Tudo que sabemos acêrca de Deus e de Jesus Cristo está envolvido na expiação. Portanto, é impossível dar uma explicação plena dêste, assunto nestas duas breves apresentações. E quanto mais estudamos a expiação, mais maravilhosa ela se nos torna. Não podemos entendê-la mais do que explicar o mistério da eletricidade ou a fôrça da gravidade. Tampouco pode alguém ter alguma concepção exata dêste grandioso tema, e deixar de reconhecer a divindade de Cristo, os incidentes da encarnação e a natureza humana e sem pecado de nosso Senhor e a fundamental provisão da justiça pela fé. Idéias limitadas sempre resultam quando alguém deixa de apreender estas verdades básicas.

Por exemplo, em edição passada, citámos um universalista que dizia: “Como pode um Deus justo, a primeira pessoa, tomar o pecado do homem culpado, uma segunda pessoa, e lançá-lo sôbre Cristo, uma inocente terceira pessoa? Pela superfície, isto parece equacionar o problema. Quando, porém, Deus, a primeira pessoa, toma o pecado do homem culpado, a segunda pessoa, e o lança sôbre Cristo, Êle não o lança sôbre uma terceira pessoa, mas sôbre Si mesmo, porquanto Cristo é Deus, a divindade encarnada. Não há, na realidade, uma terceira pessoa dessa forma envolvida.

Se Deus, como soberano governador do universo, escolhe voluntàriamente tomar a culpa do homem sôbre Si mesmo a fim de manifestar Seu amor e misericórdia ao homem, aos anjos e ao universo, que terreno pode haver para objeção? O mesmo que fêz a lei foi quem sofreu a pena por causa da violação da mesma. Foi o próprio Deus quem permitiu um substituto, quem providenciou o substituto, e Se tomou o substituto. Além disso, essa substituição não se fêz para um povo bom, nem mesmo para aquêles que procuram ser bons, mas para os “ímpios”, para os “fracos”, e realmente Seus “inimigos” (Rom. 5: 6-11). E êsse grande sacrifício era o antítipo de tôdas as ofertas do Israel antigo — cordeiros, bodes, ovelhas, novilhas, pombos e mesmo os punhados de farinha que se ofereciam em certas circunstâncias.

O Sacrifício da Manhã e da Tarde

Era básico em todo o ritual sacrifical, o sacrifício da manhã e da tarde, denominado “holocausto contínuo” (Êxodo 29:42, hebraico tamid). Fazia-se em acréscimo às muitas e variadas ofertas tanto da congregação como individuais.

“A oferta diária … constituía o fundamento de todo o sistema sacrifical.” — R. Winterbottom, em The Pulpit Commentary, vol. 5, pág. 380.

“A instituição [do sacrifício da manhã e da tarde], era tão obrigatória que, em hipótese alguma, se podia dispensar essa oblação diária.” — Jamieson, Fausset and Brown, Commentary, Criticai and Expository, sôbre Êxo. 29:38.

O sacrifício da manhã e da tarde, que simbolizava a eficácia contínua do sacrifício e ministério de Cristo (Heb. 7:24), pode ser melhor entendido se o julgarmos como oferta de Deus para o povo, do que oferta do povo para Deus. Era oferecida sem levar em conta a atitude do povo, quer individual quer coletivamente. Era eficaz mesmo para os que estavam no exílio (I Reis 8:30, 44 e 50.). Êste sacrifício “contínuo”, se pensarmos nêle como sacrifício de Deus, realmente simbolizava a divina provisão da graça, a qual existia antes da fundação do mundo, com a qual o indivíduo nada tinha a fazer a não ser aceitá-la. A graça não pode ser ganha, tem que ser aceita.

As instruções gerais concernentes às “ofertas queimadas” se encontram em Levítico 1:5 e 6. O sacerdote era instruído a matar a vítima do sacrifício, a seguir tirar-lhe a pele e “cortá-la em pedaços”. O esfolamento e desmembramento da vítima constituíam parte vital na cerimônia. Em primeiro lugar, quando o pecador arrependido trazia sua própria vítima a ser oferecida, êle a matava com as próprias mãos. A execução não devia demorar-se devido à angústia ou desespêro da parte do animal. Depois de morto, tirava-se a pele do animal ou pássaro. Sua beleza era desfigurada, o corpo estraçalhado e finalmente consumido pelo fogo — uma cerimônia na verdade repulsiva, porém representava objetivamente a ira de Deus contra o pecado.

