L. H. RUDY

(Vice-Presidente da Associação Geral)

COMO povo os adventistas chegaram a um momento grande e decisivo de sua história. Está o mundo compreendendo, como nunca dantes, o esplendor da mensagem que Deus lhes confiou. Vários fatôres contribuíram para produzir êste estado de coisas.

Atividades tais como relações públicas em nossas Associações, instituições e igrejas; os esforços da Voz da Profecia, os programas de televisão chamados Fé Para Hoje; a publicação do Seventh-Day Adventists Bible Commentary (Comentário Bíblico Adventista); e a produção de uma espécie de livros e de publicações que atrai a atenção das classes sociais mais destacadas, além de outros meios de levar ao mundo os ensinos fundamentais do cristianismo, colocaram-nos, como denominação, em posição muito vantajosa.

Cremos que tudo isso está contido na providência divina, e que ocorreu com o objetivo de que as verdades salvadoras da última mensagem de misericórdia divina para um mundo perturbado, sejam proclamadas com grande rapidez e poder. Êste é o momento tão anelado, momento em que o remanescente de Deus, mais plenamente tomará o lugar assinalado de arauto da misericórdia, em um tempo em que o mundo está à borda do abismo da destruição.

Deus nos diz: “Levanta-te, resplandece, porque já vem a tua luz, e a glória do Senhor vai nascendo sôbre ti. Porque eis que as trevas cobriram a Terra, e escuridão os povos; mas sôbre ti o Senhor vai surgindo, e a Sua glória se verá sôbre ti”. (Isa. 60:1 e 2.)

Cônscios dêste grande momento de oportunidade, devemos perguntar-nos: Estamo-nos colocando à altura do repto que a hora presente implica? Somos fiéis à fé que nos foi confiada?

Em relação com isto, animador é meditar sôbre as seguintes palavras:

“Não sabemos quais são os grandes interêsses que podem achar-se em jôgo quando Deus nos prova. Não há segurança além de na obediência estrita à Palavra de Deus. Tôdas as Suas promessas foram feitas sob condição de fé e obediência, e o não cumprirmos Seus mandamentos impede que se cumpram em nós as abundantes providências das Escrituras. Não devemos seguir nossos impulsos, nem confiar no juízo dos homens; devemos voltar-nos para a vontade revelada de Deus e andar em conformidade com Seus definidos mandamentos, quaisquer que sejam as circunstâncias. Deus tomará conta dos resultados; mediante a fidelidade à Sua Palavra podemos demonstrar na hora da prova, perante os homens e os anjos, que o Senhor pode confiar em que mesmo nos lugares difíceis cumpriremos Sua vontade, honraremos Seu nome, e beneficiaremos Seu povo.” — Patriarcas e Profetas.

Bem sabemos que tôda responsabilidade significa tanto uma prova como uma oportunidade. Tôda missão confiada implica em risco. Deus Se dispos a correr um risco extraordinário ao decidir levar a cabo Seu desígnio eterno por meio de agentes humanos. Apesar disso, correu o risco porque estava preparado para enfrentar os resultados, se os homens agissem em estrita obediência à Sua Palavra: “Mediante a fidelidade à Sua Palavra podemos demonstrar na hora da prova, perante os homens e os anjos, que o Senhor pode confiar em que mesmo nos lugares mais difíceis cumpriremos Sua vontade, honraremos Seu nome, e beneficiaremos Seu povo.”

Ao chegarmos a esta hora transcendental da proclamação da tríplice mensagem angélica, também chegamos ao momento da maior prova em nossa história. Como é animador saber que Deus “pode confiar em que mesmo nos lugares difíceis cumpriremos Sua vontade”, e que Êle revelou as bases sôbre que podemos provar essa confiança!

Da experiência presente do povo de Deus, em que testificou fielmente, em estrita obediência à Palavra de Deus, descobriremos certas qualidades que são sumamente essenciais na prova de nossa fé.

Fortaleza Espiritual

Uma das primeiras qualidades reveladas na prova de nossa fé é a fortaleza espiritual. Esta sempre foi alguma coisa real na vida do povo de Deus. Sirva-nos de exemplo a experiência de homens tais como Abraão, José, Moisés, Samuel, Daniel e Isaías. Foram poderosos homens de fé. Andaram nos caminhos do Senhor apesar das circunstâncias que os rodeavam.

Cristo é quem apresenta o exemplo mais notável de fé e obediência no fazer a vontade de Seu Pai. Os apóstolos deram testemunho da mesma fortaleza espiritual. Teriam preferido morrer a desobedecer a Deus. Juntamente com seu Mestre, cada um dêles bem poderia dizer:

“As minhas costas dou aos que me ferem, e as minhas faces aos que me arrancam os cabelos; não escondo a minha face dos que me afrontam e me cospem. Porque o Senhor Jeová me ajuda, pelo que me não confundo; por isso pus o meu rosto como um seixo, e sei que não serei confundido.” (Isa. 50:6 e 7.)

