Neste artigo pretendo enumerar as razões pelas quais rejeito pessoalmente a pretensa mensagem escatológica exposta do opúsculo intitulado “Contagem regressiva, ano 2000”. Quatro pressuposições justificam a minha tomada de posição:

Primeiramente, sou ancião de igreja e, como tal, tenho recebido a incumbência de “exortar pelo reto ensino, convencer os que contradizem. Porque existem muitos insubordinados, palradores frívolos, e enganadores… É preciso fazê-los calar porque andam pervertendo casas inteiras, ensinando o que não devem, por torpe ganância… Portanto, repreende-os… para que sejam sadios na fé” (Tito 1:9-11 e 13).

Em segundo lugar, sou professor de Teologia. Minha posição perante os meus alunos, futuros pastores e líderes da Igreja, induz-me a abrir o coração para lhes dizer que “precisamos, porém, recusar firmemente ser afastados da plataforma da verdade eterna que desde 1844 tem resistido à prova” — Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 200. É nosso privilégio defender os alicerces da fé que nos legaram os pioneiros do movimento adventista.

Terceira pressuposição: sou um pastor. E, portanto, é meu privilégio “atender todo o rebanho… pastorear a igreja de Deus…”, pois constantemente estão tentando penetrar nela “lobos vorazes que não pouparão o rebanho… Dentre vós mesmos se levantarão homens falando coisas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles. Portanto, vigiai…” (Atos 20:28-31).

Finalmente, acredito na Bíblia e no Espírito de Profecia. Perante uma tentativa a mais de alguns se levantarem para marcar datas para o retorno de Cristo, entre o povo de Deus, lembro-me de que o crente “não deve permitir que as pessoas acreditem numa mentira. Deve informar-lhes da verdade. Não deve deixar que as pessoas pensem que o assunto pode ser ou não ser…” — Mensagens Escolhidas, vol. 3, págs. 398 e 399.

Expostas as justificativas acima, passo a enumerar as razões pelas quais não acredito na pseudo-mensagem do panfleto “Contagem regressiva ano 2000”.

Razão nº 1 — Deus está guiando uma igreja, um povo, não indivíduos separados para lhes confiar Sua verdade.

“Deus tem uma Igreja na Terra que é Seu povo escolhido, que guarda os Seus mandamentos. Ele está conduzindo, não galhos extraviados, não um aqui e outro lá, senão um povo.” — Testemunhos Seletos, vol. 2, pág. 79.

“O tempo atual é de grande perigo para o povo de Deus. O Senhor está conduzindo um povo não um indivíduo aqui e ali. Ele tem na terra uma igreja que permanece na verdade…” — Idem.

Razão nº 2 — O panfleto cita tendenciosamente os Testemunhos.

Após citar os Testemunhos Seletos, vol. 1, págs. 505 e 506, na página 37 do mencionado opúsculo, o autor conclui dizendo: “A pregação da serva do Senhor é clara: assim como Deus enviou uma mensagem de tempo através de Noé, e esta foi ridicularizada, o mesmo se daria por ocasião da vinda de Jesus. Ao ser anunciado o segredo de Deus quanto ao dia que Ele estabeleceu para a vinda de Jesus, muitos hão de se opor, referindo-se às predições anteriores de tempo que não se cumpriram”.

Mas o que diz realmente Ellen G. White na referida citação? Vejamos:

O primeiro parágrafo da seção intitulada “A influência do marcar tempo” menciona que “muitos que se têm chamado de adventistas, têm marcado tempo. Repetidamente marcavam uma data para a vinda de Cristo…” Salienta então, que “o tempo exato da vinda do Senhor… acha-se além do conhecimento dos mortais”. “Por isso que passou repetidamente a data marcada, o mundo está hoje em mais positivo estado de incredulidade do que antes, com respeito ao próximo advento de Cristo.” Afirma em seguida, a serva do Senhor que, em virtude do fracasso da marcação de datas para o retorno de Cristo, “os homens têm sido enganados, dão costas à verdade sustentada pela Palavra de Deus, de estar às portas o fim de todas as coisas”. Outrossim, diz que “os que tão Presumidamente pregam um tempo definido, assim fazendo agradam ao adversário das almas; pois promovem a incredulidade, e não o cristianismo”.

A seguir, informa que os que marcam tempo para a vinda de Cristo “citam passagens das Escrituras, e mediante falsa interpretação mostram uma cadeia de argumentos que aparentemente lhes apoiam a posição. Mas seus fracassos mostram que são falsos profetas, que não interpretam devidamente a linguagem da inspiração”. E mais, “esses erros têm trazido má fama à verdade de Deus para estes últimos dias”.