Sacrifícios Individuais e Ofertas de Rotina

Êstes sacrifícios individuais eram importantes, pois cada um prefigurava o Calvário, e sendo oferecidos pelo indivíduo, expressavam sua apropriação da provisão de Deus. Podemos julgar que o sacrifício da manhã e da tarde eram os mais importantes, enquanto que o individual era secundário. O primeiro tipificava a expiação provida; o segundo, a expiação desfrutada. A falta de compreensão quanto às ofertas secundárias em Israel levou à corrução do Evangelho. Argumentam alguns que, quanto mais animais se sacrificavam, melhor seria a posição de alguém perante Deus. Dessa forma caíram no êrro da justificação pelas obras — perigo sempre presente mesmo para os cristãos.

Cristo Tomou Nosso Lugar

Pensemos agora em nosso Senhor submetendo-Se ao julgamento, e sendo “levado como ovelha para o matadouro”. Descrevamo-Lo lá, de pé, sem proteção. Sim, Seu corpo foi “moído por nós”; ofereceu Sua “alma em oferta pelo pecado” (Isa. 53:10).

Sob a carga esmagadora da culpa do mundo, Êle pesarosamente diz: “Minha alma está numa tristeza mortal”. Êle foi ferido, sim “ferido por causa das nossas transgressões”, mas quem poderá dizer quão profundas são essas chagas? Espinhos, cravos e pregos perfuraram e feriram-Lhe a carne, porém muito maior que estas torturas foi a indizível aflição que Lhe ensombrou a alma ferida. Consideremos Aquêle que suportou “tais contradições dos pecadores contra Si mesmo” (Heb. 12:3), resistindo até ao sangue em Sua batalha contra os poderes das trevas. Governador de todo o universo, Príncipe do Céu, Criador das constelações, Êle Se põe como nosso substituto no meio de uma multidão escarnecedora. Olhamos atentamente para Êste ocupante do trono que, deixando Sua glória, separou-Se da associação perfeita que fruía desde a eternidade, para assu-mir a natureza humana (sem pecado no entanto) e sofrer as mais cruciantes dores das privações em nosso lugar. Sendo condenado como criminoso, Êle curvou a cabeça em humilde submissão, e começou sua marcha de morte em direção ao Calvário. Sôbre aquela colina sanguinolenta foi Êle crucificado entre dois ladrões e ridicularizado pelos sacerdotes. Vêde o Cordeiro de Deus esfolado, dilacerado, desfigurado e mutilado.

Era o dia da páscoa quando Jesus morreu, contudo Sua morte não ocorreu propriamente no momento de matar o cordeiro pascal, mas no momento do sacrifício da tarde. A declaração de Paulo é importante: “Cristo … morreu a seu tempo pelos ímpios” (Rom. 5: 6). “Morreu no momento exato”. (Weymou-th).

Notemos agora êste comentário:

Era a hora do sacrifício da tarde. O cordeiro, que representava Cristo, fôra levado para ser morto. … Vivamente interessado, o povo acompanhava a cena. Mas eis que a Terra treme e vacila. … Tudo é terror e confusão. O sacerdote está para matar a vítima; mas o cutelo cai-lhe da mão paralisada, e o cordeiro escapa. O tipo encontrara o antítipo por ocasião da morte do Filho de Deus. — O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 564.

