Orientações bíblicas para experimentar o desenvolvimento pessoal

Ao narrar a história de Jesus em seu evangelho, Lucas faz uma afirmação importante relacionada ao crescimento do Senhor: “O menino crescia e Se fortalecia, enchendo-Se de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre Ele” (Lc 2:40). Essa declaração indica que Cristo “se desenvolvia na área física, mental, moral e espiritual. Assim, nessa descrição, Lucas apresenta Jesus a seus leitores como o Filho do Homem, um ser humano perfeito”.1 É notável observar que “a história do Menino Jesus aos doze anos representa todo o Seu desenvolvimento. A criança Jesus cresceu, não como um menino-prodígio, mas como um ser humano igual a nós, exceto no que se refere ao pecado”.2

Na sequência, o evangelista volta a apontar o processo do crescimento de Cristo: “E Jesus crescia em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2:52). Note que o Salvador Se desenvolvia de maneira plena.3 Primeiramente, Ele crescia em “sabedoria”. O termo sofia se refere a uma “inteligência ampla e completa”, “conhecimento sobre diversos assuntos”.4 Podemos entender que Seu modo de agir, Seu procedimento e Sua fala expressavam sabedoria, isto é, eram bem refletidos, adequados e corretos. Ele sabia os limites em cada situação, quando falar ou silenciar, quando e como ajudar e ainda como
posicionar-Se em diversas circunstâncias, respeitando todas as pessoas.

Em segundo lugar, Jesus crescia em “estatura e graça”. O vocábulo grego helikia significa tanto idade quanto estatura corporal.5 Ou seja, Ele passou por todas as faixas etárias, de tal maneira que desfrutou da vida terrena com suas oportunidades e desafios.

Finalmente, Jesus crescia em graça, diante de Deus e das pessoas. Isso nos leva a pensar que Ele cresceu com a aprovação divina, ao mesmo tempo que – com Sua postura amável, bondosa e simpática – conquistava o coração das pessoas, as quais O tratavam com afeto. Dessa maneira, Ele experimentou “de forma crescente a bondade de Seu Pai e também a amizade das pessoas que O rodeavam”.6

Crescimento com qualidade

A semelhança com Cristo é o traço característico mais esperado em um discípulo. Paulo escreveu aos romanos: “Pois aqueles que Deus de antemão conheceu Ele também predestinou para serem conformes à imagem de Seu Filho, a fim de que Ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8:29). Nesse verso, o apóstolo afirmou que o propósito eterno de Deus para nós – estabelecido no passado – é que sejamos semelhantes a Cristo. Em 2 Coríntios 3:18, ele acrescentou a dimensão presente a esse tema: “E todos nós, com o rosto descoberto, contemplando a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na Sua própria imagem, como pelo Senhor, que é o Espírito.” João, por sua vez, estabeleceu a dimensão futura ao tema: “Amados, agora somos filhos de Deus, mas ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando Ele Se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque haveremos de vê-Lo como Ele é” (1Jo 3:2).

Essas três dimensões enfatizam o desafio de sermos semelhantes a Cristo; esse é o propósito eterno, presente e escatológico de Deus. Tudo o que o discípulo pensa e faz deve ser com o objetivo de alcançar o mais alto padrão no que diz respeito ao caráter. Cristo é nosso padrão, nossa referência, nosso modelo, e isso torna o discípulo plenamente diferenciado de um mero seguidor. Podemos chamar isso de “crescimento com qualidade”.

Se o discípulo é semelhante a Cristo, uma característica marcante de seu crescimento qualitativo é seu inconformismo em relação às coisas erradas que há no mundo, pois ser semelhante ao Senhor implica não se conformar com nenhum tipo de postura ou comportamento que destoe daquilo que Ele faria em nosso lugar. De fato, Deus convoca Seu povo para “ser diferente de todos”;7 “portanto, sejam santos, porque Eu sou santo” (Lv 11:45). No Novo Testamento, Paulo desafiou os cristãos a não se conformarem com este século, mas se transformarem pela renovação da mente (Rm 12:2).

O inconformismo do discípulo é uma demonstração de sua maturidade. Ele não aceita uma vida superficial; quer, sim, uma vida enraizada em Jesus e em Sua Palavra. Como declarou o apóstolo Paulo, precisamos nos apresentar perfeitos em Cristo (Cl 1:28, 29). O adjetivo grego teleios, traduzido como “perfeito”, significa “completo”, “maduro”,8 compreendendo que maturidade é aquilo que distingue o adulto da criança.9 Ser maduro implica, então, um relacionamento sólido e pessoal com o Senhor, que nos leva a amá-Lo e a obedecer à Sua Palavra. Discípulos maduros têm plenas condições de testemunhar eficientemente do amor divino, proclamando ao mundo Sua graça transformadora.

Crescimento equilibrado

Outra característica fundamental do crescimento é o equilíbrio. Em sua primeira carta, Pedro usou seis metáforas que ilustram muito bem como o cristão deve conduzir-se de modo equilibrado. As metáforas usadas são: bebês, pedras, sacerdotes, povo de Deus, estrangeiros e servos (1Pe 2:1-17). Elas formam três pares: (1) bebês e pedras, (2) sacerdotes e povo de Deus, e (3) estrangeiros e servos.

Esses três pares de metáforas nos mostram que:

• Como crianças recém-nascidas, somos chamados a crescer individualmente; mas como pedras vivas somos chamados à comunhão; as pedras “abrem mão” de sua individualidade a fim de fazerem parte do prédio.

• Como sacerdotes somos chamados a adorar, mas como povo de Deus somos chamados a trabalhar.

