O propósito divino da redenção do mundo e felicidade para o Seu universo, realizar-se-á com êxito, por motivo de Sua presciência. Deus é bem capaz de guiar os negócios dos ho-mens e dos anjos, porque sabe de antemão o que vai acontecer. Pensemos na experiência de Cristo, quando na Terra, como homem. A notável presciência do Cristo terrestre foi motivada pelas visões que Lhe eram concedidas quando em oração, como por exemplo no deserto da tentação, após Seu batismo. Foi Êle de fato o Profeta, em cumprimento de Deut. 18:18. (Ver também Núm. 18:6.) Era Êle um verdadeiro vidente.
Quando no deserto, Cristo jejuou, mas era insensível à fome. Empenhado em constante oração ao Pai, a fim de que estivesse preparado para resistir ao adversário, Cristo não sentiu o tormento da fome. Passou o tempo em fervorosa oração, isolado com Deus. Era como se estivesse em presença do Pai. . . . Viu Êle o rompimento do poder de Satanás sôbre os homens caídos e tentados. Viu-Se a Si mesmo curando os doentes, confortando os descoroçoados, animando os desalentados, e pregando o evangelho aos pobres — fazendo a obra que Deus para Êle esboçara; e não Se apercebeu de nenhuma sensação de fome antes que terminassem os quarenta dias de jejum.
Passou a visão, e então, com forte anelo, a natureza humana de Cristo exigia, alimento. Era agora a oportunidade de Satanás assaltá-Lo. Resolveu aparecer como um dos anjos de luz que haviam aparecido em Sua visão.— SDA Bible Commentary, Comentários de Ellen G. White, sôbre S. Mat. 4:1, pág. 1080. (Grifo nosso.)
Em visão profética Deus revelou a Cristo cenas, no desdobramento do drama de Sua vida e paixão, preparando-O para as provas. É esta uma verdade significativa, e explica a notável presciência do Cristo humano, que recebeu de Deus conhecimento para estar preparado para as eventualidades de Seu ministério público. Talvez desta maneira Deus Lhe revelasse a tríplice negação de Pedro e a traição de Judas. (Ver também Salmo 41:9.)
É impossível manter escrituristicamente a alegação de que Deus não tenha específica presciência de determinados pecados. Há muita prova em contrário. Pensemos nos israelitas nos dias de Samuel. O Senhor dissera a Israel que viria o tempo em que pediriam um rei (Deut. 17:14). Veio êsse tempo. Receberam o seu rei, mas perderam a intuição da bênção de Deus. Os filhos de Israel arrependeram-se dêsse determinado pecado e clamaram: “A todos os nossos pecados acrescentamos o mal de pedir para nós um rei.” I Sam. 12:19. (Ver Vereda de Cristo, primeiras págs, do capítulo “Confissão”.) O seguinte comentário de SDA Bible Commentary vem bem a propósito:
O reino de Deus fundamenta-se no princípio do livre arbítrio. O fato de que Deus conhece o fim desde o princípio, de modo algum limita o homem em relação a suas próprias decisões (ver Educação, pág. 178). Quando Deus revelou ao povo, antes de entrarem na Palestina, que viria o tempo em que pediriam um rei (Deut. 17:14), não expressava Êle Sua vontade no caso, mas apenas lhes desdobrava o rumo que os acontecimentos tomariam. — Sôbre I Sam. 12:1.
Ainda, em I Sam. 2:34 o Senhor predisse a morte de Hofni e Finéias, filhos de Eli, homens ímpios que faziam coisas perversas. O Senhor advertiu-os dos resultados de seu mau procedimento. “Ser-te-á [a Eli] por sinal, o que sobrevirá a teus dois filhos, a Hofni e Finéias: ambos morrerão no mesmo dia.” I Sam. 2:34. Mas os dois presunçosos pecadores passaram por alto a palavra do Senhor. Aí está uma prova de como a presciência de Deus — revelada a sêres humanos e por êles compreendida — não lhes afetou a conduta. O homem incorrigível fará ainda o que lhe apraz. Notemos o comentário seguinte, acêrca dos filhos de Eli:
Como Hofni e Finéias haviam tratado com violência as coisas do Senhor, deviam ter morte violenta. Esperando fazê-los volver-se de seu mau procedimento, Deus por um momento descerrou a cortina do futuro. Seria natural esperar que, quando os filhos ouvissem esta profecia, mudassem de vida, a fim de evitar a má colheita. Fazendo essa profecia, Deus simplesmente previu sua condenação — não a predestinou. Aquêle que conhece o fim desde o princípio, sabe tudo que afeta o exercício do livre arbítrio. Advertindo os indivíduos acêrca do que o futuro lhes reserva, Deus prova ao universo que os homens por sua livre escolha, vão tão longe que mesmo êsse conhecimento não os detém. — Idem, sôbre I Sam. 2:34.
