Este tema denota a existência de um problema. Pode ser de ausência de relações, de más relações ou de relações sem propósito claro. Não nos referimos às relações oficiais da Igreja Adventista com outras denominações, mas sim às relações que individualmente cada um de nós mantém, e deve manter, com essas denominações. Em realidade, nossas relações são escassas, não muito boas (para não dizer más), e não possuem um propósito muito claro. Muitos de nós, entretanto, relacionamo-nos com êles para lhes ensinar a verdade, o que parece um propósito bem claro e definido, mas como veremos mais adiante não é tão claro.
Em conseqüência, vemo-nos na obrigação de analisar nossas más relações com os protestantes e ver qual é a causa teológica que as provoca, a fim de remediar o problema, se tem remédio possível. Para isto seguiremos o seguinte esbôço: primeiro, causas históricas; segundo, causas teológicas e finalmente consideraremos uma possível solução ao problema.
CAUSA HISTÓRICA: UMA EXPERIÊNCIA DE ATAQUE, REPULSÃO E DESPRESTÍGIO
É verdade que a história em geral caminha para um alvo ou objetivo que é o reino de Deus. De acordo a isto o aparecimento da Igreja Adventista com seu anúncio do reino de Deus teria que ter sido celebrado com regozijo por tôda a cristandade. Mas, como diz o teólogo Paul Tillich, “na história existe sempre uma mistura do bem e do mal;” as fôrças do mal não viram o nascimento da Igreja Adventista com alegria e portanto puseram suas energias na tarefa de desprestigiá-la. Como o fizeram? Fundamentalmente de duas maneiras:
Em primeiro lugar, levantando outros grupos e idéias errôneas mas com características semelhantes à Igreja Adventista. Citamos como exemplo três grupos que não sòmente tinham algumas semelhanças com o movimento adventista, mas que ademais surgiram mais ou menos no mesmo lugar geográfico. Referimo-nos às misteriosas pancadinhas das irmãs Fox (espiritismo moderno), os primeiros trabalhos de José Smith (fundador do mormonismo) e o perfeccionismo socialista de John Humphrey Noyes. Todos êles surgiram por volta da mesma data e dentro de um raio de 30 km no norte do Estado de Vermont. Ali mesmo Guilherme Miller, no início do século passado, iniciou o grande movimento adventista.
Conhecemos os erros do espiritismo e temos uma idéia clara do mormonismo. Talvez convenha mencionar que até hoje nos Estados Unidos se confunde a Igreja Adventista com os mórmons. Desde 13-15 de março de 1970 a famosa Gallup Internacional, fêz uma pesquisa para medir a atitude atual do público norte-americano para com a Igreja Adventista. Uma das perguntas era: O que vem primeiro à sua mente quando você ouve o nome de adventista do sétimo dia? Se bem que a resposta mais freqüente tenha sido “a observância do sábado,” ainda aparecem respostas como as seguintes: “Penso nas provas que tiveram que passar em Utah,” “Salt Lake City,” “os mórmons.”
Das idéias antes citadas provàvelmente a que nos resulta mais desconhecida seja o perfeccionismo Noyes. Êle acreditava que com a conversão vinha uma liberação total do pecado e uma completa pureza do coração. A isto acrescentou as idéias do socialista utópico Robert Owen e as de Fourrier, e concluiu que o socialismo combinado com o perfeccionismo chegaria a ser invencível e fundou a famosa colônia Oneida, na qual introduziu muitos princípios de saúde, a carne foi reduzida a um mínimo indispensável e se promoveu uma vida simples. Isto não os livrou do êrro de casamentos comuns nos quais se praticava uma extrema continência masculina.
A segunda forma como as fôrças do mal lutaram contra os adventistas foi por meio da proscrição religiosa. Os dirigentes religiosos atacaram os adventistas desde o início das atividades dos mesmos. Como exemplo leiamos o parágrafo do livro Fermento de Líbertad, escrito por Alice Felt Tyler. Falando da oposição levantada ao movimento de Guilherme Miller ela diz:
“O bispo de Vermont publicou um panfleto condenando o êrro de tentar determinar uma data para a segunda vinda. Pastores de tôdas as seitas através de tôda a Nova Inglaterra e Estados adjacentes publicaram e pregaram diligentemente condenando o movimento. Multidões de furiosos cidadãos trataram de dispersar algumas das reuniões dos seguidores de Miller; mesmo o próprio profeta (G. Miller) foi atacado com ovos e tomates podres” (págs. 73 e 74).
