Paulista de São Caetano do Sul, onde nasceu há 54 anos, num lar católico, o Dr. José Carlos Ramos conheceu a mensagem adventista aos onze anos. Batizado pelo Pastor Manoel Margarido, na igreja de Santo Amaro, em São Paulo, fez o primeiro grau no antigo Ginásio Adventista Campineiro (atual Iasp), segundo grau e Faculdade de Teologia no IAE. Iniciou suas atividades ministeriais, em 1966, na antiga Missão Bahia-Sergipe como evangelista. Três anos depois, assumiu seu primeiro distrito: Igreja

Central de Salvador, servindo posterior-mente em Aracaju e Itapagipe. Em 1975, foi para a Associação Rio-Minas como diretor de Comunicação e evangelista, sendo nomeado, no ano seguinte, diretor de Comunicação da União Este-Brasileira, cargo que ocupou até 1978 quando foi lecionar na Faculdade de Teologia do ENA. De 1981 a 1984, cursou o Doutorado em Ministério na Andrews University, retornando ao ENA em seguida. Em 1991, assumiu a direção do Seminário Adventista Latinoamericano de Teologia, Salt, já no Iaene, de onde veio em 1993 para conduzir o programa de pós-graduação do Salt.

De seu casamento, em 1969, com Elda Martins Ramos, nasceram três filhos: Jarlan, 25 anos, Elmara, 23 anos, e Jaider, 21 anos. Dizendo-se feliz em seu trabalho, o Pastor Ramos destaca os maiores privilégios de seu ministério: realização do batismo do pai, em 1977, dos filhos em 1985, e o casamento da filha com o Pastor Sandro Braun.

Do IAE, concedeu a entrevista que segue:

MINISTÉRIO: Em que termos o senhor justifica a validade de um programa doutorai na Divisão Sul-Americana?

PASTOR RAMOS: Eu diria que o fato de formarmos uma das Divisões que mais crescem no mundo é uma boa razão para isso. Crescimento não é apenas privilégio. Ele traz responsabilidades que se intensificam na medida em que nos conscientizamos dos maiores desafios que se antepõem ao nosso avanço e que demandam maior qualificação e empenho da nossa parte. A Igreja e o mundo, incluindo a premência do tempo e das novas realidades da vida humana hoje, exigem um ministério mais qualificado e preparado em suas diferentes funções. Essa melhor qualificação, o Doutorado em Teologia Pastoral o Salt propõe oferecer.

MINISTÉRIO: Como o senhor avalia o DTP, estando ele prestes a formar a primeira turma?

PASTOR RAMOS: A julgar pelo testemunho e entusiasmo dos alunos, o programa começou bem e prosseguirá melhor. Ele está inteiramente voltado para os interesses do ministério adventista e os ideais da Igreja. Abrange três áreas específicas de estudo: Administração eclesiástica, evangelismo e crescimento de igreja. Os cursos têm alcançado seus objetivos. As classes, em sua maioria, se desenvolvem na forma de seminários, onde a participação do aluno é requerida. Isso concorre para um melhor aproveitamento. Os professores são de altíssimo nível. O DTP tem tudo para dar certo.

MINISTÉRIO: Quantos obreiros participam do programa e quantos estarão se formando?

PASTOR RAMOS: São 24 obreiros de toda a DSA: dez no Brasil, onze no Peru e três na Argentina. Esperamos a primeira graduação para o início de 1997. Nem todos, porém, deverão se graduar agora. Esse é um nível acadêmico no qual o próprio participante imprime o ritmo de cumprimento dos requisitos. Entre 60 e 70% dos candidatos estão agora trabalhando no projeto doutorai, última etapa para a graduação.

MINISTÉRIO: Como é o funcionamento e qual a filosofia do curso?

PASTOR RAMOS: O programa prevê três verões (dezembro a fevereiro), ou períodos de classes e estudos independentes, seguidos de nove a doze meses para a elaboração do projeto. Ao todo, são 48 créditos acadêmicos requeridos para graduação. O Salt não existe por amor do simples intelectualismo acadêmico, ou meramente para se empenhar na busca de soluções aos chamados problemas teológicos. Aprimoramento acadêmico com vistas à prática do ministério é o que motiva a existência e as atividades do Salt. No que respeita ao DTP, o Salt oferece um plano avançado de estudos em Teologia aplicada solidamente embasado na Bíblia, nos escritos de Ellen White e nos ideais e princípios denominacionais. Sua proposta é facultar aos participantes um preparo intelectual e técnico mais efetivo e aprimorado para o serviço nas respectivas áreas de ação.

Crescimento não é apenas privilégio. Ele traz responsabilidades e desafios que demandam maior qualificação e empenho da nossa parte.

