Quanto do conflito de Mineápolis de 1888 pode ser atribuído a diferenças teológicas e quanto a conflitos de personalidade?

O conflito de personalidade foi o elemento central no debate que ocorreu nas reuniões da Associação Geral de 1888. Os paladinos da ortodoxia da “velha guarda” foram George I. Butler (1834-1918), presidente da Associação Geral de 1871-1874 e de 1880-1888, e Uriah Smith (1832-1903), editor da Review and Herald e reconhecida autoridade da Igreja sobre interpretação profética.

As “forças da oposição” da Costa Oeste eram representadas por Alonzo T. Jones (1850-1923) e Ellet J. Waggoner (1855-1916), co-editores de Signs of the Times e de American Sentinel. Seu realce teológico foi percebido pela “velha guarda” como uma ameaça a alguns aspectos da doutrina adventista e da interpretação bíblica tradicional. Smith e Butler não receberam essas ameaças de maneira leviana.

George I. Butler

Butler possuía uma visão elevada do papel do presidente da Associação Geral. Jamais, escreveu ele em 1873, referindo-se a Tiago e Ellen White, houve um “grande movimento neste mundo sem um líder; e não pode haver, de acordo com a natureza das coisas. Quando a natureza concede aos homens uma variedade de dons, segue-se que alguns têm pontos de vista mais claros do que outros, daquilo que melhor promove a Causa. E o melhor bem de todos os interessados em qualquer objetivo proposto, será alcançado seguindo-se inteligentemente os conselhos dos que estão em melhores condições de orientar.”1

Butler, que tinha uma dosagem de sangue de liderança em suas veias (seu avô foi governador de Vermont de 1826-1828), adotou para si mesmo este elevado conceito de liderança. Ele se via não apenas como um forte guia que deveria dirigir do alto, mas também como um cão-de-guarda teológico para a denominação. Afinal, não escreveu ele a Ellen White precisamente antes da convocação da sessão de 1888, procurando assegurar “a melhor posição que nosso povo poderia desejar?”2

A Sra. White indicou que ela não estava tão impressionada quanto Butler com sua elevada visão da presidência da denominação…. “Não deveis pensar que o Senhor vos colocou (e ao Pastor Smith) na posição que agora ocupais, como os únicos homens que devem decidir se qualquer luz e verdade a mais deverá vir ao povo de Deus.” Mais adiante ela censurou Butler por misturar seus próprios “traços naturais de caráter” com seu trabalho, por possuir falsas idéias de sua posição na denominação, por aplicar a mente em “condutos errados” e por referir-se a Jones e Waggoner como “neófitos” em editorial.3

Tal conselho, infelizmente, não demoveu de seu curso o presidente mentalmente exausto. Perto do fim da sessão da Associação Geral de 1888, a Sra. White escreveu que “o Pastor Butler… esteve na função por três longos anos, e agora toda humildade e modéstia de coração se apartou dele. Ele pensa que sua posição lhe dá tal poder que sua voz é infalível”.4 Dado a este primeiro choque com o “régio poder” adminstrativo, talvez não seja surpresa que tanto Jones como Waggoner se voltassem mais tarde contra o conceito de organização denominacional e, especialmente, o sistema presidencial.5

Uriah Smith

Uriah Smith possuía, em muitos sentidos, a mesma mentalidade de Butler. Ligado à Review desde o começo dos anos 50, por volta de 1888 havia servido como seu editor por aproximadamente 25 anos. Em muitos sentidos, ele se via mais como o proprietário do jornal do que como o seu editor. Como Butler, Smith considerava-se a si mesmo como um guardião da ortodoxia teológica. Smith expôs sua política editorial com relação a Jones em 1892: “Após ter-me tornado, depois de longo estudo e anos de observação na obra, firme em certos princípios, não estou preparado para bandear-me para a sugestão de qualquer noviço.”6 Baseado nisto, é natural supor que ele mantivesse a mesma posição com respeito a Jones e Waggoner em 1888. Nem ele nem Butler tinham a mais leve inclinação para mudar rapidamente de ideia, diante dos homens mais jovens da Califórnia.

