Creio que uma das maiores preocupações com que nos defrontamos hoje é o papel das mulheres na liderança. Ao pensar na espécie de liderança que, como esposas de pastores, podemos ter o privilégio de exercer, veio-me à mente esta declaração: “A maior obra que pode ser realizada em nosso mundo é glorificar a Deus, vivendo o caráter de Cristo” (Testimonies, vol. 6, pág. 439). Para mim, esta é nossa missão como mulheres da igreja.

E como vivemos o caráter de Cristo? O livro Educação, de Ellen G. White, apresenta dez características da maneira pela qual o Mestre Se desincumbiu de Sua tarefa de liderança (ver págs. 73-96). Podemos viver melhor Seu caráter adotando-Lhe os métodos, associando-nos com outros como Ele se associava com aqueles aos quais era solicitados a salvar.

1. Cristo veio com o acumulado amor da eternidade. Um dia perguntei a minha neta quanto ela me amava. Ela pensou um pouco, e depois estendendo os bracinhos, disse: “Vovó, meus braços não são suficientemente grandes para lhe mostrar.” Considerei isso uma ilustração muito bela — não há nenhum meio pelo qual possamos realmente compreender o significado da vinda de Cristo a este mundo com o acumulado amor da eternidade. Se o amor de Cristo permear nossos esforços para trazer nossos semelhantes a Ele, então nossa missão como esposas de pastores será bem-sucedida, pois o amor é a base de todo crescimento – físico, mental e espiritual.

2. Cristo tem um coração compreensivo. Alguns têm dito que aquele que procura transformar a humanidade, deve ele próprio compreender a humanidade. Somente Cristo possuía perfeita compreensão. Tal compreensão dos outros pode incluir simpatia, sentimento de pesar por eles, mas, ainda mais importante, inclui empatia, sentimento de pesar com eles.

Quando um de nossos filhos era apenas um garotinho, seu cão terrier, ao qual ele amava muito, foi atropelado. Quando ele pensava em Spotty, sentava-se atrás da casa e chorava em silêncio; as lágrimas lhe corriam pela face. Uma menina vizinha, vendo-o chorar, aproximou-se dele e lhe perguntou: “O que aconteceu?” Meu filho respondeu: “Spotty foi atropelado”. Ela olhou para ele um instante, e depois perguntou: “Morreu?” “Morreu”, disse ele. Então ela se assentou ao seu lado, pôs o braço em torno dele, e começou a chorar copiosamente. Ela possuía um coração compreensivo. Não apenas sentiu tristeza por ele, mas se entristeceu com ele.

Cristo não somente veio com o acumulado amor da eternidade, mas uma vez que criou os homens e as mulheres, tem por eles perfeita compreensão. Se nos cumpre satisfazer as necessidades do mundo, devemos, como Salomão, orar: “Dá a Teu servo um coração compreensivo”.

3. Cristo arrazoa da causa para o efeito. Vemos as pessoas fazerem coisas que nos parecem muito estranhas, e perguntamos: “Como podem elas agir dessa maneira?” Nossas perguntas surgem pelo fato de não lhes compreendermos as circunstâncias da vida. Cristo, porém, raciocinava da causa para o efeito. A fim de entendermos o que isso significa, venham comigo ao pátio do templo, onde Cristo e alguns dos Seus discípulos estão reunidos. Um grupo de ouvintes O cerca, enquanto Ele ensina. De repente, um som confuso Lhe atrai a atenção, e ao se voltarem eles vêem um grupo de homens ora puxando, ora empurrando uma mulher na direção de Cristo. Quando aqueles homens chegam onde Ele está dizem: “Esta mulher foi apanhada no ato do adultério. Devemos apedrejá-la? A lei de Moisés diz que ela deve ser apedrejada.”

Os homens não estão preocupados com a mulher e tampouco com seu pecado. O que desejam mesmo é envolver a Cristo numa cilada. Se Ele disser: “Sim, apedrejem-na, então eles podem ir aos governantes romanos e dizer: “Jesus assumiu a autoridade que lhe é reservada”. Se disser: “Não a apedrejem”, eles podem afirmar diante do resto do povo judeu que Ele rejeita a lei de Moisés.

