Os esforços em favor da unidade religiosa exigem de nós maior comprometimento com a missão de pregar o verdadeiro evangelho

Nas últimas décadas, os adventistas têm valorizado o contato com outros grupos religiosos, cristãos ou não. Todavia, é preciso cuidado. Devemos estar certos de nossa própria identidade ao dialogarmos com qualquer outro segmento religioso. Temos uma mensagem a compartilhar, “o evangelho eterno” (Ap 14:6), e devemos levá-la a todos, mesmo àqueles que estejam satisfeitos com sua própria experiência religiosa. Ao fim, todos os sinceros receberão o convite de Deus (Jo 10:16; Ap 18:4) e se unirão a Cristo, essência do evangelho eterno.

Em contrapartida, Satanás também objetiva reunir as pessoas religiosas em torno de seu último engano (Ap 17:18; 18:3). Assim, não é de estranhar que o movimento ecumênico, liderado pela Igreja Católica Romana, avance a passos largos, buscando convencer os religiosos a se unir à sua comunhão, ainda quando ela não abre mão de suas alegações de autoridade, ultrapassando mesmo a autoridade da Bíblia. O papa Bento XVI afirmou que a chave para a verdadeira interpretação das Escrituras é a Igreja de Roma, em seus “organismos institucionais”.’ Com isso, ele quer dizer que a Bíblia só é válida quando interpretada pela Igreja Católica!

Portanto, torna-se inevitável que haja um afundamento de perspectivas espirituais, as quais convergirão para dois movimentos: um, no sentido de regressar à Bíblia, e outro, convergindo para as tradições humanas. Nosso desafio é pregar a última mensagem, chamando pessoas sinceras à comunhão com a Verdade, o que ganha urgência quando pensamos nas últimas incursões católicas no diálogo interreligioso. O propósito deste artigo é justamente analisar o quanto a Igreja Católica Romana avança em seus esforços ecumênicos. Devemos estar atentos ao cumprimento das profecias apocalípticas, as quais apontam para a união religiosa encabeçada por Roma (Ap 13:3, 8), o que, em última instância, deve nos levar a maior comprometimento em relação ao verdadeiro evangelho, para que ele seja pregado a todo o mundo o quanto antes.

Como o assunto é distorcido por pregadores sensacionalistas, e exageros são proferidos, preocupamo-nos com a qualidade da informação. Por isso, recorremos, na maior parte dos casos, a fontes oficiais da Igreja Católica ou à mídia secular. Pela abrangência do assunto, nos concentramos em três grupos que são alvo dos esforços ecumênicos da igreja romana: anglicanos, judeus e luteranos.

Anglicanos

Dissidente do catolicismo, a Igreja Anglicana surgiu como denominação estatal, quando o imperador Henrique VIII (1491-1547) se separou de Roma. O imperador queria se casar com Ana Bolena, porque sua esposa, Catarina de Aragão, não lhe dava filhos homens. Sendo o divórcio condenado pelo catolicismo, o rei rompeu com o papa.

A Igreja Anglicana nunca se revelou como autenticamente protestante. Seus humores oscilaram entre um catolicismo estatal e uma fé reformada com maior moderação. Recentemente, com a decisão do Vaticano de aceitar em condições especiais anglicanos conversos, muitos desses cristãos poderão se tornar católicos a partir de agora.

site Zenit fez as honras,2 divulgando as resoluções do papado. O prefeito da Congregação Para a Doutrina da Fé, cardeal William Joseph Levada, explicou que até padres anglicanos, que são casados, poderão mudar de denominação, permanecendo padres e casados. Tornar-se católico parece boa pedida para a maioria dos membros da igreja fundada por Henrique VIII, levando em conta decepções recentes: com a aprovação do clérigo homossexual, muitos anglicanos abandonaram a denominação.

O episódio recebeu atenção maciça da mídia. Como avaliá-lo? Trata-se de mais uma iniciativa do ecumenismo de Roma, que vem crescendo em número de ações efetivas e surpreendentes. No caso da nova empreitada, os ex-anglicanos poderão manter até resquícios de sua própria tradição. O que vale é que se ponham sob a tutela da Sé. Quantos mais aceitarão este convite no fim dos tempos?

