Minha espôsa pôs-se a rir a bandeiras despregadas …” disse o ministro.
Alguém trouxera à baila o caso dos telefones em casa do ministro, a tilintar quase ininterruptamente, e dos momentos inoportunos em que às vêzes isso se dá. Êsse ministro estava a contar o caso de um telefonema que recebera de um membro da igreja, às quatro horas da madrugada. Na noite anterior tentara entrar em contato com aquêle membro, mas fôra informado de que se achava em viagem e voltaria a qualquer momento.
— Por bondade, diga-lhe que me chame, quando voltar, sim? pediu o ministro.
Mas o jovem só voltou pouco antes das quatro horas. Vendo o recado, tratou de telefonar imediatamente.
Não é lá coisa muito agradável ser despertado do sono, alta madrugada, pelo tilintar do telefone. Ao atender, assomam ao espírito da pessoa chamada, tôda sorte de possibilidades temíveis. A espôsa do ministro, nesse caso, foi sacudida a um despertamento instantâneo, pondo-se a cogitar sôbre o possível motivo do telefonema. Foi ao lhe ser esclarecido o fato, tão corriqueiro, que ela “se pôs a rir a bandeiras despregadas.”
Ao ouvir a história, pensei: Feliz o ministro cuja espôsa está disposta a rir em semelhante ocasião. Quantas se queixariam amargamente das pessoas desatenciosas que não tinham o senso da oportunidade, para telefonar a um pastor cansado numa hora tão imprópria! Mas a espôsa daquele ministro não desperdiçava tempo com semelhantes pensamentos. Inteirou-se da situação com um senso de humor, e estou certa de que ambos bem depressa adormeceram, por causa dessa atitude. Não tivesse ela demonstrado graça e bom humor, e ambos provàvelmente teriam ficado por muito tempo insones e aborrecidos.
Quanto depende de nossa atitude em relação a situações impossíveis!
Lembro-me de haver certo sábado convidado para o almôço um casal muito querido, já amadurecido em anos. Pretendíamos, depois da refeição, assentar-nos calmamente e considerar alguns dos grandes temas da Bíblia. Mas nosso convite estava destinado a crescer e crescer. . .
Primeiro nossa hóspede nos telefonou, na quinta-feira, para dizer que sua neta acabara de avisar que viria passar com ela o fim de semana.
— Traga-a consigo, sem cerimônia! disse-lhe eu.
Na sexta-feira, telefonou-me de nôvo.
— Rosalina também virá, disse ela, referindo-se a outra neta sua. Assim talvez seja melhor ficarmos em casa, mesmo porque virá com ela o namorado.
— Oh, por tudo, traga ambos também! respondi.
No dia seguinte tivemos na igreja um distinto visitante de além-mar. Fiquei cogitando se alguém o teria convidado para o almôço, e ousei perguntar-lhe.
— Não, respondeu-me, quando lhe fiz a pergunta.
— Bem, por favor vamos conosco. Ficaremos encantados com a sua visita.
— E eu ficarei encantado de aceitar o seu convite, volveu êle, mas o irmão F. me trouxe até aqui, vindo de Biftown. Porventura o convite inclui a êle também?
— É claro, respondi, e pus-me em busca do irmão mencionado.
— Muito obrigado, disse êle vivamente, em resposta ao convite. Minha espôsa veio comigo, também.
— Ótimo! exclamei, animando-me com o desafio (embora, no íntimo, contente por se tratar de um casal sem filhos). Apressei-me rumo de casa, para ir ao encontro de minha filha.
— Ó mamãe, disse ela, Joana veio à igreja esta manhã. Podemos convidá-la para o almôço, para ela ver como é bonito guardar o sábado? (Joana era uma colega amiga, não adventista, que se interessara e assistia às reuniões.)
— Como não! disse eu; mas é melhor que você venha comigo, para tratarmos de fazer render um pouco mais o cardápio. . .
Felizmente tínhamos bastante verduras próprias para fazer salada, e latas de feijão em conserva e uma caixeta grande de ricota para aumentar a refeição que eu preparara, e logo nos achávamos sentados — éramos doze ao todo — e foi uma hora aprazabilíssima a que passamos juntos. Como depois nos rimos por conta do convite que crescera, crescera e crescera! Não tivemos o tête-à-tête que havíamos planejado com os nossos amigos, mas tivemos uma hora maravilhosa.Sim, por vêzes nos sobrevém tôda sorte de situações impossíveis, e algumas delas se tornariam muito aborrecidas se permitíssemos que nos aborrecessem. Tomemo-las tais como nos vêm, aceitemos o repto que nos representam, e tratemos de tornar a todos, inclusive nós mesmos, tanto mais felizes! — The Ministry, dezembro 1969.