Os adventistas foram expulsos de suas igrejas sem que tivessem cometido outro delito que o de acreditar no advento do reino de Deus. Tudo isto criou um espírito de defesa. Os pregadores adventistas têm sido tão agudos em atacar os demais cristãos como êstes o foram com êles. Produziu-se, então, um afastamento, e o rechaço foi tão cego que condenaram os adventistas de seita não cristã, sem sequer se dar ao trabalho de estudar devidamente seus ensinos e doutrinas. Posteriormente a fonte onde os não adventistas estudavam as crenças dos adventistas foram os livros amargurados e falsos do apóstata D. M. Canright. Tem havido, entretanto, nos últimos anos uma mudança de atitude nêles e alguns teólogos protestantes ao estudar as doutrinas adventistas nos escritos dos teólogos desta igreja concluíram que a Igreja Adventista do Sétimo Dia é cristã.
CAUSAS TEOLÓGICAS: UMA VISÃO DINÂMICA E ESCATOLÓGICA
Ao tratar as causas teológicas que deterioram nossas relações individuais com os não adventistas não nos propomos apresentar uma lista dos pontos de diferença entre ambas teologias. O que nos propomos é tomar sòmente três pontos teológicos nos quais, seja pela diferença entre a Igreja Adventista e as demais denominações ou por falta de compreensão que os adventistas individualmente temos de nossa própria teologia, se dá lugar a uma atitude que repele as relações espontaneamente agradáveis. Êstes pontos teológicos são: 1) nossa compreensão das profecias, 2) nossa escatologia e 3) nosso conceito da função que a igreja deve cumprir no mundo.
1) Nossa compreensão das profecias: Referimo-nos especialmente às profecias apocalípticas. A primeira pergunta que surge em relação com êste assunto é: que é profecia apocalíptica? A literatura apocalíptica é um tipo especial na literatura hebréia relacionada com o cativeiro babilônico, que apresenta o conflito entre as fôrças do bem e do mal e o triunfo de Deus e de Seu povo, é um conflito que ocorre não sòmente no tempo quando se escreve, quer dizer, o presente, mas que também tem relação com o futuro. A profecia apocalíptica tem que ver então com acontecimentos profetizados em relação ao triunfo de Deus no futuro, tanto como no presente. Daniel e Apocalipse estão considerados dentro dêste tipo de profecias, junto com a maioria dos profetas menores e parte dos escritos dos profetas maiores.
A teologia protestante é “situacional” em sua consideração das profecias apocalípticas. Isto significa que essa teologia se concentra no propósito original e a situação na qual se deu a profecia e se escreveu seu texto. Em troca, a teologia adventista é mais “sistemática.” Isto significa que esta teologia procura coerência interna e confronto entre os diferentes textos. A ênfase está mais no futuro do que no presente, o que resulta justamente o inverso da ênfase protestante.
Existe alguma solução para êste aparente conflito? Certamente que sim. Embora essa solução teológica não tivesse surgido anteriormente desta maneira, entretanto estêve sempre presente na teologia adventista. Esta solução consiste no princípio da tríplice aplicação das profecias apocalípticas que os teólogos adventistas elaboraram mais sistemàticamente durante os últimos anos, sem que isto signifique que seja um descobrimento inteiramente nôvo.
O princípio desta tríplice aplicação consiste no seguinte:
- a) As profecias apocalípticas dadas antes de Cristo têm um cumprimento parcial e literal no Israel literal.
- b) Têm um cumprimento espiritual e universal no cristianismo.
- c) Terão um cumprimento literal e universal em todos os fiéis de tôdas as idades quando Cristo venha por segunda vez em glória.
Desta maneira a profecia tem um cumprimento passado, presente e futuro. O passado corresponde ao Israel literal; o presente à igreja cristã, e o futuro ao ESCATON, ou seja o fim. Êste princípio de interpretação está baseado em outro que é o decisivo, o mais valioso e o que jamais deve faltar em tôda interpretação das profecias apocalípticas para não cair no êrro. Referimo-nos à cruz como ponto de divisão e a Cristo como a chave para entender cada símbolo profético. Isto significa que na Bíblia existe uma harmoniosa unidade tão cristocêntrica que cada símbolo, seja êste histórico, profético ou apocalíptico, refere-se a Cristo. Em conseqüência, tôda interpretação das profecias apocalípticas deve ser cristocêntrica, e como corolário disto surge o princípio da tríplice aplicação.
