A saúde mental do pastor e a pandemia

Marlon Robinson

A maioria das pessoas concorda que a Covid-19 alterou drasticamente sua vida, redefinindo de muitas maneiras o que tem sido chamado de “novo normal”. Até o momento, a doença ceifou a vida de milhões de pessoas, virou o mundo de cabeça para baixo e expôs os pastores a um novo tipo de esgotamento. Por causa da pandemia, todos nós experimentamos mudanças relacionadas ao trabalho, vida familiar, estabilidade econômica, relacionamentos e saúde.1

Essa crise tirou os membros de seus locais habituais de adoração e alterou a koinonia, a comunhão dos crentes. Isso levou à adoção de cultos on-line, reuniões com número reduzido de pessoas e adoração em casa. De modo geral, os pastores não foram preparados para os desafios de administrar uma igreja virtual, quanto mais um distrito de igrejas virtuais!

Além disso, as mudanças na maneira pela qual os ministros prestam serviços religiosos aumentaram sua carga de trabalho, destruíram muitos dos limites que tinham antes da pandemia e atrapalharam o descanso que geralmente experimentavam em casa, agora transformada em estação de trabalho primária.Pastores que são inundados com e-mails, telefonemas, mensagens de texto e WhatsApp
e contatos por meio de outras plataformas identificam-se com a pesquisa da Universidade Monmouth, de Nova Jersey, que indica que 55% da população em geral relatou níveis mais elevados de estresse.3

Bem-estar mental

A saúde mental é imprescindível durante a crise da Covid-19, não só porque é um fator para a qualidade de vida, mas também devido à noção de que “a doença mental foi chamada de a pandemia do século 21”.4 Por isso, prestamos um desserviço aos pastores se falarmos sobre saúde sem considerar a saúde mental. De fato, não pode haver verdadeira saúde sem ela. Portanto, como os pastores estão cuidando de sua saúde psicológica durante a atual pandemia?

De acordo com a Associação Norte-Americana de Psiquiatria, “os transtornos mentais geralmente estão associados a sofrimento significativo em atividades sociais ou ocupacionais, entre outras.”5 Os problemas provocados pela pandemia provavelmente produzirão sofrimento significativo, o precursor dos transtornos mentais. Como pastores, é vital compreender que a doença mental não discrimina com base em religião, idade, gênero, deficiência, cor, raça, nacionalidade, situação financeira, herança genética, ocupação, ideologia política, estado civil ou quaisquer outras categorias ou características. Em outras palavras, a doença mental não faz acepção de pessoas.

Dois pastores descreveram sua experiência na pandemia “como uma sensação de sobrecarga avassaladora” e tendo “novos níveis de irritação e estresse”.6 Um estudo realizado com 400 pastores nesse período apontou que eles estão preocupados com as finanças (26%), os desafios tecnológicos (16%), em oferecer cuidado pastoral remoto (12%) e com a falta de acesso dos membros à tecnologia (11%).7

A crise atual torna os pastores ainda mais vulneráveis ao adoecimento por conta de eventos traumáticos decorrentes de suas situações pessoais e familiares, bem como de sua contínua exposição às informações lamentáveis compartilhadas pelos membros da igreja, necessitados de cuidado pastoral. Consequentemente, é de muita importância que os pastores implementem estratégias para cuidar de sua saúde mental durante esse período de ansiedade, medo e incerteza.

Cuidando da saúde mental

Como profissionais, os pastores precisam reconhecer que, se não preservarem sua saúde mental, não terão força psicológica para cuidar adequadamente de outras pessoas.8 Embora o impacto negativo da pandemia seja um tipo único de esgotamento ou estresse, existem oito estratégias que podem reduzir seus efeitos adversos e melhorar o bem-estar psicológico geral.

1. Mantenha o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. O fato de que os pastores “muitas vezes colocam as necessidades dos outros acima das suas”é um claro indicador de que eles precisam equilibrar trabalho e vida pessoal. Esse equilíbrio reduz os custos médicos,10 gera comprometimento,11 aumenta a satisfação no trabalho12 e melhora a produtividade,13 o que provavelmente reduzirá o nível de estresse dos pastores e melhorará seu bem-estar psicológico. Assim, as igrejas que investem em estratégias para apoiar o equilíbrio entre trabalho e vida pastoral beneficiam tanto o ministro quanto sua comunidade.

