ENTREVISTA  JERRY PAGE 

“Quando consigo me concentrar em Jesus, desejo me envolver no ministério; quero trabalhar com Ele, descentralizado de mim mesmo” 

O pastor Jerry Page cresceu em lar adventista. Seu pai era diretor de publicações e a mãe, professora. Ambos trabalhavam para a igreja com muita dedicação. Durante a juventude, o pastor Page experimentou um período de muita rebeldia; mas, graças às orações de seus pais, ele se voltou para o Senhor e Lhe dedicou a vida por meio do ministério pastoral. Como fruto de seu casamento com Janet, nasceram dois filhos. O primogênito é advogado e trabalha no Instituto Weimar (centro de saúde e educação integral da igreja, localizado na Califórnia). O outro estudou teologia e tem-se dedicado a diversos ministérios relacionados com jovens. O casal Page tem dois netos.

Por ocasião da última assembleia da Associação Geral, realizada em Atlanta em julho do ano passado, o pastor Jerry Page foi eleito secretário ministerial para o atual quinquênio. Em visita ao Brasil, durante o concilio ministerial realizado em maio, em Foz do Iguaçu, PR, ele falou a Pablo Millanao, editor da revista Ministério, da Associação Casa Editora Sudamericana, Aces, Argentina. Durante a entrevista, o pastor Page compartilhou algumas impressões e pontos de vista pessoais sobre a vida pastoral.

Ministério: O que o levou a se tornar pastor?

Page: Depois que me voltei para o Senhor, experimentei uma conversão que classifico em um nível de 110%. Senti-me chamado para um trabalho de tempo integral. Então, tive oportunidade de estudar na Universidade Andrews, onde me preparei para o ministério pastoral.

Ministério: Que papel têm desempenhado as Escrituras em sua vida? De que modo elas têm moldado seu ministério?

Page: No processo de minha conversão, a Bíblia me permitiu compreender a segurança da salvação. Em certo sentido, minha formação foi bastante legalista. Na juventude, como resultado de estudo e pesquisa da Palavra de Deus, os escritos de Paulo aos cristãos romanos foram bastante significativos para mim. As Escrituras se constituem a base do meu ministério, junto com os escritos de Ellen G. White. Tanto a Bíblia como esses escritos têm sido úteis e enriquecedores para minha vida e meu pastorado.

“Nosso real valor está em percebermos que ainda nos falta muito para ser o que Deus deseja que sejamos”

Ministério: O senhor sempre apresenta uma noção bastante realista da função ministerial, com suas lutas e seus desafios. Por que razão prefere essa abordagem?

Page: Minha esposa e eu fomos chamados a um ministério no qual compartilhamos nossa vida de oração, e sentimos como Deus nos tem tocado e transformado. Nessa experiência temos descoberto que os líderes da igreja também são vulneráveis. Temos nossas quedas e tropeços, em meio aos quais Deus atua com a manifestação de Sua graça. As pessoas podem se identificar facilmente com essas vivências – sejam pastores ou membros da igreja – ao ver que os pastores também têm suas lutas e estão no mesmo caminho em que elas estão. Quando percebem que alguém é honesto nesse sentido, poderão respeitar a liderança exercida por essa pessoa em outras áreas e nessa liderança confiar.

Ministério: O ministério pastoral sempre apresenta desafios e obstáculos. Qual tem sido o princípio que sempre o tem ajudado a superá-los?

Page: Ellen G. White disse que devemos considerar cada dificuldade como sendo um chamado à oração. Sempre podemos correr para Deus em oração, e esse tem sido um princípio vital em minha vida. Além disso, aproveito a experiência e os conselhos de outras pessoas. Porém, sobretudo, passar tempo com Deus, Sua palavra, e em oração, é uma prática que tem sido chave para mim. Peço que Ele me dê sabedoria e orientação necessárias para enfrentar a vida e os desafios pastorais. Nesse exercício espiritual, encontro as melhores respostas. Nem sempre são respostas diretas ao meu problema, contudo, a presença de Deus me reconforta e me dá segurança. Ou, simplesmente, me revela alguma coisa para a qual eu não tinha atentado antes. Estando só, com a Palavra e a oração, encontro consolo para todos os desafios e obstáculos.

