Os homens da cidade disseram a Eliseu: Eis que é bem situada esta cidade, como vê o meu senhor, porém as águas são más, e a terra é estéril. Ele disse: Trazei-me um prato novo, e ponde nele sal. E lho trouxeram. Então saiu ele ao manancial das águas, e deitou sal nele; e disse: As-sim diz o Senhor. Tomei saudáveis a estas águas; já não procederá daí morte nem esterilidade. Ficaram, pois, saudáveis, aquelas águas até ao dia de hoje, segundo a palavra que Eliseu havia dito.” (II Reis 2:19-22).
Jericó estava numa situação de necessidade desesperadora. Alguém então sugere que o profeta estaria em condições de ajudar, e Eliseu recebe a primeira solicitação de serviço, desde que Elias fora levado para os Céus. Certamente Eliseu se sentiu naturalmente apreensivo. O povo, provavelmente, estava preocupado sobre como o jovem profeta enfrentaria suas crescentes responsabilidades.
Vários séculos antes desse acontecimento, Jericó havia sido destruída. Josué tinha amaldiçoado as circunvizinhanças da ímpia cidade cananita. A despeito de ser todo o Vale do Jordão “como o jardim do Senhor” (Gên. 13:10), Deus proibira a reedificação de Jericó naquele sítio (Josué 6:26). Qual-quer um que tentasse reconstruir a cidade sofreria graves calamidades.
Contestações
Por cinco séculos e meio, os homens conformaram-se com a proibição divina. Todavia, nos dias de Acabe, todas as restrições divinas foram colocadas à parte. É assombroso como a rejeição da vontade divina, por parte de um homem, pode fermentar como lêvedo. Com Acabe, muitos se afastaram do Senhor e de Sua Palavra. A capciosa pergunta feita por Satanás, no Eden – “É as-sim que Deus disse?” -, era freqüentemente usada durante o reinado de Acabe. “Será que atualmente o Senhor quer dizer que a cidade não deverá ser reconstruída?”, alguém perguntava. Outro retrucava: “Não pensa você que essa restrição de não reedificar Jerusalém, era aplicável somente naqueles tempos passados?” “Os tempos mudaram, vivemos numa geração diferente”, alguém acrescentava. “O que era aplicável então é irrelevante hoje”, muitos concordavam.
Se tivéssemos vivido nos dias de Eliseu, provavelmente ouviriamos o povo conversar dessa maneira, acerca das recomendações de Deus, e em especial acerca de Jericó. Em nossos dias, quando ouvimos semelhantes argumentações, uma luz vermelha deveria piscar em nossa mente, como um alerta. Por trás delas, Satã se encontra. Não nos deixemos enganar, embora ele possa estar vestido como um anjo. Esta é sempre a maneira como ele trabalha.
Qualquer questionamento da validade das Escrituras e sua aplicação à vida humana, deve ser rechaçado. Paulo já alertava para este perigo: “Mas ainda que nós, ou mesmo um anjo vindo do Céu vos pregue evangelho que vá além… seja anátema.” (Gál. 1:8).
Durante o reinado de Acabe, sempre eram lançadas dúvidas sobre tudo o que tinha a ver com o que era errado ou direito. A autoridade de Deus era questionada e lança-da de lado de maneira arrogante. Cada exigência era investigada numa atitude de espírito crítico. Muitos dos mandamentos de Deus eram ignorados. Restrições e praxes que habilitariam o povo de Israel a prosperar, eram desprezados.
A narrativa inspirada nos informa que um homem chamado Hiel, um rebelde betelita, começou a edificar Jericó (I Reis 16:34).
Morador do lugar chamado “a casa de Deus”, no entanto esqueceu-se de Deus e se propôs a desafiar e desfazer a ordem divina, dada havia mais de cinco séculos. Segundo a profecia, quando alguém lançasse a pedra fundamental da nova cidade, o seu primogênito morreria e à custa do mais novo colocaria as portas (Josué 6:26). Hiel ignorou a predição. No fundamento da cidade, morreu o seu filho mais velho, chamado Abirão. Hiel continuou desafiando o Senhor. E quando ele completou as muralhas e fechou as portas da cidade, seu último filho, chama-do Segube, morreu (I Reis 16:34).
