Quando a esposa do pastor permanece em casa — ideal não alcançável por todas — a dupla pastoral, seus filhos e seu ministério podem ser beneficiados.
Sou membro de uma espécie ameaçada. Se as coisas continuarem co-mo vão, corremos o risco de tornar-nos tão extintos como o dodó — uma espécie extinta de pombos; em muitos círculos não te-mos o mesmo status. Sou uma esposa de ministro que, por escolha própria, não trabalha fora de casa.
Deixei meu último trabalho nove anos atrás, quando nasceu o mais velho de nossos dois filhos. Meu marido, André, não era pastor nessa ocasião, e seu salário líquido, oriundo do pequeno comércio de aves, era menor do que o que ele ganha no ministério. Não pensávamos naquela época — e ainda não pensamos — na possibilidade de eu trabalhar enquanto houvesse uma criança em casa.
Referindo-se à frase “boas donas-de-casa” em Tito 2:5, o Comentário Bíblico Adventista diz: “A evidência textual favorece a leitura ‘obreiras do lar’. As mães que passam grande parte do tempo fora de casa, muitas vezes negligenciam as responsabilidades da família…. Colocá-las (as crianças) sob a orientação de uma empregada, não cumpre a instrução divina aqui ministrada.”1 Sem dúvida, os exegetas mais progressistas me dirão que a interpretação acima é “chapéu” tão velho como as mulheres cobrirem a cabeça na igreja.
É curioso que Cristóvão Lasch, um escritor secular de nosso tempo, chegou a conclusões semelhantes às do Comentário Bíblico por mim citadas. Não, James Dobson, Lasch em geral é defensor da causa feminista. Não obstante, ele escreve no prefácio de seu livro Haven in a Heartless World: “O problema com o programa feminino não é que a suficiência própria econômica para as mulheres seja um objetivo indigno, mas que sua realização, nas condições econômicas existentes, solapariam valores igualmente importantes associados com a família… As feministas não têm respondido ao argumento de que o cuidado do dia não proporciona nenhum substituto para a família. Elas não têm respondido ao argumento de que a indiferença para com as necessidades da juventude se tornou uma das características distintivas da sociedade que vive para o presente, define o consumo de comodidades como a mais elevada forma de satisfação pessoal e explora os recursos existentes com desconsideração criminosa para com o futuro.”2
Ainda defendo a crença vestigial de que para educar meus filhos no caminho que eles de-vem seguir, devo dispensar-lhes uma grande parcela de tempo precioso. Muitos dos peritos de hoje, contudo, têm emitido conceitos diferentes das necessidades das crianças. Eles me dizem que a escolaridade precoce e as experiências em creches não só não são prejudiciais, mas são benéficas às crianças de pouca idade. Estudos “científicos” recentes afirmam que os filhos de mães que trabalham fora do lar se realizam melhor social e academicamente. “O instinto protetor natural da mãe é agora chama-do de ‘amor de fumaça’”, diz a escritora cristã Mary Pride (outrora uma feminista ardorosa). “Expressões como ‘amor de fumaça’, fascínio por ‘independência’ financeira e trazer as crianças presas, resumem-se todas nisto: os pais não deveriam controlar o ambiente de seus filhos. É seu dever entregarem os filhos a outros…. Presume-se que isto seja superior à antiga boa maneira de cuidar, proporcionada pelos pais.”3
No século vinte, “profissões que dão assistência”, como medicina, psicoterapia e bem-estar social, têm gradativamente tomado o lugar das funções que antes eram principalmente de responsabilidade da família. Isto tem contribuído para enfraquecer a confiança dos pais em seu próprio julgamento. Atrevem-se eles a ser tão presunçosos a ponto de ir contra a recomendação de peritos munidos de um punhado de credenciais? Não importa o fato de que a recomendação dos peritos está sujeita a constantes mu-danças no conceito médico e psiquiátrico.
