A apologética como ferramenta para um ministério eficaz

Fernando Beier

Quando eu estava no último ano da faculdade de Teologia, durante um almoço com amigos surgiu um debate sobre fé e crença. Em determinado momento, alguém sugeriu: “E se Deus realmente não existir? E se estivermos acreditando esse tempo todo em um grande engano?”

A pergunta dele pegou todos de surpresa. Depois de algumas risadas, a conversa acabou tomando outro rumo, e ninguém se preocupou com aquilo. Contudo, aquele questionamento não saiu da minha mente nos dias seguintes. O que mais me incomodou foi saber que eu mesmo não tinha respostas tão convincentes para uma abordagem como aquela. Pensei comigo: e se me fizerem essa mesma pergunta, o que vou dizer?

Corri até a biblioteca e fiz uma rápida pesquisa. Busquei fundamentação para responder as perguntas de meu colega e descobri o significado de uma palavra que antes tinha passado despercebida: apologética.

Apologética vem da palavra grega apologia, que significa algo como “apresentar uma razão”, ou simplesmente “defesa”. Naquele momento, percebi que algumas respostas rotineiras acerca de Deus e da fé poderiam não funcionar a contento. Eu precisava de um corpo de argumentos, algo mais robusto e sistematizado. Afinal, iria me tornar pastor, e qualquer pessoa poderia me abordar com perguntas intimidantes.

Foi exatamente o que aconteceu. Desde que iniciei meu trabalho pastoral, vez ou outra, alguém me aborda com questionamentos sobre a existência de Deus, o problema do sofrimento, a autoridade da Bíblia ou até mesmo a respeito da possibilidade dos milagres. Nessas horas, a apologética tem sido para mim uma ferramenta útil e eficaz.

A razão e suas exigências

O filósofo cristão William Lane Craig alerta que, nos dias atuais, “há uma guerra intelectual acontecendo nas universidades, nas revistas especializadas e nas sociedades acadêmicas. O cristianismo tem sido taxado de irracional ou obsoleto, e milhões de estudantes – nossa futura geração de líderes – têm absorvido esse ponto de vista”.1 O teólogo John Gresham Machen fez uma advertência ainda mais contundente quando afirmou que, se o cristianismo perder a batalha intelectual em uma geração, o evangelismo se tornará mais difícil na geração seguinte.2

Uma das coisas que o estudo apologético me ensinou foi que, quase sempre, buscamos explicações naquilo que é racional. Isso significa que, no contexto da religião, a razão solicita evidências suficientes para o desenvolvimento da fé. A apologética cristã trabalha com o exame e a apresentação dessas evidências. Essa busca é importante, saudável e essencial. Jesus afirmou que a procura e o conhecimento da verdade têm o poder de libertar (Jo 8:32).

Um exemplo bíblico do uso da apologética por um líder cristão é encontrado no relato de Atos 17. Paulo apresentou uma defesa racional para a existência de um Deus Criador na capital do conhecimento na época, Atenas. O esforço apologético do apóstolo abriu uma oportunidade para que o evangelho entrasse no ambiente fechado das crenças pagãs daquela importante cidade.

Em 1756, John Wesley escreveu um texto chamado “Um discurso ao clero”, no qual argumentou que, além dos dons naturais, um ministro cristão deveria ter algumas habilidades adquiridas. Segundo ele, todo pastor precisa perguntar a si mesmo: “Estou familiarizado com as várias partes das Escrituras? […] Conheço suficientemente as ciências? […] Compreendo a filosofia natural? […] Tenho conhecimento adequado do mundo? Tenho estudado as pessoas (bem como os livros), e observado seus temperamentos, máximas e costumes?”3

Pedro fez um apelo interessante: “Santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós” (1Pe 3:15). Como a apologética pode ajudar um pastor a atender essa solicitação bíblica?

O uso da apologética

Para ser um defensor eficaz da verdade bíblica é preciso entender que a apologética possui certas determinações para seu pleno funcionamento. Imagine que você se dirigirá a um grupo de pessoas (ou mesmo a um único indivíduo), para lidar com a seguinte indagação: “Por que a Bíblia é a Palavra de Deus, e não o Alcorão?” Você certamente perguntará a si mesmo: Por onde devo começar? O bioquímico e teólogo Alister McGrath apresenta três objetivos principais da apologética cristã e, com eles, tem-se um esboço de como fazer a defesa da fé.4

Defender. O apologeta tenta identificar primeiro quais são os motivos para a dúvida do interlocutor. Por meio de rápidas perguntas, pode-se descobrir o que se passa na cabeça da pessoa, quais são seus anseios e como ela reage a determinados assuntos.

Enaltecer. O apologeta apresenta então o “outro lado da moeda”, ou seja, as evidências contrárias (ou “diferentes”) àquelas que geraram a dúvida na mente da pessoa. Em seguida, enaltece essas evidências.