A atitude revelada pelos homens mais jovens não merecia tanta importância. Como disse Ellen White em 1887, faltava “humildade” e “mansidão” a Waggoner, enquanto Jones necessitava cultivar “a piedade prática”.A personalidade de Jones estava regulada de modo especial contra a conquista de amigos e da simpatia de inimigos. A Sra. White o advertia seguidamente contra suas palavras incisivas dirigidas aos outros; Jones, porém, achava quase impossível fazer distinção entre franqueza e aspereza. Isto era perigoso princípalmente porque ele considerava a franqueza uma virtude.

Alonzo T. Jones

Outrora um sargento do exército de fronteira, Jones conservava uma atitude autoritária. Esse traço de personalidade, aliado à sua crença infalível de que sempre estava certo, muito contribuiu para dar um tom negativo às reuniões de Mineápolis. A certa altura, Jones deixou escapar inadvertidamente para os delegados, que ele não queria ficar responsável pela ignorância de Smith quanto a certos aspectos históricos relacionados com Daniel 7.8

Sua maneira de falar não abrandou o “não-bandeamento” de Smith, mas fez com que ele e seus amigos se tornassem mais contrários às “novas” idéias.

Ellett J. Waggoner

Com 33 anos de idade, Waggoner era o mais moço dos principais contestadores de Mineápolis. Formou-se em medicina na Cidade de Nova Iorque em 1878, mas, descontente com a prática médica, entrou no ministério. Em 1884 foi chamado como assistente do pai, J. H. Waggoner, editor do Signs of the Times.

O principal ponto crítico teológico da vida do jovem Waggoner teve lugar numa reunião campal em Healdsburg, Califórnia, em outubro de 1882. Durante uma palestra, ele foi acometido por algo semelhante a uma visão. “Subitamente”, relatou ele, “uma luz brilhou ao meu redor, e a tenda parecia iluminada, embora o sol estivesse brilhando; vi o Cristo crucificado por mim, e pela primeira vez em minha vida me foi revelado o fato de que Deus me amava, e de que Cristo Se deu a Si mesmo por mim pessoalmente.” Como resultado dessa experiência, Waggoner dedicou a vida a descobrir na Bíblia “o amor de Deus em favor dos pecadores”, e a pregar essa mensagem.9

Foi esta “visão” que finalmente levou Waggoner a um estudo em profundidade do livro de Gálatas; um estudo que iria levá-lo à confrontação direta com as forças Smith-Butler na sessão da Associação Geral de 1888. Fiel a esta experiência de 1882, Waggoner descobriu o evangelho no livro de Gálatas. De acordo com Waggoner, a lei de que trata o livro de Gálatas eram os Dez Mandamentos. Assim, como ele resumiu sua posição, os Dez Mandamentos/lei que serviu de aio, leva-nos ‘“a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados.’”10

Este ensinamento, que Waggoner começou a publicar no Signs e a ensinar no Healdsburg College entre 1884 e 1886, contrariava os trinta anos de teologia adventista. Desde meados de 1850, os ministros que lideravam a denominação haviam ensinado que a lei em Gálatas era a lei cerimonial. Butler e Smith viam a posição de Waggoner como solapadora da teologia do sábado, pregada pela denominação, numa época em que os Estados Unidos estavam enfrentando forte pressão em favor da legalização nacional do domingo.

Enquanto isso, Jones estava suscitando inovações teológicas em outras áreas, publicando-as no Signs e ensinando-as em Healdsburg. Sua área de atrito para com “os irmãos que lideram” tinham que ver com a identicação dos dez reinos de Daniel 7. Incansável estudante da história e da profecia, Jones concluiu que a posição histórica adventista sobre os reinos estivera errada. Tal conclusão o colocou contra Uriah Smith, autor de Thoughts on Daniel and the Revelation (Considerações sobre Daniel e Apocalipse) e até então inconteste intérprete da profecia nos círculos adventistas. A conclusão de Jones, trovejou Butler, provou que ele é um desordeiro, uma vez que defendeu uma interpretação “contrária à fé há tanto tempo aceita por nosso povo adquirido quarenta anos atrás”. Ele queixou-se amargamente de que “está surgindo uma geração de moços que se aventuram a publicar suas próprias opiniões, espalhando-as para o mundo, as quais são completamente diferentes e contrárias à posição por tanto tempo mantida por nós”.11