Então, no centro do parágrafo, Ellen White afirma que, pelas razões acima apresentadas, “os homens rejeitaram a solene mensagem de advertência para os nossos dias, como fizeram no tempo de Noé”.

Caso tudo isso seja pouco para convencer os “inconstantes que torcem também outras Escrituras” (II Ped. 3:16), no rodapé da página 505 encontra-se o seguinte: “O tempo não serviu mais de prova, desde 1844, e nunca mais será uma prova. O Senhor me mostrou que a mensagem do terceiro anjo tem de avançar e ser proclamada aos esparsos filhos do Senhor, mas não deve ser feita depender de tempo. Vi que alguns se possuíam de uma falsa agitação, provinda da pregação do tempo; mas a mensagem do terceiro anjo é mais forte do que pode ser o tempo. Vi que esta mensagem pode permanecer em pé sobre seu próprio fundamento, e não precisa da questão do tempo para fortalecê-la; e que irá com grande poder, e fará sua obra, e será abreviada em justiça.” — 1851, Primeiros Escritos, pág. 75.

Razão nº 3 — A argumentação é uma coleção de fábulas judaicas.

A “teoria profética dos seis mil anos” isto é, a crendice segundo a qual os seis dias da criação, seguidos pelo sábado, juntamente com as declarações de que para Deus um dia é como mil anos e mil anos como um dia (II Ped. 3:8), e que ao fim dos seis mil anos entraremos no sábado milenar de repouso, não tem fundamento bíblico. Essa ideia foi originada na mitologia antiga (persa e etrusca, por exemplo), e em uma analogia judaica dos dias da criação. Foi cristianizada pelo pais da Igreja e persistiu por muito tempo depois que o bispo James Ussher publicou seus Annal (cronologia bíblica) entre 1650 e 1658 (ver Comentário Bíblico Adventista, vol. 1, págs. 188,, 189, 205 e 206).

O fantástico cálculo que é feito dos anos jubilares também forma parte das “fábulas judaicas”, e está confirmada em textos rabínicos, nos quais se afirma que “o rabi Judá diz que Elias contou-lhe que o mundo tem não menos de 85 ciclos jubilares, e no último ciclo o Filho de Davi virá” (Sanhedrin, 97b. Para maiores comentários e referências, ver George Wesley Buchaman, “Sabbatical Escatology” em Christians News From Israel, 18 de dezembro de 1967, págs. 51 a 54).

A interpretação literal das profecias sobre a “restauração de um Estado israelita também forma parte de uma fábula judaica moderna chamada Sionismo. Vale dizer que essa ideia faz parte da escatologia da maioria das denominações protestantes que se apoiam nos conceitos do dispensacionalismo de Scoffield.

Deturpando as Escrituras, o panfleto pretende fundamentar essa heresia dispensacionalista com uma declaração do Espírito de Profecia, no tocante à obra entre os judeus: “os conversos judeus hão de ter parte importante a desempenhar, nos grandes preparativos a serem feitos no futuro, para receber a Cristo, nosso príncipe. Nascerá uma nação em um dia”. — Evangelismo, pág. 579.

No entanto, tendenciosamente é omitida a informação a respeito de como nascerá essa “nação” em um dia. Eis a declaração de Ellen White:

“Nesta nossa época, vemos os gentios começarem a se regozijar com os judeus. Há conversos ora trabalhando em… e em várias cidades, em favor de seu próprio povo. Os judeus estão vindo para as fileiras dos escolhidos seguidores de Deus e estão sendo contados com o Israel de Deus nestes dias finais. Assim, alguns deles serão mais uma vez reintegrados com o povo de Deus e as bênçãos do Senhor repousarão ricamente sobre eles, se chegarem à posição de regozijo apresentada na Escritura: ‘E outra vez diz: Alegrai-vos, gentios, com o Seu povo’”. — Idem, pág. 578.

Noutras palavras, é a Igreja — não um Estado político e militar —, com homens de todos os povos, todas as línguas e raças, que forma o Israel de Deus. Essa é a nação que “nascerá em um dia”.

Razão nº 4 — No panfleto pratica-se a adivinhação.

Mediante um artificioso ardil numerológico, o autor pretende marcar datas para os eventos futuros, entre eles a data da chuva serôdia, o fim do tempo da graça e a data do retorno de Cristo. Sobre este particular, opina mais uma vez, o Espírito de profecia:

“Deus não nos revelou o tempo em que esta mensagem será concluída, ou mesmo quando terá fim o tempo da graça. As coisas reveladas aceitaremos para nós e nossos filhos; não busquemos, porém, saber aquilo que foi mantido em segredo nos concílios do Todo-poderoso.” — Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 191.

