Chamado para consolar, o pastor deve estar sempre disponível nos momentos angustiosos do seu rebanho
A morte é uma ferida experimentada por indivíduos que estão vivos.1 É uma amputação emocinal que afeta profundamente a pessoa.2 Significa perder um ser amado com quem se conviveu durante muito ou pouco tempo. A essa perda seguem-se a dor e o sofrimento que vão desde as primeiras reações até o período de reorganização, de busca de uma nova indentidade, com o objetivo de retomar o vínculo com novos interesses e com as pessoas.
Embora haja algumas semelhanças, o processo de pesar não é o mesmo para todas as pessoas. A maneira de uma pessoa enfrentar o sofrimento depende de sua personalidade, seu ambiente cultural, crenças religiosas e relação com o ente querido que faleceu, mesmo que nossas reações dependam, em grande medida, do modo como a morte ocorre.3
Com frequência, ocorrem crises de crenças acompanhadas de sintomas físicos como náuseas, dores estomacais e de cabeça, insônia, perda de apetite, episódios de aborrecimento, entre outros. Há ocasiões em que a pessoa experimenta um período de silêncio ou sentimento de falta de propósito. No crente, verificam-se períodos de oração e leitura da Bíblia, junto com perguntas, às vezes, de aborrecimento contra Deus.
O processo da dor
Durante as semanas ou meses seguintes ao falecimento, os enlutados iniciam uma longa jornada de reajuste. Sem o ente querido, devem retornar às suas atividades normais e envolver-se nas atividades sociais. Apesar disso, a tristeza permanece.4 Em suas investigações, E. Kübler-Ross estabeleceu um processo de cinco fases da dor: negação, depressão, ira, reajuste e aceitação.5 Alguns autores6 têm adotado o modelo de Kübler-Ross e outros o têm ampliado, dividindo-o em seis e até dez estágios progressivos. Com base nessas conclusões, são observadas as seguintes etapas emocionais no processo da dor:
Comoção ou pranto. Às vezes, um estado de estupefação protege o enlutado do impacto emocional da tragédia. É uma resposta normal desencadeada pelo sistema nervoso; é a forma que Deus tem para anestesiar a pessoa, a fim de capacitá-la para enfrentar a realidade da morte e administrar as dificuldades consequentes. Comentários como: “não chore” ou “tenha fé” são inúteis e mostram falta de sensibilidade. Se essa etapa durar demasiadamente, se tornará anormal e poderá criar problemas.
Depressão. A perda de um ente querido obriga a pessoa a reorganizar sua vida. Rompem-se relações e desaparecem sentimentos de segurança. Há ocasiões em que surgem até sintomas de problemas físicos. Se a tristeza não for completamente eliminada, poderá levar a prejuízos físicos reais.
Medo. A pessoa angustiada tem dificuldade para pensar e se concentrar. Então, se torna temerosa e sente pânico. A vida parece despedaçar-se tanto no âmbito exterior como no interior.
Sentimento de culpa. Pessoas enlutadas têm a tendência de se culpar pela morte de um ente querido. O desenlace abre velhas feridas e desperta antigas lembranças. Também existe a tendência a idealizar a pessoa falecida e ver apenas seus pontos positivos.
Ressentimento. Além da tendência de se culpar, o enlutado sente ira em relação a outros: com respeito ao médico, porque julga que ele não fez tudo o que devia ter feito. Também fica irado com outros profissionais do hospital e até com o próprio falecido.
Apatia. É penoso para o indivíduo angustiado relacionar-se com a vida real. Ele deseja fechar-se em seu próprio coração e ficar só. Certamente, é normal que pessoas chorosas queiram ficar sozinhas. Porém, se a reclusão for muito longa, é sinal de perigo.
Adaptação. Lentamente, a pessoa vai aceitando a perda, reorganiza a vida e enfrenta a realidade. Existem sinais definidos de que essa adaptação está ocorrendo: a pessoa fala facilmente sobre o falecido e, com o passar do tempo, até sorri pelas coisas que aconteceram no passado. Também deixa de dar rédea solta à sua hostilidade e busca formas de ministrar a outros sofredores. Contudo, precisa de tempo para que a aflição desapareça e, enquanto a cura está em processo, necessita de aceitação e ânimo.
