Para a Espôsa do Pastor
Oh, as preciosas crianças! Quão pouco tempo elas são nossas! Tão depressa deixam o ninho, para aventurar-se na vida por conta própria! Com que cuidado devemos guiá-las, com quanto amor corrigi-las!
Disciplinar com amor! Quão poucas vêzes o fazemos! Existem tantas maneiras de mostrarmos aos filhos quanto lhes queremos! Em casa, tôda vez que tínhamos que dizer: Não! procurávamos dar-lhes um substituto. Como, por exemplo, aquela vez em que os meninos queriam ir jogar bola. Todos os seus amigos iam, e não viam motivo para não irem também. Ora, nada de mau existe em jogar bola, mas o ambiente não era o que desejávamos para nossa família, e por isso dissemos: Não!
É natural que por uns momentos ficassem zangados. Então o papai disse: “Isto está ficando um pouco aborrecido. Temos que fazer algo que lhes interesse.” Assim (não se assustem!) compramos um bote! Isso foi o início de um desastre financeiro pelo prazo de cinco anos, mas divertimo-nos todo o verão, e os meninos nunca o esqueceram. Por tôda parte onde fomos, naquele verão, levamos conosco o velho bote. Eu poderia escrever todo um livro sôbre pneumáticos furados, rodas e eixos partidos. Mais tempo se passou ocupado com o motor do bote do que com esquiar, mas êles jamais o esquecerão! E hoje, anos mais tarde, que diferença fazem, afinal, umas poucas centenas de dólares?
Muito se escreve acêrca do hiato das gerações. Na realidade não é preciso haver êsse hiato, mas caro nos custa impedir que se verifique. Muitas mães permanecem ao lado dos filhos enquanto pequenos; quando, porém, começam a ir à escola, elas arrumam emprêgo. Por que não? arrazoam. O dia todo não há ninguém em casa. Aproveitar o tempo, ora!
E aí é quando começa a dificuldade. A mãe não está em casa quando o garôto chega, ou se está, acha-se ocupada demais para dar ouvido às suas mágoas, suas alegrias, suas esperanças. Manda-o brincar com os vizinhos, enquanto ela trata febrilmente de recuperar os atrasos — o que devera ter feito no decorrer do dia.
Vem o tempo de pôr o menino na cama, e a mãe, indisposta para lhe contar uma história ou mesmo lhe dirigir umas palavras amáveis, murmura uma oração e ajeita-o sob as cobertas. Gradualmente o pequeno apanha o gôsto de confiar a amiguinhos os seus aborrecimentos. A mãe deixa de ser sua confidente.
Na adolescência o hiato se alegra. A pouco e pouco o rapaz se vai afastando do lar. Já não fica junto dos pais na igreja. Com efeito, às vêzes os pais não têm certeza de ali estar o filho. Depois do culto êle acompanha um amigo a sua casa. Ali os jovens metem-se em calças rancheiras e correm seca e meca tôda a tarde do sábado. Mamãe está cansada. Só deseja paz e sossêgo para uma longa sesta. Que é feito das visitas pastorais, em que a espôsa acompanhava o pastor, e às vêzes mesmo os filhos iam em sua companhia? Agora o pai vai sòzinho. A mamãe não está disposta a tanto.
Triste é o dia em que descobrem que seu rapaz ou menina se meteu em dificuldades. Não compreendem a razão. Chamam-no à fala. Rogam-lhe que não os envergonhe perante a igreja. Então ao adolescente vem a idéia de que a mamãe e o papai se interessam menos nêle do que em sua própria reputação. E assim evoluem as coisas.
Agora, que é tarde, a mãe se empenha. Promove reuniões sociais para os filhos. Os pais querem levar os filhos a uma excursão familiar, ou a um acampamento, talvez. Mas agora o adolescente perdeu o interêsse. Já não quer ir com a mamãe e o papai. Prefere acompanhar os amigos. A dissolução do altar de família, num passado já quase remoto, deixou uma lacuna, preenchida com outras atividades. Alarga-se o abismo entre os pais e filhos, tornando-se vasto demais para ser transposto.
A criança à qual sejam dadas responsabilidades está em condições de ser disciplinada com mais facilidade. Dizendo “responsabilidades” não me refiro a aparar o gramado, enterrar o lixo e varrer a garagem. É claro que as crianças devem fazer serviços rotineiros. Mas as responsabilidades às quais me refiro são as atividades reservadas em geral para os adultos, tais como fazer as vêzes de hospedeiro ou anfitrião, quando o papai está fora.
