O livro de Deuteronômio, cujo nome provém da expressão deuteronomion (17:8), que significa repetição ou cópia,1 é o discurso que Moisés deixou como legado a Israel, a fim de que as gerações de israelitas após o Êxodo não se esquecessem dos atos surpreendentes que Deus realizou por eles. Outro aspecto importante do livro está relacionado ao repúdio absoluto à idolatria, especialmente depois da tragédia de Baal-peor.2

Em seu conteúdo, o Senhor encorajou o povo a se manter fiel à aliança, pois, em pouco tempo, os israelitas estariam na terra prometida, onde se cumpririam totalmente as promessas divinas. Por esse motivo, Moisés incentivou os israelitas a entrar e possuir a terra (Dt 1:5-8).3

Deuteronômio apresenta três grandes divisões, que são três grandes discursos ou sermões. A primeira mostra o que Deus fez por Israel (1:1-4:43); a segunda, o que Deus esperava de Israel (4:44-26:19) e; a última, o que Deus faria por Israel (27:1-34:12).

O que é pregação?

A pregação é “a proclamação aberta e pública da atividade redentora de Deus em e por meio de Jesus Cristo”.4 Existem algumas definições do termo que não podemos esquecer, e que o colocam em um lugar especial. Por exemplo, Phillips Brooks dizia que a pregação é a comunicação da verdade religiosa de um homem a outros homens. Por sua vez, Andrew Blackwood afirmava que é a verdade divina, como está na Bíblia, comunicada verbalmente; ou seja, a verdade de Deus proclamada por uma pessoa escolhida ou chamada por Ele. De acordo com Karl Barth, a pregação se torna Palavra de Deus. A palavra do homem é palavra de Deus conforme Ele Se apraz de usá-la para comunicar Sua verdade às pessoas. Orlando Costas afirmava que a pregação anuncia o reino de Deus, graças à obra salvífica realizada por Cristo.5

A teologia da pregação está associada à teologia da revelação. Por revelação entendemos o ato divino de disponibilizar ao conhecimento humano algo que anteriormente estava restrito à mente de Deus, e que o homem não poderia obter por si mesmo.6 A revelação, portanto, é o que Deus permite que seja conhecido e está em Sua Palavra.

Na teologia da pregação, o processo é semelhante. Entretanto, parte-se do que foi revelado: a Bíblia. Pregar é apresentar às pessoas o que Deus diz em Sua revelação. Assim, a doutrina da pregação tem base na Palavra de Deus; ou seja, ao expor as Escrituras Sagradas, cada pregador o faz assumindo uma enorme responsabilidade.

Ouvir a voz de Deus

“Se atentamente ouvires a voz do Senhor, teu Deus, tendo cuidado de guardar todos os Seus mandamentos que hoje te ordeno, o Senhor, teu Deus, te exaltará sobre todas as nações da Terra. Se ouvires a voz do Senhor, teu Deus, virão sobre ti e te alcançarão todas estas bênçãos” (Dt 28:1, 2).

Com essa introdução, Moisés deu a Israel uma mensagem íntegra e absoluta sobre o que Deus esperava deles como povo exclusivo. Em suas palavras estão associadas duas expressões antagônicas: bênção e maldição.

Obedecer à Palavra de Deus traz como consequência Suas bênçãos. De fato, o conteúdo de Deuteronômio tem a intenção de mostrar que é o Senhor, e não Baal, quem provê coisas boas. Além disso, salienta que é Deus, e não outra divindade com um ritual sacrílego, que tem o desejo de abençoar e não causar mal.7 Por outro lado, o livro também apresenta que a desobediência provoca a remoção da proteção divina, que leva ao sofrimento e às consequências naturais da vulnerabilidade.

Definitivamente, a pregação tem uma enorme importância, ao se considerar que o proclamador se torna um porta-voz de bênçãos ao povo. Esse fato implica uma imensa responsabilidade sobre o pregador, por ser ele quem busca incessantemente na Bíblia a mensagem divina para si e para a vida da igreja.

Reflexões a partir de Deuteronômio 28:1 a 15

Ouvir a voz de Deus e obedecer-lhe traria consequências visíveis ao povo de Israel. “As bênçãos da aliança podem ser divididas em três grupos: bênção sobre a terra e as pessoas (Dt 28:3-5), vitória contra os inimigos (v. 7) e exaltação de Israel sobre os adversários (v. 1, 9, 10, 13).”8

Embora nosso interesse não esteja concentrado no conteúdo das bênçãos, é importante destacar que elas são o resultado de “ouvir” as orientações divinas. Contextualizada para nossos dias, a pregação da Palavra de Deus pode trazer consequências semelhantes às descritas em Deuteronômio. Não podemos considerar a pregação apenas como algo que apresenta o que as pessoas querem ouvir. Necessita-se urgentemente de proclamadores que estejam dispostos a levar ao povo as boas-novas da salvação.