MINISTÉRIO: A seu ver, de que o pastor é mais carente hoje: conhecimento teológico ou eficiência no trabalho prático?

PASTOR RAMOS: Acho que ambas são essencialmente necessárias, considerando que nossa filosofia de conhecimento teológico deve gerar maior eficiência no trabalho. Creio que igreja alguma é merecedora do castigo de ter que suportar um pastor que é, ou apenas um “homem de gabinete”, ou alguém que concorra consideravelmente para a pobreza de nosso púlpito. Nossas igrejas necessitam de homens plenos do poder divino, devidamente preparados e eficientes na condução dos interesses do ministério.

MINISTÉRIO: A expectativa por resultados imediatos faz com que algumas pessoas ainda não compreendam bem a importância de se investir no crescimento intelectual do pastor. Como o senhor vê isso?

PASTOR RAMOS: Bem, as opiniões diferentes devem, no mínimo, merecer nosso respeito. De minha parte, acredito piamente que investir no crescimento intelectual do pastor trará dividendos mais que compensadores. Não podemos nos esquecer de que a única razão porque a Igreja ainda está no mundo é que ela tem uma missão a cumprir, em favor de uma sociedade cada vez mais complexa e exigente, e ao mesmo tempo mais decadente e perdida. Todavia, para alguns (e sinceramente espero que sejam mesmo somente alguns) é difícil aceitar que esses dividendos surjam a médio e longo prazos. Uma mentalidade imediatista, é, a meu ver, mais danosa que benéfica para os elevados ideais da Igreja.

MINISTÉRIO: Como mudar essa situação?

PASTOR RAMOS: Acredito que quando a força dos argumentos é insuficiente para mudar certos conceitos, devemos “dar tempo ao tempo”. Se conheço um pouco a maneira como o Espírito Santo opera, sei que Ele muitas vezes consegue num instante o que os homens repetidamente tentam em vão. É pena que, somente depois de se perder muito tempo e outros recursos, é dada uma chance para Ele. Certas mudanças tomam, naturalmente, um bom tempo até que sejam plenamente aceitas.

MINISTÉRIO: Mudando de assunto, como o senhor vê a Igreja no limiar de um novo século?

PASTOR RAMOS: Em lugar de vê-la como uma Igreja debatendo-se com várias dificuldades, oriundas de seu próprio crescimento e expansão, prefiro, em que pese a importância desse aspecto mais social, vê-la antes de tudo como o instrumento divino no mundo, para a comunicação da mensagem redentora do evangelho. Prefiro vê-la diante da mais “estupenda crise”, como diz Ellen White, prestes a se abater sobre o mundo, e precisamente por causa disso, diante de sua mais significativa oportunidade. Fico emocionado ao considerar que possuímos a resposta para as inquietantes indagações do mundo, neste final de século, e a única solução para os problemas que atormentam a vida humana hoje. Acho que, considerando a necessidade do mundo, por um lado, e os recursos que o Céu colocou à nossa disposição, por outro, é alto tempo de levantarmos, sacudirmos a mornidão laodiceana que ainda nos assedia, e cumprirmos o mandato do Senhor. Não negligenciando, é claro, nosso preparo pessoal.

MINISTÉRIO: Que avaliação o senhor faz do panorama mundial, em relação às profecias, especialmente aquelas contidas em Daniel e no Apocalipse?

PASTOR RAMOS: Não posso crer senão que este é o tempo áureo do cumprimento das profecias relativas ao fim. Não é possível que a volta de Jesus não esteja próxima. Para qualquer direção que olhamos, seja para a História, seja para a profecia, vemos evidências disso. Estamos na ponta dos pés da estátua de Daniel 2, no momento em que o Ancião de Dias está para fazer “justiça aos santos” em Daniel 7, na fase final da purificação do Santuário de Daniel 8, no lance culminante das conquistas do rei do norte de Daniel 11, na 7a e última igreja do Apocalipse, entre o 6o e o 7o selos, na 7a trombeta, e no tempo em que a tríplice mensagem angélica avança para alcançar os últimos rincões do mundo. Nossas percepções espirituais indicam que caminhamos apressadamente para o cumpri-mento de Apocalipse 17 e 18, para o momento em que Deus julgará a meretriz, e ao tempo em que iluminará a Terra inteira com a glória do evangelho e do caráter de Cristo, refletido no remanescente através da Chuva Serôdia. Enquanto isso, contemplamos os avanços, nada furtivos, do espiritismo em suas múltiplas formas, do poder papal na perspectiva da cura da ferida mortal, e do protestantismo no seu galopante processo de apostasia. O mundo inteiro está sendo arregimentado para o fim. O movimento ecumênico está na ordem do dia. Que o diga a Encíclica papal Ut Unun Sint, recentemente expedida. Como sabemos, as nações estão se agrupando em blocos, onde interesses religiosos, políticos, comerciais e econômicos estão envolvidos. Já são contados oito blocos. Não me causará surpresa se chegarem a dez, cumprindo, possivelmente, o detalhe dos “dez reis” de Apocalipse 17, que darão seu apoio à besta. Há um anseio cada vez maior pela democracia como forma mundial de governo (e esse é um detalhe de Apocalipse 13), e uma abertura cada vez mais definida para o Ocidente, de onde virá o anticristo em seu domínio final. Duvidamos ainda de que estamos no fim? Que mais está faltando que não esteja em rápido processo de cumprimento?

