Somente o Espírito Santo, que nos deu as Escrituras, pode nos ajudar a entendê-las corretamente

Diferente da literatura secular, a Bíblia foi escrita sob a supervisão do Espírito Santo. Pelo fato de que sua origem difere da origem de outras obras literárias, os elementos para sua interpretação também devem ser diferentes. A hermenêutica para o estudo das obras de autores famosos do mundo não é adequada para o estudo da Bíblia. Justamente porque o papel do Espírito Santo na produção, interpretação e aplicação da Bíblia a distingue de todas as outras literaturas humanamente motivadas, devemos reconhecer e respeitar sua origem singular.

Embora a Escritura não tenha um texto de significado espiritual místico, secreto ou incompreensível em si mesmo, esse significado não pode ser captado simplesmente pelo estudo da sintaxe, gramática, dos antecedentes, autor, estilo ou estrutura. A fim de compreendermos corretamente a Bíblia, necessitamos permitir que ela seja seu próprio intérprete, sob a orientação do mesmo Espírito que originalmente a inspirou.

Origens

A Bíblia se apresenta como um estilo distinto de literatura, reivindicando repetidamente sua origem divina. “Veio a mim a Palavra do Senhor”; “disse Deus”; “o Espírito do Senhor falou”; são expressões empregadas pelos autores para identificar a origem da mensagem. Paulo se referiu às Escrituras como os “oráculos de Deus” (Rm 3:2), e também declarou: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra” (2Tm 3:16, 17). Pedro afirmou que o Espírito Santo falou através dos profetas, vaticinando a vinda do Salvador.

Embora tenha sido escrita ao longo de séculos, a Bíblia mostra uma unidade de revelação divina que foi canalizada através do Espírito Santo para os profetas e apóstolos. A combinação entre o humano e o divino resultou no que é a Palavra de Deus. Por essa razão, a Escritura diz que “jamais a profecia teve origem na vontade humana, mas homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo” (2Pe 1:21).

Assim, a Bíblia é única. Por causa de sua origem divina, ela é sua própria autoridade, independentemente da autoridade, filosofia e dos métodos humanos. Sua hermenêutica vem dela mesma e está em harmonia com ela mesma.

Visão de mundo

A verdade afirmada por uma peça literária normalmente é aceita pelo poder de sua retórica, lógica, filosofia e ciência, ou por sua apresentação de fatos, a beleza de sua linguagem e habilidade do autor. Entretanto, a Escritura não necessita do poder de escritores humanos. Primeiramente, o Espírito prepara nosso coração e mente para recebê-la como autoridade para nossa vida. O Espírito confirma seus ensinamentos: “O próprio Espírito testemunha ao nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm 8:16). “Ninguém pode dizer: “Jesus é Senhor”, a não ser pelo Espírito Santo” (1Co 12:3). Também é dito: “nosso evangelho não chegou a vocês somente em palavra, mas também em poder, no Espírito Santo e em plena convicção” (1Ts 1:5).

Uma atitude mundana, ou uma empírica, humanística ou racionalista cosmovisão imposta à Bíblia pode fechar a mente para o que Deus tem transmitido através de Sua Palavra. Jesus é a Luz do mundo; todavia, quando Ele veio em Sua própria luz, os homens preferiram as trevas. Eles se agarraram à própria cosmovisão, em vez de se exporem à Luz (Jo 1:4-13). Assim, foram deixados em trevas.

Até os discípulos foram afetados pelo mesmo problema. Eles estiveram com Cristo durante três anos e meio; porém, a despeito das profecias do Antigo Testamento e dos constantes ensinamentos e advertências de Cristo, eles não esperavam a crucifixão. Sua cosmovisão não lhes permitia aceitar um Messias sofredor. Ciúmes e disputas ocupavam tanto a mente deles que não podiam ouvir as advertências de Cristo sobre Sua morte que logo ocorreria.

Nicodemos procurou Jesus à noite, levado pela visão de que o Messias podia ser um rei mundano. Ele como que produziu uma velinha, humanamente centralizada, para tentar iluminar a Luz do mundo. Aplicou uma forma de pensamento terrestre à sua compreensão de Jesus (Jo 3:1, 2).

Conhecendo Nicodemos, Jesus foi diretamente ao ponto: A menos que alguém seja nascido da água e do Espírito, não pode ver o reino do Céu. O que é da perspectiva terrestre é terrestre. O que é nascido do Espírito é espiritual. Nicodemos respondeu: “Como é possível nascer de novo?” Jesus respondeu que nós falamos do que conhecemos; isto é, a visão mundana da vida que ocupa nossa mente (Jo 3:5, 6, 9, 11).

