O Pastor Márcio Dias Guarda nasceu e se criou em Mogi Mi­rim, SP. Filho de um pequeno comerciante e líder da comunidade local, cresceu assistin­do às discussões sobre política e religião, quase diárias, ali na casa de comércio. Em casa, havia bons livros, muitos jornais e revistas, entre as quais O Atalaia e Seleções. Nesse ambiente, adqui­riu cedo o gosto pela leitura e estudos.

Após concluir o teológico, em 1971, trabalhou no Rio Grande do Sul. O começo foi numa série de conferências em Santa Rosa, quase divisa com a Argentina. Seguiram-se pastorados em Taquara, Ijuí e Porto Alegre, durante sete anos, tendo sido ordenado ao final do quarto ano. Depois de um pastorado de dois anos na região da zona leste de São Paulo, veio para a Casa Publicadora.

Fez o mestrado em Teologia com a primeira turma do SALT, tendo concluído no verão de 1983/84. No final de 1985, con­cluiu o bacharelado em Jornalismo, na Uni­versidade Metodista, em São Bernardo do Campo, SP.

Casado com Evani Marquart da Costa, tem dois filhos.

MINISTÉRIO: Quando e em que circuns­tâncias sentiu-se chamado para ser um pastor?

PASTOR MÁRCIO: Meu pai era um juve­nil, quando o Pastor Jerônimo Garcia diri­giu uma série de con­ferências em Mogi Mirim, na década de vinte. Desde esse tempo, ficou convicto de que a igreja verda­deira era a Adventista. Tornou-se um estudioso solitário da Bíblia e assinante da revista O Atalaia. Mas só em 1963, com uma série de conferências pelo Pastor Amoldo Anniehs, a igreja se es­tabeleceu em nossa cidade e nos tomamos adventistas. Eu tinha apenas 14 anos, mas comecei imediatamente a pregar. Era também o líder dos jovens e professor de uma classe da Escola Sabatina. Fazia tudo isso com gosto e dedicação. Nesse clima, não foi difícil nem traumático, anos mais tarde, abandonar a idéia de ser um engenheiro ou professor e ir fazer teologia.

MINISTÉRIO: Qual o momento mais feliz do seu ministério pastoral?

PASTOR MÁRCIO: É difícil tentar ele­ger “um momento mais feliz”. A felicidade de um pastor é feita de pequenos e freqüen­tes milagres, mais do que diários. Por exemplo: Assumir o primeiro distrito e poucos dias depois iniciar uma série de conferências que fora planejada pelo pastor anterior, dei­xando inclusive o salão alugado e obreiro bíblico contratado. O batismo desse primeiro grupo de conversos em São Francisco de Paula, RS, foi uma vitória.

Outra ocasião agradável: Vestir todos os alunos com um coletinho novo vermelho e boné, sem custo para a escola, e fazê-los desfilar no 7 de setembro como um pelotão que lembrava um avião (era o centenário do nascimento de Santos Dumont) chamando a atenção de toda a cidade.

Só mais uma: Descobrir que um daqueles rapazes de temperamento difícil na igreja é hoje um pastor de sucesso. Isso me aconteceu mais de uma vez.

MINISTÉRIO: E o mais triste?

PASTOR MÁRCIO: Não consigo lembrar nenhum que valha a pena mencionar.

MINISTÉRIO: Como nasceu o redator Márcio Dias Guarda?

O jornalista se parece, muitas vezes, com um profeta, que passa a conhecer uma informação e deve transmiti-la ao povo.

PASTOR MÁRCIO: Sempre gostei de ler e de escrever. Isso não é nada especial; deveria ser natural em todas as pessoas, pois são formas de comunicação muito úteis. Sempre tentei utilizar a imprensa local para publicar notícias e reportagens sobre a igreja e artigos religiosos. De vez em quando, mandava algum artigo para a Publicadora também. Quando surgiu o interesse da Publicadora em me chamar para a Redação, dizia que “tinha pena de quem tinha que viver da pena”. Anos depois, veio o chamado e eu o aceitei como um desafio. Hoje, tenho convicção de que Deus guiou tudo pelos melhores caminhos. Gosto muito deste trabalho e acho que posso honrar a Deus através dele.

MINISTÉRIO: Sobre que temas, especialmente, gosta de escrever?

PASTOR MÁRCIO: O escritor escreve sobre o que gosta, mas o jornalista (que se parece muito mais com o pastor do que um escritor) é um comunicador social, portanto escreve sobre o que o seu público precisa saber, e até acaba gostando do que escreve!

Se for bem versátil, possuir boas fontes de informação e conhecer as necessidades do seu público, um jornalista pode escrever sobre quase qualquer assunto, da mesma forma que um pastor quase pode pregar sobre qualquer tema.