Logo antes de depor a vida Êle proferiu as palavras mais solenes jamais ouvidas: “Telestai [“Está Consumado”]!” Não era um brado de desesperança; foi um grito de vitória. E êsse grito recuando pelos tempos se tornou a certeza de perdão de tôda a transgressão confessada ou involuntária desde a queda do homem. E êle reboará até o fim do tempo para nos assegurar a salvação e até àqueles que estarão vivos quando o tempo se fundirá com a eternidade. Ascendeu ao trono de Deus para anunciar aos anjos que Êle vencera. Atingiu as tumbas das quais alguns ressurgiram quando Êle mesmo rompeu o túmulo. Diz a mensageira do Senhor que o brado foi “uma voz que abalou o universo” (Manuscrito 165, 1899). E mais ainda: “Todo o Céu triunfou na vitória do Salvador. Satanás foi derrotado, e sabia que seu reino estava perdido”. — O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 565. Os anjos e os mundos não caídos receberam aquêle brado de triunfo com alegria, porque “fôra em seu benefício, bem como no nosso, que se operara a grande obra de redenção. Juntamente conosco, compartilham êles os frutos da vitória de Cristo”. — Ibidem.

O Universo Foi Afetado pela Expiação

Contudo o plano de redenção tinha um propósito mais amplo e mais profundo do que a salvação do homem. Não foi exclusivamente para isto que Cristo veio à Terra; não foi apenas para que os habitantes dêste pequeno mundo pudessem considerar a lei de Deus como deve ser considerada; mas era para reivindicar o caráter de Deus diante do universo. Para êste resultado de Seu grande sacrifício — sua influência sôbre os sêres de outros mundos, bem como sôbre o homem — o Salvador olhava quando, precisamente antes da crucifixão, disse: “Agora é o julgamento dêste mundo; agora será expulso o príncipe dêste mundo. E Eu, quando fôr levantado da Terra, atrairei todos a Mim”. [Não sòmente êste mundo, mas todo o universo se une nÊle] …    

Foi maravilhoso para todo o universo que Cristo Se humilhasse para salvar o homem caído. … Quando Cristo veio ao nosso mundo em forma humana, todos estavam profundamente interessados em acompanhá-Lo, ao percorrer Êle, passo a passo, a vereda ensanguentada da manjedoura ao Calvário. O Céu observou o insulto e a zombaria que Êle recebeu, e sabia que isto foi por instigação de Satanás. … Êles [os sêres sem pecado de outros mundos] observaram a batalha entre a luz e as trevas, enquanto a mesma se tornava mais forte. E ao clamar Cristo em Sua aflição mortal sôbre a cruz: “Está consumado”, um brado de triunfo repercurtiu por todos os mundos, e pelo próprio Céu. A grande contenda que estivera em andamento durante tanto tempo neste mundo, estava agora decidida, e Cristo era vencedor. … 

Unânimemente o universo fiel uniu-se no engrandecimento da administração divina. — Patriarcas e Profetas, págs. 73 e 76.

Êsse “brado de triunfo” é registrado em Apoc. 12:10:

Agora chegada está a salvação, e a fôrça, e o reino de nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derribado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite.

Citamos ainda:

Por ocasião do glorioso término de Sua obra, cânticos de triunfo ecoaram e repercutiram através dos mundos não caídos. Anjos e arcanjos, querubins e serafins juntaram-se no côro da vitória. – The Youth’s lnstructor, 6 de abril de 1903.

Antes da morte, dissera Jesus: “Êste cálice é o novo testamento de Meu sangue” (I Cor. 11:25). Seu sangue não foi apenas cobertura para o pecado, mas na realidade um testamento que selou para sempre a relação entre Deus e o homem.

A expiação de Cristo selou para sempre o eterno concêrto da graça. Tornou-se o cumprimento de tôda a condição pela qual Deus interrompera a livre comunicação da graça à família humana. Tôda a barreira foi dêsse modo derribada, mesmo a que interceptava a mais livre plenitude do exercício da graça, da misericórdia, da paz e do amor ao mais culpado da raça de Adão. — Manuscrito 92, 1899 (Grifos supridos).

Durante aquelas terríveis horas de agonia, nosso Senhor, como substituto do pecador, não pôde “ver a face reconciliadora do Pai”. “Não podia enxergar para além dos portais do sepulcro”. Não foi “confortado com a presença do Pai. Pisou sòzinho o lagar.” — O Desejado de Tôdas as Nações, pág. 562. Estas palavras são emocionantes, porém leiamos mais ainda que nos lembre que êste foi um sacrifício feito pela Divindade na pessoa do Deus-homem.