A Igreja está diante da mais “estupenda crise”, prestes a se abater sobre o mundo. E, precisamente por isso, diante de sua mais significativa oportunidade.

MINISTÉRIO: Há quase dois mil anos estamos afirmando que a Volta de Cristo está próxima. Parece que em alguns lugares essa “demora” tem suscitado sérias questões.

PASTOR RAMOS: As sérias questões suscitadas pela “demora” simplesmente não ocorreríam se aqueles que as levantam lembrassem que o mesmo Novo Testamento que fala da iminência, faz igual referência à “demora”. À luz de II Pedro 3:8 a 10, entendemos que a tensão existente entre iminência e tardança tem perturbado pessoas desde os tempos apostólicos. Tais pessoas se esquecem de que a tardança é motivada pela misericórdia divina, e questionar a validade da mensagem do advento em virtude dessa tardança, é, em última análise, tomar a misericórdia como pretexto para a incredulidade. Outro ponto crucial é onde fundamentamos nossa fé: naquilo que Deus ainda fará, ou no que Ele já fez? Certamente no que Ele já fez. Nossa fé se substancia no ato de Deus consumado em Cristo, enquanto nossa esperança olha para o futuro, para o Seu retorno. Mas em primeiro lugar vem o fato de que nossa salvação foi devidamente sacramentada no Calvário, e, a não ser que o permitamos, ninguém a tirará de nós, não importa se Cristo demore mais, ou me-nos, para voltar. O verdadeiro crente jamais duvidará de que Aquele que iniciou Sua boa obra “há de completá-la até o dia de Cristo Jesus”.

MINISTÉRIO: A seu ver, qual o sinal mais significativo da Volta de Jesus?

PASTOR RAMOS: Entendo que cada acontecimento no mundo hoje é uma evidência da proximidade do fim. Mas eu citaria dois que, particularmente, me parecem tremendamente significativos: 1) O fim da guerra fria, com todas as suas implicações, e 2) a penetração poderosa do evangelho em países que até há pouco estavam fechados. O primeiro nos lembra I Tessalonicenses 5:3, e o segundo Mateus 24:14, textos que afirmam explicitamente que em seguida a esses fatos “virá o fim”.

MINISTÉRIO: Sempre relacionamos a volta de Jesus ao cumprimento da missão. Deus está mesmo dependendo de nossa atividade nesse sentido?

PASTOR RAMOS: Esta é outra questão um tanto debatida. Até onde Deus depende do homem para o cumprimento de Seu propósito? É verdade que Jesus não voltará enquanto Sua Obra não for concluída, e dessa Obra participamos. Entendo, não obstante, que Deus é soberano, e não depende de qualquer criatura para o que quer que seja. No entanto, Ele preferiu incluir-nos em Seus planos, e isso é muito mais privilégio de nossa parte do que necessidade Sua. A Bíblia diz que a Obra é de Deus e será Ele quem a concluirá. Alguém afirmou que não sabia dizer se Deus conduz Sua Obra com os homens, sem os homens ou apesar dos homens. Estou seguro de que Ele o fará com a nossa participação, se Lhe dermos uma chance. Nossa negligência, é certo, tem postergado nossa entrada no Céu. Mas isso também não pegou Deus de surpresa. Ele tem todas as coisas em Suas mãos, de maneira que, como afirma Ellen White, “os desígnios de Deus não conhecem adiantamento, nem tardança”.

Questionar a mensagem do advento em virtude de uma suposta tardança, é, em última análise, tomar a misericórdia como pretexto para a incredulidade.

MINISTÉRIO: Sabendo-o estudioso também da Cristologia, que tipo de natureza humana assumiu Jesus?

PASTOR RAMOS: A Bíblia parece indicar que tanto a natureza pré-lapsariana como a pós-lapsariana foram assumidas por Cristo na encarnação. Evidentemente Ele não possuía duas naturezas humanas, mas apenas uma, que comportava, todavia, dois aspectos distintos. Ele tanto era o imaculado Filho de Deus, como Aquele que tomou sobre Si as nossas dores e limitações.

