A dedicação dos irmãos Annie e Urias Smith ao serviço cristão foi profundamente influenciada pelo convívio familiar. Essa influência teve papel fundamental na formação de ambos, contribuindo de maneira significativa para o Movimento Adventista Sabatista e, posteriormente, para a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Esse crescimento espiritual reflete os propósitos divinos revelados nas Escrituras para a família cristã.

A Bíblia demonstra uma preocupação clara com a educação das crianças e com a influência de um lar temente a Deus. Diversas passagens do Antigo e do Novo Testamento abordam esse tema: Sl 127:3; Jr 13:20; Gn 18:19; Dt 6:7-9; Gn 35:2-7; 1Sm 1:21-28; Pv 22:6; Êx 2:1-10; Lc 2:40, 51, 52; Ef 6:1, entre outras. De forma geral, esses textos afirmam que a instrução dos pais quanto à vontade do Senhor abre caminho para que os filhos se tornem agentes ativos na proclamação do evangelho. As Escrituras também evidenciam que a influência familiar está diretamente relacionada à redenção, pois o lar é o primeiro ambiente de instrução e formação cristã.

Dentre os vários textos mencionados acima, a educação recebida na família Smith reflete a promessa de Provérbios 22:6: “Ensine a criança no caminho em que deve andar, e ainda quando for velho não se desviará dele.” Apesar de o pecado gerar conflitos no ambiente familiar, como a ira (Ef 6:4) e a desobediência (Pv 19:18), a Bíblia assegura que as orientações divinas direcionam a mente para as verdades eternas, impulsionando os filhos a buscar um crescimento espiritual mais profundo (Dt 6:6-9, 24).

Entre as diversas influências familiares, as Escrituras destacam o papel da mãe na criação dos filhos, apresentando-a como a principal instrutora no lar (Pv 1:8; 1Sm 1:21-28; 1Sm 2:19, 20; Êx 2:1-10; Lc 2:40, 51). Ellen White reforçou esse conceito ao escrever: “Depois de Deus, o poder da mãe para o bem é a maior força conhecida na Terra.”1

Essa verdade tem sido claramente confirmada ao longo da história da igreja cristã. Líderes como John Huss e John Wesley foram moldados ainda na juventude pelo empenho e pela influência espiritual de seus familiares, evidenciando a veracidade e o cumprimento das promessas bíblicas.

O mesmo se observa na história da Igreja Adventista do Sétimo Dia, especialmente na formação dos irmãos Annie e Urias Smith. Graças ao trabalho dedicado de sua mãe, eles permanecem como exemplos de pessoas que se entregaram inteiramente à causa do evangelho.

Diante de tamanha dedicação, surge o interesse em compreender qual foi o papel de Rebeca Smith, mãe de Annie e Urias, na conversão e formação espiritual de seus filhos. O que essa história do passado ainda tem a nos ensinar hoje.

A influência da mãe

Desde a juventude, Rebeca decidiu acolher em seu coração o amor pelas verdades de Cristo. Aos 18 anos, em 1812, ela abandonou uma vida de luxo e prazeres para seguir um estilo de vida mais simples e consagrado, em comunhão com seu Salvador. Em 1844, aos 50 anos, após ouvir as pregações de Guilherme Miller sobre a volta de Jesus, seu coração se inflamou de fervor pelo Redentor prestes a retornar. A partir de então, sua vida espiritual tornou-se seu maior objetivo, e estar perto do Salvador, sua maior alegria.

Mesmo depois de se tornar mãe, Rebeca assumiu com seriedade o chamado espiritual em seu lar. Em meio às tarefas diárias, jamais deixou de nutrir, no coração de seus filhos, o amor pelos ensinamentos bíblicos. Relembrando a influência materna em sua infância, Urias Smith declarou: “Devemos, sobretudo aos seus primeiros e fervorosos ensinos, nosso presente interesse pelas coisas eternas.”2

A influência de Rebeca sobre os filhos começou desde os primeiros anos de vida de Annie e Urias. A trajetória dos irmãos foi marcada por inúmeros momentos com Cristo, muitos deles intencionalmente proporcionados pelo amor materno. Urias escreveu: “As primeiras lembranças que temos da [nossa] mãe foram seus esforços para criar interesse em seus filhos pela Bíblia como a Palavra de Deus.” Ela os conduzia para perto de Jesus, mas não o fazia sozinha – confiava na Mão Invisível que a guiara ao longo de sua própria jornada de fé. Dia após dia, Rebeca dedicava tempo à oração e leitura da Bíblia intercedendo fervorosamente por seus filhos. Descrita como uma “ardente amante da verdade presente” e possuidora de uma “valiosa e profunda experiência nas coisas de Deus”, seu exemplo tornou-se uma luz constante na vida de Annie e Urias. Em 1852, atendendo aos apelos da mãe e após examinarem as Escrituras, ambos decidiram entregar a vida ao Mestre e unir-se ao Movimento Adventista Sabatista. Os esforços de Rebeca frutificaram grandemente e foram recompensadores, pois tanto Annie quanto Urias passaram a servir diretamente na causa de Cristo.3

