Elementos fundamentais na preparação de mensagens que fortalecem a fé e transformam o coração
Geraldo Beulke Júnior
Vivemos numa época em que sistemas filosóficos e culturais têm alcançado êxito em tornar as ideias religiosas menos significativas e as instituições religiosas mais marginais.1 A estratégia inimiga se vale não apenas da secularização, mas especialmente de uma espiritualização fútil. Deus, porém, tem Seus métodos para chamar pecadores ao arrependimento e edificar a igreja.
A pregação bíblica tem sido um dos meios utilizados pelo Espírito Santo para convencer a humanidade “do pecado, da justiça e do juízo” (Jo 16:8). Afinal, “é o Espírito que envolve a pessoa numa santa atmosfera e fala ao pecador mediante palavras de advertência, indicando-lhe Aquele que tira o pecado do mundo”.2 Desde Enoque (Jd 14) e Noé, “pregador da justiça” (2Pe 2:5), até os apóstolos (1Tm 2:7), pais da igreja, apologetas, reformadores e o pastorado contemporâneo, o ministério da pregação tem sido o construtor de pontes entre a revelação divina e a ética humana.
Dada a importância desse ministério para a vida da igreja e o resgate dos perdidos, o objetivo deste artigo é refletir em como nossos púlpitos podem apresentar melhor a Palavra de Deus, oferecendo às congregações sermões que carreguem o selo da autoridade bíblica, que sejam criativos, motivadores e relevantes em sua aplicação para a vida.
Autoridade
Sermões nascem do encontro do pregador com a Palavra. Como pastores, precisamos conhecer as necessidades de nossas congregações. No entanto, um sermão somente suprirá adequadamente tais necessidades se tiver brotado de um encontro com a Palavra, quer seja no tempo em que as observamos ou em outro anterior a ele. Os pastores “devem ouvir o que diz o Senhor e perguntar: ‘Qual é a Tua palavra para o povo?’ Seu coração deve estar aberto, de maneira que Deus lhes impressione o espírito. Então eles estarão habilitados para comunicar ao povo a verdade que acabaram de receber do Céu. O Espírito Santo lhes dará ideias de modo a satisfazer às necessidades dos presentes”.3
Um sermão tem autoridade quando é bíblico. Ele vai além de uma simples leitura do texto da Bíblia. Necessita ser orientado pelo texto. Nesse sentido, o sermão do tipo expositivo é mais eficiente. Escolhemos um trecho, extraímos seu significado considerando a ocasião de sua escrita e a aplicação para a época atual e elaboramos um esboço didático. Ao expor a mensagem para a igreja, procedemos com a leitura do texto na íntegra e, então, seguimos para a exposição, conforme o roteiro previamente elaborado (Ne 8:8).
Os sermões temáticos, obviamente, também têm seu valor e facilitam a compreensão de determinados assuntos. Contudo, o pregador pode ser facilmente seduzido a conduzir o texto a fim de confirmar suas próprias deduções e ideias, em vez de deixar Deus falar a partir das Escrituras. Nos sermões temáticos faz-se necessário um exercício constante de autoconsciência sobre nossa honestidade intelectual no preparo da mensagem.
Mas o melhor que podemos fazer, sempre que possível, é pregar expositivamente para alimentar nossas igrejas e fortelecer nossos púlpitos. Também é muito útil a implementação de uma sequência de temas que permitam ao ouvinte, a partir do texto sagrado, construir gradativamente seu conhecimento sobre o assunto.
Há vários tesouros na Bíblia a ser explorados, com o mesmo significado, mas com diversas aplicações. Menciono aqui alguns que já trazem um esboço praticamente pronto: Isaías 58:1 a 14; Mateus 24; 25; Lucas 15:11 a 32; 24:13 a 35; João 15:1 a 17; 17; Romanos 8; 1 Coríntios 12; 15:35 a 58; Gálatas 5:1 a 25; Efésios 1:3 a 14; 6:10 a 20; Colossenses 3:1 a 4:6; Hebreus 12:1 a 3; 1 João 1:1 a 2:2. Quanto ao preparo dos sermões, há um excelente capítulo, de autoria de John Stott,4 que pode ajudar a resgatar o hábito de debruçar-se sobre o texto bíblico para dar-lhe voz no púlpito. Paulo resumiu bem esse ponto, quando exortou Timóteo: um obreiro aprovado maneja bem a Palavra da verdade (1Tm 2:15) e a expõe (1Tm 4:3).