A ênfase situacional da teologia protestante fica atendida com a aplicação literal ao povo de Israel na época imediatamente posterior ao cativeiro ou a da própria libertação. E a ênfase sistemática fica atendida com as aplicações à igreja cristã e a todos os cristãos quando Cristo venha. A dinâmica da aplicação da profecia apocalíptica vai do literal parcial ao espiritual universal e ao literal universal.
Se nós, em nossas relações individuais com os protestantes não consideramos êste enfoque teológico dinâmico e cristocêntrico das profecias, não estaremos em condições de compreendê-los tampouco estaremos em condições de transmitir-lhes uma imagem adequada de nós mesmos, resultando isto em uma falta de comunicação ou uma comunicação errada que sòmente provoca incompreensões e más relações.
2) Nossa escatologia: A seguinte causa que deteriora nossas relações com os não adventistas radica na má compreensão de nossa escatologia, não só por parte dos evangélicos mas o que é mais desastroso, por nossa própria falta de conhecimento da mesma.
A escatologia é a doutrina dos eventos do fim, sejam êstes os eventos finais na vida de um indivíduo, tais como a morte, ou os eventos finais da igreja de Cristo, os quais têm estreita relação com a segunda vinda de Cristo. Pela própria definição do têrmo, a Igreja Adventista é uma igreja essencialmente escatológica, entendendo-se por isto duas coisas: que sua existência se produz no fim da história da igreja cristã e que suas doutrinas estão condicionadas por seu caráter escatológico. Quer dizer que, se tivéssemos que descrever nossa teologia em uma palavra, esta teria que ser “escatologia:” nossa teologia tem que ser cristocêntrica, mas não só historicamente cristocêntrica, mas também escatològicamente cristocêntrica. É por isso que a vida da igreja não recebe suas fôrças de uma tradição histórica como ocorre com tôdas as igrejas protestantes, mas que sua fôrça vital está emanando sempre do futuro, do fim, da segunda vinda de Cristo. Mesmo o presente da Igreja Adventista, não é um simples presente temporal limitado pelo amanhã, mas o amanhã germinando no presente. Quer dizer que, parafraseando Santo Agostinho, o presente é o “arrabalde” do escaton, do futuro. Êste futuro visto não como tempo que se espera, mas como o tempo associado a uns acontecimentos que já começaram a se tornar reais.
Tudo o que ensinamos deve estar relacionado com nossa escatologia. Nesse sentido a Igreja Adventista é a única igreja escatológica. As igrejas protestantes são tôdas igrejas históricas. Elas têm um credo, a Igreja Adventista não. Isto implica uma grande diferença que contém o germe de muitas incompreensões nas relações mútuas. Enquanto uma verdade é teologicamente discutida pelo teólogo protestante, com uma mentalidade histórica baseada em uma tradição e em um credo, o teólogo adventista a analisa com uma mentalidade escatológica. Há nisto, entretanto, um perigo do qual não nos livramos como adventistas. Referimo-nos ao perigo de desenvolver hoje sentimentos acêrca de acontecimentos que ainda não chegaram à sua realização plena. Podemos dar alguns exemplos que o ilustram: a formação da imagem da bêsta e a aplicação da marca da bêsta.
Sôbre a imagem da bêsta lemos: “A ‘imagem da bêsta’ representa a forma de protestantismo apóstata que se desenvolverá quando as igrejas protestantes buscarem o auxílio do poder civil para imposição de seus dogmas” — O Conflito dos Séculos, págs. 480 e 481.
