Campeões da Imortalidade Condicional Através dos Séculos
(Continuação do número passado)
Século Vinte
CÔNEGO WILLIAM H. M. HAY AITKEN (1841-1927), organizador de missões anglicanas.
A doutrina do Tormento Eterno perdeu sua influência sobre o senso comum e as sensibilidades morais da humanidade. O povo não crê e não quer crer que um Deus infinitamente bom e misericordioso possa entregar Seus próprios filhos (Atos 17:28 e 29) a imensuráveis eras de tortura, em retribuição dos pecados e fraquezas de uns poucos e fugidios anos aqui na Terra. — Prefácio de Life and Immortaliy, 1949. ,
ERIC LEWIS (1864-1948), Universidade de Cambridge, missionário no Sudão e na Índia.
Life and Immortality (Vida e Imortalidade), 1949.
Christ, the First Fruits (Cristo, as Primícias), 1949.
Sumário:
- 1. Que o homem é mortal. Que a imortalidade não lhe pertence por natureza, mas é dom de Deus em Cristo, condicionada à fé e obediência, sendo o penhor dessa imortalidade a habitação do Espírito de Deus em nós. E essa imortalidade nos é comunicada por ocasião da ressurreição.
- 2. Que por ocasião da morte, a alma do homem, seu organismo físico, morre, e o homem volta ao pó.
- 3. Que por ocasião da morte, o seu espírito, que não é um entidade pessoal separada do corpo, volta a Deus que o deu, enquanto o homem mesmo passa para um sono inconsciente até à ressurreição.
- 4. Que por ocasião da ressurreição Deus chama de volta à vida o morto, de novo lhe inspirando o Seu Espírito. (…) O corpo da ressurreição, dado aos justos quando Cristo vier, será um corpo espiritual, corpo glorificado, semelhante ao Seu próprio, após Sua ressurreição.
Haverá uma ressurreição para o juízo, assim como para a vida. Aqueles cujo nome não for encontrado escrito no livro da vida, serão lançados no lago de fogo, para ali perecerem afinal, queimados como a palha. Quanto tempo seus sofrimentos hão de durar, só Deus sabe; Seu juízo será de acordo com o merecimento de cada um. Esta é a “segunda morte”, da qual não haverá ressurreição. — Christ the First Fruits, p. 79.
DR. WILLIAM TEMPLE (1881-1944), Arcebispo de Cantuária, Primaz da Grã-Bretanha.
Christian Faith and Life (Fé e Vida Cristãs), 1931: 16.a impressão, 1954.
Drew Lecture on Immortality (Conferência de Deus Sobre a Imortalidade), 1931.
Nature, Man and God (A Natureza, o Homem e Deus), 1953.
A doutrina da vida futura implica nosso primeiro desemaranhar do autêntico ensino das Escrituras clássicas, dos acréscimos que muito depressa começaram a obscurecê-las. — Nature, Man and God, p. 460.
O homem não é imortal por natureza ou por direito; mas é capaz da imortalidade e oferece-se-lhe a ressurreição dos mortos e a vida eterna, se a receber de Deus e nas condições de Deus. — Id., p. 472.
Não há, porém, muitas passagens que falam do intérmino tormento dos perdidos? Não; tanto quanto alcança meu conhecimento, não há isso, absolutamente. — Id., p. 464.
Afinal de contas, o aniquilamento eterno é um castigo eterno, embora não seja um tormento eterno. – Ibid.
Uma coisa podemos dizer com confiança: o tormento eterno está excluído. Se os homens não tivessem importado a noção grega e anti-bíblica da indestrutibilidade natural da alma humana, e então lessem o Novo Testamento tendo isto já em mente, teriam daí derivado uma crença, não no tormento eterno, mas no aniquilamento. É o fogo que é chamado eterno, não a vida nele lançada. — Christian Faith and Life, p. 81.
Como pode existir o Paraíso para alguns, enquanto para outros houver o Inferno, concebido como um tormento sem fim? Toda alma supostamente perdida veio ao mundo como filha de uma progenitora, e o Paraíso não pode ser para ela Paraíso, se o filho está nesse inferno. — Id., p. 454.
