Diretor do Instituto de Pesquisas Bíblicas explica detalhes a respeito da nova declaração adventista sobre o aborto

Walter Steger

Um dos temas discutidos no último Concílio Anual da Igreja Adventista do Sétimo Dia foi a proposta de um novo documento sobre o aborto, em substituição ao texto de 1992 a respeito do tema. Após amplo debate, a maioria absoluta dos cerca de 300 delegados presentes à reunião aprovaram a declaração, que apresenta com mais profundidade a percepção adventista referente à santidade da vida humana.

Nesta entrevista, o doutor Elias Brasil de Souza, diretor do Instituto de Pesquisas Bíblicas da Associação Geral, esclarece alguns pontos importantes que envolvem a produção, o conteúdo e a aplicação do documento no contexto pastoral.

O que motivou a sede mundial da Igreja Adventista a elaborar um novo documento sobre o aborto? Como foi o processo de preparação e votação?

Em resposta a vários pedidos feitos para que a igreja esclarecesse sua posição sobre o aborto, a liderança da Associação Geral solicitou ao Comitê de Ética do Instituto de Pesquisas Bíblicas que preparasse a minuta de uma declaração que pudesse expressar a visão denominacional sobre o tema, a partir de uma perspectiva bíblica.

Foram necessários dois anos de estudo e discussões no Comitê de Ética. Depois disso, o documento foi submetido a outras comissões da Associação Geral. Após aperfeiçoamentos, a versão final foi levada à votação no Concílio Anual, no qual foi aprovada pela esmagadora maioria dos delegados.

O senhor destacaria quais aspectos desse documento, em relação à declaração anterior?

A declaração anterior, que consistia de orientações, tinha como objetivo dar instruções práticas para casos específicos em que o aborto deveria ser considerado. Não era uma afirmação teológica sobre a visão bíblica a respeito do assunto.

Por sua vez, o novo documento é uma declaração que se concentra na visão bíblica sobre a santidade da vida humana e suas implicações para o aborto. Assim, ele assume uma posição inequívoca de respeito pela dignidade e pelo valor da vida humana ainda não nascida.

Quais desafios específicos a Igreja Adventista enfrenta quanto ao tema do aborto e de que maneira esse novo documento auxilia nesses desafios?

Em muitas sociedades, o aborto se tornou uma questão política. Algumas pessoas o entendem como uma manifestação de liberdade por meio da qual as mulheres expressam controle sobre seus corpos. Em contraste com essas construções políticas e sociais do aborto, o novo documento ressalta o valor e a santidade da vida humana e, assim, posiciona a questão sob uma perspectiva diferente: o feto pertence a Deus; portanto, é digno de proteção e respeito.

É importante mencionar que o novo documento não pretende fornecer instruções específicas para casos ou circunstâncias particulares. De fato, serve como base para diretrizes e/ou protocolos subsequentes que possam ser necessários às várias áreas do serviço da igreja. Deve-se esclarecer que o novo documento (declaração) substituiu o antigo (orientações).

Portanto, novas diretrizes e/ou protocolos deverão ser preparados para dar orientações específicas. Em realidade, o departamento de Ministério da Saúde da Associação Geral já iniciou as conversas para elaborar protocolos a fim de ajudar nossas instituições médicas a lidar com o aborto de maneira que respeitem os valores e ensinamentos bíblicos expressos no novo documento.

Esse documento é de uso predominantemente interno da Igreja Adventista ou tem o propósito de ser divulgado ao público em geral?

Dadas as complexidades inerentes à questão do aborto, tem havido uma necessidade crescente (interna e externa) de a igreja esclarecer sua posição sobre o assunto. Portanto, o novo documento pretende transmitir a compreensão e a posição da Igreja Adventista sobre o aborto, não apenas para seus membros, mas também para a sociedade em geral.

Que recomendações o senhor sugere aos pastores da Igreja Adventista na América do Sul quanto ao uso e à difusão desse documento?

Em primeiro lugar, o novo documento não é um item do Manual da Igreja; portanto, não deve ser utilizado como arma para ferir pessoas. Na sequência, tendo dito isso, acho que o documento pode ser útil para ajudar os membros da igreja a entender quão sagrada e digna é a vida humana ainda não nascida. Em terceiro lugar, apesar de ser uma questão tão sensível e até mesmo política, não devemos nos eximir de falar sobre isso da perspectiva correta, isto é, bíblica. Devemos estar dispostos e preparados para orientar e ajudar a todos, especialmente nossos jovens, que pode ser o segmento mais vulnerável da igreja a sucumbir diante da cultura do aborto por conveniência tão desenfreada em nossa sociedade. Finalmente, como pastores e líderes da igreja, devemos sempre lembrar a nós mesmos e a nossas congregações de que “o valor de uma vida humana só pode ser estimado à luz da cruz do Calvário” (Ellen G. White, The Signs of the Times, s.d., p. 549).

Portanto, não devemos nos esquecer de que nosso ministério se estende aos que ainda não nasceram. Por isso, mesmo nas circunstâncias em que a gravidez ocorreu como resultado de um ato pecaminoso, a mãe grávida e o filho ainda não nascido devem ser tratados com o máximo respeito, amor e cuidado. Ao fazer isso, estamos em sintonia com o maravilhoso cuidado de Deus pelas crianças ainda no ventre: “Pois Tu formaste o meu interior, Tu me teceste no seio de minha mãe. Graças Te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso me formaste; as Tuas obras são admiráveis, e a minha alma o sabe muito bem; os meus ossos não Te foram encobertos, quando no oculto fui formado e entretecido como nas profundezas da terra. Os Teus olhos me viram a substância ainda informe, e no Teu livro foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e determinado, quando nem um deles havia ainda” (Sl 139:13-16). 

O feto pertence a Deus; portanto, é digno de proteção e respeito.

Apesar de ser uma questão tão sensível e até mesmo política, não devemos nos eximir de falar sobre o aborto da perspectiva correta, isto é, bíblica.