Muitos adventistas tratam os protestantes de hoje como se êles fossem o produto dêsse outro protestantismo “que se desenvolverá.” Quer dizer que já demos lugar à existência de um sentimento que provàvelmente seja apropriado quando êsse fato alcance sua completa realidade, mas que agora não teria que surgir entre nós. O que queremos dizer é que muitos adventistas temos tratado os protestantes como se êles já estivessem nesta situação. Talvez ainda estejamos vivendo em um tempo semelhante ao que foi para Israel o tempo entre a ascensão de Cristo e o apedrejamento de Estêvão. O grande Pentecostes está ainda no futuro. Os protestantes ainda são filhos de Deus e seus ministros são ainda pastores do rebanho. Pelo menos isto é o que o Espírito de Profecia ensina quando diz: “Nossos ministros devem procurar aproximar-se dos ministros de outras denominações. Orai por êles, por quem Cristo está intercedendo. Pesa sobre êles solene responsabilidade. Como mensageiros de Cristo, cumpre-nos manifestar profundo e zeloso interêsse nesses pastôres do rebanho.” — Evangelismo, pág. 562.
Destacamos o fato de que os ministros de outras denominações são “pastôres do rebanho por que Cristo está intercedendo.” Deveriamos tratá-los como tais. Não seja que estejamos ofendendo àqueles por quem Cristo morreu, diminuindo dessa forma as bênçãos que Êle poderia derramar sôbre nossa igreja ao atrair a influência dêsses ministros em favor da mensagem escatológica que o Senhor nos recomendou.
O segundo exemplo de sentimento criado com antecipação à plenitude da realidade do fato está relacionado com a marca da bêsta:
“Mas os cristãos das gerações passadas observaram o domingo, supondo que assim fazendo estavam a guardar o sábado bíblico; e hoje existem verdadeiros cristãos em tôdas as igrejas, não excetuando a comunhão católica romana, que crêem sinceramente ser o domingo o dia de repouso divinamente instituído. Deus aceita a sinceridade de propósito de tais pessoas e sua integridade. Quando, porém, a observância do domingo fôr imposta por lei, e o mundo fôr esclarecido relativamente à obrigação do verdadeiro sábado, quem então transgredir o mandamento de Deus para obedecer a um preceito que não tem maior autoridade que a de Roma, honrará desta maneira ao papado mais do que a Deus. Prestará homenagem a Roma, e ao poder que impõe a instituição que Roma ordenou. Adorará a bêsta e a sua imagem. Ao rejeitarem os homens a instituição que Deus declarou ser o sinal de Sua autoridade, e honrarem em seu lugar a que Roma escolheu como sinal de sua supremacia, aceitarão, de fato, o sinal de fidelidade para com Roma — ‘o sinal da bêsta.’ E sòmente depois que esta situação esteja assim plenamente exposta perante o povo, e êste seja levado a optar entre os mandamentos de Deus e os dos homens, é que, então, aquêles que continuam a transgredir hão de receber ‘o sinal da bêsta’ ”. — O Conflito dos Séculos, pág. 486.
Aqui está muito claro que o sinal da bêsta ainda não foi impôsto sôbre ninguém. Não digamos então aos protestantes que têm o sinal da bêsta, e Conseqüentemente não os tratemos como se o tivessem.
Como podemos controlar nossa mentalidade escatológica para não cair no perigo que acabamos de assinalar? Existe apenas uma solução. Dissemos que temos uma escatologia cristocêntrica. Pois bem, esta é a única solução ao problema: manter sempre nossa escatologia cristocêntrica. É ao tirar Cristo de seu centro quando ficamos com uma mentalidade escatológica sem Cristo, e portanto ficamos sem Seu poder de controle e sem Seu amor. Como conseqüência, os julgamentos e as condenações que deveriam ficar sob o controle de Seu poder, passam a ser controlados pelo poder de nossas emoções. A atitude de Cristo é a solução a êste como a todos nossos problemas. E a atitude de Cristo está maravilhosamente ilustrada na parábola do bom samaritano.
3) Nosso conceito da função que a igreja deve cumprir no mundo: A terceira causa da deterioração das relações com os demais cristãos é o conceito da função da igreja no mundo. Que é a igreja?
Esta pergunta teve muitas respostas. Comumente ouvimos dizer entre os protestantes e mesmo entre os adventistas que a igreja é a comunidade dos fiéis, mas isto não é uma definição que realmente descreva a igreja. Existem alguns que a consideram uma instituição hierárquica, outros, sem deixar a idéia de instituição a transformam em democrática, o que é uma aberração já que confundem um assunto político com outro religioso, mas o mencionamos tal como alguns o usam. Últimamente J. Hoekendkijk tem dito que a igreja é um movimento entre o reino de Deus e o mundo. Isto nos coloca totalmente dentro do problema de sua função no mundo, pois o mesmo teólogo diz que a igreja é uma função da obra missionária, e não o contrário. Quer dizer que não haveria algo assim como uma função da igreja no mundo mas que esta seria uma função do plano missionário de Deus, sendo que Cristo não teria vindo estabelecer uma igreja mas ganhar o mundo, como conseqüência ninguém deve se unir a um grupo religioso específico. Isto leva à conclusão de que tôdas as igrejas são vias paralelas de salvação.