Do amargo ao doce
Quão tolos somos nós quando nos desviamos dos comandos divinos! No fim, o que imaginamos ser vantajoso realmente constitui-se nossa destruição. Contudo, existem muitos que continuam neste caminho de rebelião.
Apesar da advertência de Deus, muitas famílias se mudaram para a reconstruída cidade de Jericó, antiga cidade amaldiçoada. Ali existiam vários problemas. Havia uma nascente e as suas águas corriam através da moderna cidade. No tempo de Eliseu, as águas eram más, imprestáveis para serem bebidas. E mais, exerciam um efeito maléfico sobre o solo, tornando-o estéril.
A graça do Espírito deve ser completamente misturada à nossa personalidade e aos nossos pensamentos.
Tão logo a terra era semeada, a semente morria. O relato sagrado nos diz que a “terra é estéril”. Os animais morriam famintos.
A localidade de Jericó hoje é chamada de Telles-Saltan. Seu povo foi então ao profeta Eliseu, em busca de ajuda, dizendo que a “cidade das palmeiras” era magnificamente bem situada (Deut. 34:3). E ainda é. Um exuberante oásis. Desde o Sul e Sudeste, o deserto se estende para as margens ao Norte do Mar Morto. Ao Leste, as férteis montanhas de Moabe; e para o Oeste, as altas e áridas montanhas da Judéia. As cercanias da cidade de Jericó eram e ainda são um deserto.
A resposta de Eliseu foi imediata: “Trazei-me um prato novo e ponde nele sal”, ele sugeriu, e foi prontamente atendido. “Então saiu ele ao manancial das águas, e deitou sal nele; e disse: Assim diz o Senhor: Tomei saudáveis a estas águas; já não procederá daí morte nem esterilidade. Ficaram, pois, saudáveis aquelas águas até ao dia de hoje, segundo a palavra que Eliseu havia dito.”
Eliseu lançou o sal sobre as águas, mas foi o Senhor quem as tomou saudáveis. O profeta não exibiu nenhum poder pessoal. Ele rendeu glória ao Senhor misericordioso, que nos ajuda apesar de nós mesmos, com nossas rebeliões. Quando Ele cura e abençoa, abençoa e cura para sempre. Águas saudáveis continuam ainda hoje a correr em Jericó.
Várias são as lições que podemos tirar desse episódio. O prato novo, o sal, a nascente, todos altamente simbólicos. Segundo comentário de Ellen White, “lançando sal no manancial amargo, Eliseu ensinava a mesma lição espiritual dada séculos mais tarde pelo Salvador a Seus discípulos, quando declarou: ‘Vós sois o sal da Terra.’ O sal misturando-se com a fonte poluída purificou suas águas, e levou vida e bênção onde antes havia sequidão e morte. Quando Deus compara Seus filhos ao sal, Ele deseja ensinar-lhes que Seu propósito em fazê-los súditos de Sua graça é que possam tornar-se instrumentos na salvação de outros” (Profetas e Reis, pág. 231).
Três coisas foram combinadas para trazer um resultado agradável e feliz: 1) o meio que Deus sugeriu, 2) as diretrizes do profeta e 3) o poder de Deus.
Enche-me de satisfação pensar acerca das implicações desta narrativa. Para mim, a situação de Jericó é uma parábola da vida. Um bonito exterior é, freqüentemente, capa que esconde uma vida interior pecaminosa.
Vivemos num mundo que está debaixo da maldição do pecado. Somos admoestados por Deus a olhar para além do presente e não construirmos aqui nenhuma cidade. Porém, construímos. Semelhantemente a Hiel, ignoramos a Palavra de Deus, desafiando a vontade divina. Mas apesar de nosso pecado e rebelião, o senhor está sempre pronto a responder ao nosso clamor por auxílio.
Um prato novo
Eliseu pediu aos homens de Jericó que providenciassem para ele um vasilhame novo. Nada havia de especial naquele prato. Era simplesmente um artigo caseiro, feito de barro comum, queimado por algumas horas numa fornalha. Quando quebrado, é atirado fora sem nenhuma consternação. É comum encontrar-se nas vilas do Oriente Médio, pilhas desses vasos quebrados, de séculos atrás. Um prato de barro não é valioso pelo que ele é, mas pela utilidade que tem, e isso é o que realmente importa.
