(Continuação)

O ESTUDO de certas experiências do Antigo Testamento, que não se relacionam com o santuário, ajudará a ilustrar alguns dos significados derivados propriamente da palavra hebraica kaphar, vertida por “expiação”:

  • 1. Notai o incidente relacionado com Moisés e Arão e a formação do bezerro de ouro. Isto é relatado em Êxodo 32. Somos informados ali da infidelidade do povo enquanto Moisés se achava no monte, com Deus. Sob a orientação de Arão êles fizeram um bezerro de ouro, que lembrava sua permanência de muitos anos na terra do Egito. Quando Moisés desceu do monte, êle ficou grandemente perturbado com a apostasia do povo, e foi nesse momento decisivo que a tribo de Levi se colocou a seu lado. Disse êle então para Israel: “Vós cometestes um grande pecado. Agora subirei a Jeová; porventura farei expiação pelo vosso pecado.” Êxodo 32:30 — Tradução Brasileira. Eis aí uma expiação feita evidentemente sem sacrifício de sangue e sem que qualquer sangue fôsse aspergido sôbre o altar. Como sucedeu isto? Moisés não apresentou uma oferta sacrifical ao Senhor; não, êle fêz uma expiação pelo fato de tomar o lugar do povo. Com efeito, tornou-se o substituto dêles. Nisto êle era uma figura apropriada do Senhor Jesus, o Salvador da humanidade. Em seu ardente desejo de que o povo fôsse salvo, êle prontificou-se a ser riscado do livro da vida. “Agora, pois, perdoa-lhe o pecado; ou, se não, risca-me, peço-Te, do livro que escreveste.” Verso 32.
  • 2. Outro exemplo é o caso de Davi em seu contato com os gibeonitas. A narrativa encontra-se em II Samuel 21. Saul matara muitos gibeonitas, que os israelitas haviam solenemente prometido preservar. Procurando reparar o dano que fôra causado, Davi chamou os representantes dos gibeonitas e disse-lhes: “Que quereis que eu vos faça? com que farei expiação?” Verso 3 — Tradução Brasileira. Então vem o relato do que foi feito em seguida. PÁGINA 22

Quando foram enforcados sete descendentes de Saul, efetuou-se a expiação. Aí e sa palavra significa fazer reparação adequada do êrro cometido. Êste aspecto também está incluído no extenso âmbito da obra expiatória de Cristo. Isto é salientado nas seguintes palavras:

“[Cristo] subiu às côrtes celestiais, e ouviu do próprio Deus a afirmação de que Sua expiação pelos pecados dos homens fôra ampla, de que por meio de Seu sangue todos poderiam obter a vida eterna. O Pai ratificou o concêrto feito com Cristo, de que receberia os homens arrependidos e obedientes, e os amaria mesmo como ama a Seu Filho. Cristo devia completar Sua obra, e cumprir Sua promessa de que ‘o varão será mais precioso que o ouro, e o homem sê-lo-á mais que o ouro acrisolado.’” — ELLEN G. WHITE, O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 590. (Grifo nosso.)

“Quando, sôbre a cruz, soltara o brado: ‘Está consumado,’ dirigira-Se ao Pai. O pacto fôra plenamente satisfeito. Agora Êle declara: ‘Pai, está consumado. Fiz, ó Meu Deus, a Tua vontade. Concluí a obra da redenção. Se a Tua justiça está satisfeita, quero que, onde Eu estiver, também êles estejam comigo.’ . . . Ouve-se a voz de Deus proclamando que a justiça está satisfeita.” — Idem, pág. 621.

  • 3. Um outro incidente, relatado em Números 16, ilustra muito bem mais um aspecto da expiação. Israel provocara fortemente ao Senhor. O povo murmurara contra Deus; 250 príncipes, varões de renome, se haviam rebelado contra o Altíssimo. Como resultado desta apostasia, irrompeu uma praga no acampamento de Israel. Em conexão com isto, temos esta declaração divina:

“Disse Moisés a Arão: Toma o teu incensário, … vai depressa à congregação, e faze expiação por êles.” Verso 46.

“Tomou-o Arão, como Moisés lhe falara, correu ao meio da congregação (eis que já a praga havia começado entre o povo) e deitou incen-O Ministério Adventista so nêle, e fêz expiação pelo povo. Pôs se em pé entre os mortos e os vivos; e cessou a praga.” Versos 47 e 48.

Vemos aí a Arão como mediador, uma figura apropriada de Cristo Jesus, nosso bendito Senhor. Colocando-se assim entre o homem e Deus, e por sua abnegação e devoção sacrifical, pondo-se em pé entre os vivos e os mortos, protegendo o povo contra a ira de Deus, fêz dêsse modo uma expiação por êles.