Jesus tornou claro êste ponto na parábola do rico e Lázaro quando, em resposta ao suplicante pedido do rico, de enviar Lázaro a seus irmãos, instando com êles para que se arrependessem, escapando assim aos fogos do inferno, Jesus respondeu que não se arrependeríam mesmo se ressurgisse alguém dentre os mortos e lhes pregasse (S. Luc. 16.)
O Ponto de Vista Adventista
A posição mantida pelos adventistas acêrca da presciência de Deus exprime-se no trecho seguinte:
Deus prevê porque é onisciente, isto é, sabe tôdas as coisas. DÊle afirmam as Escrituras: “Tôdas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos dAquele a quem temos de prestar contas” (Heb. 4:13); “desde o princípio anuncio o que há de acontecer” (Isa. 46:10). … O passado, o presente e o futuro são todos por Êle igualmente conhecidos. Coisa alguma senão o conhecimento absoluto, satisfaria ao nosso conceito fundamental da perfeição de Deus. Por isso que conhece o futuro, Êle jamais é apanhado de surpresa. A apostasia de Satanás e a queda do homem foram ambas previstas por Êle, e tomou providências para satisfazer a emergência. (I S. Ped. 1:20; Apoc. 13:8; O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 22.) A profecia preditiva é a suprema prova de Sua presciência. A profecia prediz aquilo que a presciência de Deus viu que havia de ser (ver EGW, RH 13 de nov., 1900). Os acontecimentos preditos não se realizam por isso que foram previstos; êles são previstos por isso que hão de se cumprir. Esta verdade foi bem expressa por Milton que, comentando a queda de Satanás e seus anjos, põe na bôca de Deus estas palavras:
“Minha presciência vê como presentes
Quantos sucessos no porvir se envolvem;
Dêles porém nenhum dela depende:
De maneira que, se eu a não possuísse,
Sempre tais quais existiríam êles.
Sem coação, pois, sem sombras de destino,
Sem fôrça alguma que de Mim emane,
Transgrediram.” — O Paraíso Perdido, Canto III, linhas 161 e seguintes, Tradução portuguêsa do Dr. Lima Leitão. — Idem, sôbre Rom. 8:29.
Em relação com isto o Commentary observa que “a presciência divina e a divina predestinação de modo algum excluem a liberdade humana.” — Ibidem.
O Conhecimento Total de Deus
Os escritos de Ellen G. White provêem orientação muito proveitosa neste assunto. Idéias correlatas, específicas, são sugeridas em muitas afirmações: Os mais remotos acontecimentos da História passada são conhecidos por Deus. O futuro remoto é por Êle visto com clara visão. Deus previu a apostasia de Satanás e a queda do homem (O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 22) e também a existência do pecado. Tôdas as ações do homem são como um livro aberto perante os olhos do Senhor. Êle sabe qual será nosso futuro:
Foi-me mostrado que em casos de enfermidade, em que não houver impedimento algum para que sejam feitas orações em favor do doente, o caso deveria ser confiado ao Senhor com calma e fé, e não com tempestade de excitamento. Só Êle é quem conhece a vida passada do indivíduo, e sabe também o que será o seu futuro. Conhece o coração de todos os homens, sabe se o doente, depois de restabelecido, glorificará Seu nome ou se, pelo seu desvio e apostasia, virá a desonrar a Deus. Tudo que nos compete fazer é pedir-Lhe que restabeleça o doente de conformidade com Sua vontade, e crer que Êle tomará em consideração as razões apresentadas e as orações que a favor do enfêrmo forem feitas. Se o Senhor vir que o restabelecimento do doente é para Sua glória, atenderá às nossas orações. Insistir, porém, na cura sem conformar-se com Sua vontade, é um êrro. — Testemunhos Seletos, Vol. 2, págs. 213 e 214.