A coligação Smith-Butler procurou esmagar os novos ensinos numa batalha de bastidores na sessão da Associação Geral de 1886, mas ao debater-se por várias horas, a comissão examinadora dividiu-se em quatro votos a cinco. “A pergunta”, escreveu Butler, “era se deveríamos levar isto para a Associação e realizar um grande debate público sobre o assunto.”12 Não desejando uma confrontação aberta sobre um assunto tão contraditório, Butler decidiu apresentar uma posição de compromisso diante de uma sessão de negócios dos delegados. Como resultado, a sessão de negócios aprovou uma resolução segundo a qual “pontos de vista doutrinários não defendidos por uma grande maioria de nosso povo” não devia fazer parte do ensino das escolas adventistas nem ser publicados em jornais denominacionais “como se fossem doutrinas aceitas por esse povo, antes que fossem examinados e aprovados pelos irmãos experientes da liderança”.13

Essa resolução, contudo, pouco fez no sentido de resolver os pontos controvertidos. Eles continuaram latentes até as reuniões da Associação Geral, quando se tornaram os principais itens da agenda. Sua inclusão na agenda enfureceu o presidente da Associação Geral. “Meu único desgosto”, escreveu ele na véspera das reuniões, era “que o Pastor Smith e eu não pudéssemos avançar neles (os novos ensinos) e denunciá-los nos mais variados canais possíveis” quando eles foram impressos pela primeira vez.14

Butler, que se encontrava enfermo, não pôde assistir às reuniões de 1888. Enviou, porém, um telegrama a seus colegas para que “permanecessem firmes pelos antigos marcos”. Como resultado, seus colegas entraram na luta. Eles não decepcionariam seu debilitado líder nem negariam a ortodoxia adventista tradicional. Por outro lado, Ellen White aconselhava os delegados a não fazerem caso das mensagens que Butler estava enviando de Battle Creek.15

Durante as reuniões de 1888, Smith discutia com Jones sobre a identidade dos dez reinos de Daniel 7, e Waggoner e J. H. Morrison (presidente da Associação de Iowa e debatedor habilidoso) apresentavam posições opostas sobre a lei em Gálatas. Enquanto isso, Ellen White procurava servir de mediadora entre as partes e apelar para a compreensão, a cortesia cristã e o estudo honesto da Bíblia. Ela não assumiu a posição de uma autoridade teológica, nem procurou serenar os argumentos usando seus próprios escritos — embora a ‘‘velha guarda” tivesse colocado sua interpretação sobre o livro de Gálatas no centro de sua exposição de motivos, em favor da manutenção da posição tradicional.

A controvérsia continua

A associação não acabou com nenhuma das divergências teológicas. Jones e Smith continuaram a opor-se um ao outro sobre interpretação profética durante os anos 90. Mais importante, contudo, foi a contínua acrimônia sobre o problema de Gálatas.

Enquanto a disputa sobre a lei em Gálatas causou o furor nas reuniões de 1888, este não era o assunto central para a mente de Jones e Waggoner após a sessão. Waggoner havia pregado a justificação pela fé em Cristo no contexto de Gálatas, e era esse realce salvífico que ele e Jones, bem como Ellen White, continuavam a pregar durante os anos seguintes, ao levarem ao povo a mensagem de Mineápolis. Entre 1888 e 1891, eles falaram em congregações adventistas através de toda a nação, enquanto enalteciam a Cristo, Seu amor e Sua justiça. O título do livro de Waggoner, de 1890, Christ and His Righteousness (Cristo e Sua Justiça) resume-lhe o realce. Seu trabalho unido, porém, foi interrompido em 1891, com a partida de Ellen White para a Austrália e a indicação de Waggoner como editor de Present Truth (Verdade Presente) na Inglaterra — posição que ele manteve até 1902. Enquanto isso, Jones permaneceu nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo que defendia a mensagem da justificação pela fé, serviu como o líder principal da denominação na causa da liberdade religiosa. Em 1897 ele recolocou Smith com editor da Review and Herald

As forças Smith-Butler não iam muito bem no período pós-Mineápolis. Eles continuaram a abrigar fortes sentimentos sobre o assunto de Gálatas e o desafio a sua autoridade. Sua reação emocional ao problema e à personalidade de Jones e Waggoner influenciaram sua reação à mensagem de justificação pela fé, que Butler enaltecera na Review em 1884 e Smith repetidamente afirmava crer.16 Eles pareciam incapazes de desvencilhar aquela mensagem de sua posição sobre Gálatas na sessão da Associação Geral de 1888.