DR. GERARDUS VAN DER LEEUW (1890-1950), lente na Universidade de Gronigen.
Onsterfelijkheid of Opstanding (Imortalidade ou Ressurreição), 1847.
Depois de citar Ecl. 3:19-21, comenta ele:
A imortalidade [inata] é um conceito que se adapta à filosofia do panteísmo. À morte não segue a imortalidade, mas a ressurreição. — Onsterfelijkheid of Opstanding, p. 30.
A Igreja — não importa quão helenizada possa estar na doutrina e na prática — sempre tem mantido a ressurreição do corpo. (…) Morre o corpo, a morte não pode absolutamente ser negada. Mesmo o Espírito , a alma que eu sou, não existirá. A alma morre também. Mas a vida toda do homem será renovada por Deus. Deus me ressuscitará “no último dia”. — Id., p. 32.
Deus, unicamente, é imortal (I Tim. 6:16). Ao homem deu Ele a promessa da ressurreição.
A criação se tornará uma re-criação. E a re-criação é ressurreição, um ressurgimento efetuado por Deus. — Id., p. 36.
Muitos pregadores, ultimamente, hesitam em pregar acerca da imortalidade. Outrora, porém, quando se pregava acerca da vida eterna, era sem esforço que eles se demoravam em fantasias quanto ao corpo corruptível a uma alma imortal. Os devocionários e hinários antigos estão repletos disso. Mesmo hoje, na casas mortuárias e nos cemitérios o povo é confortado mediante a mesma fonte — e todavia essas representações não são em nenhum aspecto cristãs, mas puramente gregas e contrárias à assência da fé cristã. — Id., p. 20.
DR. AUBREY R. VINE (1900- ), redator-
chefe de The Congregational Quarterly; professor no Yorkshire United Independent College.
An Approach to Christology (Estudo Sobre Cristologia), 1948.
A imortalidade natural do espírito é um conceito grego, e não um conceito cristão. — An Approach to Christology (1948), p. 314.
Contra a idéia da imortalidade natural do espírito temos de opor o fato de que Deus é o único existente por Si próprio e que coisa alguma existe ou continua a existir a não ser por Sua graça e vontade, dentro deste esquema ou de qualquer outro. Deus, unicamente, é exosquemático. Quando usamos a palavra “imortal”, portanto, acerca de qualquer ser que não seja Deus, temos de sempre reconhecer que ninguém senão Deus é imortal por Sua própria natureza e sem restrições. — Id., p. 315.
“Imortal” só deve aplicar-se a um espírito humano se reconhecemos que só é imortal por graça e vontade de Deus. Unicamente Deus é imortal por Sua própria natureza e sem restrições. — Id., p. 31., rodapé.
DR. MARTIN J. HEINECKEN, lente de teologia Sistemática no Seminário Teológico Luterano, Filadélfia.
Basic Christian Teachings (Ensinos Básicos Cristãos), 1949.
Falando do homem como unidade, diz ele:
No registro bíblico da criação é-nos dito que Deus formou o homem do pó da terra, e que Ele então lhe soprou nas narinas e o homem se tomou alma vivente. Isto é geralmente interpretado como se Deus fizesse uma alma, que é a pessoa real, e que Ele então tivesse dado a essa alma uma habitação temporária num corpo, feito do pó da terra. Mas isto é um dualismo falso. (…) O homem deve ser considerado uma unidade. — Basic Christian Teachings, pp. 36 e 37.
Estamos tratando de um ser unificado, pessoa, e não de alguma coisa chamada alma e que habite numa casa chamada corpo, como se o corpo fosse simples instrumento empregado pela alma, mas não realmente parte da pessoa. — Id., p. 38.
Tratando então da questão da imortalidade da alma diz ele:
Mantêm algumas pessoas que exista dentro de todo homem uma essência imutável e indestrutível, imortal por seu próprio direito. Não é afetada pelo tempo; não teve princípio, nem pode ter fim. Sempre existiu, e sempre existirá. Veio para este mundo mutável, procedente dos domínios da eternidade e para ela retornará. — Id., p. 138.
