A imediata recusa do jovem rico de desfazer-se de sua riqueza e seguir a Jesus, aparentemente muito impressionou a Pedro. Em S. Mateus 19:27, disse êle a Jesus:

Jesus não desdenhou essa pergunta de Pedro por seu espírito interesseiro, mas aproveitou-Se da ocasião para mencionar alguns princípios básicos da remuneração divina de serviços prestados ao reino de Deus.

Usou a parábola do pai de família para salientar que os que trabalham em prol do reino não ganham a sua recompensa. Assim como alguns dos trabalhadores receberam o salário de um dia inteiro por apenas uma hora de trabalho, também Deus dará a todos quantos alcancem o Céu uma recompensa muito superior aos seus mais acariciados sonhos ou expectativas. Tão extraordinariamente generosa será a recompensa, tão além de tudo quanto poderiam haver ganho, que não se lembrarão de seus mais penosos sacrifícios e provações sofridos enquanto trabalhavam por Êle na Terra!

Se, pois, não podemos ganhar as nossas recompensas celestes, qual é o propósito do serviço? É ajudar-nos a preparar-nos para o Céu. Êste pensamento é salientado no livro Educação:

“Os que rejeitam o privilégio da associação com Cristo no serviço cristão, rejeitam o único ensino que comunica aptidão para participar com Êle de Sua glória. Rejeitam o ensino que nesta vida concede fôrça e nobreza de caráter”. — pág. 264. (Grifo nosso.’)

O serviço, portanto, é uma providência de Deus para ajudar-nos na formação de caracteres que nos tornarão candidatos ao reino. Mas nem todo o serviço realizado cumpre isso. Jesus indica nas terríveis palavras encontradas em S. Mateus 17:21-23, que “muitos” que produziram coisas extraordinárias no nome de Jesus, não serão absolutamente reconhecidos pelo Senhor. Quais, pois, são os característicos do serviço aceitável? Como podemos nós empenhar-nos em serviço para Jesus Cristo, de forma que nos sejam concedidas “capacidade e nobreza de caráter”?

O Motivo Determina o Valor do Serviço

“Não a soma do trabalho que executamos, nem seus resultados visíveis, mas o espírito com que o fazemos, é que o torna valioso para Deus.” — Parábolas de Jesus, pág. 397.

Não é a quantidade de trabalho que fazemos nem como é julgado pelas outras pessoas, mas sim o motivo com que é feito, o que determina se êle é aceito por Deus ou não. Por que o fizemos? O motivo é uma característica importante no serviço, que receberá recompensa. As esmolas dadas com motivos egoístas pelos homens, mencionadas por nosso Salvador no sexto capítulo de S. Mateus, não os ajudaram no seu preparo para o reino. Sòmente lhes aumentaram o egoísmo e se lhes tornaram uma maldição! S. Marcos relata como Jesus observou os adoradores no templo, ao passarem pela arca das ofertas. Diz o registo que observou, não quanto davam, mas como davam (S. Mar. 12: 41). Não foi o valor da moeda, mas o motivo do coração que tornou a oferta da viúva tão valiosa aos olhos de Deus. Seu feito foi motivado pelo seu amor a Deus e pelo seu interêsse à causa divina. (Ver O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 458.)

A pergunta “Por que o fizemos?” parece sobrepor-se a qualquer outra consideração da parte de Deus no julgamento do valor de nosso serviço. “Cada ato de nossa vida, seja excelente e digno de louvor ou merecedor de censura, é julgado pelo Perscrutador dos corações, segundo os motivos que o determinaram.” — Obreiros Evangélicos, pág. 275. (Grifo nosso.)

E assim é, não apenas no que concerne à quantidade do serviço, mas também quanto à importância do mesmo.

Stanley Baldwin, certa vez disse: “Tôda a minha vida cri de todo o coração nas palavras de Browning: ‘Todo serviço recebe de Deus idêntica classificação’. Pouca diferença faz se o homem está guiando nm bonde, varrendo ruas ou sendo primeiro ministro, contanto que ponha nesse serviço tôda a sua capacidade, e o realize em proveito da humanidade.”

Uma segunda característica do serviço aceitável é a total abnegação. É-nos dito que:

“É requerida uma renúncia completa do próprio eu em todo o nosso serviço. O menor dever feito com sinceridade e desinterêsse é mais agradável a Deus que a maior obra quando manchada pelo egoísmo. . . . Sòmente quando o egoísmo estiver morto, banida a contenda pela supremacia, o coração repleto de gratidão e o amor houver tomado fragrante a vida — sòmente en-tão, Cristo nos está habitando na alma e somos reconhecidos como coobreiros de Deus.” — Parábolas de Jesus, pág. 402.