Judeus

Chamada pelo padre David Mark Neuhaus, secretário-geral de vicariato católico de língua hebraica em Israel, de “sutil evolução”, a compreensão do papa Bento XVI sobre o shabat é surpreendente.3

site do vicariato católico de língua hebraica traz mais detalhes sobre o discurso de Bento XVI à comunidade judaico-católica em Paris, em 2008.4 Separamos o seguinte trecho: “Eu estou satisfeito por receber vocês nesta tarde. É uma circunstância feliz que nosso encontro tenha lugar na véspera da celebração do ‘shabat’, o dia que desde um tempo imemorial ocupa simultaneamente um lugar destacado na religião e na vida cultural de Israel. Cada judeu piedoso santifica o ‘shabat’ pela leitura das Escrituras e recitação dos salmos. Queridos amigos, como vocês sabem, a devoção de Jesus também foi nutrida pelos salmos. Ele ia regularmente ao templo e à sinagoga. Falou ali no dia de sábado. Ele queria enfatizar com que generosidade Deus olhou para o homem, também incluindo a organização do tempo. Acaso não diz o Talmud Yoma (85b): ‘O sábado foi dado para vós, não vós para o sábado’? Cristo fez a pergunta ao povo da Aliança para reconhecer constantemente a inaudita grandeza e amor do Criador de todo homem. Queridos amigos, a despeito das razões que nos unem, a despeito das razões que nos separam, podemos viver e fortalecer nossa fraternidade. E sabemos que os laços da fraternidade são um contínuo convite para conhecer melhor um ao outro e respeitar-nos mutuamente.”

Sem dúvida, o líder católico omitiu que o sábado foi substituído pela espúria observância do domingo, durante a Idade Média. Ainda assim, ele deixou nas entrelinhas sua intenção ecumênica. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo,5 Bento XVI busca sua “proximidade pessoal e a de toda a Igreja Católica” em relação aos judeus. Assim, ele prossegue com ações ecumênicas significativas, que, às vezes, esbarram em suas declarações estritamente dogmáticas. No caso dos israelitas, o esforço para reconquistá-los se deve, em parte, a um afastamento provocado por dois fatores: o caso Williamson e a intenção de beatificar Pio XII.

Em janeiro de 2009, Richard Williamson, bispo sueco ultraconservador, foi reabilitado pelo papa. Sua ordenação tinha sido “anulada”, uma vez que ocorrera sem autorização do Vaticano. Após a reintegração, divulgou-se uma entrevista dada anteriormente por Williamson, na qual ele relativizava o Holocausto. O fato de Roma não banir o bispo causou mal-estar na relação entre católicos e judeus, apesar do mea culpa de Williamson.6

Sobre o outro motivo da crise: para Bento XVI, o papa Pio XII (1876-1958) deveria ser beatificado, que é o primeiro passo para a canonização. A questão está nas diversas controvérsias envolvendo o pontificado de Pio XII (1939-1958). O livro O Papa de Hitler, de John Cornwell, conta a omissão de Pio XII durante o Holocausto. Para muitos, o pontífice da Segunda Guerra era um antissemita ou, na melhor das hipóteses, alguém sem muito compromisso com os direitos humanos.

O atual papa discorda dessa pressuposição. Para ele, “Pio XII sempre atuou de maneira secreta e silenciosa porque, à luz das situações concretas desse complexo momento histórico, teve a intuição de que era o único meio de poder evitar o pior e salvar o maior número possível de judeus”.Consequentemente, o desejo de Bento XVI de beatificar o papa Pio XII gerou manifestações contrárias em Israel.

Os dois fatores mencionados contribuíram para desentendimentos entre judeus e Bento XVI. Agora, o papa ensaia a reaproximação com o grupo monoteísta mais antigo do mundo. Da perspectiva bíblico-profética, os esforços do papa confirmam a volta do predomínio do poder político-religioso descrito em Apocalipse 13.