Ministério: De acordo com sua experiência, em que momento o ministério pode se converter em uma carga para o pastor? Como isso fica evidenciado?

Page: Estou seguro de que existem diversas respostas para essa pergunta, e não quero ser simplista. Apesar de tudo, o convite e a promessa registrados em Mateus 11:28 são significativos. Quando Ellen White comentou a respeito disso, ela se dirigiu aos líderes e às pessoas mais ativas na igreja. Devido à carga de responsabilidades, a quantidade de tarefas e a pressa com que imaginam que devem agir, muitos líderes têm deixado escapar o tempo que deveríam passar com Jesus. Acredito que o estresse é produzido quando sentimos que não estamos conseguindo alcançar os resultados esperados. Consequentemente, nos preocupamos e nos frustramos. Em última instância, o problema está no fato de não estarmos compartilhando o jugo com Jesus, permitindo-Lhe que leve nossa carga. Deixamos de permanecer nEle e de confiar nos planos que Ele tem para nós. Ao contrário disso, tentamos satisfazer as expectativas do nosso entorno, as que outras pessoas nos têm imposto, e trabalhamos com base em nossas próprias forças. Naturalmente, não podemos ir bem, e a frustração só aumenta. Para mim, a solução do problema está em permanecermos tão unidos e cheios do Espírito Santo, junto a Cristo, para que Ele nos dê a paz e o êxito que planeja concedermos. Pode haver muitas outras razões que expliquem o estresse, mas acredito que a principal é que não estamos alimentando o companheirismo íntimo com o Senhor. Precisamos ouvi-Lo constantemente e permitir que, em Seu poder, Ele dirija nosso trabalho, a fim de experimentarmos êxito e satisfação.

Ministério: Quais foram as impressões que o senhor captou dos pastores sul-americanos, durante o concilio ministerial?

Page: Minha esposa e eu nos sentimos muitíssimo abençoados com a oportunidade de conhecê-los. Não sabemos muito bem o idioma, de modo que pudéssemos nos comunicar melhor, mas, olhar nos olhos, nos rostos, e receber tantos abraços, foi uma experiência muito alentadora. Na medida em que pudemos compartilhar nossa experiência e jornada com o Senhor, sentimos que se identificaram com ela. Percebi que os pastores têm um genuíno interesse de conhecer Jesus, participar do progresso de Sua causa e que o reavivamento e reforma possam acontecer de maneira poderosa na experiência de cada um deles. Esta é uma impressão muito grata. Notamos que os pastores não apenas estão trabalhando arduamente no desenvolvimento de programas para suas respectivas igrejas, mas que, além disso, estão interessados em aprofundar o relacionamento com Jesus e desejosos de que os familiares participem diariamente da salvação de pessoas.

Ministério: A liderança da Divisão Sul-Americana propôs a distribuição de 36 milhões de livros missionários em 2012. O senhor tem algum conselho sobre a maneira pela qual os pastores possam usar esse recurso como parte de seu plano e estratégia de trabalho?

Page: Tenho certeza de que a Divisão Sul-Americana tem muitas boas idéias sobre maneiras de testemunhar. O pastor Jonas Arrais, secretário ministerial associado da Associação Geral, que é sul-americano, me disse que a oração não é algo que praticamos apenas num concilio ministerial como aconteceu neste encontro, para depois sair em busca de certos métodos que possamos aplicar no trabalho. A oração é o método. Temos comprovado que orar com vizinhos e colegas de trabalho é uma boa ideia, antes de lhes entregar o livro; esse gesto prepara o coração. A grande maioria aceita que oremos, afinal todos precisam das nossas orações, pois enfrentam problemas familiares, no trabalho e em outras áreas da vida. Acredito que a oração é a cunha de entrada para entregar às pessoas o livro A Grande Esperança. Deus nos dará entendimento para saber a quem e quando entregar o livro. Assim, temos duas opções: podemos sair e simplesmente distribuir literatura a esmo, ou podemos direcionar melhor o trabalho, por meio da oração. Que as pessoas em nossas igrejas e lares orem para que Deus as guie e oriente. Acredito que dessa maneira será mais benéfico em longo prazo.