“Tenho sido repetidamente advertida com referência a fixar datas. Nunca mais haverá para o povo de Deus uma mensagem baseada em tempo. Não temos de saber o tempo definido nem para o derramamento do Espírito Santo nem para a vinda de Cristo.” — Idem, pág. 188.

“Não tenho nenhum tempo específico de que falar, no qual tenha lugar o derramamento do Espírito Santo — quando o poderoso anjo descer do Céu, e se unir com o terceiro anjo na conclusão da obra para este mundo; minha mensagem é que nossa única segurança é estarmos prontos para o refrigério celeste… ‘porque o Filho do homem há de vir à hora em que não penseis’.” — Idem, pág. 192.

Toda e qualquer tentativa de adivinhar quando tais eventos acontecerão é uma prática abominável, condenada pela Bíblia (Deut. 18:10 e 12).

Razão nº 5 — Marcar datas para eventos futuros, é parte dos objetivos satânicos para deter a obra de pregação.

‘‘O objetivo de Satanás cumpre-se tão certamente quando homens vão na dianteira de Cristo e fazem obra que Ele nunca lhes confiou.” — Idem, vol. 2, pág. 13.

‘‘Os que se apegam à Palavra não abrirão as portas para Satanás fazendo imprudentes declarações com referência a profecias ou a sonhos e visões. Em maior ou menor grau se têm introduzido aqui e ali manifestações falsas desde 1844, depois do tempo em que aguardávamos a segunda vinda de Cristo.” — Idem, pág. 21.

“Eu disse ao povo que não necessitavam dar atenção à teoria desse homem; pois o acontecimento que ele predizia não havia de ter lugar. Os tempos e as estações, Deus estabeleceu por Seu próprio poder. E por que não nos deu Deus esse conhecimento? Porque não faríamos dele o devido uso… Desse conhecimento viria em resultado um estado de coisas entre nosso povo, que retardaria grandemente a obra de Deus no preparar um povo para subsistir naquele grande dia que há de vir. Não devemos viver em excitação acerca do tempo.” — Idem, pág. 189.

Razão nº 6 — Devemos desconfiar de qualquer pessoa que marque datas para o retorno de Cristo.

“Desconfiem todos os nossos irmãos e irmãs de qualquer um que queira marcar uma data em que o Senhor há de cumprir Sua palavra no tocante à Sua vinda, ou no tocante a qualquer outra promessa de significado especial que tenha feito. ‘Não vos toca saber os tempos ou as estações que o Pai colocou na Sua potestade’ (Atos 1:7).” — Testemunhos Seletos, vol. 2, págs. 359 e 360.

“Ninguém será capaz de predizer exatamente quando virá aquele tempo: pois ‘daquele dia e hora ninguém sabe’. Não sereis capazes de dizer que Ele virá dentro de um, dois ou cinco anos, nem deveis retardar Sua vinda, declarando que não será por dez, ou vinte anos.” — Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 189.

“Um… defendeu e publicou uma mensagem quanto ao alto clamor do terceiro anjo… Esse é um homem inteligente, falando de maneira aceitável, e abnegado e cheio de zelo e ardor; e tendo a aparência de consagração e devoção. Mas a Palavra de Deus veio a mim: ‘Não os creiais nem os enviei’. Se algum homem a quem olhei era inspirado, certamente era este, mas eu lhe disse claramente que sua inspiração era de Satanás, não de Deus. Sua mensagem não apresentava as credenciais divinas.” — Idem, vol. 2, págs. 64 e 65.

“Pessoa alguma que fixe o tempo em que Cristo deva vir ou não vir, tem mensagem verdadeira… ‘Estai vós apercebidos… porque o Filho do homem virá à hora em que não penseis’ (S. Mat. 24:44). Essa é nossa mensagem, a própria mensagem que os três anjos voando pelo meio do Céu estão proclamando.” — Idem, págs. 113 e 114.

“Sempre haverá movimentos falsos e fanáticos feitos na igreja por pessoas que pretendem ser dirigidas por Deus — pessoas que correram antes de ser enviadas, e darão dia e data para o cumprimento da profecia não cumprida. O inimigo se agrada de que assim procedam, pois seus sucessivos fracassos e direção em sentido falso, causam confusão e incredulidade.” — Idem, pág. 84.

Razão nº 7 — O dia e a hora do retorno de Cristo não serão anunciados pela boca de homem algum; e sim pelo próprio Deus, após o tempo de angústia.