Logo depois das reuniões de 1888, Butler foi para a Flórida com a saúde combalida. Em-bora se recuperasse num curto espaço de tempo, sua esposa se tornou inválida no ano seguinte. Como resultado, ele deixou o emprego denominacional por 12 anos, mantendo-se com o plantio de laranjas.

Smith continuou como editor da Review até 1897, discutindo com Jones sobre interpretação profética e outros assuntos. Sua editoria durante aqueles anos, porém, foi uma batalha decadente, em face da popularidade do carismático Jones, que, no fim de 1892, havia-se tornado a voz ministerial mais ouvida no adventismo americano. Em 1897, Smith sofreu sua última derrota, quando Jones foi indicado como editor e ele foi posto como editor-assistente de Jones no pessoal da Review.

No começo dos anos 90, as forças de Smith-Butler começaram a sair da confusão mental com respeito à doutrina da justificação pela fé, no que se relaciona com a controvérsia de 1888. O primeiro momento decisivo ocorreu no curso para ministros, realizado em Battle Creek durante a primavera de 1890. Durante aquelas reuniões, muitos dos ministros da “velha-guarda” começaram a ver que a lei de Gálatas não fora o verdadeiro assunto de Mineápolis. Esta constatação trouxe várias confissões; outras se seguiram, posteriormente.17

Confissão

Os três líderes que se declararam contra o grupo White-Waggoner-Jones em Mineápolis, finalmente confessaram seu erro quanto à justificação pela fé. Smith foi o primeiro a baquear. Em janeiro de 1891, após uma semana de oração com leitura redigida por Ellen White, que dava realce ao arrependimento com relação à justificação pela fé, ele lhe solicitou uma entrevista juntamente com vários pastores que exerciam liderança, e aí confessou muitos dos erros que cometera em Mineápolis. Falando sobre Smith, Ellen White disse que ‘‘ele havia caído sobre a Rocha e estava feito em pedaços”. Segurando a mão de Smith, ela “lhe disse que ele dissera em sua confissão tudo o que podia ter dito”. A experiência completa, relatada por O. A. Olsen, presidente da Associação Geral, criou “uma sensação bem diferente em Battle Creek, e o Senhor está operando em nosso favor de maneira especial, e o caminho se está abrindo para outros se aclararem’’.18 A confissão de Smith foi seguida no verão de 1892 pela de J. H. Morrison, que havia representado Butler como o principal intérprete dos tradicionalistas sobre o assunto de Gálatas em Mineápolis.19

Butler foi o último dos líderes da “velha guarda’’ de Mineápolis a confessar seu erro a respeito da justificação pela fé. “Creio plenamente’’ escreveu ele em junho de 1893, “que Deus abençoou grandemente, para o bem de Seu povo e da causa, a maior agitação das doutrinas da justificação pela fé (e) da necessidade de apropriar-se pela fé, da justiça de Cristo.” Butler explicou que jamais crera que pudesse ser salvo por suas boas obras, mas agora “estava bastante satisfeito pelo fato de luz adicional de grande importância ter estado a brilhar sobre essas questões”. Ele salientou que “endossava de bom grado (sic)” aquilo a que havia resistido anteriormente.20

Talvez o episódio mais revelador com respeito à unidade da liderança denominacional sobre ambos os lados do assunto da justificação pela fé seja uma reunião convocada por Jones, Smith e o Dr. J. H. Kellogg, na casa deste, durante a sessão da Associação Geral de 1893. Os presentes foram O. A. Olsen, Dan T. Jones, Smith, W. W. Prescot, A. T. Jones e Kellogg — certamente um grupo de opinião firme, que representava as várias correntes do debate. Os participantes votaram unanimemente a seguinte resolução: “Que, em vista dos fatos e explicações trazidos à tona por esta conferência, não há nenhuma base quer para controvérsia, quer para divergência com respeito à doutrina da justificação pela fé ou concernente à relação entre a fé e as obras.”21 Esta unanimidade sobre aqueles pontos não significava, porém, que eles concordassem sobre a lei em Gálatas. Smith e Butler, quanto saibamos, tiveram dificuldades quanto a esse ponto até morrerem.