Ministério: Constantemente estamos ouvindo falar de uma suposta crise no púlpito, atribuída ao fato de que a Bíblia talvez esteja perdendo seu lugar de proeminência. O que o senhor acha disso?

Page: Existe uma citação na qual Ellen G. White declara que um dos últimos enganos consistiria em se minimizar a importância da Bíblia. Falando sobre a obra do espiritismo, ela diz que “o povo é ensinado a considerar o decálogo como letra morta. Fábulas aprazíveis, fascinantes, cativam os sentidos, levando as pessoas a rejeitar as Sagradas Escrituras como o fundamento da fé. Cristo é tão verdadeiramente negado como antes; mas Satanás a tal ponto cegou o povo que o engano não pode ser discernido” (O Grande Conflito, p. 558). Então, primeiramente, vejo a observação contida na pergunta como sinal dos tempos em que vivemos, porque há quem deseje se desfazer de partes da Bíblia, pelo fato de que ela alcança e desmascara pecados e maus hábitos. Isso simplesmente revela que a batalha entre Cristo e o adversário está aumentando em intensidade, inclusive dentro da igreja. O inimigo deseja nos afastar da Palavra, que nos mantém em pé nestes últimos dias. É vital que preguemos a Palavra, que ela habite em nós e vice-versa.

“Quanto mais perto estivermos de Jesus, daremos mais frutos, glorificaremos ao Pai e nosso gozo será completo”

Ministério: O que pode motivar o pastor a passar mais tempo com Deus e Sua Palavra, antes de sair apressado para cumprir seus afazeres?

Page: Se o pastor tem fundamentado seu ministério na Palavra e nos escritos inspirados, já deve estar motivado. Contudo, se nos detivermos a pensar no que Deus realmente deseja, por mais que pareçamos ter êxito à luz de nossas opiniões, perceberemos que sequer tocamos a superfície do que Deus deseja realizar por nosso intermédio. Essa ideia deve sempre nos motivar para que nos voltemos a Deus e passemos mais tempo com Ele. As pessoas podem achar que somos pastores de sucesso, mas o real valor está em percebermos que ainda nos falta muito para ser o que Deus deseja que sejamos. Isto sempre me causa impacto, ou seja, a percepção de quão débil sou em relação ao potencial que Deus deseja desenvolver em mim. Todos necessitamos ser reavivados. Para alcançar o que Deus nos tem proposto, é preciso que se cumpra em nós a mensagem de João 15: permanecer nEle. Jesus disse que poderiamos fazer muito mais do que Ele fez; que poderiamos pedir qualquer coisa em Seu nome e seria concedida, se permanecêssemos nEle. Quanto mais perto estivermos de Jesus, daremos mais frutos, glorificaremos ao Pai e nosso gozo será completo, maior será nossa felicidade. Ou seja, estar feliz e em paz também pode servir de motivação. Achando essas bênçãos aos pés de Jesus, logo as revelamos em nosso ministério.

Ministério: Muitos dos nossos pastores aceitaram o chamado de Deus há vários anos. Apesar disso, muitos têm perdido a paixão e as convicções que, em algum momento, os motivavam. Que conselho o senhor daria, para que a chama do pastorado seja novamente acesa?

Page: A revelação de Deus nos indica que devemos contemplar Jesus. Contemplando-O e conhecendo-O, somos movidos a partilhar o conhecimento dEle com outras pessoas. Quando consigo me concentrar em Jesus, desejo me envolver no ministério; quero trabalhar com Ele, descentralizado de mim mesmo. Acredito que essa é uma das melhores formas de ser reavivado no ministério pastoral.