Como Considera Deus o aborto? Deve a Igreja tomar uma posição? Que princípios estão envolvidos? Podeis não concordar, mas sereis incentivados.
Tem aparecido, em publicações adventistas, Certo número de artigos e editoriais sobre o aborto. Algumas delas têm alegado que uma vez que a Bíblia não diz nada de definido quanto ao aborto facultativo, a Igreja deveria deixar o assunto para a esfera da consciência individual, em lugar de tomar uma posição sobre ele. Alguns artigos têm apelado para a liberdade e tolerância religiosa nessa questão, aparentemente baseados em que nada de completo se acha envolvido. Essa contribuição não tem a pretensão de ser a palavra final nesse delicado assunto, mas a apresentamos como parte do diálogo que prossegue quando pesquisamos juntos para Deus.
As Escrituras contêm princípios relevantes para essa decisão. Se estes princípios forem claros e bem compreendidos, então não é preciso que as regras específicas decorrentes desses princípios sejam explicitamente estabelecidas nas Escrituras a fim de entender a instrução de Deus. Consideremos o aborto dentro dos parâmetros dos seguintes grandes temas ou proposições. Embora uma ou mais dessas proposições talvez não sejam tão persuasivas quando tomadas separadamente, a combinação de seu peso pode ser capaz de iluminar-nos quanto ao que constitui a vontade de Deus nessa delicada área.
1. A proposição da conformidade com a Escritura.
Tem-se apresentado o argumento de que não sabemos bastante a respeito de antropologia bíblica para definir as sutilezas de quando começa a vida. Consideramos nossa teologia na vanguarda do conceito cristão acerca do que ocorre quando a vida termina. É lógico, portanto, argumentar que a revelação divina foi insuficiente para esclarecer-nos a respeito de quando começa a vida? Dizer isto é, em última análise, caluniar o próprio Deus, pois como poderia Ele deixar-nos em escuridão tal, que fôssemos incapazes de fazer escolhas sábias que envolvem a vida e a morte?
2. Duas proposições baseadas no caráter de Deus
a. A proposição do aborto cósmico
Que fazemos quando as coisas vão mal e nos deparamos com a possibilidade ou probabilidade de opróbio, aflição e sofrimento por causa de ocorrências passadas? Deus criou o mundo, mas este se tornou mau. A perspectiva, a longo prazo, era desonra, difamação de Seu nome, sofrimento, a morte de Seu Filho e a separação do Filho, do Pai. O Senhor do Universo poderia ter apelado para o aborto cósmico. Podia ter abortado a família humana, ainda que tivesse decorrido pouco tempo desde o começo da raça. Ele poderia ter banido Adão e Eva e começado de novo. Dizemos que Ele poderia ter, mas na realidade Ele não poderia, pois isto não condiz com Seu caráter. Ele não fez uso do aborto cósmico, mas do sacrifício cósmico.
b. A proposição do amor ágape
A característica fundamental de Deus, como é apresentada na Bíblia, é o amor, o amor que se sacrifica. O novo mandamento dado por Cristo é “que vos ameis uns aos outros; como Eu vos amei a vós” (S. João 13:34). Deveríamos tratar o nascituro, menino ou menina, como Deus o trata. Ele deseja que Seu amor seja comunicado por nosso intermédio. Mais do que isto, a maneira como tratamos a criança em gestação é a maneira como deveríamos tratar a Jesus. “Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes Meus pequeninos irmãos, a Mim o fizestes” (S. Mat. 25:40).
3. A proposição da criação
Do ponto de vista universal cristão, Deus é visto como Criador absoluto. Os seres humanos que “criam” a vida o fazem apenas como privilégio delegado por Deus. O aborto tem sentido, dentro do contexto de um ponto de vista universal materialista ou evolucionista, cuja filosofia nega a Deus como supremo Criador e acredita que o mais forte pode sacrificar o mais fraco.
4. A proposição da criatividade
Se as relações sexuais, a concepção e a gravidez estão entre as atividades mais criativas em que o homem e a mulher podem tomar parte, então o que isto revela com relação ao aborto? Se uma dimensão é a síntese da criatividade, então a outra deve representar a síntese da destruição.
5. A proposição da redenção
A criança em gestação foi redimida pelo sacrifício de Cristo no Calvário. É a morte a recompensa cristã que deve ser dada ao comprado pelo sangue de Cristo? (Teologicamente, cremos que o bebê no ventre materno já foi redimido. Alguns podem discordar. A estes poderíamos dirigir nossa proposição: O nascituro é redimível.)
6. A proposição da soberania de Deus
A imprensa secular tem feito todo o assunto do aborto centralizar-se no direito da mãe versus o direito da criança em gestação. Refletindo mais demoradamente, porém, vemos que esse ponto de vista gira em torno dos direitos humanos de dois grupos. Nenhuma dimensão divina é mencionada até aqui. Que dizer, porém, dos direitos de Deus? Não possui Ele direitos inalienáveis além de Suas relações com Suas criaturas?