O ponto de vista cristão de modo algum deve ser identificado com a crença exposta acima, da imortalidade da alma. A crença cristã está na imortalidade do relacionamento com Deus, e na ressurreição. O dualismo cristão não é o de alma e corpo, espírito eterno e coisas passageiras, mas o dualismo de Criador e criatura. O homem é uma pessoa, um ser unificado, centro de responsabilidade, em relação com o seu Criador e Juiz. Não tem em si vida ou imortalidade. Veio à existência mediante o poder criador de Deus. Ele passa na Terra tantos anos quantos a providência de Deus lhe permite. Enfrenta a morte como salário do pecado. — Id., pp. 133 e 134.
O homem tem especulado assim: Por ocasião da morte a alma separa-se do corpo. Aparece então perante Deus num julgamento preliminar (que em parte alguma da Escritura é mencionado) e entra num estado preliminar de beatitude ou de condenação. Então, quando soar a última trombeta, o corpo ressurge e une-se de novo à alma, e assim novamente completo, corpo e alma reunidos, comparece ao cenário do julgamento público final, para dali entrar, ou na bem-aventurança final ou na final condenação. Não admira que, com este ponto de vista, os homens pouca necessidade vejam da ressurreição, tendo afinal abandonado completamente essa noção, satisfazendo-se com a redenção da alma tão-somente. — Id., p. 135.
Morrer, então, quer dizer passar para a ressurreição e o julgamento, no final do tempo. Mesmo que alguém dissesse que todos os homens dormirão até que soe a trombeta final, que significa o passar do tempo aos que dormem? A transição do momento da morte para o da ressurreição para eles seria ainda instantâneo. Não seria diferente de ir para o leito à noite e despertar de manhã. — Id., p. 136.
DAVID R. DAVIES (1889- ), reitor St.
Mary Magdalen, Dt. Leonard-on-Sea, Inglaterra.
The Art Of Dodging Repentance (A Arte de Esquivar-se ao Arrependimento), 1952.
A alma do homem não é necessária e automaticamente imortal. É susceptível de ser destruída. A Bíblia não oferece nenhuma base para a crença de que a alma seja imune à morte e destruição. A alma pode ser destruída.
A imortalidade da alma não é doutrina bíblica, mas filosofia grega. A doutrina bíblica acerca da alma é a ressurreição dos mortos. O homem é um ser criado. Deus o criou, do nada. O homem foi criado para a imortalidade, mas por sua própria rebelião contra Deus ele se fez mortal. — The Art of Dodging Repentance (1952), p. 84.
A idéia da imortalidade da alma deriva da filosofia grega, que concebia a vida além-hades, um submundo sombrio e fantasmagórico, no qual a alma vivia uma existência crepuscular. Temos traduzido a palavra hades pela palavra inferno, que imaginamos como um lugar de dor e tormento. Mas o hades grego não era lugar de tormento. Inferno como tormento deriva mais do termo hebraico geena, do que do grego hades, que significava uma existência inferior, sombria, isenta de paixão e sofrimento. Era produto do ponto de vista grego do homem como composto de matéria e alma, que a morte separava, libertando a alma da casa-prisão da matéria, para uma existência independente.
O ponto de vista hebraico era inteiramente diverso. Na Bíblia é o homem considerado como uma unidade de “vida” ou espírito, manifestando-se como alma e corpo. Visto como o homem se tornou a si mesmo mortal, sua alma, Conseqüentemente, também participa da mortalidade. O homem não é um composto de duas entidades separadas, matéria e espírito, mas uma unidade de espírito funcionando como matéria e alma. É a unidade que é mortal. — Id., pp. 84 e 85.
DR. BASIL F. C. ATKINSON, bibliotecário da Universidade de Cambridge.
The Pocket Commentary of the Bible (Comentário de Bolso, da Bíblia) Primeira parte, Livro de Gênesis, 1954.
Comentário sobre Gên. 2:7:
Tem-se pensado às vezes que a comunicação do princípio vital, como nos é apresentado nesse versículo, significava imortalidade do espírito ou alma. Tem-se dito que, feito à imagem de Deus implica imortalidade. A Bíblia nunca diz isso. Se envolve imortalidade, por que não envolve também onisciência ou onipresença, ou qualquer outra qualidade ou atributo do Infinito? Por que destacar apenas um? O fôlego da vida não foi soprado no coração do homem, mas em suas narinas. Envolvia vida física. Através da Bíblia o homem, à parte de Cristo, compreende-se como feito de pó e cinza, criatura física, a quem é por Deus emprestado um princípio de vida. Os pensadores gregos inclinavam-se a pensar no homem como sendo uma alma imortal, aprisionada num corpo. Esta ênfase é oposta à da Bíblia, mas tem encontrado vasto lugar no pensamento cristão. — The Pocket Commentary of the Bible, Parte I, Livro de Gênesis, p. 32.
DR. EMIL BRUNNER (1889- ), professor
de teologia sistemática e prática, Universidade de Zurique, professor-visitante em Princeton e na International Christian University, Tóquio.
Eternal Hope (Esperança Eterna), 1954.
Depois de estudar o vasto conceito histórico da “sobrevivência da alma após a morte” como a “separação da alma do corpo”, declara ele:
Para a história do pensamento ocidental, o ensino platônico da imortalidade da alma assuniu um sentido especial. Penetrou tão profundamente no pensamento do homem ocidental porque, embora com certas modificações, foi assimilado pela teologia cristã e pelo ensino da igreja, tendo mesmo sido declarado como dogma pelo Concilio de Latrão de 1512 [1513], e contradizer o qual era tido como heresia. — Eternal Hope, p. 100.
Então acrescenta ele:
Só recentemente, em resultado de uma compreensão do Novo Testamento em profundidade, têm surgido fortes dúvidas quanto a sua compatibilidade com o conceito cristão do relacionamento entre Deus e o homem. — Ibid.
De acordo com o platonismo:
O corpo é mortal, a alma é imortal. O envoltório mortal oculta essa eterna essência que por ocasião da morte é liberto de sua concha externa. — Id., p. 101.
Depois de observar que “este conceito dualístico do homem não corresponde com a perspectiva cristã”, observa ele:
Visto como este modo de furtar ao mal o seu aguilhão corre necessariamente paralelo com o tornar inócua a morte mediante o ensino da imortalidade, esta solução do problema da morte permanece em irreconciliável oposição ao pensamento cristão. — Ibid.
Comentando mais a “doutrina da imortalidade da alma” (p. 105), a qual o cristianismo medieval “adotou” da “filosofia grega”, observa ele que era “completamente alheia ao essencial ensino do cristianismo”. E acrescenta:
A opinião de que nós homens somos imortais porque nossa alma é de uma essência indestrutível, porque divina, essa opinião é, de uma vez para sempre, irreconciliável com o ponto de vista bíblico de Deus e do homem. — Id., pp. 105 e 106.
A crença filosófica na imortalidade é como um eco, reproduzindo e falsificando a superior Palavra desse Criador divino. É falsa porque não toma em conta a real perda desse destino original, devida ao pecado. — Id., p. 107.
DR. REINHOLD NIEBUHR (1892- )
lente no Union Theological Seminary.
The Nature and Destiny of Man (Natureza e Destino do Homem), (Scribners), 1955. (Conferências de Gifford em Edinburgo, 1939).
Depois de contrastar o ponto de vista “clássico” acerca do homem, da antigüidade greco-romana, com o ponto de vista “bíblico”, Niebuhr afirma que ambos “realmente se fundiram com o pensamento do catolicismo medieval”. — The Nature and Destiny of Man, Vol. 1, p. 5. O ponto de vista clássico, de que a “mente” ou “espírito” seja “imortal”, era inseparavelmente ligado ao conceito dualístico do homem (p. 7). Mas entre os hebreus, observa ele, o conceito de uma mente imortal num corpo mortal permanece desconhecido. — Id., p. 13.
O platonismo do Origines destrói completamente o sentido bíblico da unidade do homem. — Id., p. 153, rodapé.
O conceito cabalmente platônico de Gregório de Nisa, acerca da relação da alma para com o corpo, expressa-se vividamente em sua metáfora do ouro e do metal inferior. — Id., p. 172.
A idéia da ressurreição do corpo é um símbolo bíblico que muito ofende os espíritos modernos, e que há muito foi substituída na maioria das versões modernas da fé cristã, pela idéia da imortalidade da alma. Esta última idéia é considerada como expressão mais plausível da esperança de vida eterna. — Ibid., Vol. 2, p. 294.
A ressurreição não é uma possibilidade humana no sentido em que assim é considerada a imortalidade da alma. Todas as provas da imortalidade da alma, plausíveis ou não, representam esforços por parte da mente humana para dominar e controlar a consumação da vida. Todos procuram, de um ou outro modo, provar que um elemento eterno na natureza do homem é digno e capaz de sobreviver a morte. — Id., p. 295.
A esperança cristã da consumação da vida e da história é menos absurda do que as doutrinas alternadas que procuram compreender e efetuar a inteireza da vida por algum poder ou capacidade inerente ao homem e sua história. — Id., p. 298.
DR. T. H. KANTONEN (1900- ), professor luterano, Hamma Divinity.
School, membro americano da Comissão da Federação Mundial Luterana Sobre Teologia.
The Christian Hope (A Esperança Cristã), 1954.
A influência da filosofia helênica representada em particular pelos pais da Alexandria, tendia a espiritualizar a escatologia numa contínua purificação interior e na imortalidade da alma. — The Christian Hope, p. 20.
O animismo primitivo com sua noção de uma alma-fantasma destacável, que continua após a morte a levar uma existência sombria e participar de uma interação com os vivos — esta noção está ainda à base de muito pensamento religioso popular sobre o assunto. Mais importante e influente do ponto de vista teológico é a idéia grega da imortalidade da alma, que baseou sua formulação clássica nos diálogos de Platão, quatro séculos antes de Cristo. Visto que o platonismo forneceu as formas de pensamento mais sublime para o período formativo da teologia cristã, não é de surpreender que muitos dos pais identificassem a doutrina cristã da vida eterna como a imortalidade platônica e que finalmente o quinto Concilio de Latrão (1512-17) o adotasse como dogma da igreja. — Id., p. 27.
Tem sido característica do pensamento ocidental, desde Platão, fazer nítida distinção entre a alma e o corpo. O corpo supõe-se composto de matéria, e a alma de espírito. O corpo é uma prisão da qual a alma é liberta por ocasião da morte, para continuar por si mesma uma existência não-física. Por motivo de sua natureza espiritual imaterial, a alma tem sido considerada indestrutível. Daí a questão da vida após a morte tornou-se a questão de demonstrar a imortalidade, a capacidade da alma de desafiar a morte. O corpo pouco importa.
Este modo de pensar é inteiramente estranho à Bíblia. Fiel à Escritura e definitivamente rejeitando o ponto de vista grego, o credo cristão: “Creio na imortalidade da alma o credo cristão não diz: “Creio na imortalidade da alma”, porém sim: “Creio na ressurreição do corpo”. — Id., p. 28.
Não é a alma uma parte separada do homem, constituindo uma substância por si própria. — Id., p. 29.
“A fé cristã desconhece a imortalidade da pessoa. Isso significaria a negação da morte, não reconhecendo esta como juízo de Deus. A fé cristã sabe apenas de um despertamento da morte real, mediante o poder de Deus. Existe vida após a morte apenas mediante o despertar da ressurreição”.(*) Não há imortalidade de alma, porém uma ressurreição da pessoa toda, corpo e alma. A única imortalidade que a Bíblia reconhece é a imortalidade de um relacionamento pessoal com Deus em Cristo. — Id., p. 33.
A Bíblia não faz distinção entre homens e animais quanto a possuir o homem alma imortal e os animais não. Os homens, os animais, e mesmo as plantas são semelhantes na morte. Não precisamos preocupar-nos com o espiritismo ou hipóteses de qualquer espécie, quando à existência futura. Toda a questão de morte e vida após a morte se simplifica quando nossa única preocupação é a fé em Deus, que pode destruir e pode ressuscitar. A vida não tem sentido e nenhuma esperança oferece exceto condicionada à vitória de Cristo sobre a morte e à certeza de que participamos dessa vitória.