Traduzir. É o momento em que se faz uso das “ilustrações” que complementam a apresentação das evidências. Pode ser uma história, uma imagem familiar ou uma experiência da vida real. Isso fortalecerá o apelo racional do argumento apologético.

Tendo em vista que a apologética cristã trabalha com as evidências que reforçam um argumento, o pastor-apologeta deve conhecer bem de perto o sistema de defesa que vai utilizar. Norman Geisler apresenta alguns dos pressupostos da apologética evidencial:5

Evidência histórica. Muitas vezes os dados históricos proporcionam as provas que fazem o argumento encontrar sua força. Esses dados, quando oferecidos com cuidado e correção, serão quase incontestáveis.

Evidência arqueológica. Principalmente para quem defende histórias antigas, como aquelas do Antigo Testamento, as muitas descobertas arqueológicas podem comprovar a autoridade divina sobre a criação e a história.

Evidência experimental. Quando se encontra alguém que experimentou uma situação real de transformação, os argumentos partirão da teoria para a prática da verdade defendida.

Evidência profética. Não apenas uma profecia que explicará ou fortalecerá o argumento, mas um conjunto de profecias que se entrelaçam, apresentando uma narrativa coerente.

Limitações e possibilidades

O pastor poderá encontrar na apologética um grande auxílio para a defesa da fé, mas não deve perder de vista que se trata apenas de uma ferramenta, e ela não é infalível. Certos detalhes acerca de Deus e da fé não encontrarão uma defesa unicamente racional. Usando uma analogia apresentada por Martinho Lutero, a fé é uma viagem que se faz de barco em direção a uma ilha no meio do oceano. A função da apologética cristã é demonstrar que o barco pode existir, e que é possível viajar nele se houver vontade de chegar à ilha. Contudo, no fim, é preciso a escolha da fé: a escolha de embarcar.

Para que o pastor consiga fazer uso da apologética com sucesso, precisará atentar para alguns detalhes importantes:

Orar por sabedoria. Não será nossa capacidade intelectual que tornará nossa apologética melhor nem pior. Precisamos do poder de Deus, reconhecendo nossa dependência do Espírito Santo.

Compreender a mensagem. A apologética exige dedicação e preparo. A leitura constante de obras de referência e o estudo profundo do assunto que se deseja defender são requisitos mínimos que se esperam de um pastor-apologeta.

Conhecer o interlocutor. Quem é ele? O que pensa sobre religião? Que leituras fez sobre a temática que gerou suas dúvidas? Ele está enfrentando dificuldades espirituais?

Falar com mansidão. Por vezes, mais do que uma explicação, nosso interlocutor deseja ser ouvido, receber alguma consideração. Se o pastor for atencioso, a mensagem poderá se tornar mais atraente.

Ensinar com paixão. Se o pastor não estiver completamente seguro de sua defesa, e a mensagem não arder em seu coração, então é melhor ficar em casa e orar pelo poder de Deus.

Acreditar no sobrenatural. Os argumentos e evidências podem contribuir para o entendimento racional, mas a transformação, da mente e do espírito, é trabalho de Deus. O pastor-apologeta ajuda a montar o quebra-cabeças, mas quem coloca a moldura na parede é Jesus Cristo.

Conclusão

O advento da internet mudou o mundo de muitas maneiras. Toda voz, seja ideológica, política ou religiosa, encontra no mundo virtual o espaço para ser ouvida e compreendida, bem como para ser confrontada. Todos que desejam podem colocar ali suas opiniões e idiossincrasias. No meio de tantas vozes, muitos cristãos não sabem distinguir o bom do ruim, a verdade do erro. Alguns são desafiados em suas crenças mais profundas.

William Lane Craig afirmou: “Sempre que falo em igrejas […], constantemente me encontro com pais cujos filhos perderam sua fé porque não havia ninguém na igreja para responder suas perguntas”.6 Trata-se de uma constatação desoladora! Então, sinto-me em parte responsável pela luz que está deixando de chegar aos corações. Pergunto-me como pastor: “Será que nas igrejas que pastoreio estou deixando de apresentar uma defesa coerente e poderosa da fé? Sou um ministro que estará pronto para responder a todo aquele que me pedir a razão da esperança evangélica?

É claro que não temos respostas para tudo, mas ao decidir ser um pastor-apologeta, podemos atender as demandas do ministério sem perder de vista a importância de defendermos racionalmente, e apaixonadamente, a verdade que liberta. 

Referências

1 William Lane Craig, Apologética Para Questões Difíceis da Vida (São Paulo: Vida Nova, 2010), p. 16.

2 Ibid., p. 16.

3 Ibid., p. 24, 25.

4 Alister McGrath, Conversando com C. S. Lewis (São Paulo: Planeta, 2014), p. 109, 110.

5 Norman Geisler, Enciclopédia de Apologética (São Paulo: Editora Vida, 2002), p. 62, 64.

6 Craig, p. 29.

Fernando Beier, mestre em Teologia, é pastor em Hortolândia, SP