De repente, ergueu-se de sôbre a cruz a sombra, e em tons claros, como de trombeta, tons que pareciam ressoar por tôda a criação, bradou Jesus: “Está consumado”. … Uma luz envolveu a cruz, e o rosto do Salvador brilhou com uma glória semelhante à do Sol. … E à medida que em submissão Se confiava a Deus, o sentimento da perda do favor do Pai se desvanecia. Pela fé saiu Cristo vitorioso. … Ganhara a batalha … Como Vencedor, firmou Sua bandeira nas alturas eternas. — O Desejado de Tôdas as Nações, págs. 564 e 565. (Grifos supridos.)

Ao proferir o brado: “Está consumado”, Cristo sabia que a batalha estava ganha. — Manuscrito 111, 1897. (Grifos supridos.)

Sua Vitória Acentuada nas Epístolas

O significado dessa vitória não é plenamente revelado nos evangelhos, e alguns críticos procuraram desacreditar a doutrina da expiação, afirmando que ela não é ensinada por Cristo. No livro dos Atos, porém, e nas epístolas, especialmente na carta aos Hebreus, os escritores do Novo Testamento apresentam-na com muita clareza. A expiação constituía todo o objetivo de Sua morte. O escopo primordial da missão terrena de nosso Senhor não era tanto pregar o evangelho, mas fazer uma expiação para que pudesse haver um evangelho a pregar. No registro de Sua vida maravilhosa, um têrço de todos os escritos tratam de acontecimentos ocorridos na ultima semana; não Sua vida, Seus milagres, mas Sua morte constituía a maior obra que Êle veio realizar. Os inspirados comentários que seguem não deixam nenhuma dúvida quanto ao conhecimento verdadeiro que os adventistas têm dêste assunto:

Ao oferecer-Se na cruz, se fêz perfeita expiação pelos pecados do povo. — Signs of the Times, 28 de junho de 1899. (Grifos supridos.)

Cristo realizou uma completa expiação, dando Sua vida em resgate por nós. — Carta 97, 1898 (Grifos supridos).

Ao contemplar o Pai o sacrifício de Seu Filho, inclinou-Se diante dÊle, reconhecendo sua perfeição. “É o bastante”, disse. “A expiação é com-pleta.” — Review and Herald, 24 de setembro de 1901. (Grifos supridos.)

Linguagem alguma podia descrever o júbilo do Céu ou a expressão do contentamento divino, e o comprazimento em Seu Filho unigênito, quando Êle contemplou o acabamento da expiação. — Signs of the Times, 16 de agôsto de 1899. (Grifos supridos.)

Sua plenitude é realçada mais e mais nas epístolas paulinas. O grande apóstolo gloriava-se na vitória de nosso Senhor. Ouçamo-lo :

E, quando estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com Êle, perdoando-vos tôdas as ofensas, havendo riscado a cédula que era contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era contrária, e a tirou do meio de nós, cravando-a na cruz. E, despojando os principados e potestades, os expôs públicamente e dêles triunfou em Si mesmo. (Col. 2:13-15.)

Mas agora em Cristo Jesus, vós, que antes está-veis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes perto. … E pela cruz reconciliou ambos com Deus em um corpo… (Efés. 2:13-16.)

Observemos êste comentário:

Êle tomou em Suas mãos o mundo sôbre o qual Satanás pretendia presidir como sendo seu território legal, e pela Sua obra maravilhosa de dar a vida, restaurou tôda a raça humana ao favor de Deus. — Manuscrito 50, 1900. (Grifos supridos.)

Sim, a batalha foi ganha, a luta terminou, estamos redimidos, o preço foi pago: que maravilhoso Salvador! E quando “Êle Se ofereceu” (Heb. 7:27) o fêz na qualidade de Sacerdote e Sacrifício. Isto está em harmonia com o cristianismo histórico, e também com o que o Espírito de Profecia realça repetidas vêzes. Ouçamos!