“Foi à meia-noite que Deus preferiu livrar o Seu povo. Estando os ímpios a fazer zombarias em redor deles, subitamente apareceu o Sol, resplandecendo em sua força e a Lua ficou imóvel… Sinais e maravilhas seguiam-se em rápida sucessão. Tudo parecia desviado de seu curso natural. Os rios deixavam de correr. Nuvens negras e pesadas subiam e batiam umas nas outras. Havia, porém, um lugar claro de uma glória fixa, donde veio a voz de Deus, semelhante a muitas águas, abalando os céus e a terra. Houve um grande terremoto. As sepulturas se abriram… O céu abria-se e fechava-se, e estava em comoção. As montanhas tremiam como uma vara ao vento, e lançavam por todos os lados pedras anfractuosas. O mar fervia como uma panela e lançava pedras sobre a terra. E, falando Deus o dia e a hora da vinda de Jesus, e declarando o concerto com o Seu povo, proferia uma sentença e então silenciava, enquanto as palavras estavam a repercutir pela terra. O Israel de Deus permanecia com os olhos fixos para cima, ouvindo as palavras, enquanto elas vinham da boca de Jeová e ressoavam pela Terra como estrondos do mais forte trovão. Era terrivelmente solene. No fim de cada sentença, os santos clamavam: Glória! Aleluia!…” — Primeiros Escritos, págs. 285, 286 e 34.

Razão nº 8 — O Elias vindouro que aparecerá “antes que venha o grande e terrível dia do Senhor” não será um homem — como pretende sê-lo o autor do panfleto — e sim um povo com o “Espírito e poder de Elias”.

‘‘Há uma obra a ser feita em nossos campos. Pecadores que nunca ouviram a mensagem precisam ser advertidos. Oxalá que todos os filhos de Deus fossem obreiros. A obra de salvar almas não foi confiada aos pastores somente. Aqueles que têm a verdade em seu coração e que têm exercido uma boa influência nos seus lares, devem sentir que uma responsabilidade descansa sobre eles: ser um missionário de Deus… João Batista foi enviado no Espírito e poder de Elias para preparar o Caminho do Senhor, e para voltar o povo à sabedoria dos justos. Ele foi representante daqueles que vivem nestes últimos dias aos quais Deus tem confiado sagradas verdades para apresentar ao mundo, a fim de preparar o caminho para o segundo aparecimento de Cristo.” — Testimonies, vol. 3, págs. 61 e 62.

‘‘Hoje, como no espírito e poder de Elias e de João Batista, mensageiros escolhidos por Deus estão chamando a atenção de um mundo em vias de julgamento para os solenes acontecimentos a terem lugar breve em conexão com as horas finais de graça e o aparecimento de Cristo Jesus como Rei dos reis e Senhor dos senhores. A hora do juízo de Deus é chegada, e sobre os membros de Sua Igreja na Terra repousa a solene responsabilidade de advertir aos que estão mesmo às bordas, por assim dizer, da eterna ruína… Nestas horas finais de graça para os filhos dos homens, quando a sorte de cada alma deve ser logo decidida para sempre, o Senhor do Céu e da Terra espera que Sua Igreja desperte para a ação como nunca dantes. Os que foram feitos livres em Cristo pelo conhecimento da preciosa verdade, são considerados pelo Senhor Jesus como Seus escolhidos, favorecidos sobre todos os outros povos na face da Terra.” — Profetas e Reis, págs. 676 e 677.

Conclusão

Diante de tais considerações, resta-nos lembrar que não é nosso dever marcar datas para eventos futuros, e sim, estarmos prontos a cumprir nossa missão de anunciar o evangelho eterno ao mundo, tal como foi confiado à Igreja por meio do testemunho de Jesus Cristo. “Em lugar de exaurir as faculdades de nossa mente em especulações quanto aos tempos e as estações que o Senhor estabeleceu pelo Seu próprio poder, e ocultou aos homens, devemos submeter-nos ao controle do Espírito Santo, para cumprir os deveres presentes, dar o pão da vida, não adulterado com opiniões humanas, a almas a perecer por falta da verdade…” — Mensagens Escolhidas, vol. 2. pág. 23.

Finalmente, convidamos o prezado leitor a considerar solenemente as palavras do apóstolo João: “Acautelai-vos para não perderdes aquilo que temos realizado com esforço, mas para receberdes completo galardão. Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece, não tem Deus; o que permanece na doutrina, esse tem assim o Pai, como o Filho. Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas. Porquanto aquele que lhe dá boas-vindas faz-se cúmplice das suas obras más” (S. João 8:11).

RICARDO CABERO, Professor no SALT — Artur Nogueira