O sábado como tempo, lugar e pessoa

Raúl Quiroga

A prática da observância do sábado é significativa para os adventistas do sétimo dia. Como parte da reflexão sobre esse tema, poderíamos nos perguntar se esse dia especial foi dado à humanidade como uma questão existencial, uma prática religiosa para agradar a Deus ou parte essencial da vivência humana, tenha ela ou não consciência disso. Neste artigo proponho pensar o sábado em três dimensões: tempo, espaço e pessoa.

Sábado como tempo

Na criação da Terra, o descanso sabático foi inserido após a sequência de seis dias de atividade criativa como período de tempo santificado e abençoado (Gn 2:1-3). Essa sequência se tornou parte essencial do ser humano, que idealmente não pode ser pensado fora da estrutura de seis dias de trabalho e um dia dedicado a uma atividade diferente. Até o Criador e o cosmos estão sujeitos a esse ciclo (Êx 20:8-11).

No Éden, o sétimo dia foi o único que recebeu nome. Enquanto os primeiros seis dias foram mencionados ordenadamente e em um pacote nominal de “seis”, o sétimo foi chamado de “sábado” e “descanso”. O primeiro nome, “sábado” (shabbat, “cessação”), refere-se à hora da cessação do sétimo dia, marcando a diferença de atividade entre os primeiros seis dias e o sétimo (“seis dias […] fará toda a sua obra, mas o sétimo dia”. Êx 20:9, 10). O segundo nome, “descanso” (verbo nuach, “descanso integral”) indica a atividade desse dia e os efeitos físicos, mentais, sociais e espirituais da cessação no sábado. O que é feito nos primeiros seis dias? O trabalho cotidiano. E no sétimo dia? O mesmo que Adão e Eva fizeram assim que foram criados: passaram o sábado com o Criador. Deus e a família humana em perfeita comunhão por um dia inteiro, o sétimo. A partir de então, o ser humano se tornou uma “criatura adoradora sabática”, fato que o distinguiria para sempre de todas as outras criaturas.

Adão e Eva deveriam contar as estações, dias e anos a partir dos luzeiros no firmamento do céu (Gn 1:14-18). Dentro dessa contagem, no sétimo dia deveriam dedicar o tempo para adorar o Criador. 
Até hoje, todo sétimo dia é declarado sábado devido ao funcionamento do cronômetro do cérebro e do coração da criatura adoradora sabática. O ser humano é o instrumento que sinaliza e põe em movimento a adoração consciente ao Criador a cada sétimo dia. Aliás, as genealogias bíblicas são um testemunho de que ao longo da história os verdadeiros adoradores mantiveram o relógio funcionando perfeitamente. O sábado em que atualmente adoramos o Criador é o mesmo observado pelos patriarcas e profetas, por Jesus e os apóstolos.

A mensagem do terceiro anjo de Apocalipse 14:6 a 12, proclamada pelo remanescente fiel para a humanidade no tempo do fim, declara que aqueles que não reconhecem Deus como criador (v. 7) “não têm descanso” (v. 11), isto é, não têm “sábado”. Dado o teor simbólico do Apocalipse, ele não usa a palavra “sábado”, que seria a indicação temporal do sétimo dia, mas o termo grego anapausin (de anapauō), que significa “o descanso espiritual e mental obtido de Deus em Seu sábado” e corresponde ao verbo hebraico nuach.

Em suma, as palavras gregas e hebraicas fazem uma referência essencial ao sábado, ou aos efeitos benéficos do sétimo dia na vida daqueles que adoram o Criador. Na sequência, o texto menciona aqueles que têm um sábado, “os que guardam os mandamentos de Deus”, incluindo o sábado como dia de adoração, e fazem isso porque têm a “fé em Jesus” (v. 12), que também guardou os mandamentos de Seu Pai (Jo 15:10). Diz-se daqueles que têm um sábado que descansarão (anapaēsontai) de suas fadigas (v. 13), porque ouviram e aceitaram a mensagem do terceiro anjo.

Portanto, se o sábado é uma questão de tempo, devemos decidir aceitá-lo e vivê-lo, porque “o tempo se abrevia” (1Co 7:29). Precisamos dedicar esse tempo de adoração a Deus. Fazer isso será um verdadeiro “remédio para o corpo” (Pv 16:24).