O profeta foi imediatamente atendido. Trouxeram-lhe um prato novo, que ainda não havia sido usado, isto é, “dedicado somente ao senhor”. Devotado somente para a tarefa de carregar o sal para o fim designado.
Sal e graça
Usado largamente com funções preservativas e de dar sabor aos alimentos, o sal é descrito como símbolo da graça salvadora de Deus. “O sal salvador é a justiça de nosso Redentor”, escreveu Ellen White. (O Desejado de Todas as Nações, pág. 424). Semelhantemente “o Espírito de Cristo… é comparado com o sal, por causa de suas qualidades preservativas”. O Espírito Santo está pronto a morar conosco, se Lho suplicamos. Jesus prometeu enviar uma outra Pessoa como Ele mesmo (João 14:16), para fazer-nos Seu templo. Quando o Espírito toma posse de nós, Ele nos tempera com a natureza divina e preserva-nos puros até a vinda de Cristo. Guia os nossos passos nos caminhos retos, trazendo-nos à lembrança as palavras do Senhor Jesus Cristo, ensinando-nos as coisas que devemos saber.
Como o sal, a graça do Espírito deverá permear todo o nosso ser. Não é suficiente fa-lar, cantar, ou mesmo orar acerca da graça do Espírito Santo. O que é sumamente importante é a nossa aceitação voluntária de Sua presença transformadora em nosso coração. Ele deve tornar-Se parte de nós e nós dEle.
O ferreiro na sua tarefa diária, prepara as ferraduras para os cavalos. Coloca um pedaço de ferro na forja. O fole acende os carvões. O fogo aquece o ferro e os carvões tornam-se rubros. E então, o ferro e os carvões se tornam da mesma cor e temperatura. O ferro está no fogo e o fogo no ferro. Assim deve ser com o coração que é penetrado pelo Espírito Santo. Estamos nEle e Ele em nós.
Eliseu tomou o sal num vaso simples e saiu para a fonte. Aparentemente não havia nenhuma indicação de poder miraculoso em suas mãos. Na fonte, o profeta colocou sal. Não o colocou no riacho. Se suas águas deveriam tornar-se puras, essa purificação deveria ser na fonte, na nascente. Assim é a nossa vida. Sua transformação deve ser na fonte, no interior, no mais íntimo recesso de nossa alma. O poder preservador da graça divina deve começar sua ação no centro do ser. “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração”, Deus adverte, “porque dele procedem as fontes da vida” (Prov. 4:23).
O Senhor fez um veemente apelo ao Seu povo, dizendo: “Lava o teu coração da malícia, ó Jerusalém, para que sejas salva! Até quando hospedarás contigo os teus maus pensamentos?” (Jer. 4:14)
Para obter alguma coisa real e durável, o sal do Espírito deverá permanecer no coração pecador e permeá-lo. Então a vida será preservada do poder corrosivo do pecado, e cheia do sabor celestial.
A fonte de nossa alma deve ser temperada com a graça do Espírito. Então, e somente então, os objetivos e resultados de nossa vida serão de acordo com a vontade de Deus. A graça do Espírito deve ser completamente misturada à nossa personalidade e aos nossos pensamentos. Nenhuma parte de nossa mente pode ser livre de Sua orientação. Não deve haver nenhum pensamento, nenhuma ambição, nenhum plano, nenhuma filosofia de vida, sem o sabor e a preservação do Espírito divino.
Foi assim com o nosso Salvador: “Toda a verdadeira obediência vem do coração. Deste procedia também a de Cristo. E se consentirmos, Ele por tal forma Se identificará com os nossos pensamentos e ideais, dirigirá nosso coração e espírito em tanta conformidade com o Seu querer… A vontade refinada, santificada, encontrará seu mais elevado deleite em fazer o Seu serviço.” (O Desejado de Todas as Nações, pág. 642).
Sem o sal da graça do Espírito, o riacho da vida continuará a ser amargo e sem esperança. Devemos permitir que a presença e o poder do Espírito Santo inundem o nosso coração, diariamente. Então experimentaremos a transformação tão necessária em nossa vida, e que nos possibilitará repartir doçuras a outros.