Apostasia

Se Butler e Smith se inclinaram a vir mais tarde para a luz sobre a justificação pela fé, durante os anos 90, uma das grandes tragédias do adventismo, durante o mesmo período, foi que Jones e Waggoner se inclinavam, com o passar da década, para uma escuridão produzida pela introdução de pontos muito profundos, relacionados com a habitação de Cristo. Como resultado, em 1891 eles haviam ido a extremos em normas de fé-saúde, bem como de santidade, e foram advertidos por Ellen White.22 Por volta de 1894 eles haviam introduzido furtivamente a marca de seu ensino sobre a organização. Nos anos seguintes, ensinaram que toda organização humana estava errada — que a única organização de igreja certa era aquela na qual cada indivíduo era diretamente controlado pelo Espírito Santo.23 Na primavera de 1889, Jones estava ensinando conceitos de “trasladação mediante a fé”, sobre os quais o movimento da Carne Santa iria fundamentar-se. Em 1898 ele escreveu em um editorial que “a perfeita santidade abrange a carne, bem como o espírito”.24 Em 1897 Waggoner havia aceito o panteísmo — uma extensão lógica se a doutrina da habitação em Cristo for levada a extremo. Todos estes problemas e tendências podem ser vistos como perversões da doutrina da justificação pela fé.25

Juntamente com seu realce exagerado sobre a santidade, em 1891 Jones estava ensinando extremos sobre a Igreja e indicando afinidades que Ellen White e outros líderes da Igreja reprovavam freqüentemente. Em 1894 ele foi introdutor de Anna Rice como uma segunda profetisa adventista, dizendo que viriam mais.26 Apesar dessas dificuldades, Ellen White permaneceu firme em apoiar Jones e Waggoner e sua mensagem de justificação pela fé de 1888. Até o final de 1896 ela afirmou constantemente que eles eram mensageiros de Deus para exaltar a Cristo. Por outro lado, excede aos fatos inferir que ela aprovou em toda a sua extensão a mensagem básica da justificação pela fé. Na verdade, nem mesmo nas reuniões de 1888 ela concordava com toda a sua teologia e interpretações escriturísticas relacionadas com o assunto.27

Pode-se conjecturar que apesar de suas oportunas reprovações em particular, durante esse período, seu repetido endosso público a Jones e Waggoner como mensageiros de Deus, exacerbou sua natural falta de humildade. Seu apoio não devia surtir esse efeito, mas esse caloroso endosso público só se manteria em equilíbrio se Waggoner e Jones aplicassem constantemente suas mensagens de entrega ao Espírito Santo a suas próprias vidas. Evidentemente, porém, este foi um ponto no qual eles se sentiam pequenos.

Jones, tendo falhado grandemente como editor da Review, foi deslocado para o pastorado, em 1901. Ele foi substituído por Uriah Smith, que ficou satisfeito com o reverso. Infelizmente, porém, Smith não conseguiu deixar de responder os editoriais que Jones havia publicado sobre o evangelho em Gálatas. Em 1902 o “novo” editor se responsabilizou por uma série escrita por William Brickey, que enaltecia a posição anterior a 1888 sobre a lei em Gálatas. Enquanto dizia ainda crer na justificação pela fé, sua reativação da controvérsia de Mineápolis foi a tal ponto que a adminstração da Associação Geral o tirou de novo da editoria. Seu substituto foi W. W. Prescott, que se havia alinhado com Jones e Waggoner no início dos anos 90. Essa nova derrota significou o fim para o idoso guerreiro. A Review que anunciou a mudança, informou também que Smith estava gravemente enfermo.28 Não mais se recuperando plenamente desde o impacto, veio a descansar em março de 1903, com a idade de 70 anos.