Jesus considera a situação como um todo. Lê a história da vida da mulher — raciocina da causa para o efeito. Sabe que cada um dos indivíduos que a trouxeram a Sua presença, levou-a àquele pecado.

Agindo como se não lhes tivesse ouvido a pergunta, Jesus Se inclina e escreve no chão, onde a próxima brisa apagará o que Ele escreveu. Às vezes tenho pensado no que Ele escreveu. Mas, conheceis a história — enquanto Ele escreve, um por um os acusadores desaparecem com a face enrubescida. A seguir, erguendo os olhos, Jesus diz à mulher: “Ninguém te condenou?” E, pela primeira vez, a pobre e assustada mulher ousa erguer os olhos e olhar para Sua face. A compreensão que ela observa ali é confirmada por Suas palavras: “Nem Eu também te condeno: vai, e não peques mais.”

Porque olhava para as causas que se encontravam atrás dos efeitos, Cristo compreendia as pessoas. Ao passo que não justificava o pecado, Ele estava disposto a perdoar o pecador. Se pudéssemos entender a vida daqueles aos quais podemos condenar, também diríamos: “Não te condeno”.

4. Cristo Se associava intimamente com aqueles aos quais esperava salvar. Dizem as Escrituras: “Habitou entre nós” (S. João 1:14). A palavra grega no original para habitar dá a impressão de Cristo armando Sua tenda entre as dos filhos dos homens. Ele não falava de alguma posição que se elevava acima do comum das pessoas – Ele Se unia a elas em todas as suas atividades. Os que escolheu para serem Seus íntimos seguidores, comiam, viviam e andavam com Ele.

Não podemos erguer ou ajudar aqueles aos quais desprezamos ou consideramos como menos privilegiados. Se quisermos exercer influência como líderes, devemos percorrer o caminho daqueles a quem desejamos ajudar.

5. Cristo foi um ardoroso reprovador do pecado. Jamais houve alguém que odiasse tanto o pecado. A denúncia que fazia do pecado era muitas vezes forte. Estais lembrados de que Ele disse certa vez a Pedro: “Para trás de Mim, Satanás”. E chamou de hipócritas os escribas e fariseus. Seu amor, porém, atraía aqueles aos quais reprovava. Jamais falou a verdade sem amor. Nunca feria desnecessariamente uma alma sensível. Poder-se-ia dizer isto de nós? “Necessitam aprender a respeito de repreensão que é amor, do golpe que fere para curar, da advertência que fala de esperança” (Atos dos Apóstolos, pág. 516).

6. Cristo ensinava as pessoas individualmente. Ele não falava às massas — e mesmo quando o fazia, observava o rosto das pessoas. Quando uma fisionomia revelava dúvida ou falta de compreensão, mais adiante acrescentava ilustrações do princípio que estava ensinando.

7. Quando ensinava, Cristo usava ilustrações com as quais as pessoas estavam familiarizadas. Ele não falava em linguagem abstrata. “Considerai os lírios”, dizia, ao andar pelo caminho. Ao ver um cortejo nupcial em movimento, falou das dez virgens. Ao andar pelo campo, falou de um homem que semeou sua terra.

Se quisermos ser líderes e professores, devemos usar ilustrações comuns à vida de nossos ouvintes. Tais ilustrações, além de comunicarem melhor, serão lembradas por nossos ouvintes ao ocorrerem em sua vida as lições que ensinamos.

8. Cristo via infinitas possibilidades em cada indivíduo a quem desejava salvar. Penso às vezes naqueles que vêm a nós; nas pessoas que encontramos pelo caminho. Muitas vezes somos tentados a dizer que não há nenhuma esperança para tais indivíduos. Pensamos em sua origem. Queremos saber de onde vêm. Cristo, porém, via em cada indivíduo as infinitas possibilidades de que seria capaz, caso a pessoa fosse transformada pelo amor divino. Se quisermos ser representantes de Cristo e refletir-Lhe o caráter, não devemos considerar sem esperança ou de pouco valor nenhuma pessoa. Não sabemos o que Cristo pretende fazer com o material aparentemente sem utilidade.