A suficiência infinita de Cristo é demonstrada em suportar Êle os pecados do mundo inteiro. Ocupa Êle a dupla posição de ofertante e de oferta, de sacerdote e de vítima. — Carta 192, 1906. (Grifos supridos.)

Cristo esvaziou-Se a Si mesmo, e tomou a forma de servo, e ofereceu o sacrifício, sendo Êle mesmo o sacerdote, e Êle mesmo a vítima. — The Southern Watchman, 6 de agôsto de 1903. (Grifos supridos.)

A seguir, tendo vencido todos os poderes do mal na cruz, derrotou completamente o inimigo, ressurgindo do túmulo selado. Rompendo os grilhões da morte, ascendeu ao Pai, como o “Rei da glória,” e foi “coroado de glória e honra” (Sal. 24:7-10; Heb. 2:9).

Seu Glorioso Retorno ao Lar

Nenhuma pompa na Terra pode comparar-se ao retôrno de nosso Senhor após Sua batalha com os poderes das trevas. Enquanto a procissão se movia majestosamente pelas côrtes celestes, ressoava a voz: “Quem é Êste, que vem de Edom, com vestidos tintos de Bozra? Êste que é glorioso em Sua vestidura, que marcha com a Sua grande fôrça?” E a seguir vem a resposta: “Eu, que falo em justiça, poderoso para salvar” (Isa. 63:1). Entre todos os filhos da Terra, sòmente Êle podia falar em justiça. E lá está Êle para falar em justiça em favor do pecador; para oferecer Seu trajo imaculado a todo o que queira recebê-Lo.

Ao transpor as portas celestiais, foi Jesus entronizado em meio a adoração dos anjos. — Atos dos Apóstolos, pág. 38.

Ocupando o trono na qualidade de co-soberano com o Pai no govêrno do universo, Êle é ao mesmo tempo nosso intercessor celestial, tornando eficaz em nós aquilo que efetuou por nós na cruz.

Para o universo chegara o tempo de o Céu aceitar seu Rei. Anjos, querubins e serafins permaneciam na expectativa da cruz. — Signs of the Times, 16 de agôsto de 1899.

A natureza do ministério de nosso Senhor transcende a compreensão humana. João, o revelador, viu-0 não apenas como sumo sacerdote e juiz mas como o cordeiro no ato de ser imolado (Apoc. 5:6). Suas mãos e pés marcados pelos cravos dão constante testemunho de Seu sacrifício expiatório.

Como Sumo Sacerdote além do véu, Cristo de tal maneira imortalizou o Calvário, que, embora viva junto de Deus, morre continuamente para o pecado e dêsse modo se algum homem pecar, tem um Advogado junto do Pai. Êle ressurgiu da tumba envolto por uma nuvem de anjos em maravi-lhoso poder e glória — a Divindade e a humanidade combinadas. — Manuscrito 50, 1900. (Grifos supridos.)

Cristo — o Rei-Sacerdote no Trono

Sejamos gratos a Deus pelo nosso ungido Sumo Sacerdote, porém não nos esqueçamos de que Êle é ao mesmo tempo nosso exaltado Rei, um rei-sacerdote “segundo a ordem de Melquisedeque”.

O Salvador erguido surge em Sua obra eficaz como o Cordeiro morto, assentado no trono, para dispensar as inapreciáveis bênçãos do concêrto, os benefícios de Sua morte para comprar tôda alma que venha a crer nÊle. — Evangelism, pág. 191. (Grifos supridos.)

Êle pode dispensar essas bênçãos e benefícios porque entrou no lugar santo [“os santos”, grego hagia] tendo obtido [“arranjado”, grego heurisko] “eterna redenção por nós” (Heb. 9:12). Seu ministério fala de um sacrifício acabado. Nada é mais maravilhoso do que o ministério sumo sacerdotal de nosso Senhor. Do trono da graça Êle derrama o Espírito Santo em nossos corações.

