(Conclusão da Perg. 39)

X. Satanás Solto por um Pouco, no Final do Milênio

O cenário da Terra é de fato sombrio: destroços de cidades outrora fervilhantes, ruína de toda a pompa e esplendor — sinistras recordações do mundo pululante que Satanás levara a fútil rebelião contra Deus. E agora, ao final dos mil anos, Cristo, acompanhado de todos os santos, desce à Terra com tremendo poder, glória e majestade, para executar juízo sobre os ímpios. Ordena então aos ímpios mortos que ressurjam. Em resposta, aparecem as hostes poderosas, incontáveis como a areia do mar (Apoc. 20:8). Não só o “mar” mas também a “morte” (inseparável aliado do pecado) e o “inferno” (grego hades), cruel receptáculo da presa da morte, cada qual entrega sua cota de ímpios mortos.

Isto está em harmonia com a descrição de Isaías: “Serão ajuntados como presos em masmorra, e encerrados num cárcere, e serão castigados depois de muitos dias.” Isa. 24:22. Mas esta segunda ressurreição é a ressurreição da “condenação” (S. João 5:29). Esses que agora ressurgem compreendem os “restantes dos mortos,” que “não reviveram até que se completassem os mil anos” (Apoc. 20:5).* E as nações de Gogue e Magogue voltam à vida mediante a segunda ressurreição. E espalham se pelo mundo.

Os ímpios ressuscitam com o mesmo espírito rebelde que os possuía em vida, e acham-se em presença do Eterno. Vêem a vasta cidade de Deus, a Nova Jerusalém, descendo do céu, da parte de Deus (Apoc. 21:2 e 3). Cristo volta ao mesmo Monte das Oliveiras, fora da Velha Jerusalém (Zac. 14:4), do qual ascendeu após Sua ressurreição, quando os mensageiros angélicos asseguraram aos discípulos que Ele voltaria (Atos 1:9-12).

* Conquanto alguns aleguem que a cláusula “os restantes dos mortos não reviveram até que se completassem os mil anos” seja espúria, não conhecemos tradução em português que não a tenha, assim como a autorizam Rotherham, Tischendorf, Westcott e Hort, Griesbach, Wordsworth, Lachmann, Tregelles, Nestle, Weymouth e Alford. Com efeito apenas um dos manuscritos maiores, o Codex Sinaiticus, omite a cláusula.  

Graças à ressurreição dos ímpios, Satanás é “solto por um pouco de tempo” (Apoc. 20:3). Terminada está sua ociosidade forçada, depois do período de mil anos de cativeiro (vv. 7 e 8). Uma desesperada esperança renasce-lhe no coração maligno, ao ver as inumeráveis hostes de ímpios de todos os séculos. Vem então a última, poderosíssima luta pela supremacia. Convence os de que são capazes de tomar a cidade de Deus e, assumindo o comando, dispõe freneticamente as hordas ímpias em ordem de batalha, levando-as a um inútil assalto* ao “arraial dos santos,” a amada Cidade Santa, num empenho de subverter o reino de Deus (vv. 8 e 9). Os ímpios, que obstinadamente recusaram a entrada à Cidade de Deus por intermédio dos méritos da expiação sacrifical de Cristo, determinam-se agora a conseguir entrada e domínio, sitiando-a para então tomá-la de assalto.

Transcorre agora o último ato no grande conflito dos séculos, quando toda a raça humana se vê face a face, pela primeira e última vez. A derradeira e suprema tentativa de Satanás mostra que está ainda em rebelião, e os homens maus demonstram serem visceralmente ímpios. A separação eterna entre justos e ímpios fixa-se agora irrevogavelmente. Então, do grande trono branco, pronuncia-se a sentença de condenação dos ímpios. E a sentença é seguida de execução imediata.

É, evidentemente, durante este último episódio que se cumprem as palavras do Mestre: “Ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes, no reino de Deus, Abraão, Isaque, Jacó e todos os profetas, mas vós lançados fora.” S. Luc. 13:28.

* “Subiram” (v. 9), de acordo com Dusterdieck, é expressão idiomática referente a uma expedição militar, sendo o lugar de ataque geralmente uma posição elevada (no caso, a de Jerusalém), vista de todos os ângulos. Por outras palavras, é o quadro de um exército invasor a espalhar-se pela terra.

