Apesar das lutas, nenhuma atividade é mais compensadora do que o pastorado

Meu dia de trabalho tinha começado às 7h, e eu ainda estava trabalhando às 22h. Encontrava-me no automóvel conversando com um membro da igreja, no estacionamento da sua residência, a cerca de 30 quilômetros da minha casa. Naquela noite, estivemos juntos em nosso pequeno grupo. Felizmente, a reunião incluiu um lanche, do contrário, eu ainda estaria sem comer.

Poucos meses antes, participamos de um projeto missionário de construção, na Ásia. Ali, enfrentamos mosquitos, desafios do idioma, alimentos com risco de doenças para nosso estômago, e práticas culturais diferentes do nosso estilo de vida. Apesar de tudo, agradeci a Deus a oportunidade de trabalhar com esse valoroso irmão. Alegrei-me com sua benevolência cristã demonstrada a toda pessoa em qualquer circunstância. Como construtor, ele empregou naquele ministério seu tempo, energia e habilidade.

Nossa conversa girava em torno de um acidente que alterou a sua vida, roubando-lhe boa porcentagem de sua capacidade visual. Foi uma daquelas experiências que nos levam a perguntar: “Por quê?” Meu amigo foi súbita e traumaticamente confrontado com um obstáculo físico que o afastou de sua profissão.

Primeiramente, ele lutou com todas as perguntas costumeiras. Mas, sua fé em Deus o reorientou admiravelmente. Agora, ele estava confiante em que Deus queria ensiná-lo, através da tragédia, como usar a perda para a Sua glória. Meu coração agonizou e, ao mesmo tempo, se alegrou por ele. Quando estávamos terminando a conversa, ele me perguntou como eu estava indo.

“Eu?”, respondí. “Oh, sim, vou bem, obrigado! A semana está agitada, mas Deus é bom.” Ele então continuou: “Deve ser muito difícil ser pastor. Nossa igreja tem enfrentado tantas tragédias ultimamente, e você está presente em todas elas. Como consegue manejar tudo isto e ainda ter alguma coisa para dar à próxima pessoa?”

Num relance, passou em minha mente tudo que exigiu minha atenção justamente naqueles últimos quatro dias. Estávamos na quarta-feira à noite, e eu já tinha trabalhado 50 horas. Respondi-lhe: “Deus me chamou para este trabalho e, em sua maior parte, eu realmente o desfruto. Ainda estou aprendendo como orar incessantemente e confiar em Deus, para obter a sabedoria e a força necessárias para cada momento. Ele é o Pastor e eu sou apenas Seu subpastor.”

Ao nos despedirmos, meu amigo disse: “Estarei orando para que o restante de sua semana seja calmo.”

Desafios pastorais

Dirigindo de volta para casa, cansado, sonolento, e ansioso para rever minha família, pensei mais um pouco sobre o que significa ser pastor.

Primeiramente, cada semana a congregação espera que eu pregue um sermão cujas palavras, ela também imagina, lhe cheguem diretamente do trono de Deus. Por isso, levo muito a sério o preparo do sermão. Peço a Deus sabedoria para expor o texto bíblico de um modo que os recém-nascidos no Senhor possam compreender. Oro por uma ilustração prática que sirva como âncora para o navio da verdade na consciência de minha igreja. Peço que o Senhor me dê inteligência para alcançar os santos de cada geração sob meus cuidados. Humilha-me a compreensão de que não tenho ideia sobre como cumprir a tarefa para a qual Deus me enviou. Porém, Ele nunca me desaponta.

No entanto, há muito mais para fazer: aconselhar, administrar, instruir, estudar, captar recursos financeiros, assistir a reuniões, e por aí vai. O pastorado, hoje, é muito desafiador e exigente. Em muitas partes do mundo, a complexidade da igreja do século 21 eliminou a idéia de “qualquer pessoa faz isto”. Quando examinamos um voluntário em potencial para certas atividades, sentimos que devemos confrontá-lo com algumas questões um tanto invasivas, antes de lhe permitir trabalhar a sós com nossas crianças. Uma certa neurose social nos tem despertado para as regras éticas, quando se trata de relacionamentos – homem/mulher, adulto/criança, casado/solteiro. A constante possibilidade de litígio convence-nos a ficar alertas para os riscos de gerenciamento pessoal.

Em muitos países, leis de construção civil desqualificam voluntários para mutirões de reforma de templos nos fins de semana. Ao lado disso, há leis requerendo a supervisão de relatórios financeiros e aplicação de cada centavo. Tudo o que se relacione com igreja exige habilidade pastoral.