Criatividade
Ao mesmo tempo que Ellen White instruiu a não fazer uso de “linguagem floreada, contos agradáveis ou anedotas impróprias”,5 ela advertiu que “quando um pastor sente que não pode diversificar a maneira habitual de sua mensagem, o efeito dela é pouco mais do que o de um sermão lido. Discursos sem vida, formais, contêm pouco do poder vitalizante do Espírito Santo”.6
A criatividade deve estar a serviço da didática. Ela pode ser utilizada de diversas maneiras, a fim de abrir caminho para o conteúdo e fixá-lo na mente dos ouvintes. Por exemplo:
Ilustrações com objetos: uma corda de 15 metros pode ter a ponta pintada em 20 centímetros de vermelho para indicar nossa vida, enquanto o restante representa a eternidade. O pregador estica a corda através do corredor central do auditório, deixando claro o contraste entre o passageiro e o eterno, levando à reflexão sobre quanto investimos no passageiro em detrimento da eternidade
Imagens: ilustrações, desenhos ou figuras que permitam a visualização do cenário bíblico ou que reforcem a ideia que está sendo trabalhada na argumentação.
Títulos e introduções que cativem a atenção: um pregador decidiu expor o cântico de Moisés e anunciou o título da mensagem como “A Melodia da Vitória”. Relatou como acordava nas manhãs de domingo, quando criança, ao som dos carros de Fórmula 1. Em seguida, relembrou o clima de expectativa pela bandeira quadriculada. Nesse momento, a equipe de som fez tocar o tema das vitórias de Ayrton Senna. Até as gerações posteriores ao atleta brasileiro puderam sentir naquela melodia um elemento de triunfo, de celebração, mesmo sem terem vivido naquele tempo. Então, fez a conexão com o cântico de Moisés, o qual não presenciamos, mas que pode nos contagiar com o triunfo da gratidão pela vitória em Cristo.
Testemuhos que fortaleçam a mensagem pregada: combinar previamente com pessoas que tenham experiências dentro do tema abordado e conduzir uma entrevista rápida, que contagie os ouvintes a fortalecer a fé, crescer em fidelidade e buscar a superação. Sejamos criativos, mas não nos esqueçamos de ser relevantes!
Relevância
A relevância da pregação depende de sua abrangência de temas, tendo em vista a característica heterogênea da congregação e de como o que foi exposto a partir do texto se aplica à vida cotidiana. Um calendário homilético, planejado ao final do ano corrente para ser usado no próximo, é a maneira mais apropriada de atender as necessidades da igreja e as exigências da Palavra.
Os anciãos reunidos, sob a liderança pastoral, devem definir a ênfase do púlpito em cada mês ou bimestre do ano, abordando temas sobre doutrina, família, profecia, relacionamentos, estilo de vida, livros bíblicos e outros assuntos teológicos. Nessa dinâmica, os pregadores devem ser convidados e informados do tema e sua ênfase com antecedência suficiente para que possam se preparar de forma adequada, respeitando a sequência do calendário.
Tão importante quanto a abrangência dos temas é sua aplicação à vida dos membros durante a exposição da Palavra. Assim temas abrangentes se tornam específicos quando aplicados de forma individual para a edificação dos membros do corpo de Cristo.
É importante lembrar que, enquanto a interpretação fidedigna, expondo o que o autor pretendeu, fornece a autoridade do sermão, a aplicação aos nossos dias garante sua relevância. O texto de Filipenses 2:1 a 30, por exemplo, poderia ter a seguinte aplicação: “Quando pensamos que merecemos mais ou que somos mais, seria bom olhar para o exemplo de Jesus e também daqueles que colocaram os interesses de Deus e do próximo acima dos interesses próprios: Paulo, Timóteo e Epafrodito.”
Interpretar o texto, sem aplicá-lo à vida dos ouvintes, é como tocar a campainha e sair correndo antes que alguém abra a porta. Aplicar é muito importante porque a Bíblia não foi dada para informar, mas para transformar pessoas.
Portanto, nessa época de futilidades, “permitam que a Palavra de Deus fale ao coração de vocês. Deixem que os que têm ouvido falar apenas de tradição, teorias e máximas humanas ouçam a voz Daquele que pode renovar a alma para a vida eterna”.7
Referências
1 Mark Shaw, Lições de Mestre (São Paulo: Mundo Cristão, 1997), p. 130.
2 Ellen G. White, Obreiros Evangélicos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1993), p. 155.
3 Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, p. 165.
4 John Stott, Eu Creio na Pregação (SP: Vida, 2003), p. 225.
5 Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, p. 155.
6 Ibid., p. 165.
7 Ellen White, Profetas e Reis (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996), p. 626.
Geraldo Beulke Júnior, pastor em Tatuí, SP