O capelão é um amigo em potencial, que acolhe o irmão diminuído pela doença.
Até 1850, a assistência médica e de enfermagem era considerada em grande parte uma responsabilidade da igreja. Ela mantinha a maioria dos hospitais. Os religiosos estavam sempre próximos da equipe médica e muitas vezes cuidavam da administração dos hospitais. Essa associação faz parte da história humana. Em Israel, o sacerdote diagnosticava, prescrevia e dava alta aos enfermos (Lev. 13). Muitos povos tradicionalmente vinculam seus líderes religiosos ao cuidado da saúde.
Se por um lado o progresso científico facilitou o cuidado físico, por outro, estimulou a dicotomia — físico e espírito — o profissional médico é responsável pelo físico-mente de seus pacientes, ao passo que o espiritual é de responsabilidade dos religiosos. Essa tendência aprofunda-se, à medida que a ciência médica progride, tornando-se mais especializada no tratamento das enfermidades.
Atualmente, o trabalho em equipe é fundamental para a manutenção da vida. Além do médico, faz-se necessária a assistência de outros profissionais de saúde, a fim de garantir a saúde do paciente. Cristo agia como uma equipe de saúde. Foi um médico-missionário, pois cuidava da saúde física das pessoas, sem esquecer o aspecto espiritual. A limitação humana e o progresso da ciência, porém, exigem trabalho em equipe. O capelão é parte de uma equipe de saúde que deve cuidar do paciente, considerando-o um todo indivisível.
Necessidades espirituais
O capelão se relaciona com diferentes tipos de pessoas. Seus pacientes têm origem em classes sociais e culturas diversas, mas em sua maioria são pessoas que admitem a dependência de Deus. Segundo Mary Hubert, “o homem tem marcante tendência para a dependência de Deus, e para confiar num Senhor soberano. É grato a Ele como o grande benfeitor, ama-O como fonte de bondade, sente tristeza e culpa quando O ofende”.
Batismo, comunhão, culto, oração, jejum, adoração e louvor são expressões legítimas da fé em Deus e um componente importante no estilo de vida de uma pessoa. Quando a hospitalização a impede de expressar sua religiosidade através dessas práticas, suas necessidades espirituais podem não estar sendo preenchidas. Essas necessidades vão além da simbologia expressa nos cultos. O homem necessita de um relacionamento vivo e pessoal com Deus, que inclua o saber-se amado e perdoado por Aquele de quem ele depende.
Relacionamento e perdão
O capelão pode ajudar o paciente a enfrentar a doença e o sofrimento e se for necessário encontrar o sentido dessas experiências. Joyce Trowebee define sentido como “A razão que o indivíduo dá para a experiência pela qual está passando”. — Cuidado Espiritual do Paciente, pág. 45. A busca de significado é essencial na vida. Mostrar à pessoa que Deus a está dirigindo, mesmo em sua experiência traumatizante, a tornará capaz de adaptar-se quando mudanças inesperadas surgirem.
A necessidade de amor e relacionamento acontece no contexto das relações humanas significativas tais como o lar, trabalho, etc. Não só as crianças precisam de amor. Adultos que perdem um relacionamento humano, fonte principal de amor e apoio, tornam-se depressivos, doentes, e chegam a desejar a morte.
“A religião pode libertar ou esmagar, pode culpar ou libertar da culpa. Uma religião moralista, impregnada de tabus e que apre-senta um Deus ameaçador, suscita o medo e com ele um mecanismo sinistro de endurecimento, de revolta e de mal.” — Culpa e Graça, pág. 176. O capelão deve ser o mensageiro de uma religião de graça perdoadora. Um mensageiro de Deus, portador de um espírito generoso, que torna leve a culpa do pecador. Ele o conduz ao Cordeiro de Deus que tira o pecado do homem.
Como ajudar
O homem é o único animal que sabe que deve morrer um dia, antes da hora. Ao adentrar um hospital na condição de paciente, a visão da morte torna-se viável e sempre aterradora.
O paciente é alguém à espera. É alguém que sucumbiu à fatalidade de um acidente, à enfermidade e ao tempo. Alguns acham que podem estar sendo punidos por algo que fizeram. Paul Tournier disse que “Uma consciência culpada é o sabor de nossa vida diária”. O impacto produzido pelo ressurgimento da culpa é sempre negativo e a enfermidade debilitante é terreno fértil para ela.