  • 4. Há, porém, outro aspecto da questão que merece ser considerado. Isto se deduz da narrativa registada em Números 25. Israel fôra seduzido pelas artimanhas dos pagãos ao seu redor. Pecaram gravemente perante Deus, cometendo as abominações dos cananeus. Um homem trouxe uma mulher pagã para o acampamento. Deus mostrou Seu desagrado enviando uma praga entre o povo. Então Finéias, neto de Arão, compreendendo a seriedade da ofensa, saiu em nome de Deus e matou os ofensores. Quando isto foi feito, cessou a praga. Em virtude do zêlo pela obra de Deus manifestado por êsse homem, disse o Senhor:

“Eis que lhe dou a Minha aliança de paz. E êle, e a sua descendência depois dêle, terá aliança do sacerdócio perpétuo; porquanto teve zêlo pelo seu Deus, e fêz expiação pelos filhos de Israel.” Versos 12 e 13.

Neste exemplo vemos que êste sacerdote leal fêz uma expiação removendo os ofensores impenitentes. Êste aspecto do plano ‘de Deus era ensinado a Israel no serviço do santuário, com a chegada anual do Dia da Expiação. O ato final nesse grande dia era a remoção ‘do bode para Azazel, que representava o instigador do mal. Êsse bode era tirado do acampamento de Israel e banido para sempre. Assim será na obra final de Deus. Então o Seu derradeiro ato no grande plano de purificar o universo do pecado consistirá na remoção do maior de todos os ofensores, aquêle que foi mentiroso desde o princípio, o antigo inimigo, o diabo e Satanás.

Estas quatro experiências nos ensinam vitais e importantes lições a respeito da obra da expiação. No eterno propósito de Deus, Aquêle que faz a expiação é o Mediador. Tudo no serviço típico — os sacrifícios e a obra do sacerdócio — apontava para Jesus Cristo, nosso Senhor. Êle colocou-Se em nosso lugar e morreu por nós. Ao fazer isto, tornou-Se nosso substituto. Ao morrer na cruz e ao entregar a vida como expiação pelo pecado, Êle fêz adequada reparação do êrro cometido; sofreu tôda a punição da lei de Deus que havia sido transgredida.

“O sacrifício de Cristo em favor do homem foi amplo e completo. A condição da expiação tinha sido preenchida. A obra para que viera a êste mundo tinha sido realizada.” — ELLEN G. WHITE, Atos dos Apóstolos, pág. 29.

Mas a obra efetuada no Calvário abrange também a aplicação do sacrifício expiatório de Cristo à alma anelante. Isto é providenciado no ministério sacerdotal de nosso bendito Senhor, nosso grande Sumo Sacerdote no santuário do Céu.

Não sòmente Seu povo é purificado do pecado pelo sacrifício do Filho de Deus, e salvo para o presente e a eternidade, mas todo o universo será purificado da mancha da iniqüidade quando fôr completamente destruído o autor do pecado. A seguir virá um nôvo céu e uma nova Terra (II S. Pedro 3:13) que será o lar eterno dos remidos de tôdas as épocas, que foram resgatados pelo precioso sangue do Cordeiro.

Alguns dos primitivos escritores adventistas do sétimo dia, crendo que a palavra “expiação” possuía um sentido mais amplo do que pensavam muitos de seus amigos cristãos, expressaram-se de molde a indicar que a expiação não foi efetuada na cruz do Calvário, mas foi realizada por Cristo após o início de Seu ministério sacerdotal no Céu. Êles criam plenamente na eficácia do sacrifício de Cristo para a salvação do homem, e acreditavam com a maior convicção que êste sacrifício foi efetuado uma vez por tôdas e para sempre, mas preferiam não usar a palavra “expiação” como referindo-se apenas à obra sacrifical de Cristo no Calvário. Repetimos: êles acreditavam com a mesma certeza que nós, que a obra sacrifical de nosso bendito Senhor, na colina do Calvário, foi ampla e completa, não precisando ser oferecida novamente, e que foi efetuada uma vez por tôdas. Sua opinião era que o sacrifício de Jesus proveu os meios da expiação, e que a expiação em si só era efetuada quando os sacerdotes ministravam a oferta sacrifical em favor do pecador. Encarando a questão sob êste aspecto, ver-se-á que afinal de contas ela consiste apenas na definição de expressões. Atualmente, não tendo de enfrentar os mesmos pontos que nossos escritores primitivos, cremos que o sacrifício expiatório foi realizado na cruz e provido para todos os homens, mas que no ministério sacerdotal de Cristo, no Céu, êste sacrifício expiatório é aplicado à alma anelante.

A ênfase a êste conceito mais amplo não deprecia, porém, de maneira alguma a completa eficácia da morte do Filho de Deus, uma vez por tôdas, pelos pecados dos homens. É lamentável que a falta de definição conduza muitas vêzes a uma compreensão errada do mais grandioso assunto da mensagem cristã. — Questions on Doctrine, págs. 343-348.