É a igreja uma via de salvação? Não, não é uma via, mas um movimento no qual a salvação se manifesta. A igreja é a manifestação visível da salvação entre os homens. Em harmonia com isto está a seguinte definição de igreja: “A essência da igreja é Jesus Cristo existindo na mente ou coração daqueles que O aceitaram como seu Salvador, que o amam, que se amam entre si e que obedecem a Palavra de Deus como êles a entendem”. — Seventh-Day Bible Commentary, Vol. X, págs. 266 e 267.
Esta definição adventista de igreja implica fé para aceitar a Cristo como Salvador e reconhecimento de que também outros formam parte da igreja embora entendam as palavras do Salvador em forma diferente de como nós as entendemos. Os adventistas nunca acreditaram que êles sejam os únicos filhos de Deus sôbre a Terra hoje. Concedemos mais importância ao conceito de parentesco com Deus, isto é de ser filhos de Deus, que ao conceito de doutrina. É certo que a doutrina verdadeira identifica a igreja verdadeira, mas não exclui a outros que não’ tenham tôda esta doutrina. Êles também podem pertencer, e de fato pertencem ao povo de Deus, à igreja. Isto é possível em uma teologia como a nossa porque a relação com Deus é individualmente dinâmica e progressiva. O conhecimento da doutrina é “como a luz da aurora que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito.” A perfeição não é um estado a ser alcançado mas um processo a seguir. A igreja não é uma instituição, nem sequer uma via de salvação, mas um movimento no qual a salvação se toma real e visível aos sêres humanos. Visível como uma experiência que podemos contemplar em outros e real no sentido de que é uma experiência que devemos experimentai em nós mesmos.
Isto significa que não devemos pregar o evangelho aos protestantes? Não. A Igreja Adventista tem a missão de pregar o evangelho eterno a tôda nação, e tribo, e língua e povo (Apoc. 14: 6 e 7). Aqui também estão incluídas as igrejas evangélicas e protestantes. Mas não devemos pregar-lhes para convertê-los como o faríamos com os não crentes, mas devemos pregar-lhes para admoestá-los. Com êles devemos fazer a obra de reforma que Elias e João Batista fizeram por Israel. O lamentável é que amiúde acreditamos que a reforma consiste em degolar falsos profetas no Monte Carmelo e tratar de geração de víboras aos apóstatas. Desta maneira concentramos nossa atenção nos sacerdotes de Baal que provàvelmente não eram israelitas mas estrangeiros trazidos por Jezabel, e nos concentramos nos fariseus cuja religião tão misturada com elementos humanos já não era divina. Desta forma nos esquecemos dos sete mil cujos joelhos não se dobraram a Baal (I Reis 19:18) e nos esquecemos de que a mensagem de João era um chamado ao arrependimento com o objetivo de preparar os corações para a vinda do Senhor.
Êstes imperdoáveis esquecimentos nos ocorrem quando cultivamos o espírito de orgulhoso exclusivismo que tinham os judeus. Êste espírito nos faz levantar uma barreira entre nós e os protestantes, assim como os judeus a levantavam entre êles e os gentios. Ao sentirem possuidores da verdade que temos acreditamos que somos possuidores em nós mesmos dessas qualidades que fazem da verdade o supremo saber acessível ao homem. Como conseqüência desta aberração acreditamos ser quase infalíveis em matéria de doutrina. Isto nos dá uma atitude que ofende aos demais. Mas escutemos êste conselho: “Muitos há que necessitam nossa simpatia e conselho, mas não êsse conselho que implica superioridade no doador e inferioridade no que o recebe.” — Testimonies, Vol. 3, pág. 534. Devemos eliminar esta barreira que nossa atitude levantou contra os protestantes. O muro de separação entre judeus e gentios devia ser derribado (O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 301). Já não deveria haver barreiras. Não deveria haver fronteiras, tampouco haver nenhuma distinção, porque os adventistas e os demais cristãos temos necessidade do perdão de nossos pecados e necessidade do mesmo Cristo para que lave nossas imundícias. Por esta mesma razão a igreja não é uma instituição, mas um movimento onde a salvação se torna real e visível a todos os homens.