Esta mesma inteireza espiritual, esta determinação de apartar-se da presunção e da complacência, caracterizou as fiéis testemunhas de Deus através da vida da igreja cristã, e hoje está presente na igreja remanescente. Não podemos deixar de encontrá-la onde quer que o povo que guarda os mandamentos de Deus seja provado pelas circunstâncias especiais que o rodeiam, circunstâncias que exigem apêgo estrito à Palavra de Deus.

O irmão K., da Rússia, é um bom exemplo entre os obreiros daquele país. Em 1934, ao final do primeiro plano quinquenal destinado a destruir a fé em Deus, êste irmão, com muitos outros, foi aprisionado, tratado com crueldade e enviado para o destêrro siberiano. O trem que o conduzia para a Sibéria, estava em péssimo estado de conservação. Houve muitos acidentes, e o irmão K. sofreu ferimentos mortais. Morreu no hospital quase imediatamente depois de haver chegado ao seu destino, na Sibéria. Sua morte não foi notificada oficialmente à família, em Moscou, mas algum tempo depois chegou carta de um de seus companheiros de prisão. A seguir, transcrevemos alguns parágrafos dessa carta:

“Durante a cansativa viagem de duas semanas pelas estepes da Sibéria, êle [o irmão K.J não perdeu oportunidade, nem de dia nem de noite, de falar, tanto a mim como aos outros, do amor de Deus e da conversão. Falou-nos do plano da salvação, desde a queda de Satanás até à vinda de Jesus, a libertação dos justos e a nova Terra. Combinamos momentos de silêncio para orar juntos. Depois que lhe contei a história de minha vida, experimentei o poder do Espírito Santo. Agradeci a Deus a maravilhosa revelação que me concedeu nesta viagem para o exílio, prometi servir-Lhe desde aquêle momento e guardar Seus mandamentos.

“Ao acontecer o terrível acidente do choque de nosso trem com outro, o irmão K. sofreu ferimentos muitos dolorosos, que finalmente lhe causaram a morte. Durante os momentos de dor e angústia que experimentou, nunca ouvimos de seus lábios uma palavra de queixa nem de lamento. Depois de expressar sua última vontade, que foi a de notificarmos sua família e a igreja de Moscou, pronunciou sua última oração. Agradeceu a Deus o privilégio de sofrer com Cristo, e a esperança de que seu sofrimento logo terminasse, e êle entrasse no repouso quando Cristo vier e o levar para o lar. Seu rosto resplandecia. Experimentou verdadeiramente a morte de um justo”.

Ao receberem os irmãos de Moscou esta mensagem, celebraram um culto religioso em sua memória. O lugar de cultos foi ornamentado com belas flôres, porque elas lhes lembravam o seu amado ministro e ancião da igreja. O texto da Escritura considerado nessa ocasião foi o de Hebreu 13:3 e 7:

“Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com êles, e dos maltratados, como sendo-o vós mesmos também no corpo. . . . Lembrai-vos dos vossos pastôres que vos falaram a Palavra de Deus, a fé dos quais imitai, atentando para a sua maneira de viver.”

Nossos evangelistas em solitários postos missionários, amiúde reanimam as visitas com sua fé e firmeza espiritual. Certa ocasião estive visitando um de nossos veteranos missionários do Oriente Próximo. Havia então estalado a Segunda Guerra Mundial. Estávamos em Jerusalém. Depois da ceia comecei a animar êsse irmão e sua fiel espôsa, para que, logo que lhes fôsse possível, passassem suas férias em sua terra natal. Já haviam renunciado a um período de férias, e passou-se o seguinte sem que o tomassem. Depois de eu insistir sôbre o assunto, disse-me o missionário:

“Por favor, não insista em que devamos tomar férias. Já gozamos várias quando nossos filhos eram pequenos. Naturalmente, gostaríamos de ver outra vez nossos filhos, depois de tantos anos de separação. Também nos seria um gôzo o vermos nossa pátria novamente. Mas preferimos não ir até que voltemos definitivamente. As férias sòmente nos fazem acarinhar-nos mais à nossa terra, e a readaptação à vida missionária torna-se mais difícil depois de um tempo de ausência passado na pátria. Por favor, deixe-nos prosseguir em nossa obra neste lugar, sem tomar férias”.