O papel do pastor
Na terapia do consolo, somente podem ser efetivas a utilização de recursos obtidos na própria experiência da perda,7 bem como a ajuda de profissionais especializados ou conselheiros.8 Os procedimentos mais úteis para trabalhar com pessoas que sofrem alguma perda, são os seguintes:
Ajudar a perceber a perda. Enquanto a perda não for assumida, não é possível trabalhar com as emoções. A melhor forma de ajudar enlutados a tomar consciência da realidade é falar sobre o assunto. Contar a experiência ou narrar a memória do falecido pode ser outro modo de afirmar a aceitação.
Ajudar a identificar e a expressar sentimentos. Muitos sentimentos podem não ser reconhecidos. Os mais prováveis são ira, angústia, culpa e desamparo. Há circunstâncias em que o pesar estimula ideias de suicídio. Por isso, convém perguntar ao sofredor se, durante a experiência pela qual está passando, em algum momento ele pensou que a vida perdeu o sentido. Externar experiências reprimidas é fundamental. Expressar e sentir é o caminho único para curar, fechar a ferida e recuperar-se.
Ajudar a reorganizar a vida. Em geral, o falecido cumpria diversos papéis, e o fato de o enlutado assumir esses papéis contribui para sua melhor adaptação. Enfrentar a dor é aprender a viver só, aprender novas formas de relacionamento com familiares e amigos, e aprender a realizar tarefas desempenhadas pelo falecido. O pastor e os membros da igreja devem ajudar os familiares a tomar decisões importantes, principalmente nas primeiras etapas do processo.
Facilitar a substituição emocional. É importante assinalar que a pessoa que faleceu nunca mais será substituída. Porém, é possível preencher o vazio com outras relações, no devido tempo.
Dar tempo para a dor e a aflição. É preciso tempo para se processar uma perda, considerando que nenhuma pessoa se liberta totalmente do sentimento de perda. É uma etapa difícil na qual se procura superar a dor, porém, não exterminá-la. Isso é impossível. Estudiosos estabelecem um ano ou ano e meio, para superar as dores mais profundas. A experiência tem demonstrado que o fato de um cônjuge unir-se a outra pessoa, antes de se desvincular emocionalmente da anterior, gera mais confusão e dificuldades do que ajuda.
Considerar normais as condutas inusitadas. Durante o processo de sofrimento, são experimentadas raras sensações, tais como dor, tristeza profunda, mal-estar, angústia, vontade de chorar, insônia, inapetência, sensação de estar na presença do falecido, ouvir sua voz, entre outras. Tudo isso é normal.
Respeitar diferenças individuais. Nem todas as pessoas processam do mesmo modo a experiência da perda. É importante reconhecer isso e permitir que cada uma revele, a seu modo, os próprios sentimentos.
Providenciar apoio contínuo. Quem recebeu a nobre tarefa de consolar deve estar disponível, especialmente nos momentos críticos ou quando surgem os picos de angústia e solidão. Jamais deve abandonar o sofredor, porém manter contato com ele por meio de telefonemas e visitas pessoais.9 Essa é a oportunidade áurea para atuação de pequenos grupos de apoio, compostos por irmãos que também sofreram alguma perda e aprenderam as lições decorrentes dela. Eles podem prover companhia e ajuda no lar de algum sofredor.
Avaliar os meios de enfrentar a perda. Não se deve apoiar o consumo de bebida alcoólica nem drogas. É necessário desenvolver recursos centralizados no problema, afirmando a autoestima, estimulando a autossuficiência e fortalecendo as habilidades pessoais.
Referências:
1N. Wright, Como Aconsejar en Situaciones de Crisis (Barcelona: Editorial Clie, 1990), p. 178-186.
- 2 G. Collins, Consejería Cristiana Efetiva (Grand Rapids: Editorial Portavoz, 1997), p. 172.
- 3 E. N. Jackson, Cuando Alguien Muere (Buenos Aires: Editorial América, 1973), p. 6.
- 4 G. Collins, Aconselhamento Cristão (São Paulo: Edições Vida Nova, 1985), p. 173.
- 5 E. Kübler-Ross, Sobre la Muerte y los Moribundos (Barcelona: Editorial Grijalbo, 1969), p. 115.
- 6 J. Hightower, El Cuidado Pastoral Desde la Cuna Hasta la Tumba (El Paso, TX: Casa Bautista de Publicaciones, 1986), p. 169,170.
- 7 Mario Pereyra, En Busca de la Alegria de Vivir (Libertador San Martín, Entre Rios: Bienestar Psicológico, 1999), p. 43-45.
- 8 Guia Para Ministros (Buenos Aires: Aces, 1995), p. 208.
- 9 Pablo Polischuk. El Consejo Terapêutico: Un Manual Para Pastores y Consejeros (Barcelona: Clie, 1994), p. 364, 365.