A julgar pela última sentença desta citação, estou certo de que, por muitos dos dias de meu ministério, não fui reconhecido como obreiro de Deus. Meditai nisto, irmãos. Nosso serviço para Deus, não importa quanto produzamos nem a importância que pareça ter, pode ser tão sem valor quanto o do faquir hindu em seu leito de pregos! Triste é lembrar que a vasta maioria do exército de Gedeão foi rejeitada por Deus por estarem cheios de egoísmo. Muito embora fôssem muitos milhares, por motivo de sua preocupação consigo mesmos “não acrescentariam fôrça aos exércitos de Israel.” — Patriarcas e Profetas, pág. 607.

Serviço Feito por Amor

Para que o serviço seja aceitável a Deus e ajude a conceder “fôrça e nobreza de caráter” a quem o faz, a condição do coração é da maior importância. Não sòmente deve êle ser inteiramente abnegado; deve êle estar repleto de amor de origem celeste. “Considera Êle mais o amor e a fidelidade com que trabalhamos do que a quantidade que fazemos.” — Parábolas de Jesus, pág. 402. Isto evidencia nitidamente a diferença entre trabalho de “obrigação” e “devoção”. O primeiro não é reconhecido por Deus e só serve para aferrar-nos mais firmemente ao nosso egoísmo. Quantas vêzes devo eu ser lembrado de que nem todo o serviço feito no nome de Jesus é levado em conta — quer para Êle quer para mim! “Únicamente o trabalho realizado com muita oração e santificado pelos méritos de Cristo, demonstrar-se-á afinal haver sido eficaz.” — O Desejado de Tôdas as Nações, págs. 268 e 269. Nossos trabalhos serão eficazes sòmente quando motivados pelo amor, sobrecarregados de oração, e feitos fielmente como para Deus. O serviço que brota do coração cheio de amor celestial estabelece os princípios do reino de Deus no caráter humano.

O verdadeiro motivo do serviço aceitável é a consideração amorável. “E, vendo a multidão, teve grande compaixão dêles” (S. Mat. 9:36). Esta grande fôrça impelente atingiu o clímax no suor de sangue de Cristo no Jardim do Getsêmani. Como ansiou Êle por um meio de escape daquele terrível transe! Como era forte a tentação de voltar para o Céu!

“Surge, porém, então a história da raça humana diante do Redentor do mundo. Vê que os transgressores da lei, se deixados a si mesmos, têm de perecer. . . . Vê o poder do pecado. . . . Salvará o homem, custe o que custar de Sua par-te.”—O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 517.

Serei eternamente grato ao meu Salvador por haver cuidado de mim então, e ainda cuida agora! Seu interêsse custou-Lhe a vida. Tão grande foi a Sua compaixão, que arriscou mesmo a vida eterna a fim de salvar-me. Essa mesma atitude compassiva deve caracterizar o meu serviço para que seja aceitável. A crítica proferida por alguns dentre nosso povo referente tanto aos membros leigos como a obreiros, da par-te de quem percebem mostrar pouco interêsse ou nenhum pelo bem-estar de seus semelhantes, é sem dúvida justificada. Êsse procedimento de indiferença egoísta tem há muito sido uma provação para Deus e para o homem. Davi clamou: “Ninguém cuidou da minha alma!” (Sal. 142:4). Alguém por quem trabalhamos, sentirá isso mesmo a nosso respeito? Oxalá não aconteça tal!

Talvez o salmista haja corretamente sumariado as características do serviço aceitável no sexto versículo do Salmo 126: “Aquêle que leva a preciosa semente, andando e chorando, voltará sem dúvida com alegria, trazendo consigo os seus molhos.” Andar significa gastar muito de nosso tempo e energia buscando auxiliar quem está necessitado. Significa desprezar conforto, proteção e segurança para trabalhar num mundo de insegurança, lutas, contendas, egoísmo, impureza e impiedade. Poderá representar sacrifício, incompreensão, maus tratos e mesmo a morte.

O semeador, chorando, semeia a preciosa semente nos caminhos e vaiados, com oração, amorosamente, fielmente, esperançosamente. Por que? Não aspira ao louvor dos homens; não busca honras ou posições; não ultrapassa o que outros já tenham feito. Trabalha muito, esforçada e alegremente, por ter o coração transbordante de amor. Não é impelido por outro qualquer motivo. Quando estas qualidades nos caracterizam o serviço, não gastaremos muito tempo conjeturando sôbre “Que receberemos?” Um serviço tal Deus abençoará com a dupla recompensa de ganhar outras almas para o Seu reino e salvar por Sua infinita graça todos quantos servem. Quão maravilhoso é Deus! Dá-nos Êle a oportunidade de servir; provê a capacidade e a sabedoria que nos torna o trabalho produtivo — e depois nos recompensa como se o mérito fôsse nosso (Parábolas de Jesus, pág. 361). Como devemos ser agradecidos por êsse plano da maravilhosa graça divina pela qual não só somos redimidos mas é-nos concedida a elevada honra de prestar serviço a Deus e a nossos semelhantes, o que, além do mais, nos habilita para ser cidadãos do Céu!

“Quem pois está disposto a encher a sua mão, para oferecer hoje voluntariamente ao Senhor?” (l Crô. 29:5).