Em tempos de fake news, privacidade e proteção de dados, não é fácil a vida de profissionais que têm o dever ético e profissional de manter sigilo sobre as confissões e informações recebidas. E os pastores estão entre esses profissionais. Como parte de sua atividade, eles eventualmente ouvem informações sigilosas de outras pessoas. Assim, desse ponto em diante, os pastores ficam “presos” a esses fatos que, por vezes, podem ser contrários à sua própria índole. Ao segredar uma informação, o aconselhado tem a garantia de que sua intimidade será protegida e preservada.

  1. O que diz a legislação?

Todas as constituições na América do Sul contêm esse tipo de regulamentação da privacidade. No Brasil, por exemplo, a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso X, diz que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

É importante que os pastores entendam esse preceito. A percepção do instituto da dignidade da pessoa humana é diretamente relacionada à privacidade. Nessa linha de entendimento, J. M. Othon Sidou afirma: “O direito à intimidade é, pois, o direito à dignidade, desde que é aí que ele vai buscar todo o seu conteúdo digno.”*

Essa linha de pensamento se reflete em todo o sistema jurídico dos países democráticos. Exemplos são os artigos 388 e 488 do Código de Processo Civil Brasileiro. Eles regulamentam o sistema de produção de provas em processo judicial. E aqui há algo diretamente relacionado ao ministério pastoral, pois os pastores não são obrigados a depor em juízo cível sobre fatos que devam guardar sigilo.

Esse preceito jurídico é tão forte que ultrapassa a esfera cível para levar a não obrigatoriedade de revelar informações obtidas sob proteção do sigilo profissional também à seara criminal. O exemplo mais uma vez vem do Brasil, mas encontra reflexos nos vários ordenamentos da América do Sul: é o artigo 154 do Código Penal Brasileiro, que tornou crime a conduta de “revelar a alguém, sem justa causa, segredo de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem”. Os pastores precisam entender que não é apenas um direito, mas também um dever manter o sigilo profissional.

Para deixar ainda mais claro, os ministros religiosos têm garantida a proteção quanto às informações que recebem durante seu ministério. Qualquer que seja a denominação religiosa, a atribuição do
líder espiritual é suportar os dramas sociais de seus seguidores, orientando os fiéis espiritualmente a resolver seus variados problemas.

2. Ponto de exceção

No entanto, há uma exceção à proteção do sigilo profissional. E aqui é fundamental deixar uma orientação clara para os pastores. Se um ministro religioso obtém informação acerca de um crime de abuso sexual infantil, ele não poderá manter sigilo. Nesses casos, deverá buscar a orientação jurídica de um advogado a fim de receber instruções adequadas para lidar com esse problema. A Igreja Adventista do Sétimo Dia mantém um corpo de advogados disponível para apoiar e orientar cada pastor no exercício do seu ministério, quando houver alguma dúvida jurídica. Dessa maneira, os ministros adventistas têm segurança na manutenção do seu sigilo profissional, pois a imperiosidade de sua observância é condição para a manutenção das estruturas das instituições religiosas e sua função social e espiritual na Terra.

Tales Moura, advogado assistente da sede sul-americana da Igreja Adventista

Referência

* Flávio Wender Meireles Paladino, “Guardar Segredo Ainda é Necessário?”. Disponível em <link.cpb.com.br/fbbe9e>, acesso em 6/10/2022.