Jamais posso esquecer um jovem que veio para o colégio quando eu estava na sexta série. Órfão, Carlos tivera que trabalhar durante toda sua existência, e havia passado de uma família para outra. Um representante do colégio, porém, visitou naquela ocasião a comunidade na qual morava Carlos, e o convidou a voltar à escola. Incentivado, aos 16 anos de idade ele voltou à sala de aulas, juntamente com as crianças de 11 e 12 anos.

Não foi fácil voltar à escola. Ele ia colportar nas férias, e muitas vezes voltava para a escola em frangalhos. Seus estudos sempre lhe foram difíceis. Ele, porém, jamais os abandonou. Finalmente, dedicou a vida à obra médico-missionária e ao erguimento da humanidade; e hoje há um hospital com o seu nome.

Estou certa de que muitas pessoas terão dito: “É esforço inútil recolocá-lo na escola com essa idade.” Cristo, porém, via infinitas possibilidades onde para outros parecia haver apenas material inútil.

9. Porque olha para as pessoas com confiança, Cristo inspira esperança. Quando Cristo e Seus discípulos passavam por Gádara, dois endemoninhados lhes correram ao encontro, clamando: “Que temos nós contigo, Filho de Davi? Deixa-nos — vai embora.” Mas, apesar de suas imprecações, Cristo ouviu o clamor por auxílio e, olhando para eles com confiança, inspirou esperança. Eles viram em Seu olhar a certeza de que havia um futuro para eles.

Quando olhamos para as pessoas com esperança, inspiramos confiança; e, quando há confiança, há crescimento. Esta característica do Mestre, de revelar confiança no indivíduo, habilita esse indivíduo para tornar-se de grande utilidade na obra do Senhor.

O princípio de revelar confiança e fé é importante em especial quando se lida com pessoas jovens. Aprendi uma lição valiosa acerca de confiar nas pessoas jovens, quando um de nossos dois filhos, que estava trabalhando na Associação Geral como impressor, estava aprendendo a guiar. Eu estivera hesitando em entregar-lhe o molho de chaves do carro da família. Certo dia, ele entrou em casa balançando um molho de chaves. Quando lhe perguntei que chaves eram aquelas, ele respondeu: “São as chaves do novo carro do patrão. Ele confia em mim! Ele me pediu para buscar alguns trabalhos impressos no centro do D.C.”

Foi somente vários anos mais tarde que descobri quão importante para aquele jovem de 16 anos de idade era o fato de o patrão ter nele confiado. Um de seus amigos contou-me a história. No dia em que ele e outros amigos de nosso filho souberam que o patrão lhe dera as chaves do novo carro, eles tiveram uma idéia luminosa. Tomaram o ônibus até uma loja onde sabiam que ele estava entregando um pacote de impressos. Quando ele saiu da loja, um deles disse: “O patrão não sabe quanto tempo leva para você fazer suas entregas. Entraremos no carro com você e você nos levará ao pátio de manobras para fazermos a parte de que necessitamos para tirar nossa carteira de habilitação.”

O amigo disse: “Seu filho olhou as chaves por um momento, e depois respondeu: ‘Sei que ele não pode controlar o meu tempo, mas ele confiou em mim e não posso trair sua confiança.’”

10. Finalmente, Cristo viveu o que ensinou. Se se puder dizer isto de nós, então seremos líderes eficientes. Mas só podemos viver a fé que professamos se Cristo habitar-nos o coração. Não podemos, por nossos próprios talentos ou dons, atrair os pecadores para nosso Salvador.

Cristo viveu para fazer os outros felizes, porque isso fazia parte de Sua natureza. O amor que Lhe inundava o coração, levava-O a alcançar a todos que Lhe ficavam ao redor. Se nós, que somos esposas de pastores, desejamos ser Suas representantes, se queremos cumprir nossa missão, refletindo-Lhe o caráter, cumpre-nos viver e trabalhar no espírito de Cristo.

RUTH M. MURDOCH — Professora emérita de psicologia educacional e aconselhamento na Universidade Andrews