ARTUR L. BIETZ

(Pastor da Igreja White Memorial)

Capítulo XIV — Encarar a Saúde de Forma Cristã

JESUS disse ao escriba que perguntou qual era o mandamento mais importante: “O primeiro de todos os mandamentos é: Ouve Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de tôda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de tôdas as tuas fôrças êste é o primeiro mandamento.”

Deus é uno, e como o homem foi criado à imagem de Deus, também é uno. Quando se fala do coração, entende-se a vida emocional; a alma refere-se à experiência da vontade; a mente simboliza a faculdade do raciocínio; a fôrça abrange a energia física.

O homem foi criado como um instrumento harmonioso que manifesta a unidade de Deus. Como expressão original que era da vontade de Deus, constituía uma unidade, uma ação recíproca harmoniosa. Suas emoções, Sua vontade, Sua capacidade de raciocínio e Sua energia formavam um conjunto majestoso. Tôdas as faculdades da vida se condensaram em uma simples expressão da glória divina. Nesse estado de pureza, manteve-se o homem em comunhão perfeita consigo mesmo, com a Natureza, com os demais sêres criados e com Deus.

O pecado produziu a divisão da vida. A interrupção da amizade com Deus refletiu-se na inimizade entre os homens. Deus era a fonte da unidade no homem, porque unia as partes recíprocas em um todo harmônico. Quando Eva buscou o conhecimento fora dos limites impostos por Deus, a capacidade de raciocínio voltou-se contra a necessidade de comunhão espiritual. A carne buscou a satisfação de seus desejos. A vontade ficou privada da faculdade de realização. A inimizade entre a carne e o espírito foi conseqüência do pecado.

O apóstolo Paulo fala do conflito interior com o pecado: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero êsse faço. Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim. . . . Mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros.” (Rom. 7:19-23.) O pecado é o destruidor da unidade do homem e o provocador da revolta interior.

Podemos imaginar o homem como instrumento de comunicação. Está dotado de órgãos sensitivos: os receptores; de órgãos atuantes: os transmissores; e dos transmissores internos, as vias nervosas e químicas que se dirigem ao cérebro, o centro do grande sistema de comunicação. Os órgãos sensórios estão distribuídos desde a cabeça até aos pés, na superfície externa do corpo e nos órgãos internos. O homem foi criado com a faculdade de comunicar-se com Deus, consigo mesmo, com seus semelhantes e com a Natureza; mas o pecado interrompeu o sistema de comunicação.

Ao passo que Deus é o grande unificador da vida, Satanás pugna por dividi-la e destruí-la. Se a comunicação com Deus houvesse sido mantida intata, jamais se teria produzido a morte física. A enfermidade resulta da divisão interior do homem. Ao perguntar Jesus ao endemoninhado qual era o seu nome, respondeu êle: “Meu nome é Legião”. Eram muitos em lugar de um. A mulher que disse: “Creio que não serei capaz de reunir as partes de minha vida”, expos o problema básico de sua existência.

Atualmente se conhecem vários sistemas de cura incompleta. Qualquer tentativa de curar em forma parcial perpetua a divisão que o pecado produz e agrava a discórdia, porque ignora o todo. Os neurólogos querem reparar o sistema de comunicação do ponto de vista técnico e físico; o pastor, o psicólogo e psiquiatra, por outro lado, procuram restaurar a capacidade de comunicar-se que o homem possui do ponto de vista mental e sentimental. O médico que atende unicamente o corpo e ignora as demais esferas da experiência humana, não é verdadeiro curador. De pouca utilidade é concertar a câmara de ar se se deixa o prego no pneumático, pois causará danos posteriores. Pôr certa parte do homem em condições de lutar com maior eficiência contra outras partes da vida, não é sarar; não passa de fortalecimento das partes para prolongar a luta.