Se temos dificuldade em compreender sinais e milagres, como podemos compreender o que Cristo nos fala a respeito das coisas celestiais? Em contraste ao pensamento mundano, se o Filho do homem é levantado, Ele atrai a Si todos os seres humanos (Jo 12:32). Aqueles que vão a Jesus sabem quem é Ele, porque são nascidos e guiados pelo Espírito Santo (Jo 3:1-20; cf. Jo 1:31-34). Em outras palavras, somente sob o poder e inspiração do Espírito Santo alguém pode conhecer a verdade. Sistemas mundanos de pensamento não nos levarão à cruz; na verdade, nos afastarão dela.

Paulo chama a atenção para a importância da perspectiva correta para a compreensão da Palavra de Deus: “Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12:2). Assim, ele adverte: “Tenham cuidado para que ninguém os escravize a filosofias vãs e enganosas, que se fundamentam nas tradições humanas e nos princípios elementares deste mundo, e não em Cristo. Pois em Cristo habita corporalmente toda a plenitude da divindade, e, por estarem nEle, que é o Cabeça de todo poder e autoridade, vocês receberam a plenitude” (Cl 2:8-10).

Por meio de sua sabedoria, o mundo, conforme Paulo mencionou aos coríntios, não conhece Deus. Alguns buscam sinal, isto é, evidência empírica, enquanto outros querem sabedoria filosófica; mas Deus não é encontrado nesses sistemas. Somente podemos conhecê-Lo através de Sua autorrevelação e, por meio do Seu Espírito, Ele Se faz conhecido a nós. O Espírito Santo, não o mundo, nos ensina a respeito de Deus. Nosso poder e conhecimento não se encontram nos sistemas humanos, mas na sabedoria e no poder de Deus, segundo nos é revelado por Seu Espírito.

Conversão

Quando nos entregamos à vontade de Deus através do Espírito, somos nascidos de novo. A conversão produzida pelo Espírito Santo é uma completa reversão de direções. Anteriormente, vivíamos em trevas; agora, vivemos na luz. Nossa vida era direcionada para as coisas deste mundo; agora sabemos que desejamos as coisas celestiais. Nossa mente estava enlaçada pelos erros das perspectivas mundanas; agora, por meio da revelação bíblica, vemos as coisas segundo o ponto de vista de Deus.

Por essa razão, toda atitude de rejeição da posição de que a Escritura é fruto da vontade de Deus, através da mediação do Espírito Santo, nega a razão para a existência da Bíblia. Rejeita seu contexto imediato. Portanto, o intérprete perde o que é vital para a compreensão da Escritura, que é a Palavra de Deus. Essa imposição de uma cosmovisão externa sobre a Bíblia nega ao intérprete o princípio básico e o poder essencial para compreensão da Bíblia. Assim, surgem as interpretações erradas.

Além disso, a obstinada retenção do pecado na vida nos torna desafinados com a Palavra de Deus, pois o pecado nos insensibiliza para a influência do Espírito Santo, da qual necessitamos para discernir corretamente a Escritura. “Quem não tem o Espírito não aceita as coisas que vêm do Espírito de Deus, pois lhe são loucura; e não é capaz de entendê-las, porque elas são discernidas espiritualmente” (1Co 2:14). “A mentalidade da carne é morte, mas a mentalidade do Espírito é vida e paz; a mentalidade da carne é inimiga de Deus porque não se submete à Lei de Deus, nem pode fazê-lo” (Rm 8:6, 7).

Manobras

Sob o poder e direção do Espírito Santo, a Bíblia é nossa ligação com Deus. Por isso, é propósito de Satanás nos levar a interpretá-la mal. O inimigo deseja instilar em nós um “coração perverso e incrédulo, que [nos] afaste do Deus vivo” (Hb 3:12). Ele trabalha para nos tentar a duvidar da Palavra de Deus (Hb 3: 4) e, nessa tentativa, leva-nos a usar métodos independentes dos métodos de Deus. Leva-nos a deificar a razão, fazendo-nos pensar em nosso próprio intelecto como sendo independente de Deus. Sugere que, fundamentados em princípios científicos, podemos explicar a influência do Espírito. Leva-nos a perverter o significado da Escritura; tenta-nos a rejeitar as menores verdades bíblicas, o que nos fará rejeitar as maiores. Em suma, ele sabe que o evangelho é um mistério para os que estão perdidos, aqueles a quem o “deus desta era cegou o entendimento… para que não vejam a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus” (2Co 4:4).

Portanto, é fundamental que jamais nos deixemos levar por essas manobras destinadas a nos fazer rejeitar o papel do Espírito Santo na compreensão da Escritura.

Nossa compreensão da Escritura é aclarada quando abrimos a mente ao Espírito que transforma tanto a mente quanto o coração. “Se o Espírito dAquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vocês, Aquele que ressuscitou a Cristo dentre os mortos também dará vida a seus corpos mortais, por meio do Seu Espírito, que habita em vocês (Rm 8:11).

