No mês de outubro celebram-se os 500 anos da Reforma Protestante, um grande movimento que se originou dentro da Igreja Católica, liderado pelo monge agostiniano Martinho Lutero. De fato, suas reivindicações revolucionaram o mundo cristão e a cultura ocidental.
Quando se pensa na Reforma, é compreensível que, uma vez que se toma como ponto de partida as famosas 95 teses de Lutero, o primeiro assunto que nos venha à mente seja a doutrina da salvação, ou mais precisamente, da justificação pela fé. Ao fazê-lo, às vezes negligenciamos o verdadeiro pilar do movimento, que permitiu não somente uma mudança na concepção da salvação e de outras doutrinas distintivas, mas também o prolongamento que influenciaria grupos ligados àquilo que foi designado como “reforma radical” (anabatistas, por exemplo), o reavivamento subsequente iniciado por John Wesley e, em última instância, o redescobrimento de verdades bíblicas importantes pelo movimento adventista. Refiro-me ao conceito da sola Scriptura.
“Sola Scriptura é a certeza de que a Palavra de Deus contém tudo o que precisamos conhecer a respeito da salvação.”
Sola Scriptura é a certeza de que a Palavra de Deus contém tudo o que precisamos conhecer a respeito da salvação. O centro da Bíblia é Cristo, e no testemunho do Livro Sagrado descobrimos que Ele é o centro da redenção (solus Christus). Nas Escrituras também se encontra a palavra que inspira a fé (sola fide) e nos mostra que a salvação é alcançada somente pela graça divina (sola gratia). Finalmente, cada página da Bíblia nos apresenta o único Ser que merece toda honra e glória: o Deus dos Céus (soli Deo gloria).
Ao mesmo tempo, o princípio sola Scriptura quebra toda uma série de filtros que a Igreja Católica havia imposto à salvação e ao conhecimento de Deus:
O filtro da tradição: Sola Scriptura foi uma forma de deixar para trás a teologia escolástica, com seu apelo à tradição e aos seus elaborados argumentos abstratos. A tradição, deixada ao critério do magistério do poder eclesial e da filosofia grega, tinha se constituído na base argumentativa da fé cristã.
O filtro da inacessibilidade: A Bíblia era mantida em segredo pelo poder eclesiástico, que a aprisionava em suas catedrais, sem deixá-la acessível ao povo.
O filtro do idioma: A Palavra de Deus ficava confinada ao latim, que não era mais a língua comum.
Uma vez que, para os reformadores, não deveria haver filtros interpretativos nem mediações, em conformidade com a crença no sacerdócio universal de todos os crentes, Lutero dedicou seus esforços para tornar a Bíblia acessível ao povo, convencido de que, em suas páginas, encontra-se a fonte universal da fé.
Como herdeiros não somente da Reforma, mas também de um movimento que surgiu enraizado no estudo dedicado e profundo das Escrituras, os ministros adventistas da atualidade devem como nunca antes erguer o estandarte do sola Scriptura: “No entanto, Deus terá na Terra um povo que se fundamentará na Bíblia, somente na Bíblia, como norma de todas as doutrinas e base de todas as reformas” (Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 595).
Sim, 500 anos se passaram, mas o princípio é o mesmo. Reformadores, príncipes, reis, presidentes, guerras e fortunas passaram, “mas a Palavra de nosso Deus permanece para sempre” (Is 40:8, NVI). Como John Wesley, cada pastor hoje deveria dizer: “Deixe-me ser um homem de um só Livro!”