2. Gerencie o estresse e as crises de maneira eficaz. O gerenciamento adequado do estresse inclui capacidade de adaptação, admissão e busca de ajuda para resolver os problemas, ver as crises como desafios e oportunidades, abertura para mudanças e resiliência.14 Tratado de maneira correta, o estresse pode levar à felicidade, saúde, eficácia no trabalho e menos doenças mentais.15 Portanto, é fundamental que os pastores regulem seus níveis de estresse e administrem as crises com sucesso.

3. Tenha um amigo de ministério. Ter um amigo com quem o pastor possa falar abertamente e com segurança é extremamente importante para seu bem-estar mental. O apoio social de um colega de confiança é uma proteção contra os estressores do trabalho.16 Isso é muito importante para gerenciar o estresse, promover brainstorming, motivar o feedback construtivo e fomentar o apoio dos colegas.

4. Seja grato. A Bíblia nos incentiva a dar graças em todas as circunstâncias (1Ts 5:18). A gratidão está associada a melhor humor e sono, menos fadiga e mais autoeficácia,17 bem como melhor bem-estar mental, maior apoio social e enfrentamento adaptativo.18 Gratidão é essencialmente “uma emoção positiva benéfica para o funcionamento positivo, bem como para ampliar e construir outras emoções positivas que, por sua vez, resultam em um aumento no bem-estar emocional.”19

5. Faça exercícios. Um treino físico de 30 a 60 minutos serve como calmante e produz endorfinas, o hormônio da felicidade. Os pastores que se exercitam pelo menos três vezes por semana reduziram o risco de grande exaustão emocional em 25%.20 Um estudo sobre exercícios e saúde mental descobriu que as pessoas que se exercitavam tiveram cerca de 1,5 dia a menos de problemas de saúde mental no mês anterior, em comparação com aqueles que não faziam exercícios.21 Claramente, a atividade física é fundamental para diminuir o estresse e promover a saúde mental dos pastores.

6. Descanse. Os adventistas entendem a importância de tirar um dia semanal de descanso, o sétimo dia. O pastor deve ter períodos de folga semanal e férias anuais para desestressar, reequipar, reorientar seu ministério e aprofundar a conexão com seu bem terreno mais importante, a família.

7. Procure serviços de saúde mental. Falar com um profissional de saúde mental é essencial para a saúde psicológica dos pastores. Se o sofrimento psicológico dos ministros interfere em suas relações pessoais, profissionais e sociais ou outras atividades importantes, eles provavelmente estejam atrasados para consultar um especialista. É imperativo observar que os serviços de saúde mental não são apenas para quem tem transtornos identificados, mas também para todos aqueles que precisam de ajuda para lidar com questões como transições de vida, luto e perda, preocupações com os pais, objetivos pessoais e escolha ocupacional.

8. Tenha esperança. A esperança é definida como “a crença de que seu futuro pode ser melhor do que seu passado, e você desempenha um papel em fazê-lo”.22 Essa esperança está ligada ao bem-estar psicológico geral e à resiliência.23 Ela amortece o estresse e a adversidade, mitiga os efeitos negativos do trauma e é o melhor promotor de uma vida bem vivida.24 Os pastores podem encontrar esperança em Deus (Sl 71:5), em Sua Palavra (Sl 119:114), em Sua misericórdia (Sl 147:11 ) e, finalmente, na segunda vinda de Cristo (Tt 2:13). É essencial que os ministros compreendam que podem viver sem comida por três semanas, sem água por três dias e sem oxigênio por três minutos, mas não poderão viver um segundo sem esperança. Portanto, eu digo aos pastores: falem de esperança, andem na esperança, pensem na esperança, preguem a esperança e mergulhem na esperança! 

Referências

1 David Burke, “Pastors Facing Additional Stress, Depression, Anxiety During Pandemic”. Disponível em <bit.ly/3bTJvBI>, acesso em 10/10/2020; Simon Dein et al., “COVID-19, Mental Health and Religion: An Agenda for Future Research”. Disponível em <bit.ly/3lskIYw>, acesso em 17/3/2021; Aaron Earls, “Pastors’ Views on How COVID-19 is Affecting Their Church”. Disponível em <bit.ly/3lpwTW6>, acesso em 17/3/2021; “Monmouth Poll: Covid-19 Impact Intensifies”. Disponível em <bit.ly/3cN3b9T>, acesso em 17/3/2021.