Luteranos

Desde os anos 70, luteranos e católicos promovem um diálogo com intenções ecumênicas, o que tem rendido alguns documentos expressando pontos doutrinários comuns entre as duas tradições. Em parte, esse entendimento parece divergir do princípio Sola Scriptura, adotado por Lutero, que consiste em tratar a Bíblia como regra de fé e única autoridade para determinar a crença cristã. Sutilmente, as denominações envolvidas procuram se unir em pontos que suas respectivas tradições compartilham, sem considerar, à luz da Bíblia, em que aspectos seus credos precisam ser corrigidos e alinhados com a doutrina bíblica.

Isso nos faz imaginar o que o próprio Lutero diria se estivesse vivo e presenciasse as condições do diálogo entre seus confrades e os católicos. Basta lembrar que, na época de Lutero, um de seus mais próximos colaboradores, Felipe de Melâncton, foi duramente combatido por irmãos luteranos e até repreendido pelo próprio Lutero, por ter se mostrado, em mais de uma ocasião, “flexível” demais em diálogos interdenominacionais (não espontâneos, mas convocados pelo imperador Carlos V, do Sacro Império Germânico). Talvez, os luteranos deveríam ser chamados de “filipinos”, por uma questão de justiça.

Seja como for, o papa Bento XVI parece satisfeito com o rumo do diálogo, cujo tópico é o da justificação pela fé, o mesmo que impulsionou Lutero a pregar contra os abusos romanos em pleno século 16, quando acender uma fogueira para um herege era uma atividade que não demandava muita burocracia. Em 31/10/1999, um documento foi assinado por luteranos e católicos, expressando sua crença comum na justificação.

Que ninguém pense que a Igreja Católica assumiu qualquer culpa durante os diálogos! No dia 19/01/2009, diante de uma delegação finlandesa representando interesses ecumênicos, Bento XVI expressou seu desejo da união do corpo de Cristo: “A Igreja é este Corpo místico de Cristo e é guiada continuamente pelo Espírito Santo; o Espírito do Pai e do Filho. Só baseando-se nesta realidade encarnacional se poderá compreender o caráter sacramental da Igreja como comunhão em Cristo.” Essa declaração8 revela o próximo passo: uma união, baseada na compreensão da universalidade do corpo de Cristo, uma reaproximação que apela para a unidade da Igreja.

Os movimentos ecumênicos adotam João 17 como sua oração de cada dia, esquecendo-se de que a unidade da Igreja não passa por cima dos seus alicerces, os quais se constituem de facetas da Verdade revelada, em torno da qual devem se unir os que aceitaram a pessoa de Jesus. Sem essa Verdade bíblica, toda tentativa de união não chega a formar o corpo de Cristo. Ora, Cristo não é outro senão Aquele que Se acha revelado. Rejeitar a revelação em favor da manutenção das tradições religiosas é distorcer Cristo.

União na verdade

Nas entrelinhas do depoimento papal, percebe-se a doutrina católica da Igreja como depositária dos sacramentos, abrindo a porta para outras ideias nocivas, como as indulgências, a intercessão dos santos, a infalibilidade papal e outras. Tais dogmas têm em comum a ênfase nos méritos pessoais que tanto o Senhor Jesus, como algumas pessoas (os santos) alcançaram, e que se encontram acessíveis à comunidade dos crentes, através de sua administração feita pela Igreja. Por isso, a Igreja Católica é uma denominação essencialmente sacramental, em que os sacramentos se definem não apenas por símbolos da graça, mas rituais que igualmente servem de conduto para a graça (ou seja, rituais que operam a salvação, paradigma teológico que nega a exclusividade da obra de Cristo).

Só nos resta aguardar para ver os efeitos do diálogo entre católicos e luteranos, bem como o impacto disso sobre os cristãos em geral. Se uma união é vital para revitalizar um cristianismo desunido, então essa união deve ocorrer dentro do âmbito bíblico. Por isso, a missão adventista, que consiste em anunciar a última mensagem de Deus, a “Verdade Presente”, para esta geração, deve ser reforçada e levada adiante. Apenas por meio da apresentação da verdade, os verdadeiros sinceros poderão deixar “babilônia” e se unir aos que esperam a segunda vinda de Jesus.

Referências: