Quando eu tinha cerca de dez anos, um vendedor apareceu na casa dos meus pais com uma enciclopédia de oito volumes. Ao ver aqueles livros ilustrados com fotos coloridas sobre geografia, biologia e história, pensei: “Preciso deles!” Morando em uma pequena cidade, eu costumava ir à Biblioteca Municipal para estudar, o que adorava. Mas, com essa enciclopédia em casa, não precisaria mais caminhar até lá em dias quentes ou frios. Pedi à minha mãe que comprasse, e, apesar do esforço financeiro, foi uma aquisição que valeu muito a pena.

Por que estou mencionando isso? Vou explicar. Após uma palestra sobre o uso de Inteligência Artificial (IA) na produção de conteúdo religioso, um pastor me abordou dizendo que eu estava incentivando os pastores a estudarem menos e a usar menos o cérebro. Esse comentário não foi novidade para mim. A IA é amplamente discutida hoje, com opiniões divididas entre tecno-­pessimistas, que veem a IA como um perigo, e tecno-otimistas, que a consideram revolucionária. Eu me coloco em uma posição equilibrada: reconheço os riscos, mas também vejo as oportunidades que a IA oferece, assim como aconteceu com a enciclopédia que meus pais compraram.

A IA pode impactar o trabalho pastoral de duas maneiras:

Positiva:

  1. Acesso a uma vasta base de dados;
  2. Busca de histórias e ilustrações para enriquecer sermões;
  3. Ajuda na redação de textos e criação de apresentações. Contudo, deve ser usada com cautela e sempre avaliada.

Negativa:

  1. Perda de profundidade espiritual com o uso excessivo e menos estudo da Bíblia;
  2. Falta de desenvolvimento do pensamento crítico ao receber tudo pronto;
  3. Perda de habilidades de oratória.

Esses desafios, porém, não são novos. Usar sermões prontos ou apresentações de PowerPoint feitas por outros, sem estudo, oração e reflexão, traz os mesmos riscos.

A Bíblia nos ensina: “O princípio da sabedoria é: adquira a sabedoria; sim, com tudo o que você possui, adquira o entendimento” (Pv 4:7). Temos a responsabilidade de aprimorar nossas capacidades intelectuais e buscar sabedoria continuamente. Como pastores, somos chamados a ensinar com sabedoria nossas igrejas, e essa sabedoria vem da busca constante por Deus, a fonte de todo conhecimento. Nenhuma tecnologia ou recurso pode substituir nosso compromisso com o desenvolvimento intelectual e espiritual.

Ellen White escreveu: “Cada ser humano criado à imagem de Deus é dotado de uma característica própria do Criador: a individualidade, capacidade de pensar e agir. Os homens nos quais se desenvolve essa qualidade são os que encaram responsabilidades, lideram empreendimentos e influenciam pessoas” (Educação [CPB, 2021], p. 10).

Todo líder deve buscar crescimento espiritual e intelectual para influenciar pessoas, por meio de esforço, foco e consagração. Nada substitui o estudo pessoal da Bíblia e a oração. Assim como a enciclopédia que meus pais compraram aumentou minha produtividade sem substituir o estudo, a IA, usada corretamente, pode ser muito útil, mas não nos torna mais ou menos inteligentes. Como pastores adventistas, podemos usar essas tecnologias para crescer e compartilhar o evangelho, lembrando que a IA nunca substituirá o ser humano. Reflita e peça sabedoria a Deus para ser guiado nesse processo.

Jorge Rampohna, líder de comunicação da Igreja Adventista para a América do Sul