Quando Satanás se aproximou de Jesus para tentá-Lo no deserto, apresentou-Lhe verdades parciais. Pediu-Lhe que preservasse o corpo para o milagre de criar pão. Jesus não consentiu, porque a vida é mais que simples existência física. Com o desafio para que se lançasse do alto do templo quis enfrentar as leis espirituais com as leis físicas. Ao tentá-Lo a ceder ante a glória dos reinos do mundo para alcançar projeção social e honra, longe da adoração do Deus verdadeiro, Satanás desprezava a natureza da significação cabal da vida. Apelou para a legitimação das necessidades parciais, mas Jesus recusou submeter-Se ao impulso de uma parte que se opunha à verdade do todo. O pecado é a satisfação impulsiva de uma necessidade parcial em oposição à reciprocidade do todo.

Os que pretendem curar unicamente por meio da mente, são tão parciais quanto os que querem fazê-lo só pelo corpo. Uma teoria religiosa muito difundida busca a cura de tôdas as enfermidades através da mente. Quem sustém esta opinião afir-ma que a mente é a única realidade essencial. Semelhante conceito é parcial e divisório; perpetua a separação que produz o pecado.

Certos psiquiatras propõem o conceito de que tôdas as fontes do conflito residem nas emoções deformadas da vida. Procuram averiguar tôdas as experiências emocionais da infância e da vida posterior para explicar a enfermidade da mente e do corpo. No intento parcial de curar pelas emoções, também ignoram a significativa unidade da vida.

Pastôres há que fazem oposição ao uso dos métodos psiquiátricos, físicos e psicológicos para a cura das enfermidades. Dizem assim: “Existe só uma resposta, que é a religião. Os homens necessitam de auxílio espiritual. Nisto e unicamente nisto consiste o auxílio exequível.” Tais pastôres também ignoram o todo e são tão culpáveis de perpetuar a separação produzida pelo pecado, como o são os outros métodos unilaterais tentados na cura.

A enfermidade não consiste unicamente na separação das várias partes vitais, mas também no fracasso dessas partes ao quererem relacionar-se corretamente umas com as outras. Algumas vêzes é mais importante determinar que espécie de pessoa tem o germe, do que a espécie de germe que a pessoa tem. Muitos há que lastimam não mais haja milagres. Semelhante atitude pode provir somente dos que definem os milagres em têrmos de uma parte da vida, ao passo que ignoram a intervenção entrelaçada de tôdas as disciplinas curativas. Em 1850, o têrmo médio da vida humana era apenas de quarenta anos; hoje, entretanto, chega a uns setenta anos. Cinicamente quem possui conceito limitado do que é milagre, poderá deixar de ver as maravilhas das curas milagrosas da atualidade.

A união da ciência e da religião efetua-se atra-vés do conceito do homem como uma unidade. A ciência e a religião continuarão em luta, exigindo a resposta final, tanto quanto se perpetue a divisão entre as várias partes do ser humano. A essência da cura cristã reside no conceito da unidade da vida. O homem não é só corpo, só mente, só emoções, ou só espírito; não é um cadáver potencial a que se une frouxamente um espectro. O homem é uno; a mente, o corpo e o espírito são meras expressões dessa unidade.

Cura, portanto, significa o processo de restaurar a perdida harmonia que impede qualquer parte do ser — corpo, mente, ou espírito — de desenvolver-se com perfeição em seu meio ambiente. A mente, o corpo e o espírito são cumes de uma mesma montanha. Quem escala apenas um dos cumes e nêle permanece, não consegue conhecer a natureza da vida que é o fundamento de tôda a estrutura. Como é insensata a luta dos psicólogos e psiquiatras contra médicos e pastôres! Como é absurdo que es-sas disciplinas parciais se guerreiem umas às outras salvaguardadas pelo púlpito de suas atividades especializadas! Ao erguer-se a névoa, êsses homens verificarão que a cooperação sincera é o único caminho para a cura verdadeira e completa de seus pacientes.

Devemos compreender a montanha que unifica a vida. Todos os cumes da verdade devem considerar-se como pertencentes à base de uma mesma montanha. A luz divina que refletem todos os cumes é o próprio Deus. Deve o homem colaborar com Êle. Podemos vendar um ferimento, mas só Deus pode curá-lo.