Os teóricos de choque do futuro nos conduzirão pelo caminho descendente, a fim de permitirmos que os peritos eduquem nossos filhos. Eles afirmam que “a família já não pode transmitir valores numa era de mudança, transitoriedade e mobilidade aceleradas, e opções que se alargam (‘superescolha’). Se o industrialismo exige que a família seja despojada de sua forma ampliada, então o superindustrialismo, como o chama Toffler, requer um ‘filete’ ainda maior — a redução da família ao casal. A parentela, importante demais para ser entregue a amadores e diletantes, será profissionalizada ao se entregarem os filhos a clínicas especiais ou, se isto se parece frio e impessoal demais, a casais especialmente treinados e aceitos pela paternidade”.4
Desafiando os peritos
Apesar do risco de ser rotulada como inepta, fumacenta, diletante, não estou disposta a abandonar minha compreensão da Bíblia nem minha própria experiência e senso comum e deixar que os ”peritos” assumam a direção. Obviamente, creio que é melhor para meus filhos que eu fique com eles em casa. Devo admitir, porém, que uma razão igualmente forte para que eu assim proceda, não é tão altruísta. A ver-dade é que gosto disto. Aprender com eles, ajudá-los a alcançar seus próprios interesses, ler para meu filho e minha filha e estar junto com eles, dá-me grande prazer. De novo aqui estou marchando de pé trocado com a nova or-dem. Penelope Leach, o Dr. Spock britânico, diz: É tornar-se fora da realidade, admitir que você gosta de estar em casa com as crianças.”5
Embora eu tivesse 97 por cento de possibilidade de conseguir uma nota desfavorável em um teste de aptidão de colégio, minha falta de status profissional como dona-de-casa não me tem preocupado muito. Um artigo de uma re-vista recente sobre Pais, expressa bem meu sentimento. Escrevendo sobre sua decisão de deixar seu trabalho de meio período como enfermeira, diz Elizabeth Berg: “De início, permanecendo em casa, só faltei morrer. Pela primeira vez, sabia agora que estava inteiramente na dependência do salário do meu marido. Não que fôssemos ficar mais pobres sem meu ordenado. Mas eu achava que estava perdendo bastante poder, e mesmo a individualidade. Havia também aqueles temores infundados: minha ca-beça vai-se tomar mingau; não vou ter nenhum status…. Dessa forma, procurei uma resposta alternativa para quando as pessoas me perguntarem o que faço… Cirurgia do cérebro, chama-se isto. Cirurgia não invasora do cérebro. Instalação de imagens importantes. Criadora de valores permanentes…. Não acho que minha mente vai-se tornar um mingau, coisa nenhuma; sinto, em lugar disto, que vai haver tempo para ocupá-la com aquilo de que necessito para nutrir a mim mesma, bem como aos meus filhos.”6
Necessidade dos filhos à parte, a esposa de pastor que fica em casa pode ser um auxílio para o ministério do seu esposo. Tem havido muita discussão e incentivo em favor de a mulher e o marido formarem equipe ministerial, em anos recentes. Quando nosso atual distrito ficava entre pastores, estes ouviam quais os predicados que desejavam em um pastor e sua família. Um dos itens foi equipe visível do minis-tério esposa. O que eles queriam, em resumo, não era um segundo pastor, mas uma esposa de pastor que fosse literalmente visível — não tão ocupada com outras atividades, como es-tar na igreja e funções sociais; capaz de contribuir onde for necessária.
Algumas esposas de pastores que conheço, especialmente aquelas cujos filhos já são crescidos e não constituem mais sua principal responsabilidade, estão encontrando grande satisfação em sua escolha de trabalhar ao lado de seus esposos, em lugar de procurarem emprego fora. Algumas preferem participar mais plenamente de um ministério de parelha. Algumas têm dom para dar estudos bíblicos, liderar ou ajudar em seminários ou outros tipos de evangelismo. Outras, para aconselhar ou fazer trabalho de secretaria. Não significa isso, que a esposa de pastor que trabalhe não possa contribuir para o ministério de seu esposo; mas, especialmente quando tem filhos pequenos em casa, ao procurar desempenhar-se nas três funções, está ela exigindo um grande esforço de sua parte. Obviamente, a intensidade de seu envolvimento será limitada pelo número de horas em um dia.
Meu esposo e eu achamos que há ainda lugar para nossa família no ministério. Temos muitas vezes feito visitas a interessados, e dado estudos bíblicos, em companhia de nossos filhos. As crianças pequenas podem servir de “quebradoras de gelo”, quando visitamos uma casa pela primeira vez. Quando damos estudos bíblicos a famílias que têm crianças pequenas, as nossas têm cuidado daquelas, a fim de deixar os pais livres. Para que eu não dê lugar a um dilúvio de cartas de enfermeiras e secretárias iradas, permitam-me dizer-lhes que não estou prescrevendo um estilo de vida para todas as duplas pastorais. Muitas não compartilharão de minhas convicções quanto à esposa permanecer em casa. Enquanto outras podem ter idéias semelhantes, elas podem ter maiores responsabilidades financeiras (tais como custos educacionais) do que temos atualmente. Não obstante, estou dizendo como fazemos com um único salário.
O fator mais importante, tem sido nosso costume, durante toda a nossa vida de casados, de não ter dívida. Pagamos juros apenas sobre a hipoteca de uma casa. Gostamos da conveniência do cartão de crédito, porque fazemos muitas de nossas compras por correspondência, mas mantemos equilibrado nosso orçamento. André mantém e conserta os veículos mais antigos que dirigimos.
Contudo, não somos ascetas, nem estamos inteiramente imunes às ciladas de nossa sociedade materialista.7 Embora nunca tomemos em-prestado para suplementar nosso ordenado, somos muitas vezes culpados de enfiar a mão em nossas economias para gastar mais do que devíamos.