XI. Destruição Final de Satanás e dos ímpios

O milenar drama termina com a final e irrevogável derrota de Satanás, e seu completo extermínio (assim como de todos os que o seguem) quando, da parte de Deus, desce fogo do céu e o devora (II S. Ped. 3:10 e 11; Apoc. 20:9). A própria superfície da Terra parece fundir-se, e torna-se um vasto “lago de fogo” em ebulição (Apoc. 20:10), para “destruição dos homens ímpios” (II S. Ped. 3: 7).*

A Terra arde “como fornalha”; os ímpios “serão como o restolho; o dia que vem os abrasará, diz o Senhor dos Exércitos” (Mal. 4:1). Assim nas chamas purificadoras da conflagração final, os ímpios (Satanás, anjos maus e homens impenitentes) são todos afinal destruídos pelo fogo, raiz e ramos. Mesmo a morte e o hades, parceiros mútuos, são lançados nesse lago de fogo (Apoc. 20:14), sem alívio nem escape de sua terrível destruição. A punição é eterna (S. Mat. 25:46),** e constitui a segunda morte, da qual não há ressurreição. Nisto estamos de acordo com o falecido Arcebispo William Temple, já citado, que, considerando “o destino final da alma que recusa o amor de Deus,” assim se exprime:

Uma coisa podemos dizer com confiança: o tormento eterno será excluído. Se os homens não tivessem importado a noção grega, e anti-biblica da natural indestrutibilidade da alma individual, e então lessem o Novo Testamento tendo isto em mente, teriam daí tirado a crença, não no tormento eterno, mas na aniquilação. É o fogo que é chamado aeoniano, e não a vida nele lançada. — Christian Faith and Life, 1931, pág. 81 (conferência pronunciada em 1931 na igreja da Universidade de Oxford).

* De acordo com II S. Ped. 3:3-13, o mundo antigo, que pereceu no dilúvio, prefigurou o final dilúvio de fogo. Nessa assoladora conflagração não só perecem os ímpios, mas a própria superfície da Terra se dissolve, e suas obras más são queimadas. Os “elementos não são aniquilados, mas se “derreterão” sendo assim expurgados de toda mancha de pecado e todo traço de maldição.

Esse fogo foi preparado primariamente para o diabo e seus anjos (S. Mat. 25:41). Mas ele atinge a todos os que preferem segui-los. É esse o fogo da Geena, que consome completamente tudo que lhe é entregue (S. Mar. 9:43-48). Davi predisse: “Fará chover sobre os perversos brasas de fogo e enxofre, e vento abrasador será a parte do seu cálice” (Sal. 11: 6). Tal é a condenação final que remata para sempre a longa rebelião contra Deus, Sua lei e Seu governo.

Mas sobre os justos, que ressurgirão na primeira ressurreição, “a segunda morte não tem autoridade” (Apoc. 20:6). Os santos habitarão tranqüilos e ilesos na cidade de Deus, em meio ao “fogo devorador” e as “chamas eternas” (Isa. 33:14). Enquanto para os ímpios Deus é “fogo consumidor” (Heb. 12:29), para os justos é Ele um protetor escudo.

Do meio das fumegantes ruínas da velha Terra, ressurgem “novo céu e nova Terra” (Apoc. 21:1), onde os remidos encontrarão sua herança eterna e eterna habitação. Em surgindo a nova Terra, lamentos, lágrimas, dor e morte, tudo isto, “não existirá” (Apoc. 21:4). Destruída estará a morte (I Cor. 15:26; Apoc. 21:4). Não mais haverá maldição (Apoc. 22: 3), e Deus será “tudo em todos” (I Cor. 15:28).

A terminação do milênio assinala o começo do eterno estado da nova Terra. Os acontecimentos mileniais são todos produto da sabedoria divina, da divina graça, do poder e intervenção divinos. Desta maneira, e nesse tempo, entendemos que os remidos de todas as nações entrarão de posse do prometido reino eterno de glória, que por tanto tempo aguardaram (Dan. 7:18; Apoc. 22:5).

Ellen G. White expressa magistralmente nossa convicção:

O grande conflito terminou. Pecado e pecadores não mais existem. O Universo inteiro está purificado. Uma única palpitação de harmonioso júbilo vibra por toda a vasta criação. DAquele que tudo criou emanam vida, luz e alegria por todos os domínios do espaço infinito. Desde o minúsculo átomo até ao maior dos mundos, todas as coisas, animadas e inanimadas, em sua serena beleza e perfeito gozo, declaram que Deus é amor. — O Conflito dos Séculos, pág. 678.

**“Castigo eterno” (S. Mat. 25:46) não é um castigo interminável, nem é a “eterna destruição” (II Tess. 1:9) uma destruição sem fim, justamente como o “juízo eterno” (Heb. 6:2) não é um eterno julgar. “Eterno” pertence aos resultados, e não ao processo.