Quando os pioneiros adventistas não queriam organizar uma igreja, estavam certos. Temiam que a idéia de movimento se perdesse e o conceito de instituição dominasse as mentes, com a idéia de “dentro” e “fora.” Não, na igreja de Cristo não existe um “dentro” nem um “fora.” Nesta igreja existe uma fraternidade baseada no amor e alicerçada no sacrifício de Cristo que é a maior expressão do amor salvador. Hoje os protestantes e evangélicos estão proclamando a união de todos os crentes baseando-se nos princípios de tolerância e ecumenismo. Nós não propiciamos a união mas sim a destruição de barreiras.
Tem a igreja uma missão no mundo? Não, a igreja é uma missão. Todos nós somos uma missão vivente na qual a salvação se torna visível e real. A igreja e Cristo são um assim como Cristo e o Pai eram um no plano de salvação. Cristo não era uma missão do Pai, mas disse que era “um com o Pai,” e disse ademais: “quem Me vê a Mim vê o Pai” (S. João 14:9). Assim como a salvação foi visível na cruz de Cristo, hoje se torna visível na igreja. Êste movimento não conhece fronteiras nem admite exclusivismos de nenhuma natureza, Cristo é seu único limite, é Êle disse: “atrairei todos a Mim mesmo” (S. João 12:32). A Igreja Adventista (em seu ministério também) portanto, deve desenvolver a atitude de um movimento que inclua a todos os que crendo em Cristo se preparam para Seu regresso. Não deve se separar, mas expandir-se. Não deve excluir, mas incluir. Não deve lutar contra os protestantes mas admoestá-los e chamá-los ao arrependimento.
POSSÍVEL SOLUÇÃO AO PROBLEMA
Para a causa histórica propomos a solução adventista escatológica. Aqui está a oportunidade de demonstrar que nossa força não vem do passado histórico mas do futuro, e no futuro não existe a experiência de ignomínia mas a contrária, a de um grande movimento de membros das igrejas evangélicas protestantes unindo-se com os adventistas na espera do reino de Deus. “Esquecendo-me das coisas que para trás ficam, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Filipenses, 3:13 e 14).
Para as causas teológicas propomos as seguintes soluções: Em primeiro lugar, um estudo mais a fundo de nossa própria teologia escatológica para que dessa forma não desenvolvamos sentimentos que não deveriamos ter, já que nosso princípio escatológico de compreensão teológica é o mais gloriosamente dinâmico e impregnado das mais preciosas bênçãos de esperança e de vitória. Uma teologia cristocêntrica deve nos dar maturidade espiritual suficiente para des-truir tôda parede de separação e conservar-nos na verdade que é em Cristo para aceitação de todos que O recebam.
Em segundo lugar, propomos a validez teológica do princípio do amor fraternal que tolera as crenças de outros e os aceita como irmãos em Cristo, embora tenham crenças diferentes, sabendo que a separação entre ovelhas e cabritos não está encomendada a nós os sêres humanos, mas que é uma prerrogativa que só corresponde a Cristo, que Êle aplicará quando venha em Seu reino e não antes.
Em terceiro lugar, propomos que cada adventista desenvolva uma consciência definida de que sua igreja não é uma instituição que tem limites que marcam um “dentro” e um “fora,” mas que é um movimento vivo onde a salvação, o próprio Cristo, torna-se visível aos olhos enceguecidos da humanidade atual.
E como última solução, propomos que a igreja, ao considerar-se como um movimento vivo, nem sequer pensa que êste movimento procede de sua própria atividade, mas da atividade todo-poderosa em conversão de almas do Espírito Santo, que é a potência e a segurança da igreja. Quer dizer que há necessidade de que um verdadeiro espírito de humildade se apodere de cada ministro e de cada membro de igreja a tal ponto que cheguemos a aceitar a todos os cristãos como nossos irmãos, não olhando aos não adventistas como publicanos e pecadores. São nossos irmãos na necessidade do mesmo perdão e do mesmo Cristo.