Assim, vibro escrevendo sobre temas teológicos, contando histórias para crianças, desafiando jovens a se prepararem melhor para a vida, mas gosto também de fazer uma reportagem sobre a inauguração de uma nova igreja e até de criar uma frase curiosa, comunicativa, com uma pitada de humor, para uma propaganda.

MINISTÉRIO: Não há muitos livros, nem artigos freqüentes em nossas revistas, escritos por redatores locais. Em que consiste o trabalho de um redator da CASA?

PASTOR MÁRCIO: É… Gastamos 90% do tempo corrigindo e melhorando textos dos outros, e muito pouco escrevendo os nossos próprios. Bom para eles, não tanto para nós. Em geral, demora mais corrigir um texto do que se a gente escrevesse outro, do mesmo tamanho, sobre o assunto. Veja como é altruísta nosso trabalho! Faz até lembrar João 3:30!

Nem todos os jornalistas são redatores; alguns são repórteres, outros são editores, e há outras funções. Mas aqui na Casa Publicadora não há essa divisão de funções; todos fazemos um pouco de tudo, e a produção criativa acaba sendo menor do que todos gostaríamos de ter. Para a maioria de nós, as idéias estão lá, reprimidas, querendo sair da mente para o papel, esperando apenas um desafio ou oportunidade.

MINISTÉRIO: Planeja escrever algum livro?

PASTOR MÁRCIO: Sim. Mais de um. Mas não adianta falar sobre planos.

MINISTÉRIO: Recentemente o senhor participou de um congresso mundial de redatores. Qual a importância desse encontro para a Obra de Publicações, e para o senhor em particular?

PASTOR MÁRCIO: O Congresso Mundial de Redatores Adventistas foi realizado em Frankfurt, Alemanha, de 11 a 17 de outubro do ano passado. Estiveram presentes cerca de 70 redatores, representando quase todas as editoras adventistas do mundo. Foi uma oportunidade para trocar experiências sobre questões variadas como: métodos para descobrir novos escritores, fontes de informações (princípalmente os novos bancos de dados informatizados), co-edições entre duas ou mais editoras adventistas, como escrever de maneira interessante para as mentes secularizadas, o manejo de temas polêmicos, etc.

Foi uma excelente oportunidade para aprender muitas coisas e também para informar sobre as soluções praticadas aqui no Brasil, já que a nossa está entre as três maiores editoras adventistas.

MINISTÉRIO: Como deve situar-se o redator em relação à igreja e à liderança da Obra?

Escrever é uma atividade solitária, difícil, freqüentemente não apreciada. Mas é um ministério tremendamente importante.

PASTOR MÁRCIO: Esse foi exatamente um tema discutido no Congresso de Frankfurt. O jornalista se parece, muitas vezes, com um profeta, que passa a conhecer uma informação e deve transmiti-la ao povo. Depois de assegurar-se de que a informação é verdadeira e de que o público necessita recebê-la, sobra-lhe o problema crucial: como expressá-la de forma adequada, já que, algumas vezes, essa verdade pode ameaçar a liderança dominante, e outras vezes pode alarmar desnecessariamente a massa. Até Cristo, que sempre enfrentou essa situação com maestria, sofreu algumas conseqüências. Portanto, é de se esperar que até o comunicador adventista, vez ou outra, tenha diante de si esse conflito de interesses, o qual terá de administrar com a ajuda divina e uma boa dose de prudência.

MINISTÉRIO: Não estando em contato direto com as pessoas, como um redator mantém aceso o seu amor pelas almas e o sentido de missão?

PASTOR MÁRCIO: O redator adventista é geralmente um pastor experiente, que se mantém ativo na igreja, pregando e participando de toda a programação; vez ou outra é convidado a dirigir semanas de oração ou participar de outras reuniões fora da igreja local. Mas é princípalmente pelas cartas que recebe dos leitores que ele pode medir a repercussão dos seus textos. Cada carta vale por milhares de leitores que pensaram da mesma forma, mas não tiveram a iniciativa de escrever. Doutro lado, um pouco mais de informações sobre o movimento ministerial e a chance de assistir a pelo menos um concilio por ano com os demais pastores, seria também saudável. Eu, pelo menos, acho falta daqueles maços de circulares que recebia quando estava no campo!

MINISTÉRIO: Geralmente um pastor diz que o momento mais significativo de seu trabalho é quando batiza alguém. E, quanto ao redator, qual a atividade que produz um maior sentido de realização pessoal?

PASTOR MÁRCIO: A mesma coisa. O redator fica feliz quando vê o seu trabalho realizado (quando o seu texto sai numa revista com grande tiragem) da mesma forma que o pastor quando faz uma conferência evangelística para um grande auditório. E uma bela semeadura. O crescimento e a colheita, num caso e noutro, é obra do Espírito Santo. Portanto, o redator também fica feliz quando descobre que o pastor batizou alguém que fora impressionado pelo seu texto. Mas tem a consciência de que trabalhando com semeadura em muito maior escala que um pastor não tem como acompanhar a sega. Acho que as maiores surpresas estão reservadas, tanto para o pastor como para o redator, lá no Céu. Os resultados hoje perceptíveis não passam de amostras.