O espírito com que foi expresso êste modo de pensar e o ambiente reinante na conversação, não deram lugar a dúvidas quanto ao fervor e ao zêlo do missionário e de sua espôsa. Não se insistiu mais no assunto. Se o missionário estava certo ou não, pode ser discutível, mas não há dúvida quanto à fortaleza de espírito. Conquanto sua decisão fôsse contrária aos meus desejos pessoais, nunca deixei de maravilhar-me de tão sincera devoção a Deus e aos interêsses de Sua obra sôbre a Terra.

Êste mesmo fervor espiritual se encontra entre os jovens do movimento adventista. Lembro-me do caso de um de nossos jovens educadores. Quando efetuava estudos adicionais após sua diplomação, preparando-se para a profissão que escolhera, os pais e parentes buscaram interessá-lo na carreira da Medicina. Ao contar a última conversa que tivera em particular com o filho, o pai disse: “Não tornei a dizer-lhe coisa nenhuma mais sôbre o assunto, depois que ouvi as palavras que êle proferiu então. Depois de breve pausa, disse: “Papai, não quero estudar Medicina, porque exercería essa profissão apenas pelo dinheiro”.

Tratava-se de um jovem cujos motivos de serviço não podiam medir-se em termos de comodidades e bem-estar materiais. Dedicara a vida à causa que exigia sacrifício, e não se deixaria dissuadir de sua determinação. Tal como centenares de rapazes e moças das fileiras adventistas da atualidade, êsse jovem manifesta a espécie de fervor espiritual que provará a fé que Deus confiou aos adventistas do sétimo dia nestes últimos tempos.

O Verdadeiro Sentido do Encargo Missionário

Outra qualidade essencial que Deus requer ao provar a fé é um verdadeiro senso do encargo missionário, uma participação consciente e equilibrada da responsabilidade da obra de Deus, cujo progresso não deve pesar sôbre os ombros de uma só pessoa, nem de um grupo escolhido de indivíduos. Essas responsabilidades devem ser partilhadas por todo seguidor de Cristo.

Sem dúvida o apóstolo Paulo tinha em mente essa idéia, ao escrever a Timóteo: “Participa das aflições do evangelho segundo o poder de Deus.” (II Tim. 1:8.) Paulo lembrava-se do que abrangera o seu chamado para o apostolado entre os gentios. Fôra-lhe dito o muito que sofreria por Cristo. Nunca houve em seu dilatado ministério um momento em que não suportasse algum sofrimento pela causa de seu Mestre. Agora que se lhe aproximava o fim da vida, exortava Timóteo: “Portanto, não te envergonhes do testemunho de nosso Senhor, nem de mim, que sou prisioneiro Seu, antes participa das aflições do evangelho”.

Participar das aflições ou responsabilidades do evangelho significa ter verdadeiro senso da missão recebida, em relação com a urgência e as necessidades da causa de Cristo. A comissão evangélica abrange a proclamação do evangelho em todo o mundo, fazendo caso omisso das circunstâncias existentes e prescindindo dos sacrifícios que encerra. Nesta tarefa não pode haver detenção nem descanso. Cada soldado da cruz deve ser voluntário e estar pronto para levar a parte da carga que lhe toca, em qualquer tempo ou lugar que o Senhor indique. Amiúde isso inclui possuir a vontade de levar avante a obra de Deus com as menores facilidades, e sem a colaboração de uma igreja ou de ajudantes remunerados. O verdadeiro senso do encargo missionário não espera que cada obstáculo haja sido aplainado e tudo esteja pronto de antemão, para chegar a dêles apossar-se e desfrutá-los.

A atitude do apóstolo Paulo para com sua obra é digna de imitação. Êle nunca se colocou a si próprio ou a seus interêsses pessoais em primeiro lugar, nem pensou no prestígio, na posição que alcançaria, ou na categoria que teria. Nunca almejou sobressair à custa do esfôrço de outros homens.

A sinistra tentação que amiúde assalta o obreiro evangélico ao ser chamado para outro campo de trabalho, está bem descrita no artigo “Uma Carta que Nunca Foi Escrita”, publicado faz alguns anos na revista Canadian Churchman. Suponhamos, diz o autor, que São Paulo houvesse assim escrito:

“Prezado irmão:

“Sem dúvida estará lembrado do convite que me fêz para passar a Macedônia e ajudar o povo dêsse lugar. O Senhor irá perdoar me por dizer-lhe que estou um tanto surprêso por ver que espera que um homem da minha categoria na igreja considere com seriedade um chamado com tão pouca informação. Há uma quantidade de coisas acêrca das quais eu quisera inteirar-me antes de comunicar-lhe a minha decisão, e apreciaria que me escrevesse uma carta, que remeterá para Troas.