As chagas do pecado são ferimentos profundos devidos á interrupção das comunicações. A chaga do cinismo é o fracasso da mente para comunicar-se com Deus. A solidão á uma lesão produzida pelo afastamento de Deus pelo homem. A ansiedade feriu profundamente a vida, pela incapacidade do homem de dar e receber amor. O abatimento é outro ferimento que resulta da falta de inspiração e propósitos. A culpa acompanha o sentimento de separação, e o ódio é um câncer conseqüente da falta de agradecimento, da obstrução dos desejos.

Êstes profundos ferimentos da mente e do espírito refletem-se em tôda a vida e reclamam cura. Todos os processos físicos são direta ou indiretamente determinados por estímulos mentais e emocionais. A física, aristocrata das ciências naturais, sofreu grande modificação nos seus conceitos fundamentais, pondo em dúvida os próprios alicerces materiais da ciência numa época em que a Medicina não tolerava nada que lembrasse os valores espirituais. Entretanto, atualmente, êstes conceitos estão modificando-se. Os médicos começaram a interessar-se pelos homens e não unicamente pelos órgãos humanos. Produziu-se uma troca do ponto de vista analítico para o sintético. A verdade de que a vida é um todo, é um dos fatos mais fundamentais que descobrimos. Êste conceito começou a revolucionar o ministério da cura em todos os seus ramos.

Todos os pensamentos e emoções estão acompanhados de alterações fisiológicas. A tristeza produz chôro; a diversão causa hilaridade. Quando alguém ri, todo o corpo participa; ao chorar, todo o ser é afetado. A vergonha produz a resposta física do rubor, ao passo que o temor aumenta os batimentos do coração. Os pensamentos e as emoções têm influência no sangue e no metabolismo. A desesperação traduz-se por inspirações e expirações profundas. Os pensamentos e os sentimentos não ocorrem no vácuo, mas no organismo físico.

Todos os lamentos por enfermidade: física, mental ou emocional, originam-se em dificuldades da faculdade de comunicação. A lesão espiritual produzida pela falta de harmonia com Deus conduz a transtornos físicos que devem ser tratados por médicos. O cepticismo, a solidão, a ansiedade, o abatimento, a culpa e o ódio são sintomas da incapacidade de dar e receber amor. Ao vacilar alguém entre tendências egoístas e tendências altruístas e ficar entravado por ambas, a energia aniquila-se e produzem-se desordens emocionais, físicas e mentais.

Quando o homem é incapaz de comunicar-se harmoniosamente com Deus, com os demais homens e consigo mesmo, o corpo despedaça-se. Igualmente certo é que a mente e as emoções podem transtornar-se em seu funcionamento, como resultado do menoscabo físico. Não se trata de tomar estas coisas separadamente, mas de estabelecer quanto de uma e de outra entra em um processo progressivo de adaptação.

Em que forma procederão os curadores cristãos para curar os ferimentos da mente e do espírito que se refletem nas desordens do corpo? A ferida do cepticismo cínico deve ser curada com a fé. A fé cristã é a resposta de todo o ser — do pensa-mento, dos sentimentos e da vontade — para a atuação de Deus por meio de Cristo, por cujo meio o homem entra em amizade pessoal e consciente com Deus. Um aluno do decano Inge, disse: “A fé consiste em crer o que se conhece como verdadeiro.” ‘‘Melhor dito — acrescenta o decano — é a resolução de permanecer firme ou ceder em favor das hipóteses mais nobres”. A fé não é fruto da fôrça de vontade. A fé é o descobrimento do que capacita o homem para suportar qualquer coisa que possa acontecer.

Curamos a ferida da solidão com a oração, a adoração e o companherismo com os demais filhos de Deus. Idênticamente aos metais que se não fundem em temperaturas baixas, mas sim em temperaturas elevadas e produzem uma liga mais resistente que os componentes separados, também as personalidades dos discípulos se fundem no crisol da amizade com seu Mestre. “Tôdas as coisas subsistem por Êle”. (Col. 1:17.)