MINISTÉRIO: Se tivesse de assumir novamente um distrito, com a visão adquirida como redator, o que faria diferente do que fez anteriormente?

PASTOR MÁRCIO: Eu já usava, naquela época, os meios de comunicação; agora, usaria muito mais e melhor. Estou convencido de que (fazendo um trocadilho com a conhecida frase de E. G. White) serão, cada vez mais, “a chave nas mãos da fé para abrir os corações”. Especialmente a imprensa secular (que tem maior penetração e credibilidade que a denominacional) está aí disponível para publicar (de graça!) bons textos de autores cristãos. Dou um exemplo: quando saiu um texto meu no jornal O Estado de S. Paulo, faz alguns anos, sua mensagem foi lida por nada menos que Seiscentas mil pessoas. De que outra maneira poderia ter pregado a mesma mensagem a tantas pessoas?

MINISTÉRIO: Como vê o adventismo, 150 anos após o seu surgimento?

PASTOR MÁRCIO: Com gratidão, porque me atingiu também com a mensagem salvadora, assim como a milhões nesses 150 anos. Vejo também com alguma preocupação pela dificuldade de coordenar uma ação evangelizadora mais abarcante. Vejo ainda como um enorme potencial que deve liberar toda a sua energia quando aprender a usar os recursos atuais da comunicação sob o poder do Espírito Santo.

MINISTÉRIO: Pelo menos um historiador denominacional argumentou que os grandes movimentos tradicionais enveredaram pelo secularismo, após 150 anos de existência. Isso traz alguma preocupação?

PASTOR MÁRCIO: Sem dúvida, e até acho que começamos a enveredar pelo secularismo antes de completar 150 anos. Reverter essa tendência, só por um milagre do Espírito Santo. E é esse milagre que devemos permitir, primeiro individualmente em nossa vida, depois, como organização. Quanto mais demorar esse epílogo, mais temerário e doloroso.

MINISTÉRIO: Como avalia o Projeto Missão Global?

PASTOR MÁRCIO: Abracei-o com muita esperança, tenho acompanhado alguns relatórios, mas não estou sentindo seus efeitos em nível de igreja local. Gostaria que alguém dissesse que estou enganado.

MINISTÉRIO: A Colportagem continua plenamente identificada com a missão evangelizadora?

PASTOR MÁRCIO: Não me arriscaria a afirmar que não. Mas é preocupante notar que a média de vendas, em todo o Brasil, não chega a 300 mil volumes por ano, se computarmos os últimos sete anos, que são os últimos dados que tenho em mãos. Como são 30 milhões de lares no Brasil, a Colportagem teria que ser cem vezes mais eficiente para colocar um livro adventista, por ano, em cada lar. Outro problema é a proporção crescente dos livros não-religiosos nesse montante. Não se vende mais O Grande Conflito e Vida de Jesus como antigamente.

MINISTÉRIO: Que mensagem gostaria de dar aos leitores de MINISTÉRIO?

PASTOR MÁRCIO: Quero apenas recordar a frase de Ellen G. White em Evangelismo, pág. 161: “Há grande necessidade de homens capazes de servir da imprensa com o melhor proveito, para que à verdade sejam dadas asas que a levem depressa a toda nação, e língua e povo.”

E um pensamento do Pastor Robert Pierson (que, quando presidente da Associação Geral, além de livros, escrevia artigos até para os boletins das Associações e Missões): “A imprensa é o púlpito mais elevado do mundo. Por ela se pode chegar a muitíssima gente. Por outro lado, a palavra escrita está investida de uma autoridade que a palavra falada não tem.”

O ministério da escrita não tem a animação dos cultos religiosos. Não há um suave coral por detrás do escritor, nem nenhum símbolo cristão sobre a máquina de escrever, nem vitrais coloridos no seu escritório. Também não acontece o desfile de ouvintes solícitos que chegam às oito em ponto com um elogio: “Mas que belo artigo, esse de hoje!”

Escrever é uma atividade solitária, difícil, freqüentemente não apreciada. É mais fácil qualificar alguém como embaixador de Cristo quando está atrás de um púlpito pregando ou na calada da noite aconselhando a um casal em vias de separação do que quando está assentado a uma escrivaninha procurando a palavra certa, refazendo um parágrafo ou piedosamente chocado pela situação do mundo. Mas escrever é um ministério, e tremendamente importante. – Donald Yost, Writing for Adventist Magazines, págs. 20 e 21.