Eu estou ouvindo, mas não estou gostando.

Um professor de Religião falou-me sobre as igrejas existentes na área onde mora. “Para lhe dizer a verdade”, ele afirmou, “não há uma única igreja saudável, vibrante, por aqui. Tanto as igrejas como a própria região estão moribundas.”

Numa das comissões de planejamento para o evangelismo via satélite, a NET 98, falava-se sobre o número de reuniões que seriam realizadas. Um dos membros, admirado com o pouco número de reuniões, sugeriu que as igrejas locais fossem incentivadas a assumir os estudos bíblicos com os interessados. Mas um administrador replicou, dizendo: “Isso já foi tentado, e concluímos que não devemos depender das igrejas locais para esse trabalho. Simplesmente não funciona.”

Conversando com um presidente de Campo, perguntei-lhe quantas das 100 maiores igrejas em seu território demonstravam possuir uma visão correta do ministério pessoal. Sua resposta foi: “Umas três, talvez quatro.”

Um leigo ativo explicou o apuro que sentia ao ter que convidar seus amigos incrédulos para as reuniões da igreja. “Não posso convidá-los. Não conheço uma só igreja em minha vizinhança, para a qual eu me sentiria confortável em levá-los.”

Eu estou ouvindo, mas não estou gostando.

Igrejas doentes

Diante disso, fico me perguntando às vezes: Será que estou entendendo bem o que ouço? Ou estou realmente ouvindo vozes negativas, pessimistas?

Nos últimos meses, tenho participado de várias comissões, juntamente com outros pastores, administradores e leigos, que estudam a situação crítica de muitas igrejas. Aí, são apresentados excelentes relatórios sobre o crescimento de instituições de saúde, educacionais e de publicações. Fala-se sobre os programas via satélite. Mas o relatório sobre a igreja local, geralmente, denuncia estagnação. Não é que ela não tenha seu brilho. Em muitos casos, a chama ainda está bruxuleando; mas as histórias se parecem mais com um canto fúnebre do que com um coral cantando aleluias.

Muitos irmãos questionam por que de-vem assistir a seminários, ou estudar literatura, estranhos à nossa denominação para aprender sobre como tornar a igreja melhor. Eles estão ansiosos para fazer a igreja crescer dinâmica, entusiasta, cheia do espírito. Têm uma fome intensa de ser parte da mudança de vida da igreja local, de capturar a adrenalina da Igreja apostólica.

Participação jovem

Poucas instituições universitárias denominacionais, se é que existe alguma, guardam estatísticas sobre a assistência à igreja por parte de seus alunos. Mas, depois de ter conversado com alguns recém-formados de várias faculdades, minha avaliação é que cerca de 50% a 80% de seus ex-alunos pouco participam na igreja que freqüentam.

“Os rumores são de que aproximadamente 60% continuam ativos”, diz Bailey Gillespie, do Centro Acadêmico da Universidade La Sierra. “Mas é difícil determinar os números. O que é fascinante é que 95% dos jovens adventistas vêem-se comissionados por Jesus. A questão é que eles são menos leais à Igreja institucionalizada. Não a vêem como algo que alimenta sua fé.”

Eu estou ouvindo, mas não estou gostando.

Particularmente creio que uma perigosa ilusão nos tem cegado os olhos. Enquanto nós cuidadosamente gerimos uma grande e sofisticada estrutura administrativa, um globalizado sistema educacional, um renomado conglomerado de saúde, além do crescimento de respeitabilidade teológica nos círculos cristãos sérios, a parte mais importante da Igreja – a igreja local – é atrofiada.

Creio que temos substituído a comunidade da igreja local pela organização religiosa. Temos nos enamorado das entidades designadas a apoiar o corpo, e esquecido o próprio corpo. Temos colocado a igreja como uma organização paralela. E isso é doloroso.

Aparentemente nos esquecemos de que escolas, casas publicadoras, hospitais, funções administrativas, são importantes apenas quando servem saudavelmente à igreja local. Se a comunidade local não se tornar saudável, esses ministérios perdem sua efetividade. De nada adianta todos os nossos hospitais curarem fisicamente o povo, se as igrejas locais não o cura espiritualmente. De nada adianta nossas escolas educarem jovens que nunca se tornarão ativos na igreja local. Ou se livros e revistas trazem maravilhosos artigos e idéias que nunca serão colocadas em prática na igreja.

Sem uma igreja local forte, tudo o mais resulta insignificante.

Nosso sistema falha quando a equipe de apoio brilha mais que a da própria igreja. Quando nossos recursos administrativos são melhores e em maior quantidade do que os da igreja local. Quando os mais modernos recursos tecnológicos estão nos escritórios dos Campos e instituições, enquanto uma antiga máquina de escrever é tudo o que existe na igreja. Sim. nosso sistema falha quando as expressões “subir” ou “cair” são relacionadas ao fato de um pastor ser transferido da igreja para um departamento ou função administrativa; e vice-versa.