Note-se também em Counsels in Stewardship, págs. 74 e 75, o seguinte:
Rogo a meus irmãos e irmãs através do mundo, que despertem ao reconhecimento da responsabilidade que sôbre êles pesa, de pagar um dízimo fiel. . . . Mantende conta fiel com vosso Criador. Reconhecei plenamente a importância de ser justos com Aquêle que possui divina presciência. Esquadrinhe cada qual, diligentemente, seu coração. Examine suas contas, e veja sua situação em relação a Deus. (Grifo nosso.)
Devemos manter contas fiéis com o nosso Criador quanto ao dízimo, e reconhecer a importância de sermos “justos com Aquêle que possui divina presciência”. Isto indica que, retido o dízimo, êsse pecado não é ignorado por Deus.
Armadilha Perigosa
Os que brincam com a doutrina de uma presciência de Deus apenas limitada, caem numa armadilha perigosa. Primeiro, limitam o poder de Deus, roubando-Lhe assim aquela onisciência que tôdas as criaturas finitas esperam Deus possua e exerça. E isto fazendo, aceitam um conceito incorreto do caráter divino e das prerrogativas da Divindade. Privam-nO da grandeza que motiva a reverência e o culto. Assim é adversamente afetada tôda a perspectiva da natureza de Deus. O culto dessas pessoas torna-se limitado, segundo as limitações de seu próprio conceito do Senhor. Criam seu próprio Deus — criatura semelhante a êles mesmos.
Em O Conflito dos Séculos (Introdução) é-nos dito que Satanás leva os homens a nutrirem um falso conceito de Deus. E na pág. 583 é esclarecido o propósito de Satanás em representar mal a Deus. É claro que o culto e a sincera fidelidade não são possíveis se Deus não é compreendido, ou é representado falsamente.
Deus é infinito em conhecimento.1 É onisciente.2 Coisa alguma é oculta aos olhos de Deus, que tudo vêem.3 Os refolhos da alma humana são-Lhe abertos.4 Tôda obra e todo segrêdo são-Lhe manifestos.5 Os motivos e atos enganosos dos homens são discernidos por Deus.6 Coisa alguma é demasiado pequena para a atenção de Deus.7 É êrro julgar que aquilo que reputamos pequeno ou grande, tem de ser pequeno ou grande para Êle também.8 Êle lê os corações e discerne os motivos.9 Êle está familiarizado com todo ato realizado na Terra.10 Êle conhece cada ato da vida dos homens.11 (Ver Spirittial Gifts, pág. 49) Êle conhece por nome tôda pessoa,12 todo segrêdo da alma;13 tudo que acontece em qualquer parte do universo.14 O mais secreto pensamento do homem é-Lhe conhecido.15 Coisa alguma ocorre na Terra ou no Céu sem o conhecimento de Deus.16 Entretanto, há os que consideram a vida um drama cuja conclusão o próprio Senhor desconhece, crendo que o universo se move no escuro, qual trem expresso sem iluminação nem maquinista a dirigi-lo, podendo nós a qualquer momento precipitar-nos no abismo.
Não Especular Quanto às Prerrogativas de Deus
Assim, a doutrina da perfeita presciência de Deus é revigorante e confortadora, mas não compreendemos perfeitamente êste assunto. O intelecto humano pode desgastar-se em conjeturas acêrca de Deus.17 Não devemos especular acêrca de Deus nem tentar penetrar para além do que se acha revelado em Sua Palavra.18 Mesmo o mais elevado intelecto não pode compreender a Deus.19 Êle oculta aos homens, mais do que revela, o que a Êle se refere.20 Não devemos tentar explicar aquilo que não nos foi revelado.21 A eternidade não será suficiente para compreendermos tudo a respeito de Deus.22 Não devemos especular quanto às prerrogativas de Deus.23 Suas prerrogativas são assunto que não ousamos tocar.24
Também é errado pensar que Deus não tem controle sôbre Suas próprias Leis ou que a elas esteja sujeito.
Outrossim, ensina a sabedoria mundana que a oração não é essencial. Homens de ciência pretendem que a oração não pode, na verdade, ser atendida; que isto seria uma violação da lei, um milagre, e que os milagres não existem. O universo, dizem êles, é governado por leis fixas, e o próprio Deus nada faz contrário a essas leis. Assim representam a Deus governado por Suas próprias leis, como se a operação das leis divinas pudesse excluir a liberdade de Deus. Tal ensino se opõe ao testemunho das Escrituras. Não foram operados milagres por Cristo e por Seus apóstolos? O mesmo compassivo Salvador vive hoje, e está tão disposto a escutar a oração da fé, como quando andava visivelmente entre os homens. O natural coopera com o sobrenatural. Faz parte do plano de Deus conceder-nos, em resposta à oração da fé, aquilo que Êle não outorgaria se o não pedíssemos assim. — O Conflito dos Séculos, pág. 525.