Enquanto isso, Butler saiu do seu retiro após a morte da esposa. Em 1901, com 67 anos de idade, tornou-se presidente da Associação da Flórida. De 1902 a 1907, serviu como presidente da Associação da União Sul. Surpreendentemente, ele permaneceu ativo na obra da Igreja até sua morte em 1918. Ao que parece, jamais mudou de ponto de vista com respeito à lei em Gálatas, e a apostasia de Jones e Waggoner nos primeiros anos do novo século tão-somente o fortaleceu em sua posição.29

Paradoxalmente, foram os vitoriosos de 1888, e não os perdedores, que finalmente deixaram a denominação. Os problemas mais graves de Waggoner começaram na Inglaterra. Ele não só aceitou o panteísmo, mas começou a defender o conceito da “afinidade espiritual’’ — ponto de vista segundo o qual a pessoa que não é um cônjuge legitimamente casado nesta vida, pode sê-lo na vida por vir. Seu problema com a Srta. Edith Adams, uma enfermeira britânica, levou sua esposa a divorciar-se dele em 1905. No ano seguinte ele se casou com a Srta. Adams.

Embora Waggoner se afastasse do emprego denominacional durante o cisma Kellogg de 1903, nunca foi agressivo em sua oposição à Igreja e seus ensinamentos. Mas enquanto manteve sua crença na justificação pela fé, por ocasião de sua morte em 1916, Waggoner abandonou muitas de suas crenças adventistas distintivas. Pouco antes de sua morte, ele afirmou, no que parece ser um documento cuidadosamente escrito, que sua rejeição de crenças adventistas, como a questão do serviço do santuário, havia começado desde 1891.30

Jones, que chamava Waggoner de seu “irmão de sangue no sangue do concerto eterno, pregou o sermão fúnebre no enterro de Waggoner’’.31 Como Waggoner, ele se colocou do lado de Kellogg no cisma de Battle Creek em 1903, tornando-se presidente do novo Colégio de Battle Creek, do médico.

Tendo rejeitada a sua solicitação, pela liderança denominacional no final dos anos 90 e começo do século vinte, Jones, ao contrário de Waggoner, tornou-se o principal acusador público da denominação adventista e de Ellen White. Numa série de artigos e pequenos livros ele atacou a organização da Igreja, o conceito de um presidente denominacional e a pessoa e obra de Ellen White.32

Suas credenciais foram cassadas em 1907 e seu nome tirado do rol de membro da Igreja em 1909. Depois de 1915 ele editou The American Sentinel of Religious Liberty, uma publicação particular que fazia disparos regulares contra os adventistas. Suas filiações com igrejas foram incertas durante esse período, sendo sua última ligação com um grupo de pentecostais que falavam línguas e guardavam o sábado. Para infortúnio de Jones, esse grupo resolveu organizar-se naquilo que para ele era a abominação das abominações — uma denominação — e Jones teve que renunciá-lo.33 Logo após, a saúde de Jones baqueou. Depois de uma prolongada enfermidade, ele foi ao seu descanso, em maio de 1923.

Questionário

1. Como deve a igreja tratar os que dizem ter nova luz sobre questões em que a igreja já possui um ensino histórico consistente? Responderíeis a questões “periféricas” de maneira diferente da que usaríeis para responder a questões centrais de nossa fé?

2. O que estava errado com a estima-própria de George Butler em favor da Presidência da Associação Geral?

3. Que pensais de um assunto insignificante como o dos reinos que se tornaram dez chifres, serem transformados em um assunto de debate tão acalorado na igreja?

4. Votaríeis a favor da resolução de 1886, sobre o ensino de pontos de vista doutrinários não defendidos pela maioria?

5. Por que, em vossa opinião, Ellen White se recusou a assumir o papel de autoridade teológica e estabelecer o debate?

6. Como descreveríeis o papel que Ellen White desempenhou durante a sessão da Associação Geral de 1888?

7. A confissão de Uriah Smith estava plenamente certa, embora ele não tenha mudado de ideia a respeito da lei em Gálatas. O que pensais que sua confissão envolvia?

8. Prova a apostasia de Jones e Waggoner que seu ensino sobre a justificação pela fé estava errado?

Bibliografia

1. G. I. Butler, Leadership (Battle Creek, Michigan, 1873), pág. 1.

2. G. I. Butler a E. G. White, 1? de Out. de 1888.

3. E. G. White a G. I. Butler, 14 de Out. de 1888.

4. E. G. White a Mary White, 4 de Nov. de 1888.

5. Ver G. R. Knight, From 1888 to Apostasy: The Case of A T. Jones (Washington, D. C.: Review and Herald Publishing Assn., 1987), págs. 178-193.

