Os adventistas do sétimo dia, devido a sua insistência sôbre a perpetuidade da lei de Deus, e em especial do sábado do sétimo dia, são muitas vêzes acusados, direta ou indiretamente, de manter e ensinar a heresia dos gálatas, contra a qual Paulo escreveu tão vigorosamente. Uma declaração típica aparece num livro recente, o qual, por curioso que pareça, é bastante recomendado por alguns ex-adventistas. Escreve o autor:

“Esta é, portanto, a doutrina adventista da salvação. Ela ensina que somos perdoados sòmente pela graça, mas depois revela que o perdão é apenas provisório, dependendo de nossa subseqüente atitude correta — o que é galacianismo.” 

A Gravidade do Problema na Galácia

Perguntamos a nós mesmos se o que êsse autor diz ser a heresia dos gálatas é realmente essa heresia. Interpretou êle corretamente os fatos históricos? Que sucedeu na Galácia para motivar a escrita de uma carta em têrmos tão fortes? Não é comum escreverem os pastôres a suas congregações, chamando-as de “insensatas.” Qualquer que fôsse essa nova crença, ela estava errada — consistia num “evangelho” diferente do que fôra pregado por Paulo (Gál. 1:6). Era um caso de completa apostasia doutrinária. O mundanismo e as normas baixas são bastante prejudiciais na igreja, como aconteceu em Corinto, mas a apostasia doutrinária não sòmente exerce um efeito nocivo sôbre os membros, mas dilacera o próprio fundamento sôbre que se baseia o evangelho e produz deletéria forma de paganismo, devido a achar-se às vêzes tão próxima da verdade. Por isso afirma Paulo: “Não que exista outro evangelho, mas há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo” (Gál. 1:7). Não resta dúvida de que havia um sério problema na igreja dos gálatas; perguntamos, porém: Consistia êsse problema naquilo que o Sr. Douty diz que êle era?

A Questão Era a Obediência a Deus?

A declaração do autor: “… o perdão é apenas provisório, dependendo de nossa subseqüente atitude correta — o que é galacianismo” baseia-se evidentemente sôbre a crença na doutrina da eterna segurança, comumente denominada “Uma vez salvo, salvo para sempre,” e parece indicar que Deus não leva em conta, no juízo, a conduta diária. Na realidade, todo o capítulo em que aparece aquela declaração, deixa transparecer uma tentativa para provar êsse pormenor; tanto do ponto de vista do calvinismo como do arminianismo.

Na página 70 o autor salienta que os arminianos são “tão enfáticos quanto os calvinistas em ensinar que no momento em que o pecador se arrepende e crê, êle possui o perdão incondicional de seus pecados passados e a fruição imediata da vida eterna.” Acrescenta então: “Êles não crêem que o perdão e a vida eterna dependam do procedimento futuro, embora acreditem que a má conduta futura resultará na perda de bênçãos já desfrutadas.” Seja qual fôr o significado desta declaração bastante confusa, o autor parece indicar que a vida eterna não depende da conduta futura, mas que o mau procedimento futuro será punido. Qual é a diferença?

Entretanto, a questão da obediência a Deus como resultado da salvação não era o ponto controverso na Galácia. Diz o próprio apóstolo Paulo:

“Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade: porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne. … Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito.” Gál. 5:13 e 25.

Êstes versículos só podem significar que a salvação deve produzir uma modificação na vida. O cristão não vive da mesma maneira que o pecador. Em parte alguma da Bíblia se ensina que a salvação isenta o homem do dever de obedecer a Deus. Tampouco constitui legalismo manter êsse ponto de vista. O que a Bíblia ensina é que a salvação pela fé habilita a pessoa, a fim de que pela graça e o poder de Deus em sua vida, consiga obedecer. Declarar que o indivíduo que experimentou o nôvo nascimento está livre do dever de prestar obediência, é contradizer o que Paulo afirmou. A questão da obediência não era a dificuldade na Galácia.

Qual Era o Problema na Galácia?

Na página 68 do livro em consideração, o Sr. Douty escreve que o galacianismo é “a doutrina de que não obstante o que Cristo tenha feito por nós, a salvação depende, em parte, de nossas boas obras.” Isto aproxima-se mais da verdade, mas ainda está apenas meio certo. Os gálatas não confiavam sòmente em suas próprias obras, mas introduziram outro sistema de salvação em lugar do que Deus lhes revelara por meio de Paulo. Das palavras introdutórias do livro, ressalta que os crentes gálatas haviam alterado radicalmente suas idéias a respeito de como obtinham a salvação, substituindo o sistema de salvação por intermédio da graça de Deus, pela lei, especialmente a lei cerimonial e um judaísmo apostatado.

“Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo, para outro evangelho; o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo.” Gál. 1:6 e 7.

Comenta Ellen G. White:

“Através da influência de falsos ensinadores que se tinham levantado entre os crentes em Jerusalém, a divisão, heresia e sensualismo estavam rapidamente ganhando terreno entre os crentes na Galácia. Êsses falsos ensinadores estavam misturando tradições judaicas com as verdades do evangelho. Desconsiderando a decisão do concilio geral de Jerusalém, impuseram aos crentes gentios a observância da lei cerimonial. . . .

“Cristo, o verdadeiro fundamento da fé, fôra virtualmente renunciado pelas obsoletas cerimônias do judaísmo.” 

Que ninguém pode salvar-se por quaisquer obras que tenha realizado é uma das mais claras verdades da Bíblia, mas ensinar que a pessoa pode transgredir a lei moral e fazer o que lhe apraz, é ensinar o antinomismo — uma doutrina que não se encontra na Bíblia. Uma coisa é dizer que o homem se salva por meio da lei moral ou cerimonial, como afirmavam os judaizantes; e outra bem diferente, é declarar que o recebimento da graça de Deus e a fé em Jesus habilitam a pessoa a obedecer, conforme ensinam os adventistas do sétimo dia. Paulo emprega os capítulos cinco e seis de Gálatas para salientar exatamente isso — que o nôvo nascimento e a recepção do Espírito produzem na vida diária os frutos do Espírito. A liberdade cristã jamais será liberdade para pecar; ela é libertação do pecado pela duradoura presença de Cristo na vida.

Contràriamente ao que declara o Sr. Douty, os adventistas do sétimo dia não ensinam que obter a salvação dependa de alcançar perfeição de caráter. Ensinamos que a graça de Cristo continua operando em nós após a justificação, e produz progresso diário em direção à maturidade cristã. Por si próprio, o indivíduo não pode atingir qualquer espécie de perfeição. Essa era a heresia dos gálatas — a tentativa de alcançar a salvação sem Cristo. “Se a justiça (justificação, na R. S. V.) é mediante a lei, segue-se que morreu Cristo em vão.” Gál. 2:21.

Infelizmente, talvez alguns adventistas do sétimo dia não compreendam nossa verdadeira posição, e como resultado tenhamos às vêzes dado a impressão de que sejamos salvos por observar o sábado. O melhor argumento contra afirmações errôneas a respeito de nossas crenças, como a que consideramos neste artigo, é a manifestação dos frutos do Espírito em nossa vida diária.