Sentir-se seguro e perdoado facilitará todo o processo de cura a que será submetido o paciente. O capelão pode usar diversos recursos para ajudar o paciente:
• Estar presente. Estar disponível é indispensável para convencer o paciente de que o capelão não desempenha uma função burocrática. Além disso, ele o verá como um amigo em potencial, que acolhe o “irmão diminuído pela doença”. — O enfermo, pág. 334.
• Ouvir atentamente. Não significa permanecer paralisado, mas envolver-se. É necessário bloquear as distorções e o desejo de contar as próprias experiências para não sufocar os pensamentos dos outros. O bom ouvinte faz a outra pessoa sentir-se importante. “Procurar interpretar as frustrações simuladas por trás de críticas, ou mesmo de elogios, favorece muito a compreensão das necessidades das pessoas. ’’ — Atitudes Interpessoais em Enfermagem, pág. 6.
O mais importante não é o tempo gasto ouvindo, mas como se escuta. “Os grandes líderes religiosos de todos os tempos têm sido aqueles que ouvem, por um lado, a voz de Deus e, por outro, a voz do povo.” — O Ministério Adventista, Jan. 1989, pág. 21.
- • O toque das mãos. Segundo a Dra. Liliana F. Daniel, o cultivo da expressividade das mãos deveria ser uma tarefa integrante do preparo profissional da equipe de saúde. O toque humano pode ser mais significativo do que uma simples palmadinha no ombro, ou algo que possa ser interpretado como um apelo sexual.
Para a Dra. Liliana, há ocasiões em que o toque humano pode “falar” mais alto do que qualquer discurso. Tanto em momentos difíceis como alegres, em que a necessidade espiritual sobressai, em súplica ou gratidão, o toque da mão pode ter grande significado. Tocar a fronte, afagar os cabelos de uma criança ou de uma pessoa idosa pode transmitir conforto e apoio espiritual. Nutrindo a alma de sentimentos bons é que as mãos passam a produzir o bem.
- • Orar. Sem ser inconveniente ou ofensivo, o capelão pode sempre orar com os pacientes. Dificilmente o enfermo rejeita uma prece. Através da oração pode se estabelecer um vínculo terno entre o paciente e o que ora por ele.
Prudência da serpente
O trabalho espiritual de nossos hospitais requer reflexão, tato e vasto conhecimento da Bíblia. Os ministros que possuem essas qualidades devem estar ligados aos nossos sanatórios.” — Conselhos Sobre Saúde, pág. 293. O capelão deve estar preparado para poder adaptar-se a situações adversas e distintas. Só assim ele poderá convencer o doente do valor único de sua própria vida, de seu ser ameaçado e de seu sofrimento aparentemente absurdo. O conselho de Jesus é: “Sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas” (S. Mat. 10:16). Alguns cuidados precisam ser observados: • Não critique a religião das pessoas. “O Senhor tem Seus representantes em todas as igrejas. A essas pessoas as verdades especiais para estes últimos dias não foram apresentadas sob circunstâncias que trouxessem convicção ao coração e à mente; portanto, ao rejeitar a luz, elas não romperam sua ligação com Deus. Muitos estão no limiar do reino, apenas esperando ser recolhidos.” — Meditações Matinais, 1992, pág. 309.
- • Aceite sem julgar. Todos temem o julgamento alheio. E isto é muito mais verdade e sensível quando uma pessoa encontra-se enferma. A tendência julgadora dos religiosos tem afastado deles os sofredores. Muitos preferem um psicólogo ou psiquiatra, porque sabem que eles não os julgarão. Segundo Paul Tournier, estritamente falando é impossível não julgar. A saída é a aceitação do outro, através da graça e do amor de Jesus.
- • Não argumentar sobre o que é “certo” ou “errado”. O exercício da apologia é estranho à situação do enfermo. Não force o ensino da religiosidade, a oração ou o estudo da Bíblia.
Dizem que “de médico e de louco todo mundo tem um pouco”, mas bancar o médico quando não se tem preparo para isso é muita loucura. O capelão não é a equipe de saúde. Ele faz parte dela. Permanecer em sua área de atuação, respeitando os colegas da equipe, só tende a beneficiar o paciente e o trabalho de todos. Evite apresentar opiniões, “diagnósticos”, etc.
Classificado como um ministério paralelo, a Capelania hospitalar pode ser uma das mais fascinantes missões. Pastores e médicos, religião e ciência. Separados pouco podem fazer. Unidos pela graça de Cristo transformam-se em Sua mão salvadora.