É importante notar que Deuteronômio 28:1 a 15 apresenta claramente os elementos básicos da pregação. Eles são: a mensagem divina; o pregador, proclamador e exortador, que é Moisés; e as pessoas, que ouvem a voz de Deus por meio do pregador. Desse modo, o povo tinha a possibilidade de aceitar a mensagem e praticar as orientações tanto individuais quanto coletivas. Atualmente, os três elementos também existem. A Bíblia; os pregadores, ministros da Palavra; e as pessoas, que formam a congregação. Elas também podem tomar decisões individuais e coletivas.

Naturalmente, o interesse de Israel se concentrava em seu bem-estar. Por isso, atender ao convite que Deus fazia por meio de Seu servo se tornava um imperativo. Em nossos dias, as pessoas também deveriam estar interessadas na salvação. Assim, deveriam atentar para a qualidade da pregação. O Senhor nos deu uma mensagem hoje? Será que posso voltar à minha casa com a convicção de ter aceitado uma verdade de Deus? Essas são algumas perguntas que poderiam ser feitas pelos ouvintes de um sermão. Não seria mau que a igreja exigisse mais dos pregadores. Não seria algo negativo se as pessoas quisessem ouvir mensagens vindas de Deus e não experiências pessoais.

A seção bíblica se encerra da seguinte maneira: “Não te desviarás de todas as palavras que hoje te ordeno, nem para a direita nem para a esquerda, seguindo outros deuses, para os servires. Será, porém, que, se não deres ouvidos à voz do Senhor, teu Deus, não cuidando em cumprir todos os Seus mandamentos e os Seus estatutos que, hoje, te ordeno, então, virão todas estas maldições sobre ti e te alcançarão” (v. 14, 15).

Conclusão

O Senhor deseja que Suas palavras sejam internalizadas no coração de Seus filhos. Portanto, a pregação aplicada na busca humilde e sincera da Palavra de Deus trará consequências positivas sobre as mentes que se sensibilizarem pela influência do Espírito Santo (Jo 16:8). Evidentemente, não se deve esquecer que, nesse processo, o instrumento não passa disto: um instrumento. Mesmo assim, nas mãos de Deus, ele se torna tão poderoso que sua mensagem pode salvar vidas.

Assim como Moisés estava preocupado em transmitir a mensagem divina às gerações de israelitas após o Êxodo, pregadores contemporâneos devem procurar, com humildade e dedicação, apresentar a Palavra de Deus para que as pessoas se lembrem de sua condição pecaminosa e busquem fervorosamente o Senhor e a salvação.

Como Israel no passado, estamos às portas de Canaã. Portanto, apresentar corretamente a Palavra de Deus fará com que o Israel moderno possa ouvi-la e tomar decisões que trarão consequências eternas. Dessa maneira, assumir o papel de um arauto transmissor da mensagem divina ao povo fará uma diferença significativa e perceptível nas congregações atuais. 

Referências

  • 1. Wilton M. Nelson e Juan Rojas Mayo, Nuevo Diccionario Ilustrado de la Biblia [Edição Digital] (Nashville, TN: Editorial Caribe, 2000).
  • 2. Alfonso Lockward, Nuevo Diccionario de la Biblia (Miami, FL: Editorial Unilit, 2003), p. 285.
  • 3. Ibid.
  • 4. J. D. Douglas, Nuevo Diccionario Biblico (Miami, FL: Sociedades Bíblicas Unidas, 2000).
  • 5. Pablo Alberto Deiros, Diccionario Hispano-americano de la Misión (Casilla, Argentina: Comibam Internacional, 1997).
  • 6. Alfonso Lockward, Nuevo Diccionario de la Biblia (Miami, FL: Editorial Unilit, 2003), p. 883.
  • 7. D. A. Carson, R. T. France, J. A. Motyer e G. J. Wenham, Nuevo Comentario Bíblico: Siglo Veintiuno [Edição Digital] (Miami, FL: Sociedades Bíblicas Unidas, 2000), Dt 28:1-14.
  • 8. Daniel Carro, José Tomás Poe e Rubén O. Zorzoli, Levitico, Numeros, y Deuteronomio (El Paso, TX: Editorial Mundo Hispano, 1993 -1997), p. 511.