6. Uriah Smith a A. T. Robinson, 21 de Set. de 1892.

7. E. G. White a E. J. Waggoner e A. T. Jones, 18 de Fev. 1887.

8. A. T. Robinson, “Did the Seventh-day Adventist Denomination Reject the Doctrine of Righteousness by Faith?”, manuscrito não publicado, 30 de jan. de 1931.

9. E. J. Waggoner, The Everlasting Covenant (Londres, Inglaterra: Sociedade Internacional de Tratado, 1900), pág. 5.

10. ______, The Gospel in the Book of Galatians (Oakland, Califórnia: Pacific Press Publishing Assn., 1888), pág. 45.

11. G. I. Butler a E. G. White, 1 de Outubro de 1888.

12. G. I. Butler a E. G. White, 16 de Dez. de 1888.

13. “General Conference Proceedings”, Review and Herald, 14 de Dez. de 1886, pág. 779.

14. G. I. Butler a E. G. White, 1 de Out. de 1888.

15. E. G. White a W. H. Healey, 9 de Dez. de 1888, manuscrito 15, de Ellen G. White, 1 de Nov. de 1888; manuscrito 13 de E. G. White, n. d„ 1889.

16. Ver, e. g., Uriah Smith a Ellen G. White, 17 de Fev. de 1890, Review and Herald, 23 de Set. de 1884, págs. 616 a 617.

17. D. T. Jones a J. D. Pegg, 17 de Mar. de 1890; D. T. Jones a W. C. White, 18 de Mar. de 1890; O. A. Olsen a G. C. Tenney, 20 de Mar. de 1890.

18. E. G. White, “Be Zealous and Repent”, Review and Herald Extra, 23 de Dez. de 1890, págs. 1 e 2; E. G. White, manuscrito 3, de 9 de Jan. de 1891; D. T. Jones a R. M. Kilgore, 9 de Jan. de 1891; O. A. Olsen a R. A. Underwood, 16 de Jan. de 1891.

19. O. A. Olsen a J. H. Morrison, 10 de Julho de 1892; O. A. Olsen a E. J. Waggoner, 27 de Julho de 1892.

20. G. I. Butler, “Personal”, Review and Herald, 13 de Junho de 1893, pág 377.

21. “Relatório da Associação para a Consideração dos Assuntos da Justificação pela Fé e da Relação entre a Fé e as Obras, Apresentado no Gabinete de Kellogg no Sábado à Noite, 18 de Fev. de 1893”, manuscrito não publicado (itálicos supridos).

22. S. N. Haskell a E. G. White, 3 de Out. de 1899; E. G. White, manuscrito 26º, 5 de Agosto de 1892; J. H. Kellogg a W. C. White, 2 e 21 de Out. de 1891, 9 de Set. de 1892.

23. Ver Knight, págs. 178 a 193.

24. “Saving Health”, Review and Herald, 22 de Nov. de 1898, pág. 752. Ver também Knight, págs. 56 a 60, 167 a 171.

25. Boletim da Associação Geral de 1897, págs. 70- 71 e 84-89.

26. Ver Knight, págs. 83-84, 104-131.

27. E. G. White, manuscrito 15, de 1 de Nov. de 1888.

28. Eugene F. Durand, Yours in the Blessed Hope, Uriah Smith (Washington, D. C.: Review and Herald Publishing Assn., 1980, págs. 266-268; Uriah Smith a L. F. Trubey, 11 de Fev. de 1902; “Notice to Readers of the Review”, Advent Review and Sabbath Herald, 25 de Fev. de 1902), pág. 128.

29. A. G. Daniells a W. C. White, 21 de Jan. de 1910.

30. E. J. Waggoner, The “Confession of Faith” of Dr. E. J. Waggoner (n. p., [1916]), pág. 14

31. The Gathering Call, Nov. 1916, pág. 6.

32. Ver Knight, págs. 226 a 256.

33. The American Sentinel, Set. 1922, págs. 7 e 8; Out. 1922, págs. 3 e 4.

GEORGE R. KNIGHT — Prof, de História da Igreja no Sem. Teológico Adventista, Andrews University