Logo antes de morrer, Êle desvendou alguma coisa dêsse ministério de intercessão, ao dizer: “Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós” (S. João 14:18). Por ocasião do Pentecostes Êle veio, não em pessoa, mas em poder, por meio do Espírito Santo. Disse Pedro: “ … [Êle] derramou isso que agora vê-des e ouvis” (Atos 2:33). Como nosso advogado e intercessor, Cristo envia Seu Espírito ao nosso coração para nos levar à comunhão com a família celestial. A justificação e a santificação são, respectivamente, obra de Cristo, e o Espírito Santo ajuda as nossas fraquezas uma vez que “não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós … E Êle … examina os corações” (Rom. 8:26 e 27.)

Cristo no trono da graça, e o Espírito no trono do coração são um em seu ministério de intercessão.

Cristo, nosso Mediador, e o Espírito Santo estão constantemente intercedendo em favor do homem, porém o Espírito não pleiteia por nós como faz Cristo que apresenta Seu sangue, derramado desde a fundação do mundo; o Espírito trabalha em nos-so coração provocando nêle orações, arrependimento, louvor e ação de graças. — Manuscrito 50, 1900. (Grifos supridos.)

Qual é, porém, a natureza da intercessão de Cristo? Certamente não objetiva forçar o Pai a ser misericordioso, pois não foi em primeiro lugar a misericórdia do Pai que permitiu o sacrifício? E certamente não podemos conceber que Êle de novo agonize diante do Pai, ou faça outro sacrifício, ou derrame outra vez Seu sangue. Tal idéia é disparatada. Não é Sua intercessão uma declaração diante de todo o universo, de que todos os pecadores são admitidos à família do Céu mediante Seu sangue? Observemos o pensamento claro do espírito de profecia:

Tão necessário é que Êle nos proteja pela Sua intercessão como nos redima com Seu sangue. Se Êle relaxasse, por um momento que fôsse, Sua posição em nosso favor, Satanás imediatamente se levantaria para destruir. Agora Êle protege pela intercessão os que foram comprados pelo Seu sangue”. — Manuscrito 73, 1893. (Grifos supridos.)

O Capitão de nossa salvação intercede pelo Seu povo, não como peticionário para mover o Pai à compaixão, mas como vitorioso que reclama os trofeus de Sua vitória. … Tornai bastante claro êste ponto”. — Obreiros Evangélicos, pág. 154. (Grifos supridos.)

Estamos tornando claro êste ponto? Nossos próprios membros, bem como outros, precisam ter isto apresentado diante de si em linhas claras. Uma compreensão mais clara dêstes grandes temas se faz necessária.

Nossas igrejas perecem por falta de ensinamento sôbre o tema da justiça pela fé em Cristo, e verdades correlatas. — Idem, pág. 301.

A beleza da intercessão de nosso Salvador se expressa nestas palavras:

À medida que as orações sinceras e humildes do pecador sobem ao trono de Deus, Cristo as mistura com os méritos de Sua própria vida de obediência. Nossas orações se tornam fragrantes em virtude dêste incenso. — Sons and Daughters, pág. 22.

Perfumadas com a fragrância de Sua justiça, sobem como cheiro suave a Deus. A oferenda é inteiramente aceitável, e o perdão cobre tôdas as transgressões. — Parábolas de Jesus, pág. 156.

Sua morte no Calvário proveu a expiação. Seu ministério sumo sacerdotal aplica a expiação àqueles que crêem. Como o chefe que representa o novo reino, Êle no trono da graça está agora reivindicando e preparando os cidadãos dêsse reino.

O Juízo e a Expiação

A obra intercessora de Cristo concluirá quando Êle, como o “juiz de tôda a Terra” pronunciar a sentença do juízo, depois de vir em poder e grande glória para receber do mundo os que Lhe pertencem. Esta sentença está registrada em Apocalipse 22:11 e 12. Nossa compreensão da profecia nos leva à convicção de que êste grande tribunal está presentemente em sessão, desde a hora do juízo soada em 1844. Referimo-nos a isso co-mo sendo o juízo investigativo, em que os casos do professo povo de Deus são levados a exame.

O transcendente ato de nosso Senhor na cruz e Seu ministério sacerdotal são partes essenciais da expiação de Jesus, ou resultados definidos que decorrem dela.