O poder de Cristo operando através do Espírito, remove o véu da nossa cegueira mental (2Co 4:4-17). Com face descoberta, todos nós que contemplamos “a glória do Senhor, segundo a Sua imagem estamos sendo transformados com glória cada vez maior, a qual vem do Senhor, que é o Espírito” (2Co 3:18). Então, Ele escreve a lei de Deus em nosso coração de carne (v. 3), harmonizando esse coração bem como nossa mente com a mente de Cristo (1Co 2:16).

Essa união com Cristo abre nossa mente para ver a beleza e ter a compreensão da Palavra de Deus, o que éramos incapazes de experimentar antes da conversão. Em outras palavras, uma verdadeira compreensão da Bíblia depende da conversão do coração e da mente por meio da operação do Espírito.

Poder e direção

O Espírito Santo é o Espírito da verdade (Jo 15:26). O Espírito não fala de Si, mas sempre em harmonia com a Bíblia. Ele nos faz lembrar as palavras da Escritura, estimula a mente a fim de possibilitar mais profunda compreensão da mensagem bíblica. “Quando o Espírito da verdade vier, Ele os guiará a toda a verdade. Não falará de Si mesmo; falará apenas o que ouvir, e lhes anunciará o que está por vir. Ele Me glorificará, porque receberá do que é Meu e o tornará conhecido a vocês” (Jo 16:13, 14).

Temos o privilégio de comungar com Aquele que nos deu a Palavra do Senhor e receber o estimulante poder que produz conversão de coração e mente. O Espírito Santo nos conduz às palavras de vida. Ele comunica o perdão de Deus através do sacrifício de Jesus Cristo, capacita-nos a viver por Jesus e confirma nossa esperança de vida eterna com Cristo.

Unicamente o Espírito, que nos deu as Escrituras, pode nos dar compreensão delas. O Espírito Santo fala à nossa mente e imprime verdades bíblicas sobre nós. Ele exalta e glorifica Jesus Cristo em Sua pureza, justiça e salvação, “conduzindo-as [verdades bíblicas] como um poder vivo ao coração obediente” (Ellen G. White, Evangelismo, p. 167).

Pelo Espírito, entramos na vida de santificação. A regeneração de nossa vida nos habilita a compreender plenamente a verdade. Cristo orou: “Santifica-os na verdade, a Tua Palavra é a verdade” (Jo 17:17). Existe uma interação entre a vida que vivemos e nossa compreensão da verdade. A verdade não é simplesmente o que nós sabemos, mas o que fazemos (1Jo 1:6; Jo 3:21). Disse Jesus: “Se alguém decidir fazer a vontade de Deus, descobrirá se o Meu ensino vem de Deus ou se falo por Mim mesmo” (Jo 7:17).

Proclamação

Se nossa leitura da Bíblia estiver aberta à orientação do Espírito Santo, ela culminará com o desejo de partilhar com outras pessoas o que Cristo tem feito por nós. Depois da ressurreição, Cristo Se reuniu com os discípulos e lhes prometeu que o Espírito Santo viria sobre eles a fim de que fossem testemunhas em Jerusalém, Judeia, Samaria, até os confins da Terra. Mais tarde, quando todos estavam juntos, ficaram cheios do Espírito e apresentaram corajosamente a Palavra de Deus (At 1:5-8; 4:31). Paulo também afirmou que não tinha vindo com excelência de sabedoria, com palavras persuasivas de sabedoria humana nem sinais empíricos, mas em demonstração do Espírito e poder (1Co 1:17; 2:16).

O dom do Espírito Santo impeliu os discípulos a levar a mensagem do evangelho a todo o mundo. Em vez de especulação humana, a espada do Espírito derramou luz sobre Cristo e abriu caminho entre a descrença, produziu penitência, confissão e transformação. Milhares se converteram em um só dia. Rapidamente, a igreja se expandiu (Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 284).

O poder da Bíblia sob o Espírito de Deus não é imaginário, etéreo nem místico. Esse poder trouxe mundos à existência, deu vista a cegos, cura para surdos e vida a mortos. O que mais Satanás desejaria era reduzir a força desse poder em nós, distanciar-nos da transformação que ele produz e separar nossa pregação de sua influência.

O Espírito Santo é o Consolador. Ele almeja abrir a Bíblia para nós, pois ela contém a mensagem do amor de Deus, Seu plano de salvação e Sua oferta de perdão. Ele nos purifica do pecado que anuvia nossa leitura das Escrituras. O Espírito Santo produz conversão de coração e mente, o que nos habilita a compreender a Palavra de Deus e viver em harmonia com ela. Finalmente, através das Escrituras, o Espírito Santo nos dá a promessa da breve vinda de Jesus, que restaurará nossa comunhão face a face com Deus, propósito para o qual a Escritura foi dada originalmente.

Inspirada pelo Espírito Santo, a Bíblia pode ser compreendida apenas por meio desse mesmo Espírito. Quão importante é que abramos nossa vida à obra do Espírito!