Tôda vez que meu espôso saía, confiava aos cuidados dos meninos a mãe e a irmãzinha. “Cuidem bem da mamãe e da Judite enquanto estou fora,” dizia êle. “Vocês agora são os homens da casa.” Embora ainda bem pequenos, os meninos impavam de orgulho. Revezavam-se na responsabilidade de serem a cabeça da casa. Uma semana Jerry assentava-se à cabeceira da mesa, dava graças, ou pedia a outro que as desse, mesmo quando havia visita. E os meninos sempre ajudavam a Judy e a mamãe a assentarem-se — mesmo quando o papai estava em casa.
Quando íamos a compras, o chefe da casa ia comigo, para ajudar a carregar as sacolas, levando-as para o carro e dêle as tirando. No sábado, o que era o hospedeiro da semana assentava-se na extremidade do banco, na igreja, junto ao corredor. Ajudavam-me mesmo a planejar o cardápio do sábado, e quando eu estava doente ou por outro motivo me achava impedida, êles punham Judy na cama, liam-lhe a história e oravam com ela.
Esta co-participação nas responsabilidades domésticas contribuía muito para a unidade familiar. E foi na verdade triste o dia em que tivemos de mandar de volta para a pátria nossos adolescentes, para lá se educarem. Foram anos tão críticos êsses, que eu invejava todas as mães de minha pátria que tinham os filhos junto a si. Com que temor e tremor confiamos nossos rapazes a um internato cristão! Quanto por êles orávamos! E cada semana eu cuidava que tivessem duas cartas de casa. Essas cartas, soube-mo-lo depois, foram o que os manteve em forma. Sentiam-se mais próximos de nós, sentiam-se desejados, amados e orientados. Embora nos achássemos a milhares de quilômetros de distância, tinham uma intuição de segurança, e cada qual fazia o melhor para que dêle nos orgulhássemos. Não houve entre nós nenhum hiato de gerações, nem é preciso haver quando há amor, respeito e compreensão mútuos.
Nos últimos anos da adolescência, quando os jovens começam a pensar sèriamente na constituição do lar, os pais mais do que nunca precisam estar bem perto dos filhos. Como é bonito se, depois de um encontro com a namorada, o filho adolescente sabe que pode ir ao nosso quarto, lâmpada ainda acesa, e assentar-se em nossa cama e descrever, enlevado, a formosura, o encanto e a personalidade da menina que o cativou! Essa ocasião sagrada proporciona aos pais uma oportunidade para não só ouvir, mas também lançar pequenas sugestões e pedacinhos de conselhos ao sonhador Príncipe Encantado, ou a Cinderela dos olhos côr de estréla. Nada de criticar, nem ficar chocado com o que nos é contado: apenas calma compreensão e censura leve e aprazível. E no fim, o adolescente, na realidade ainda imaturo, que procura convencer-se de que é o tal, acerca-se-nos e, embora não admitindo estar em êrro, prega a filosofia paterna como se fôsse dêle mesmo.
Os adolescentes apreciam as regras e regulamentos que lhes proporcionem segurança, embora se contorçam sob elas. Sermonear e criticar afugentá-los-ão. Entretanto, os ministros não podem correr o risco de permitir que a vida no lar decorra de modo que desacredite sua profissão. Entenda-se de uma vez por todas que, enquanto o filho ou filha frui a segurança e o amor do lar, dêle ou dela se deve esperar que cumpra os regulamentos. Os discos comprados e usados no lar devem ser de alto padrão. O vestuário, dêle e dela, devem conformar-se com a decência, a modéstia e a conduta cristã. A assistência aos cultos deve ser uma obrigação, e qualquer reunião social ou convescote deve ter a companhia de pessoa de responsabilidade. É natural que regras há que aborrecem os adolescentes. Dirão que querem ser livres. Todavia a maioria dêles, se conservarmos livres as linhas de comunicação com êles, se submeterão de boa vontade. Perderão sem dúvida alguns de seus amigos, mas êstes não merecem suas lágrimas. Os amigos verdadeiros estimarão as regras, e muitos desejarão ter pais que dêles cuidem.
Amor. Quanto poder neste vocábulo! Como une a família em laços inquebrantáveis! E se uma ovelha do rebanho porventura tresmalhar do redil, o amor a reconduzirá a êle. Pois como poderá um filho esquecer os pequenos atos de amor que fizeram do lar um Céu? Certo, não poderá conservar-se por muito tempo afastado de um lar que lhe signifique segurança, paz e alegria.
Para erguer alguém, temos de curvar-nos. Talvez haja pais que tenham sido severos demais, demasiado estritos, disciplinando sem amor. Estejam os pais dispostos a curvar-se. Peçam perdão. Cedam um pouco em seus modos obstinados. Perceba o extraviado que os pais o amam e nêle se interessam. Digam-lhe que sempre o amaram, mas eram por demais orgulhosos para o declarar ou mostrar. Digam: “Eu amo a você,” “Sinto muito,” “Perdoe-me!” Não valerá a pena o esfôrço, a fim de recuperar o filho, e saber que êle estará conosco através da eternidade?