• Como estrangeiros somos conscientizados de nossa peregrinação neste mundo, mas como servos somos lembrados de nossos deveres como cidadãos.

Dessa maneira, “somos tanto discípulos individuais quanto membros da igreja, tanto adoradores quanto testemunhas, tanto peregrinos quanto cidadãos”.10 Assim, precisamos viver as expectativas que Deus tem a nosso respeito de modo equilibrado.

Crescimento dependente

Finalmente, precisamos crescer de modo dependente, não apenas de Cristo, mas das pessoas. Paulo recomendou: “Levem as cargas uns dos outros” (Gl 6:2). Constantemente aprendemos e ouvimos que nossa sociedade e a igreja necessitam de pessoas que sejam competentes naquilo que fazem; isso é verdade, mas não é suficiente. A igreja também necessita de pessoas que valorizem seus relacionamentos, que aprendam a trabalhar em equipe; enfim, que dependam umas das outras.

Certa vez perguntaram ao empreendedor norte-americano John Rockefeller qual era a qualidade que mais apreciava encontrar nos líderes de seu complexo de empresas. Sua resposta permanece viva até hoje: “Pagarei mais pela habilidade do relacionamento com pessoas do que por qualquer outra habilidade que possa haver debaixo do sol”.11

O propósito do crescimento

Nosso crescimento pessoal se fundamenta no exemplo de Jesus e tem ao menos três características: qualidade, pois nos torna discípulos de Cristo, e não meros seguidores; equilíbrio, pois favorece a individualidade e a comunidade, a adoração e o testemunho, o peregrinar e o ser cidadão; e dependência, pois contamos com o apoio de Cristo e das pessoas.

Ao somar os benefícios desses três aspectos, concluímos que sua utilidade é inegável: tornamo-nos melhor preparados, com maior entendimento para viver a vida que Deus espera que vivamos. Entretanto, uma pergunta precisa ser respondida: Qual é o objetivo desse melhor entendimento e preparo? Não estamos falando de mero utilitarismo, e sim de vida com propósito.

Essa resposta pode ser dada em três pontos.

Para aprender os mandamentos: Davi declarou: “As Tuas mãos me fizeram e me formaram; dá-me entendimento para que eu aprenda os Teus mandamentos” (Sl 119:73); e acrescentou: “Sou teu servo; dá-me entendimento, para que eu conheça os Teus testemunhos” (Sl 119:125).

O crescimento bem orientado resulta em melhor preparo e entendimento, o qual nos permite aprender e obedecer aos mandamentos de Deus. Observe que o crescimento não redunda em mera satisfação pessoal, mas em uma vida que se pauta pela vontade de Deus.

Para viver melhor. O salmista também declarou: “Eterna é a justiça dos Teus testemunhos; dá-me entendimento, e viverei” (Sl 119:144). Por sua vez, Salomão escreveu: “Quem adquire sabedoria ama a sua alma; o que conserva o entendimento acha o bem” (Pv 19:8). Em Eclesiastes 7:12, ele ainda afirmou: “A sabedoria protege, do mesmo modo que o dinheiro; mas a vantagem da sabedoria é que ela dá vida a quem a possui.”

Esses três textos apontam para um princípio fundamental: O crescimento bem orientado resulta em melhor preparo e entendimento, o qual nos permite viver melhor. Assim, a vida correta de um cristão autêntico não é resultado de técnicas familiares, lições de autoajuda ou esforço humano solitário. Não! Ela é resultado de uma compreenssão pautada no “assim diz o Senhor”.

Para obter êxito em nossas atividades. Em Provérbios 24:3 está escrito: “Com a sabedoria se constrói a casa, e com a inteligência ela se firma.” Considerando que “o temor do Senhor é o princípio da sabedoria; conhecer o Santo é ter entendimento” (Pv 9:10), é fácil concluir o seguinte: O crescimento bem orientado resulta em melhor preparo e entendimento, o qual nos abre as portas de uma vida bem-sucedida.

O pastor, como discipulador, é desafiado a experimentar crescimento diário e consistente. Para que isso aconteça, é necessário que ele desenvolva de maneira equilibrada todos os aspectos de sua vida. Assim, ele seguirá a orientação da Palavra de Deus: “Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Ef 4:15).

Nosso crescimento pessoal se fundamenta no exemplo de Jesus e tem ao menos três características: qualidade, equilíbrio e dependência.

Referências

1 I. Neves e J. McGee, Comentário Bíblico de Lucas: Através da Bíblia (São Paulo, SP: Rádio Trans Mundial, 2012), p. 49.

2 F. Rienecker, Evangelho de Lucas (Curitiba, PR: Editora Evangélica Esperança, 2005), p. 72.

3 As considerações a seguir estão baseadas em Rienecker, Evangelho de Lucas, p. 76-78.

4 J. Strong, Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong (Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2002), verbete sofia.

5 Strong, Léxico, verbete helikia.

6 W. Hendriksen, Lucas (São Paulo, SP: Cultura Cristã, 2014), v. 1, p. 231, 232.

7 John Stott, O Discípulo Radical (Viçosa, MG: Ultimato, 2011), p. 13.

8 Lothar Coenen e Colin Brown (orgs.), Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento (São Paulo, SP: Vida Nova, 2000), p. 94.

9 Coenen e Brown, Dicionário Internacional, p. 984.

10 Stott, O Discípulo Radical, p. 84.

11 Frank Viana Carvalho, Pedagogia da Cooperação: Uma introdução à metodologia da aprendizagem cooperativa (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2000), p. v.