu para o avanço da Causa. Acredito que a igreja precisa ser mais instruída a esse respeito.
Ornella Borgiattino nasceu há 12 anos no lar de Elizabeth Guido Luxen e Juan Carlos Borgiattino. Depois de pastorear vários distritos no sul da Argentina, seu pai trabalha atualmente em Buenos Aires. Ornella estuda música e participa com entusiasmo do Clube de Desbravadores. Filho de Karina Almeida Pereira e Rafael Osvaldo Paredes, Ariel Paredes tem 14 anos. Seu pai também pastoreou igrejas no sul da Argentina, foi capelão do Instituto Adventista Balcare e, no momento, lidera um distrito pastoral em Buenos Aires. Ariel gosta de atividades ao ar livre e também faz parte do Clube de Desbravadores. Esses dois adolescentes foram entrevistados pelo Pastor Marcos Blanco, editor na Associación Casa Editora Sudamericana, Aces, sediada em Buenos Aires.
Ministério: Crescer em um lar lidera-do por um pastor pode não ser coisa simples. Que acha disso?
Ornella: Não tenho razões para me queixar. Evidentemente, como tudo na vida, tem o lado positivo e o lado negativo. Meu pai me ajudou muito no conhecimento da Bíblia. Por causa das mudanças, conhecemos muitos lugares e muitas pessoas queridas. É algo especial ser filha do pastor da igreja. Como desvantagem, posso dizer que, em algumas ocasiões não foi fácil deixar amigos e a escola, para começar tudo novamente em outro lugar.
Ministério: Geralmente, os filhos de pastor sentem a pressão das expectativas formadas em tomo de sua conduta e ação. Qual é a sua experiência nesse sentido?
Ornella: É verdade. Na escola ou na igreja, todos esperam que não façamos certas coisas e nos comportemos de determinada forma. A pressão existe, mas, para mim, meu pai é meu pai, não apenas o pastor. Se devo me comportar bem, é porque isso é o certo. Sei que de mim é esperado muito mais. Porém, também sei que não posso ser perfeita.
Ministério: Quais são suas expectativas quanto ao futuro! Que profissão é mais atraente para você?
Ornella: Na verdade, ainda não tenho uma definição clara. Existem várias áreas nas quais penso. Só estou segura de uma coisa: seja qual for a escolhida, desejo trabalhar para Deus.
Ministério: Você se casaria com um pastor, para continuar fazendo parte de uma família pastoral?
Ornella: Quando chegar a ocasião, o principal critério da escolha é que o pretendente me ame e seja fiel a Deus. Se, além disso, for chamado por Deus para o ministério pastoral, não será problema.
Ministério: O que você gostaria de dizer aos demais filhos de pastor?
Ornella: Não causem desgosto a seu pai. Compreendam que ele está trabalhando para Deus e o amem.
Ministério: Você não escolheu, mas, se pudesse, escolheria ser filho de pastor?
Ariel: Sim. Não me imagino de outra maneira. Embora enfrente situações difíceis relacionadas com a atividade do meu pai, também há muitas experiências agradáveis.
Ministério: Como você convive com a separação dos amigos, por ocasião das mudanças?
Ariel: Eu não tenho sofrido muito. Geralmente, depende do novo grupo de amigos. Na maioria das vezes, tenho encontrado bons amigos que ajudam a me adaptar ao novo lugar, sem esquecer os velhos amigos. A gente acaba se acostumando.
Ministério: Você tem sentido alguma pressão da igreja, dos amigos e professores , em relação à sua conduta como filho de pastor?
Ariel: Sei que esperam algo diferente de mim, mas não é uma coisa que eu sinta como pressão ou me torne dependente. Estou consciente de que tenho certa responsabilidade. Meus pais nunca me impuseram condição nenhuma nesse sentido, e sei que tenho o apoio deles.
Ministério: Que acha do tempo dedicado por seu pai às atividades pastorais! Gostaria que ele passasse mais tempo com você?
Ariel: Obviamente, todo filho quer passar mais tempo com o pai. Às vezes, o trabalho tem que ser feito em horários diferentes dos meus, ou ele tem que atender alguma urgência. Mas não há urgências todos os dias. E, mesmo que não fosse pastor, meu pai também teria de passar algum tempo fora de casa. Ele tem seu dia livre, e o aproveitamos bem. Sinto que meu pai gosta de ficar comigo e isso me alegra.
Ministério: Gostaria de ser pastor?
Ariel: Creio que meus dons e inclinações vão em outra direção. Gosto de matemática e de medicina. Não me sinto à vontade falando em público. Porém, se um dia sentir o chamado de Deus para o ministério, não terei nenhum problema. Admiro a tarefa do meu pai, mas ainda tenho algum tempo para refletir sobre o futuro.
Ministério: Teria uma mensagem para seu pai e, por extensão, aos demais pastores, no Dia do Pastor?
Ariel: Quero felicitá-los pelo trabalho que fazem. Acredito que todos procuram dar o melhor de si. Continuem desfrutando sua vocação. Feliz Dia do Pastor.