2 Tess Schoonhoven, “Pastors Face Mental Health Challenges in COVID-19 Pandemic”. Disponível em <bit.ly/3bWecXd>, acesso em 17/3/2021; Burke, “Pastors Facing Additional Stress”.

3 “Monmouth Poll: Covid-19 Impact Intensifies”.

4 Andrea K. Witterborn et al., “Strengthening Clinical Research in Marriage and Family Therapy: Challenges and Multilevel Solutions”. Disponível em <bit.ly/38PM467>, acesso em 17/3/2021.

5 American Psychiatric Association, The Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (Arlington, VA: American Psychiatric Association, 2013), p. 20.

6 Schoonhoven, “Mental Health Challenges”.

7 Earls, “Pastors’ Views on How COVID-19 is Affecting Their Church”.

8 Marlon Robinson, “In Pursuit of Self-Care: Health and Well-Being for the MFT”, Family Therapy Magazine 14, n. 4, julho de 2015, p. 25.

9 Crystal Mary Burnette, “Burnout Among Pastors in Local Church Ministry in Relation to Pastor, Congregation Member, and Church Organization Outcomes” (Tese de doutorado, Clemson University, 2016), p. 41.

10 Sunday Azagba e Mesbah Sharaf, “Psychosocial Working Conditions and the Utilization of Health Care Services”. Disponível em <bit.ly/2QbX3QF>, acesso em 17/3/2021.

11 Azagba e Sharaf, “Psychosocial Working Conditions”.

12 Michelle M. Arthur, “Share Price Reactions to Work-Family Human Resource Decisions: An Institutional Perspective”, Academy of Management Journal 46, n. 4, agosto de 2003, p. 497-505.

13 Mental Health America, “Work Life Balance”. Disponível em <bit.ly/3tuGZYH>, acesso em 12/7/2020; E. Jeffrey Hill et al., “Influences of the Virtual Office on Aspects of Work and Work/Life Balance”. Disponível em <bit.ly/3vwrEsB>, acesso em 17/3/2021.

14 Sylvia M. Asay e John DeFrain, “The International Family Strengths Model”. Disponível em
<bit.ly/30VMV0F>, acesso em 17/3/2021.

15 Eluned Gold et al., “Mindfulness-Based Stress Reduction (MBSR) for Primary School Teachers”, Journal of Child and Family Studies 19, n. 2, abril de 2010, p. 184-189.

16 Burnette, “Burnout Among Pastors”.

17 Paul J. Mills et al., “The Role of Gratitude in Spiritual Well-Being in Asymptomatic Heart Failure Patients”, Spiritual Clinical Practice 2, n.1, março de 2015, p. 5-17.

18 Chih-Che Lin, “Impact of Gratitude on Resource Development and Emotional Well-Being”, Social Behavior and Personality 43, n.3, abril de 2015, p. 493-504.

19 Lin, “Impact of Gratitude”.

20 Benjamin R. Doolittle, “The Impact of Behaviors Upon Burnout Among Parish-Based Clergy”, Journal of Religion and Health 49, n.1, março de 2010, p. 88-95.

21 Sammi R. Chekroud et al., “Association Between Physical Exercise and Mental Health in 1.2 Million Individuals in the USA Between 2011 and 2015: A Cross-Sectional Study”, The Lancet Psychiatry 5,
n. 9, agosto de 2018, p. 739-746.

22 Casey Gwinn e Chan Hellman, “Dr. Seuss, Resilience, and the Science of HOPE”. Disponível em
<bit.ly/3cHbd3T>, acesso em 17/3/2021.

23 Ricky T. Munoz et al., “Adverse Childhood Experiences and Posttraumatic Stress as an Antecedent of Anxiety and Lower Hope”, Traumatology 24, n. 3, 2018, p. 209-218.

24 Gwin, “Science of HOPE”.

Os pastores precisam reconhecer que, se não preservarem sua saúde mental, não terão força psicológica para cuidar adequadamente de outras pessoas.

Marlon Robinson, diretor de cuidados pastorais da AdventHealth Manchester, Estados Unidos