Há na Escritura considerável apoio ao ponto de vista de que tanto a alma como o corpo são perecíveis. Esta evidência foi obscurecida porque o conceito grego da imortalidade inerente da alma suplantou o ensino da Escritura. — Id., p. 34.
Há duas realidades indisputáveis na doutrina escriturística: O fato da morte e o fato da ressurreição dos mortos, por ocasião da segunda vinda de Cristo. Mas entre a morte da pessoa e a volta de Cristo há um intervalo que, segundo o ponto de vista humano, no caso da maioria dos homens, é um longo período de tempo. — Id., p. 36.
Contra essa especulação [purgatório, limbo, etc. da Igreja Romana], a ortodoxia protestante tem, em geral, negado todas as concepções de um estado neutro de aguardo, sustentando que as almas passam imediatamente para o estado de miséria ou de bem-aventurança. — Id., p. 37.
Se morte quer dizer entrada no Céu, a ressurreição e o julgamento perdem então seu sentido. — Id., p. 38.
(*) De Paul Althaus, Die Lezten Dinge (Gutersloh: Bertelsmann, 1933), p. 126.
A alma não tem existência à parte do corpo. Morre o homem todo, corpo e alma, e o homem todo, corpo e alma, ressurge no último dia. Ao morrer, o homem segue diretamente para a ressurreição final e o juízo. Não existe período de espera, pois a espera implica tempo, e para além da morte o tempo não tem nenhum sentido. Segundo nosso próprio ponto de vista temporal, podemos falar dos mortos como estando dormindo, e então dizer, como Lutero, que para a pessoa em sono profundo a passagem de séculos é um instante apenas. Podemos mesmo dizer que os crentes finados estão no lar com o Senhor, no sentido de que são passadas suas lutas e sua espera, e eles alcançaram seu alvo final. — Id., pp. 96 e 97. (*)
Uma alternativa é a de que a sorte dos ímpios não seja nem a redenção final nem o tormento eterno, mas simplesmente o aniquilamento. A morte eterna conformar-se-ia com a conotação neotestamentária da morte em geral, apoleia, destruição. Os proponentes deste ponto de vista alegam que a idéia do castigo eterno se baseia no conceito platônico da inerente indestrutibilidade da alma e de que o raciocínio empregado para confutá-lo se aplica aqui também. Nesta base, a natureza de Deus também se apresenta reivindicada. — Id., p. 107.
Quando Cristo, então, no final, destruir “todo o império, e toda a potestade e força”, Ele erradicará todo vestígio de oposição a Deus, seja humano ou super-humano. Este ponto de vista, diferente da restauração universal, preserva o juízo duplo ensinado nas Escrituras. E ser completamente separado de Deus, a fonte da vida, parece logicamente implicar a não-existência. Esse declínio para o nada, de todas as esperanças e valores da vida, toma a perdição uma terrível realidade, mesmo sem o aspecto do prolongado tormento. — Id., p. 108.
A esperança do cristão ao morrer não está no poder do homem de desafiar a morte, mas sim no poder de Deus de ressuscitar da morte o homem. A morte é real e o homem não tem a capacidade inerente de saltar por sobre a sepultura para outra existência. — Id., p. 111.
O significado último da vitória de Cristo sobre a morte tornar-se-á manifesto na ressurreição dos mortos. – Id., p. 112.
DR. D. R. G. OWEN, professor de conhecimento religioso, Trinity College; conferencista sobre filosofia e religião, Wycliffe College, Toronto, Canadá.
Body and Soul (Corpo e Alma), 1956.
(*) Posterionnente o Dr. Kantonen mudou seu ponto de vista, concordando com Walter Kuenneth (Theologie der Auferstehung), em que os mortos não são inexistentes. (Ver p. 39.)