Annie, assim como sua mãe, foi agraciada com o dom da escrita. Após aceitar a verdade, ela se dispôs a colaborar com o Movimento Adventista Sabatista, dedicando-se ao trabalho com as publicações. Em dezembro de 1852, Annie enviou um poema à Review and Herald, o que resultou em um convite para atuar como editora-assistente. Ao aceitar o chamado, escreveu à mãe: “Louvado seja Seu nome pelo que tem feito por mim!” Ao longo de três anos, além de liderar a edição da Review em algumas ocasiões, contribuiu com mais de 45 poemas e hinos. No hinário adventista em inglês, Church Hymnal, constam dez músicas de sua autoria, testemunhando sua sensibilidade, talento e dedicação à obra de Cristo. Annie morreu em 1855 aos 27 anos, vítima de tuberculose. Todavia, seu legado perdura, especialmente por meio da vida e do ministério de seu irmão Urias, a quem ela influenciou no compromisso com a causa adventista.4

Urias, influenciado por sua irmã Annie, ingressou na Review and Herald e, após dois anos de trabalho, assumiu o cargo de editor-chefe. Durante meio século, ele não somente atuou como editor, mas também serviu como secretário da Associação Geral por 21 anos, escreveu o primeiro livro a ser vendido por meio da colportagem, foi professor, destacado expositor da profecia bíblica e um notável.

Além de seu impressionante legado intelectual, sua fé era visível na prática. Urias Smith era conhecido por ser um homem sempre calmo e sereno, um cristão cuja vida refletia o caráter de Jesus e cujo coração esteve constantemente dedicado à obra de Deus.

Após anos de serviço, no dia 6 de março de 1903, enquanto estava a caminho do trabalho, Urias sofreu um derrame cerebral e faleceu horas depois. Em seu bolso, porém, foi encontrado um sermão manuscrito, no qual ele declarava: “Estou com todos vocês, no esforço de proclamar este evangelho.”5

Ao olharmos para a história da família Smith, podemos confirmar que o “poder divino aliado ao esforço humano” produz grandes resultados, tanto no âmbito familiar quanto na vida da igreja. Os frutos do amor e da consagração de Rebeca transformaram a vida de Annie e Urias. Esse legado construído no passado continua a gerar frutos por meio dos ensinamentos e contribuições deixados por ambos. Essa história nos motiva a confiar nas promessas bíblicas e a educar nossos filhos nos caminhos do Senhor.6

Marcio Costa, professor de Teologia na Faculdade Adventista do Paraná

Jorge Dutra, estudante de Teologia na Faculdade Adventista do Paraná

Referências

1 Ellen G. White, O Lar Adventista (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2021), p. 193.

2 Eugene F. Durand, Yours In The Blessed Hope, Uriah Smith (Washington, DC: Review and Herald Publishing Association, 1980), p. 21, 25.

3 Ver Rebekah Smith, Poems: With a Sketch Of The Life And Experience of Annie R. Smith (Manchester, NH: John B. Clarke, 1871), p. 97-100; Durand, Yours In The Blessed Hope, Uriah Smith, p. 20, 23; Uriah Smith, “Obituary”, Review and Herald, 4 de março de 1875, p. 79; Arthur G. Daniells, “At Rest”, Review and Herald, 10 de março de 1903, p. 4; Uriah Smith, “Comunications”, Review and Herald, 9 de junho de 1853, p. 16.

4 Ver Lygia D. Oliveira, Na Trilha dos Pioneiros (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), p. 171; Ron Graybill, “Annie Smith, Her Life and Love”, Review and Herald, 1o de abril de 1976, p. 5; Arthur W. Spalding, Footsprint of the Pioneers (Washington, DC: Review and Herald Publishing Association, 1974), p. 126; Arthur G. Daniells, “At Rest”, Review and Herald, 10 de março de 1903, p. 4, 5.

5 Ver R. W. Schwarz, F. Greenleaf, Portadores de Luz: História da Igreja Adventista do Sétimo Dia (Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2021), p. 184, 186, 188, 609, 817; Alberto R. Timm, A Colportagem Adventista no Brasil: Uma Breve História (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2000), p. 24, 25; Durand, Yours In The Blessed Hope, Uriah Smith, p. 163, 164, 202; Spalding, Footsprint of the Pioneers, p. 128; Norma J. Collins, Retrato dos Pioneiros (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2007), p. 144, 145; William A. Spicer, Pioneer Days of the Advent Movement (Washington, DC: Review and Herald Publishing Association, 1941), p. 246; Sharon Boucher, “Pioneer Father”, The Youth´s Instructor, 24 de julho de 1956, p. 3; John N. Loughborough, “Reminiscences of the Life of Uriah Smith”, Review and Herald, 7 de abril de 1903, p. 8, 9; Stephen N. Haskell, “A Faithful Standard Bearer”, Review and Herald, 17 de
março de 1903, p. 6, 7.

6 Ellen G. White, Eventos Finais (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2022), p. 188.