Cremos que o serviço típico de Israel no dia da expiação ensina lições importantes. Naquele dia o sumo sacerdote concluía seu ministério de reconciliação, tomando o sangue do bode sacrifical e purificando o santuário terrestre, depois do que confessava os pecados da congregação sôbre a cabeça do bode emissário e o enviava para o esquecimento uma ilustração objetiva do que nosso Intercessor fará na conclusão de Seu ministério sacerdotal no Céu. Pela virtude de Seu sangue, que é a própria base de Sua intercessão, nosso Sumo Sacerdote purificará o santuário celestial. Então, despojando-se das vestes sacerdotais, descerá Êle pelos céus, como Rei dos reis e Senhor dos senhores para receber Seu povo e destruir Seus inimigos. A seguir, como justo governador do reino dos remidos, lançará às costas de Satanás (o antitípico Azazel) todo o negro registro da rebelião contra Deus, e também o jogará no lago de fogo para que a rebelião seja destruída pa-ra sempre.

Quando Satanás, o próprio instigador do mal, e as miríades de anjos maus, e todos os que recusaram a graça de Deus são finalmente destruídos, então, pela primeira vez, desde o início do pecado, o universo será purificado.

A compreensão que os adventistas têm da expiação nos leva a reconhecer pelo menos quatro aspectos do assunto, os quais, tomados em conjunto, completam o quadro:

  • 1. Expiação provida, feita em favor de todo o mundo pela morte de Cristo na cruz. Como Salvador do mundo, Êle restaurou tôda a raça ao favor de Deus e, ao mesmo tempo, pôs o universo em segurança contra a possibilidade de futura rebelião.
  • 2. Expiação aplicada por meio do ministério de Cristo no santuário celestial; eficaz para tôda alma que aceita esta provisão divina.
  • 3. Expiação eliminatória quando, concluído Seu ministério sacerdotal, Cristo como Juiz determinar o destino de cada alma, sentenciando a cada um segundo suas obras. (Êste exame dos livros de registro, ou juízo investigativo começou em 1844).
  • 4. Expiação retribuitiva quando a sentença contra o pecado e pecadores será executada, redundando na destruição final da rebelião e na purificação do universo.

Os limites dêste artigo não permitem o desenvolvimento das duas últimas fases, cada uma merecedora de um estudo amplo. A igreja cristã, em geral, aceita sem controvérsia as primeiras duas, ao passo que a 3a. e 4a., embora inferidas e às vêzes sucintamente tratadas por certos teólogos, não são geralmente consideradas como aspectos reais do assunto; cremos, porém, que sòmente quando todos os quatro aspectos são tomados em conjunto teremos o quadro completo da obra expiatória de nosso Salvador e seus efeitos finais sôbre o universo. Isto pode ser levado como nossa contribuição denominacional adventista à teologia cristã.

Traz grande gôzo ao nosso coração o contemplarmos a plena fruição do sacrifício expiatório de nosso bendito Senhor, em primeiro lugar porque se aplica ao pecador individualmente, limpando-o de tôda mancha naquela “fonte aberta … para o pecado e impureza”; depois porque se aplica ao próprio santuário celestial, quando na qualidade de sumo sacerdote, em virtude de Seu sangue derramado, Êle remove todo o registro do pecado; e finalmente aplica-se à Terra amaldiçoada por causa do pecado, pequenina partícula na vasta criação de Deus, a qual, sendo recriada, desempenhará para sempre um original papel no universo — a lição objetiva do amor e da graça de Deus. (Efés. 2:7).

Quão glorioso será quando o pecado e seus trágicos efeitos forem eliminados, e um único pulso de harmonia e contentamento latejar por todo o poderoso universo de Deus, e tôda a criação refletir Sua glória inefável. Com ardente antecipação aguardamos aquela hora em que os remidos de tôdas as épocas unirão as vozes numa antífona de louvor e “tôda criatura que há no Céu, na Terra, debaixo da Terra, e no mar”, juntar-se naquele coral maravilhoso: “Digno é o Cordeiro que foi morto!” “Ao que está assentado sôbre o trono, e ao Cordeiro, sejam dadas ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre”.