O ano da igreja

Creio que a grande questão enfrentada pelos adventistas do sétimo dia, no limiar de um novo século, é: Como podemos tornar a igreja local a mola-mestra, em vez do elo fraco da corrente denominacional?

Freqüentemente, selecionamos um determinado ano para enfatizar um aspecto do nosso trabalho: “Ano da Mulher”, “Ano do Evangelismo Jovem”, “Ano da Oração”, etc. Que tal separar a próxima década e nomeá-la “A Década da Igreja Local”? Devemos discutir seriamente sobre como restaurar a igreja local ao seu lugar próprio; comprometer-nos com a sua primazia, no contexto denominacional.

Há pelo menos cinco maneiras de efetivar esse processo.

  • 1. Plantar novas igrejas. Isso não significa mais um programa opcional. O exemplo do explosivo crescimento da Igreja Primitiva mostra que é a própria vida de uma comunidade cristã. Quando uma igreja deixa de gerar outras igrejas, ela morre. Poucas coisas são tão espiritualmente animadoras como a sensação do surgimento de uma nova igreja.

Isso também pode nos levar a considerar a possibilidade de fechar algumas igrejas. Plantar e ceifar são atividades importantes para o crescimento. Muitas igrejas têm experimentado crescimento zero, durante anos, tornando-se mais perda do que ganho. Décadas de comodidade tornam-se perversão espiritual para algumas igrejas locais; e sua extinção torna-se a melhor decisão espiritual que poderia ser tomada. Ademais, devemos nos lembrar que Deus usa pessoas e igrejas por determinados períodos de tempo, incluindo começo e fim.

Casas publicadoras, hospitais, funções administrativas, são importantes apenas quando servem saudavelmente à igreja local.

  • 2. Inspirar os jovens. Não raro, destacados jovens em nossos colégios e universidades escolhem carreiras como medicina, administração, direito, entre outras. Embora sejam nobres ocupações, a igreja local clama por líderes efetivos que possam dirigir a visão de uma excitante comunidade bíblica. Devemos recrutar, sob a direção divina, “os melhores e os mais brilhantes” para o ministério. Através da história, Deus sempre necessitou de grandes líderes para promover o Seu reino. Agora não é diferente. Não devemos encontrar desculpas para não desafiar os jovens para a liderança espiritual. Uma infusão de juventude pastoral em nossas igrejas causaria grande impacto.
  • 3. Apoio das instituições. De maneira construtiva, deveriamos avaliar cada publicação, programa de trabalho e projeto dos Campos e instituições. É preciso analisá-los à luz das possibilidades e realidades da igreja local, a fim de termos uma idéia da efetividade dos programas. Então, poderiamos adotar aqueles que realmente são uma ajuda, testar alguns que parecem viáveis, mas necessitam de ajustes, e eliminar os que não trazem benefícios.

Os departamentos e instituições devem ajudar, não complicar a vida da igreja.

  • 4. Distribuição de recursos. Temos chamado a igreja local para apoiar instituições educacionais, programas administrativos, publicações, iniciativas evangelísticas, e um grande número de projetos dig-nos. Mas é preciso também apoiar a igreja local. Nossa “perigosa ilusão”, a qual nos tem levado a focalizar especialmente sobre os projetos que “vêm de cima”, é visualizada muito claramente em nosso sistema de alocação financeira. Há muitos recursos direcionados para esses projetos, e muito pouco para as iniciativas locais.

Muitas igrejas lutam com programas de construção, necessitam de equipamentos, e até secretária de tempo integral. Algumas necessitam dinheiro para fazer evangelismo. Precisam de recursos para desenvolver programas comunitários. E, como uma família adventista, devemos estudar e descobrir juntos como satisfazer essas necessidades, investindo mais recursos financeiros nas igrejas locais.

Alguns temem que esse tipo de apoio redunde em congregacionalismo doentio. Mas a visão mundial de uma Igreja que prioriza suas comunidades locais, nada precisa temer. Paradoxalmente, quanto mais for apoiada a igreja local, menor será o perigo da explosão de uma mentalidade congregacionalista.

  • 5. Criatividade e fervor. Não devemos esperar novos pastores, mais dinheiro, ou uma mudança de estrutura, para começar a plantar igrejas. O Deus que nos chamou deseja que sejamos criativos e fervorosos no desempenho de nossa missão. Não devemos transferir para outros o nosso trabalho. Uma aventura de fé nos aguarda. Devemos nos tornar um corpo de crentes nunca satisfeitos com a rotina.

A força da Igreja Adventista do Sétimo Dia, como instituição, reside na força de suas igrejas locais. A promessa do amanhã reside em nossa habilidade de produzir igrejas locais prósperas. A vitalidade de nossa mensagem e missão, nosso chamado profético, o futuro de nossos jovens, juvenis e crianças reside nos cuidados que lhes dispensamos. A igreja local é a Igreja. Devemos avançar destemidamente para cumprir o que Deus nos confiou.