“Sobretudo, eu gostaria de saber se a obra na Macedônia se realiza no interior ou na cidade. Isto é importante, pois me foi dito ser impossível para o missionário que inicia a obra fora das cidades, conseguir depois um cargo na cidade. Se Macedônia abrange mais de um lugar onde eu deva pregar, preciso dizer-lhe francamente que não posso pensar em aceitar o chamado. Estive empenhado em preparação longa e dispendiosa. De fato, posso dizer com orgulho perdoável, que sou membro do Sanedrin, o único que agora está no ministério. (Minha educação e talentos habilitam-me para dirigir muito bem uma grande congregação.)

“Passei a idade em que o senhor podia esperar que um homem se lançe a um novo campo sem ter a mínima idéia do salário que receberá. Forjei me uma boa posição na Galácia, e iniciar um trabalho que signifique rebaixamento seria assunto que traria conseqüências desagradáveis.

“Eu lhe agradecería que se reunisse com os irmãos de Macedônia, a fim de fixarem o salário que me poderiam conceder. O senhor nada mais me diz além de: ‘O lugar precisa de ajuda’. Qual é a posição social dos dirigentes do grupo de Macedônia? Está a igreja eficientemente organizada?

“Ultimamente recebi um oferecimento para voltar para a Antioquia, com aumento de salário, e foi-me dito que causei muito boa impressão na igreja de Jerusalém. Se êstes fatos forem de algum auxílio para a comissão executiva de Macedônia, posso comunicar-lhos; e também que alguns dos irmãos da Judéia ouviram dizer que se eu prosseguir como até agora, dentro de poucos anos poderei ter algum dom da igreja. Quero dizer que sou pessoa adaptável e sociável de primeira classe, e especialmente me destaco na oratória argumentativa.

Afetuosamente, Paulo”.

Presteza e Decisão

Uma terceira qualidade, que precisa ser cultivada continuamente, é a decisão e presteza na direção da obra de Deus. O temor, a vacilação e a indecisão foram a causa da perda de muitas batalhas. Ao consultarem os homens seus temores, em vez de avançar rapidamente no momento em que, providencialmente, as oportunidades se apresentam, Satanás está em condições de reunir tôdas as suas fôrças e fechar essas portas abertas.

Sôbre êste ponto, especialmente, o Senhor concedeu ao Seu povo conselhos muito definidos. No livro Obreiros Evangélicos, págs. 129 e 130, lemos:

“A causa de Deus requer homens de golpe de vista e capazes de agir pronta e energicamente no momento oportuno. Se esperais para medir cada dificuldade e pesar cada perplexidade que encontrardes, bem pouco haveis de realizar. Encontrareis dificuldades e obstáculos a cada passo, e deveis, com um firme propósito, decidir vencê-los, ou do contrário sereis por êles vencidos. . ..

“Tem-me sido mostrado que as mais assinaladas vitórias e as mais terríveis derrotas se tem decidido em minutos. . . . Perdem-se freqüentemente vitórias devido a tardanças. Haverá crise nesta causa. A ação pronta e decisiva no momento oportuno conquistará gloriosos triunfos, ao passo que dilações e negligências darão em resultado grandes fracassos e positiva desonra para Deus.”

Às vêzes os homens que estiveram empregados em nossa obra chegam a ser críticos e rebeldes. Em certas oportunidades procuram dividir nossas igrejas, ou mesmo buscam entre nosso povo quem os siga, e trabalham em forte oposição à causa de Deus. Ao surgirem tais apostasias sediciosas, nossos dirigentes nas igrejas e Associações devem agir com decisão e presteza. Cada vez que começam a desenvolver-se os planos do inimigo, podem êles ser desbaratados com discernimento rápido e ação pronta. A autoridade decisiva e a presteza combinadas com amor fervoroso às almas perdidas e aturdidas, falarão gloriosamente em prol de Deus.

Cada vez que essa atitude foi assumida, os elementos rebeldes foram vencidos, e até os dirigentes dêsses movimentos souberam encontrar a senda que os conduziu de volta ao seio da igreja. Igrejas inteiras foram libertas de um estado crítico de confusão. Centenares de pessoas foram salvas da apostasia, e hoje se rejubilam com o povo de Deus numa bela experiência cristã.

Portanto a fim de provar perante os homens e os anjos que Deus pode confiar em que cumpriremos Sua vontade, devemos cultivar estas qualidades essenciais de grande valor. Sem elas, será impossível seguir uma senda de estrito cumprimento da vontade de Deus. Com elas, bem desenvolvidas e apropriadamente exercitadas, a causa de Deus sempre estará em mãos seguras. Cada crise será enfrentada e vencida para a glória de Deus. Os obstáculos, a oposição e a indecisão serão transformados em valor e vitórias. A causa de Deus avançará com a glória do Céu, em meio das trevas e contratempos do mundo.