Alguns podem achar que a mulher tem o direito de fazer o que desejar com seu próprio corpo. A Bíblia responde: “Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai pois a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus” (I Cor. 6:19 e 20). A humanidade frágil pode pensar que conhece toda a situação, quando há apenas Alguém que realmente sabe, que é o próprio Deus. Devemos usurpar a divina prerrogativa da vida e da morte? Pela virtude de que conhecimento “perfeito” podemos assumir essa responsabilidade?
7. A proposição da prioridade da reverência pela vida sobre a liberdade de escolha
O poder de escolha é concedido por Deus e, certamente, de grande importância. Contudo, esse princípio não existe no Universo em solitário explendor. Existem outros princípios universais. Temos aqui o exemplo clássico de um dilema moral. Dois princípios universais opõem-se um ao outro. Nesse caso, a liberdade de escolha deve ceder lugar, porque sua esfera não é absoluta e seu propósito concedido por Deus jamais foi que tenhamos a opção de tirar a vida de um indivíduo que não praticou nenhum ato contra Deus ou o homem. Dizemos que o respeito para com a santidade da vida é de maior importância do que a liberdade de escolha. Contudo, o destino do escolhedor está em jogo. A Bíblia diz: “Os céus e a Terra tomo hoje por testemunhas contra vós, que te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua semente” (Deut. 30:19). Afinal, a liberdade que Deus nos concede como legítimo direito não é a liberdade para tirar a vida inocente, mas para escolhermos quem será nosso senhor, Cristo ou o maligno.
8. A proposição da característica de adventista do sétimo dia
Afirmamos que o aborto facultativo viola os fundamentos da fé de qualquer comunidade religiosa bíblica, mas ele é grave de modo especial com relação aos adventistas do sétimo dia. A aquiescência ao aborto solapa dois pilares da teologia que nos distinguem: 1) Nega a essência do sábado e 2) leva-nos a uma posição ambígua quanto à doutrina da natureza do homem.
Iniciemos pela segunda questão. Muitas religiões afirmam que numa ocasião não determinada a alma “infunde” o feto. Assim, talvez no segundo trimestre (ou em qualquer outra época) o feto, que até esse instante era basicamente animal, é cheio de uma entidade divina que o torna verdadeiramente humano e na imagem de Deus. A mesma lógica alega que essa entidade deixa o corpo, por ocasião da morte, e flutua em sua existência eterna com Deus ou vai para o fogo eterno. Os adventistas crêem que “o homem é indivisível”. Por isso, essa divindade que se desenvolve está presente desde a concepção, e o aborto é a destruição dessa divindade, e um crime contra o próprio Criador.
O sábado encontra o seu significado no reconhecimento de Deus como Criador. A observância do sétimo dia no contexto das três mensagens angélicas de Apoc. 14:6-12, baseia-se no reconhecimento do poder de criar dAquele que fez o Céu e a Terra. Ao mesmo tempo em que o aborto nega a soberania e poder criador de Deus sobre uma de Suas criaturas, está negando a essência do sábado.
Podemos, como cristãos, permitir-nos ser neutros com relação a uma prática que tem sua origem e desenvolvimento histórico em culturas pagãs, e que encontra sua justificativa em um ponto de vista mundano que nega o criacionismo de Deus?
Concluímos estes pensamentos com uma deferência aos errantes, em favor de uma atitude redentora. Há entre nós aqueles que têm praticado o aborto. A misericórdia de Deus é grande. Ele nos perdoa por amor a Cristo. Um sério problema em nossa Igreja é que muitas vezes é mais socialmente aceitável praticar um aborto do que ser uma mãe-solteira. Para divulgar isso, nossas igrejas e associações deveriam dedicar-se ao assunto e buscar alternativas. Os membros solícitos deveriam deixar suas próprias ocupações e dedicar-se à vida dos outros. Com corações ternos, devemos ir àqueles que estão em dificuldade, demonstrando-lhes amor e aceitação, bem como lhes proporcionando ajuda prática. Talvez alguns possam oferecer suas próprias casas a uma mãe-solteira. Quem sabe, necessitemos de lares especialmente fundados e providos de pessoal adequado, com essa finalidade, e localizados estrategicamente. Por certo, são necessários conselheiros cuidadosos para ajudar tanto ao pai como a mãe, da mesma forma que outros familiares, a trabalharem pelos seus sentimentos e a tomarem a decisão necessária, seja em favor do casamento, adoção, paternidade única ou a colocação do bebê na casa de um parente próximo da família. Programas que provejam aconselhamento, apoio moral e compreensão, bem como cuidado médico e legal, merecem nosso apoio e encorajamento.
Estamos no mundo, mas nossa conduta não deve ser do mundo. Olhemos de maneira devota para os dilemas éticos que estão diante de nós, e estejamos certos de que nossa posição se baseia no peso da evidência dos grandes temas bíblicos.
JOHN E MILLIE YOUNGBERG, da Escola de Educação da Universidade de Andrews