Devemos lembrar-nos de que Deus, em Seu trato com os homens, só emprega meios coerentes com a verdade e a justiça.25 Deus não é senhor duro e rigoroso.26 É Deus compassivo, inteligente, e compreensivo, que Se alegra na liberdade individual de Suas criaturas, e em seu amor volitivo e fidelidade. Contudo, é Êle todo-poderoso, e dirige a natureza segundo Lhe apraz.27 Êle ordena aquilo que Sua previdência vê ser melhor.28 Por vêzes, quando há necessidade de juízos, impõe Êle uma restrição aos Seus próprios atributos, e adia o juízo.29
À luz da presciência de Deus devemos alegrar-nos, especialmente por isso que nossa liberdade para decidir que caminho seguir através da vida não é enfraquecida pela presciência de Deus.
Com efeito, a presciência de Deus provoca atos especiais de bondosa providência e avisos para proteger Seus filhos em tempos de iminentes perigos e tentações.
A presciência de Deus confere-Lhe uma vantagem sôbre Suas criaturas, mas proporciona-nos uma sensação de alívio, saber que Êle usa para nosso bem êsse conhecimento, e não para mal. Assim a presciência é usada de acôrdo com o caráter de Deus, que é de amor e compaixão.
A onisciência e onipresença de Deus são protetoras, assim como detectoras.
A passagem de Gên. 16:13 (“Tu és Deus que vê”) tem sido usada mais no sentido de restrição ao mal, do que como estímulo ao bem. Para o filho do maligno, certamente se adapta o primeiro caso. Deus não deve ser considerado como severo superintendente ou constante ameaça, mas antes como alguém que nos compreende, nos ama, e nos ajuda. Sal. 139:17 e 18: “Que preciosos para mim, Senhor, são os Teus pensamentos! E como é grande a soma dêles! Se os contasse excedem os grãos de areia: contaria, contaria, sem jamais chegar ao fim.” — A. H. Strong, Systematic Theology, pág. 284.
Referências
- The SDA Bible Commentary, comentários de Ellen G. White, sôbre Isa. 40:12-14, pág. 1145.
- Ellen G. White, Counsels on Stewardship, pág. 172.
- White, Mensagens aos Jovens, pág. 266.
- Idem, Vereda de Cristo
- Idem, Testimonies, Vol. 4, pág. 646.
- Idem, idem, Vol. 1, pág. 501.
- The SDA Bible Commentary, comentários de E. G. White, sôbre Jó, todo o cap. 38, pág. 1141; Vereda de Cristo; Testimonies, Vol. 5, pág. 260.
- White, Testimonies, Vol. 5, pág. 337.
- Idem, idem, Vol. 3, pág. 513.
- Idem, My Life Today, pág. 209.
- The SDA Bible Commentary, comentários de E. G. White sôbre Atos 10:1-6, págs. 1059 e 1060.
- Idem, pág. 1059.
- White, Testimonies, Vol. 5, pág. 645.
- The SDA Bible Commentary, comentários de E. G. White sôbre Jó 42:11, pág. 1141.
- White, Testimonies, Vol. 5, pág. 147.
- Idem, My Life Today, pág. 291.
- Idem, Ciência do Bom Viver, pág. 429; Testimonies, Vol. 8, pág. 279.
- Idem, idem, págs. 429 e 430; Testimonies, Vol. 8, pág. 297.
- Idem, Fundamentais of Christian Education, pág. 444.
- The SDA Bible Commentary, comentários de E. G. White sôbre Jó 38, pág. 1141.
- White, Medicai Ministry, pág. 92.
- Idem, Educação, pág. 172.
- Idem, Ciência do Bom Viver, pág. 430; Testimonies, Vol. 8, pág. 279.
- Idem, Medicai Ministry, pág. 92.
- Idem, Patriarcas e Profetas, pág. 42.
- Idem, Vereda de Cristo.
- Idem, Testimonies, Vol. 8, págs. 259 e 260.
- Idem, Ciência do Bom Viver, pág. 417.
- Idem, Conselhos aos Professores, págs. 415 e 416; Fundamentais of Christian Education, págs. 356 e 357; Profetas e Reis, pág. 276.