Se vocês já estiveram endividadas e querendo sair da dívida, poderão mostrar-se sábias ao consultarem um conselheiro sobre finança. O contador que preenche nosso formulário de imposto de renda, poupa-nos cada ano uma grande quantidade de dinheiro — devo admitir que nesta área algumas de nós necessitam de ajuda dos, peritos.
Alguns anos faço certas economias típicas de dinheiro, tais como costura, jardinagem, compotas e acabamento de móveis. Geralmente, porém, nossos projetos e os de vocês são itens sem os quais a maioria pode viver — tais como a má-quina de desenhar de 1.800 dólares que André faz por 500 dólares. Houve depois o balanço de madeira que as crianças e eu queríamos. Os catálogos de brinquedos jeitosos os anunciam ao preço de 475 dólares, e André fez um por apenas 400 dólares! (Com toda honestidade, este total inclui a compra de uma máquina de furar.) Estes projetos, diga-se de passagem, foram levados a efeito nas férias — não excursão ao Havaí. Ganhar um único salário exige alguma adaptação.
Tanto eu como meu marido, gostamos de usar roupas da melhor qualidade. Ficamos, porém, bastante contentes por usar uns casacos de lã não muito bons, durante anos, de preferência a ter um guarda-roupa cheio de objetos de barganha. Depois disso, os tiramos, antes que a congregação se canse de olhar para eles.
Descobrimos que algumas firmas davam descontos aos pastores. Por exemplo, este ano compramos um computador e uma máquina de cortar grama bem abaixo do preço de varejo. E o dono de nossa loja local dá a todos os pastores da cidade o mesmo desconto que concede a seus empregados.
Se vocês estiverem procurando uma maneira de ficar em casa, uma boa fonte de renda que merece ser levada em consideração é uma atividade comercial doméstica. Em anos recentes, a empresa do lar tornou-se parte do renascimento deste. Mais de dois milhões de americanos, e muitos brasileiros, vivem basicamente de atividades domésticas. Talvez aqueles acolchoados para enxoval de bebê ou aquele arranjo de flores artificiais que você faça para a igreja, tenha uma maior aceitação. Com certeza, uma pe-quena empresa doméstica pode não gerar o mesmo rendimento ou ser tão certa quanto um trabalho regular, mas você pode, em geral, dispor de suas horas e decidir quanto do seu tempo deseja nela empregar.
Não só é possível manter seus filhos em casa, em sua companhia, mas, como fazem mui-tas pessoas, você pode incluí-los, embora sejam pequenos, como auxiliares em sua aventura. Que treinamento! No seu sétimo ano de idade, nosso filho teve seu próprio negociozinho. Passar apenas cerca de uma hora cada duas semanas fazendo pé-de-moleque para duas casas de produtos naturais, rendia-lhe mais de 100 dólares.
Outra fonte que não deve ser esquecida é o Senhor. Poucos de nós hesitam em instar com os novos conversos para andarem na fé, quando estes estão convencidos a respeito do dízimo e do trabalho no sábado. Creio que se vocês estiverem convencidas de que devem ficar em casa, Deus lhes indicará maneiras de aliviar-lhes os fardos financeiros.
Tenho ouvido dizer que alguns administradores denominacionais estão interessados em preservar minha espécie. Estão examinando a possibilidade de remuneração para as esposas de pastores envolvidas em ministério de dupla nu-ma base regular. Esta pode ser a solução para esposas que desejam essa condição mas necessitam de meios adicionais para pagar a faculdade, o colégio ou outros gastos. Enquanto isso, alguns pastores continuarão dando o seu apoio ao grupo das “Obreiras do Lar”, um grupo digno de ser aproveitado.
lSDA Bible Commentary, vol. 7, pág. 365.
- 2. Christopher Lasch, Haven in a Heartless World, pág. 16.
- 3. Mary Pride, The Way Home, pág. 115.
- 4. Lasch, pág. 137.
- 5. Ann Banks, “Penelope Leach: The Experts’ Expert”, Parenting (março de 1987), pág. 46.
- 6. Elizabeth Berg, “Why I’m At Home”, Parents Magazine (abril de 1987), pág. 123.
- 7. Em The Culture of Narcissism (Nova Iorque: W. W. Norton & Company, Inc., 1978), Christopher Lasch dá uma incisiva descrição do espírito econômico da época, à qual todos nós sucumbimos: “Numa época de expectativas decrescentes, as virtudes protestantes já não produzem entusiasmo. A inflação corrói os investimentos e poupanças. Os anúncios diminuem o horror das dívidas, aconselhando o consumidor a comprar agora e pagar depois. Como o futuro se toma ameaçador e incerto, apenas os tolos deixam para amanhã o prazer que podem ter hoje.” (pág. 53).
Homenagem a Walter Schubert no 75º aniversário de sua chegada à Argentina em 1914
— Arlo Fleming