Não é exagero dizer que a cultura prevalecente, de modo geral, desconsidera o papel da liderança pastoral. A ausência de respeito é implícita, se não explícita. Qualquer pessoa, seja ela qualificada ou não para o ministério, parece querer ter o mesmo direito de estabelecer a teologia para a igreja. Um pastor já não pode marchar à frente, tacitamente, esperando que o rebanho o siga; não pode estar certo de que será visto como um guia especializado para orientar a vida espiritual.

Sobe-e-desce emocional

Em adição a tudo isso, não raro nos sentimos um pouco desprotegidos. Quase não existe ninguém a quem nos voltarmos, em quem confiar, ou para consultar. É difícil encontrar alguém com quem possamos manter um diálogo honesto sobre nossas dificuldades, dúvidas ou tentações.

As emoções pastorais sobem e descem como iô-iô, entre a alegria e a tristeza; deleite e horror; coragem e medo. Em um dia, posso oficiar um casamento e consolar uma família angustiada em um hospital; alegrar-me com a satisfação de uma jovem quando ela capta uma nova verdade bíblica e, então, censurar a desobediência de outro jovem; ungir um membro enfermo e batizar um novo crente; ouvir a queixa do aparentemente negligenciado irmão e ser elogiado como pastor cuidadoso e organizado.

Posso receber uma ligação de um pai perturbado ou ser interrompido por um transeunte mentalmente descontrolado. Posso fugir do flerte de uma mulher e, logo depois, abraçar outra que luta contra um câncer. Também posso ministrar a um adulto e alegrar-me com a confissão de fé de uma criança; ser convidado a fazer um discurso de formatura e um sermão fúnebre. E ainda tenho que me manter emocionalmente saudável e espiritualmente incansável.

O pastor do século 21 tem à sua disposição os “milagres” da tecnologia: telefone celular, correio eletrônico e outras facilidades. Em uma tarde, podemos fazer o que pastores do passado levavam um mês para realizar. Porém, tudo isso tem um preço. Acesso instantâneo significa receber chamadas que incluem pedidos ou demandas, sugestões ou imposições, acusações ou até ameaças – e tudo requerendo uma imediata resposta, quer estejamos em uma reunião, dirigindo o automóvel, no banheiro ou dormindo. O custo é freqüentemente lançado na conta da saúde emocional e espiritual.

Lutas e compensação

Confesso que minha humanidade é freqüentemente testada. Afinal, sou um pecador necessitando de torrentes de graça. O aprimoramento do meu caráter ainda está em processo, como acontece a qualquer outro cristão. Eu tive um passado, antes de Cristo entrar em minha vida. Ainda tenho questões que necessitam ser resolvidas; tenho altos e baixos. Nem sempre entendo claramente o que Deus está fazendo ou quer fazer comigo. Algumas vezes, reclamo duramente com Ele. Sou tentado, caio, peco, sinto dor, vergonha e culpa. Choro e lamento. Mas, agradeço a Deus porque estou vivo para sentir essas coisas. Sei que Ele me ama, apesar da minha reflexão imperfeita do Seu amor.

Tudo isso me leva a Paulo que, certa vez, aconselhou: “… em tudo recomendando-nos a nós mesmos como ministros de Deus: na muita paciência, nas aflições, nas privações, nas angústias, nos açoites, nas prisões, nos tumultos, nos trabalhos, nas vigílias, nos jejuns, na pureza, no saber, na longanimidade, na bondade, no Espírito Santo, no amor não fingido, na palavra da verdade, no poder de Deus; pelas armas da justiça, quer ofensivas, quer defensivas; por honra e por desonra, por infâmia e por boa fama; como enganadores, e sendo verdadeiros; como desconhecidos e, entretanto, bem conhecidos; como se estivéssemos morrendo e, contudo, eis que vivemos; como castigados, porém não mortos; entristecidos, mas sempre alegres; pobres, mas enriquecendo a muitos; nada tendo, mas possuindo tudo.” (II Cor. 6:1-10).

Eu já me encontrava perto de casa, quando notei que meu telefone celular tinha muitas mensagens esperando respostas. A primeira era da minha esposa: “Você já está sabendo que houve um acidente no encontro social dos jovens nesta noite? Alguns deles foram levados ao hospital em uma ambulância. Estão esperando você na sala de emergência.” A segunda mensagem vinha do hospital: “Pastor, quando você acessar esta mensagem, por favor, venha depressa ao hospital; necessitamos de você.”

Quando a luz verde do semáforo acendeu, o caminho à direita me levaria para casa; o da esquerda, para o hospital. Virei à esquerda. Já passava da meia-noite quando, afinal, fui para a cama. Mas não posso imaginar nenhuma outra vocação, nenhuma outra atividade no século 21, que possa ser tão compensadora como a de ser um pastor.

William Colburn, Pastor em Ventura, Califórnia, Estados Unidos