Já no quarto século AD, Juliano o apóstata acusava os cristãos de fazerem prosélitos alimentando e auxiliando os enfermos. Disse êle: “Êstes galileus ímpios entregam-se a esta espécie de filantropia; como os homens atraem as crianças com um pedaço de bôlo, também êles . . . atraem conversos para a sua impiedade. . . . Agora podemos ver o que torna êsses cristãos inimigos tão intensos de nossos deuses. É o amor fraternal que manifestam aos desconhecidos, enfermos e pobres.” Êste método cristão, de socorrer os enfermos — usado já nos albores da igreja — deve reviver na verdadeira cura.

Curamos a ferida da ansiedade com a segurança, inspirada mediante a compreensão, a simpatia e o aprêço. Ao manifestar-se amor aos enfermos e compaixão por êles, realizam-se milagres. O amor é o que exerce maior ação curativa. Deus é amor: Deus é saúde.

Curamos a ferida do abatimento com a esperança e a confiança. A confiança em Deus tem de ser res-taurada tanto na própria pessoa como nos semelhantes.

Curamos a ferida da culpa com o perdão encontrado em Cristo. A confissão é a maneira de curar esta ferida do pecado, porque ao partilhar do pesar e da culpa de outrem, diminuímos-lhes os efeitos em cinqüenta por cento.

A confissão oportuna alivia-nos os pensamentos recalcados. “O que encobre as suas trangressões nunca prosperará”. (Prov. 28:13.)

Curamos a ferida do ódio com o amor, abundância de boa vontade que não espera recompensa. O mundo necessita de amor que expila o ódio e o temor, e torne possível aceitar e conceder perdão.

Necessita-se de amor que fortaleça e abençoe, porque, sem êle, a vitória se torna vulgar e insípida. Para compreender o amor, deve-se viver com amor. Contudo, quando se vive com amor, não se compreende nada; só se sabe que a escuridão deu lugar à luz, o temor foi. deslocado pelo amor, a solidão foi substituída pelo cálido companherismo.

Os grandes curadores devem haver experimentado em si mesmos a cura. Devem sentir o gôzo da fé, da adoração, da oração, da simpatia, do per-dão e do amor, antes de poder partilhá-los. O que somos decidirá o que podemos fazer. A cura é obra de Deus; tudo quanto podemos fazer é com Êle cooperar na cura dos enfermos. Só Deus pode salvar-nos das facções que atuam em nosso íntimo e nos conduzem à enfermidade e à morte. O pecado é fraccionamento, divisão, desunião. A piedade é harmonia, paz, comunicação e companheirismo de amor.

O homem foi criado à imagem de Deus. Isto significa em essência que nossa vida e nosso ser estarão seguros unicamente se permanecerem em comunhão com nosso Criador. Êle deve ser a fonte de vida e inspiração de todos os nossos planos e ações. A ausência de Deus conduz finalmente à morte. A vida cristã não é alguma coisa superposta, mas sim o resultado da dependência de nosso ser no tocante à contínua efusão de vida e amor que nos vem de Deus. Para viver de modo inteligente é necessário que investiguemos tôdas as leis que regem o ser. Não obstante, êste conhecimento não deve ser um fim em si próprio. Deve guiar-nos a uma compreensão inteligente das necessidades que só nos podem satisfazer plenamente quando agimos e vivemos em harmonia com o caráter e a natureza de Deus.

O Estudo da Biblia é Necessário à Eficiência

“Os ministros que quiserem ser obreiros eficientes quanto à salvação das almas, têm de ser estudantes da Bíblia, e homens de oração. É um pecado negligenciar o estudo da Palavra, ao mesmo tempo que se tenta ensiná-la a outros. Os que sentem o valor das almas, compreendem que há demasiado em jôgo, para que ousem ser negligentes em buscar progredir no conhecimento divino, e refugiam-se na fortaleza da verdade, onde podem obter sabedoria, conhecimentos, e fôrças para fazer as obras de Deus. Não descansarão sem uma unção do alto.” — Obreiros Evangélicos, pág. 96.