Sábado como lugar

Vimos que o sábado é um espaço de tempo dedicado a uma atividade especial e diferente dos seis dias anteriores. Essa atividade consiste em passar um dia com o Criador, oferecendo-Lhe nossa adoração e reconhecendo que “foi Ele quem nos fez, e Dele somos” (Sl 100:3). Mesmo nossas realizações pessoais dos seis dias também são devidas a Ele. Essa adoração é feita não apenas em uma fração de tempo, mas também em um determinado lugar.

O culto do sábado teve sua origem em um espaço físico específico, o Jardim do Éden. Foi o primeiro dia plenamente vivido por Adão e Eva. No sétimo dia, o Criador visitava o santo casal e passava um dia inteiro com eles. Essa era a rotina até que Ele não os encontrou, porque Seus filhos, disfarçados de plantas, esconderam-se da presença de seu Criador (Gn 3:7). Por medo e vergonha, eles alteraram a imagem e semelhança que tinham com seu Criador e preferiram se associar às folhas de figueira. Essa ruptura afetou todas os aspectos da relação entre Criador e criatura, incluindo a vivência do sábado.

Uma vez que o culto sabático não pode mais ser feito no Jardim do Éden como um centro representativo, a humanidade pode fazê-lo em meio à natureza, em casas ou templos feitos por mãos humanas. No sábado, os adoradores ainda se levantam cedo para ir à Escola Sabatina e prestar culto a Deus, vestidos como se fossem a um casamento. Os templos se abrem ao amanhecer para receber os adoradores à luz do dia, a fim de que tenha um encontro especial com aquele que é o Sol da Justiça, a Luz do mundo!

Sábado como pessoa

É verdade que o sábado não é uma pessoa e é experimentado no tempo e no espaço. Jesus nunca disse “Eu sou o sábado”, como afirmou: “Eu sou o pão da vida” (Jo 6:38). Contudo, é interessante notar que, certa vez, Ele declarou: “Venham a Mim todos vocês que estão cansados e sobrecarregados, e Eu os aliviarei [anapauō]. Tomem sobre vocês o Meu jugo e aprendam de Mim, porque sou manso e humilde de coração; e vocês acharão descanso [anapausin] para a sua alma” (Mt 11:28-30).

Assim, as duas sentenças – “Eu os aliviarei” e “vocês acharão descanso” – usam o termo grego derivado de anapauō que, com seu correlato hebraico nuach, indicam os efeitos terapêuticos, espirituais e salutares da cessação do sábado, isto é, da atividade própria do sábado, a adoração ao Criador, de maneira diferente das atividades realizadas ao longo dos seis dias da semana.

É como se Jesus dissesse: “Eu sou o seu sábado”, “Eu sou a sua nuach”, “Eu sou o seu descanso total”, “Eu sou seu anapauō”, “Eu sou sua terapia”. E certamente é! No sábado temos um encontro de adoração com Jesus, em uma dinâmica totalmente diferente dos demais dias.

Conclusão

O sábado, portanto, não se limita à prática religiosa ou questão existencial, mas é algo puramente essencial. Ele faz parte do nosso ser, no tempo e no espaço. Jesus declarou: “O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado. Assim, o Filho do Homem é senhor também do sábado” (Mc 2:27, 28).

Mais do que fazer parte da nossa existência, o sábado faz parte da nossa essência. É como se estivesse escrito em nosso ser: “Na mente lhes imprimirei as Minhas leis, também no seu coração as inscreverei; Eu serei o Deus deles, e eles serão o Meu povo” (Jr 31:33). Assim como precisamos de ar, água e alimento para viver, também precisamos do sábado para ser o que somos (essência) e vivemos (existência). Nossas células precisam da cessação do sábado para funcionar adequadamente, estejamos ou não cientes desse fato. Assim fomos criados. Tudo na vida pessoal, nas famílias e sociedade seria diferente se todos observassem o sábado. Dessa maneira, o sábado, mais do que um mero “dia de descanso”, feriado ou tempo para lazer, deve ser considerado o dia em que a família humana cultua seu Criador. É “dia de adoração”, “dia da família”, “dia do encontro do Criador e suas criaturas”. O sábado é o instrumento de Deus para que a humanidade mantenha continuamente diante de si o fato de que é imagem e semelhança do Criador.