Os pontos em tela giram em torno dos conceitos de “corpo” e “alma”. A antropologia “religiosa” [encontra distinção à bíblica] adota um extremo dualismo, afirmando que o corpo e a alma são duas substâncias diferentes e distintas. Alega que a alma seja divina na origem e imortal por natureza, e que o corpo corruptível seja a fonte de todo o pecado e impiedade. Recomenda o cultivo da alma independente do corpo, e defende a supressão de todos os apetites físicos e impulsos naturais. Considera o corpo como túmulo ou prisão da alma, prisão da qual ela anela libertar-se. Afinal, tende a supor que a alma, mesmo em sua existência na Terra, é inteiramente independente do corpo e assim goza um livre arbítrio desimpedido pelas leis que regem os domínios físicos. — Body anã Soul, p. 26. (Copyright 1956, por U. L. Jenkins, The Westminster Press.)
Se consultarmos a Bíblia, como o faremos depois, porém, veremos que há grande diferença no ponto de vista quanto ao homem. Aí não há dualismo, e dificilmente qualquer idéia da imortalidade de uma alma distinta e independente. — Id., p. 29.
Platão permanece até ao fim um dualista antifí-sico. Ele e seus seguidores são os maiores responsáveis pela imposição da antropologia “religiosa” ao pensamento ocidental. — Id., p. 41.
Esta última crença, especialmente — a idéia de que a alma pode subsistir sem o corpo — implica obviamente alguma forma de dualismo corpo-alma. (…) Este dualismo corpo-alma era uma implicação necessária da doutrina grega da imortalidade da alma. — Id., p. 59.
Ora, há algumas poucas passagens escriturísticas isoladas que podem sugerir a idéia da imortalidade da alma no sentido grego, mas o ponto de vista normal bíblico é bem diverso: No Novo Testamento é a ressurreição do corpo que é acentuada, e esta doutrina é quase uma contradição direta da escatologia “órfica”. Por que, então se inclinavam os pais para essa noção em grande parte anti-bíblica? – Ibid.
Fato é que a adoção, por parte dos Pais da idéia “religiosa” da imortalidade da alma separada do corpo forçou-os a adotar a doutrina do dualismo corpo-alma. — Id., p. 61.
A idéia do estado intermediário afinal se tornou na doutrina do purgatório. — Ibid.
Os Pais sem dúvida foram impressionados pela força do argumento apresentado pela filosofia grega para provar a imortalidade da alma. E afinal, naturalmente, a idéia de um estado intermediário deu ao ser humano outra oportunidade de ser purificado de seus pecados antes do último juízo. Foi o desenvolvimento dessa noção que levou à doutrina do purgatório, com todas as superstições e práticas objetáveis que afinal constituíram o sistema purgatorial e, em última análise, forneceram parte da imediata causa da Reforma. — Id., p. 62.
A antropologia resultante dos ensinos dos Pais da Igreja era uma mistura de idéias bíblicas e gregas. Acrescentaram à idéia neotestamentária da ressurreição do corpo, a idéia de um estado intermediário no qual a alma existe à parte do corpo, aguardando sua recuperação no fim. — Id., p. 77.
A antropologia “religiosa”, no que concerne ao pensamento do Ocidente, é de origem grega, e não bíblica. É também típica das religiões orientais em geral, tais como o induísmo e o budismo. Parece ser caracteristicamente “religiosa”, e por esta e outras razões tem-se inclinado a insinuar-se no ponto de vista cristão acerca do homem, corrompendo-o. Isto, como vimos, aconteceu nos períodos patrístico e medieval, e o catolicismo e protestantismo modernos têm-se inclinado a perpetuar este erro primitivo. — Id., p. 163.
O ponto de vista bíblico acerca do homem é inteiramente diverso do “religioso”. — Id., p. 164.
A idéia da imortalidade da alma no sentido grego pode ser sugerido em algumas passagens da literatura erudita e é positivamente encontrada em certos trechos dos apócrifos. Esta linha de pensamento desenvolveu-se mais tarde no judaísmo helenístico da Escola Alexandrina, no período inter-testamentário, do qual o filósofo religioso Plínio é o máximo exemplo. — Id., p. 178.
Estes são alguns exemplos da legião de defensores da imortalidade condicional, ou vida unicamente em Cristo, e da destruição final dos pecadores impenitentes.