MINISTÉRIO: Algumas poucas declarações de Ellen White parecem dar a impressão de que a conservação da natureza humana limitou a Cristo. Como explicar isso?

PASTOR RAMOS: O trecho mais citado sobre isso encontra-se no livro O Desejado de Todas as Nações, pág. 499, onde ela afirma que “embaraçado com a humanidade, Cristo não poderia estar em toda parte em pessoa. Era, portanto, do interesse deles que fosse para o Pai, e enviasse o Espírito como Seu sucessor na Terra. Ninguém poderia ter então vantagem devido à sua situação ou seu contato pessoal com Cristo. Pelo Espírito, o Salvador seria acessível a todos”. Isso parece comprometer a onipresença de Deus Filho. Mas notemos que ela se refere à Sua presença “em pessoa”. Fala também da vantagem do “contato pessoal” com Ele, desfrutada por aqueles que estivessem no local onde Jesus Se encontrasse. É claro que ela está falando, não de Sua onipresença divina, mas de Sua presença corpórea, o que tem a ver com Sua humanidade. Por amor aos próprios discípulos que haveriam de se multiplicar por todo o mundo, a presença de Jesus, como observada na Palestina há dois mil anos, não deveria continuar na Terra. Esse tipo de presença seria transferido para o Céu, de onde Ele enviaria o Consolador através do qual estaria com eles em todas as épocas e lugares. Não vejo aqui nada que comprometa a onipresença do Filho de Deus, que independe da encarnação, da ascenção e do envio do Espírito. O assunto tem a ver com comunhão e não com onipresença.

MINISTÉRIO: Quem morreu na cruz: Cristo humano, ou Cristo divino-humano? Muitas pessoas se debatem com essa dúvida.

PASTOR RAMOS: A inspiração deixa claro que foi a natureza humana de Jesus que morreu, não Sua divindade. Esta não poderia morrer. Entendo que em lugar de nos referirmos à morte do “Cristo divino-humano”, seria mais próprio mencionar o sacrifício divino-humano de Cristo. É inegável que todo o Ser de Jesus foi envolvido na obra de resgatar-nos, mas isso não significa que Sua natureza divina só seria envolvida se ela, a exemplo da humana, morresse. A função da natureza divina no ato do sacrifício de Cristo não era incorrer na morte, mesmo porque Deus é imortal. Sua função foi tríplice: 1) sustentar a natureza humana, para que ela suportasse o peso da dor e do pecado, e prosseguisse até o fim, consumando o sacrifício da cruz; 2) apropriar-Se do sofrimento suportado pela natureza humana; e 3) comunicar Seu poder e valor ao sacrifício da cruz, de forma que este atingisse a estimação necessária para nossa salvação, mediante o pagamento pleno do preço requerido. Essa reciprocidade entre as naturezas no ato da redenção humana é reconhecida como genus majestaticum, isto é, existe uma transferência de propriedades de uma natureza para outra, para o cumprimento de atos expiatórios. Dessa forma o sacrifício humano de Jesus alcançou valor infinito.

Todo o Ser de Jesus foi envolvido na obra de resgatar-nos, mas isso não significa que Sua natureza divina teria de morrer.

MINISTÉRIO: Se tivesse apenas uma oportunidade de falar aos líderes da Igreja, o que lhes diria?

PASTOR RAMOS: Jamais devemos nos esquecer de que a tarefa de liderar a Igreja é antes pastoral que simplesmente administrativa, embora estejam envolvidos também princípios administrativos. Às vezes, somos tentados a tratar a Igreja nos moldes de um bom negócio, de uma rentável empresa, cujos interesses envolvem apenas fortalecimento econômico e expansão do patrimônio. Deus nos salve de uma mentalidade secularizada de liderança. Estejamos vigilantes, porque o perigo do institucionalismo sempre ronda os nossos arraiais. É imperioso que mantenhamos continuamente acesa a consciência de que lidamos, antes de tudo, com seres humanos comprados com o sangue de Cristo, que devem ser preparados para o Céu, e que nós mesmos estamos incluídos entre eles. Tal consciência nos livrará de certas tendências que contrariam o plano divino. Creio ser sempre oportuna a admoestação que Pedro deixou aos líderes de seu tempo: “Pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade, nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes tornando-vos modelos do rebanho.” (I Ped. 5:2 e 3). Esse tipo de lide-rança não se fundamenta apenas num relacionamento horizontal (do líder para os liderados), mas também num relacionamento vertical (do líder para com Deus); e isto vem primeiro. Necessitamos diariamente do batismo do Alto. Afinal, alguém pretender liderar a Igreja sem primeiro submeter-se à liderança divina, não faz sentido. Esse é um ponto crucial, porque dele depende o verdadeiro êxito na Causa de Deus.