W. JOHN CANNON

Pastor da Associação de Potomac

PARTE I

TÊRMO aconselhar não é ainda aceito pela totalidade dos adventistas do sétimo dia, e muito menos um conceito definido ou filosofia neste campo. Pesquisas científicas nas esferas da psicologia referente à obra do ministério estão provando que a Palavra de Deus nunca é antiquada. Os princípios básicos de seus escritos, por virem de encontro às necessidades humanas, satisfazem as almas famintas dêste século, melhor do que qualquer plano de origem humana. Ainda assim não devemos desprezar os esforços dos homens que procuram penetrar as dores da raça humana. O estudo dos processos de aconselhar pode ajudar o pastor da cidade a fazer trabalho mais eficiente para Cristo.

Por causa de bem definidas injunções, muitos adventistas são precavidos quanto ao têrmo psicologia. Ainda que corretamente compreendida, ela é uma ciência fundamental a tôda tentativa que fazemos para melhorar nossos métodos. Para efetuar um trabalho eficiente no ramo da educação, na Colportagem evangelística, no progresso evangelístico, no método de anunciar, precisamos conhecer algo sôbre as reações da mente humana. A êsse respeito sentiu-se que o têrmo conselheiro pode designar alguém como seguidor de um dos expoentes de alguma teoria particular, tal como: Freud, Adler, Jung, Dewey e outros semelhantes; e muitas dessas teorias têm base em premissas inaceitáveis para os biblicistas que crêem ser a Bíblia tôda a inspirada Palavra de Deus. Neste ponto se admite prontamente que há hoje um crescente número de ministros que aconselham guiados por idéias racionalistas e não encontram nenhum conflito com sua fé religiosa. São modernistas ao interpretar a Bíblia, e por isso o racionalismo não os atrapalha.

Tal não é o ponto de vista apresentado aqui. Sustenta-se que aconselhar é a incumbência e o dever de todo aquêle que é chamado para pastorear o rebanho. Os adventistas rejeitam categoricamente todo ponto de vista que esteja em desacordo com a Palavra de Deus, mas também reconhecem que algum conhecimento que auxilie no conhecer e compreender melhor os homens e as mulheres por quem trabalham, contribui para um mais eficiente trabalho de salvar para Cristo os perdidos. Não se trata de um departamento profissional do ministério pastoral; é o ministério pastoral.

Todos os pastôres são conselheiros. São conselheiros quando encontram almas inquiridoras e anelantes, como o jovem rico que perguntou: “Que farei eu de bom para alcançar a vida eterna?” São conselheiros quando a algum fariseu, como Nicodemos, se tiver de mostrar que o novo nascimento vai muito além da observância formal de leis codificadas. São conselheiros quando alguém opresso por incurável enfermidade física como a mulher dos tempos bíblicos, procura um raio de esperança. São conselheiros quando a fé cristã está abalada pela morte de um ente querido ou quando surgem os críticos problemas maritais, ou um homem perde o emprêgo ou sobrevem uma crise financeira. É trabalho do ministro aconselhar. Não devemos ter mêdo do têrmo, pois o quadro profético de Isaías, da vinda do Messias, era que Seu nome deveria ser “Maravilhoso, Conselheiro.” Algumas traduções dão “Maravilhoso Conselheiro.”

Não estou procurando um título que se adapte bem ao trabalho que está sendo feito, mas parece-me conveniente que a obra de Seus servos fiéis seja chamada de conselho segundo o exemplo do Maravilhoso Conselheiro. É verdade que os modernos “descobrimentos” dos métodos psicológicos são de grande ajuda, especialmente para quem é pastor numa cidade grande, pois quanto mais aprende tais métodos tanto mais aprecia que, fundamentalmente, tudo quanto possui algum valor tem suas raízes na prática, ilustração e exemplo dentro das capas do Livro dos livros. O melhor estudo que temos nesse sentido está na vida e no ministério do Maravilhoso Conselheiro.

Isso, porém, não dispensa a instrução. Tão certo como afiamos nossa ferramenta teológica na bigorna do intensivo estudo acadêmico no Seminário, é certo que precisamos aperfeiçoar nossa habilidade para usar essa ferramenta por cuidadoso preparo na teoria e na prática, quando estudamos o caminho para o coração e a mente dos homens. A experiência ajuda, mas ainda assim não pode tomar o lugar da instrução especial para atender às necessidades das ruínas emocionais do colapso moral das grandes cidades. Êste estudo busca mostrar como estamos desempenhando êste papel na aplicação da instrução dada a nós pelo Senhor.

Que é Aconselhar?

Não tentamos definir o têrmo aconselhar. É aqui que nos defrontamos com um problema. Há um volume crescente de obras sôbre o conselho pastoral. Há suficiente quantidade de objetivos e processos, etc., mas as definições mudam com o mudar da filosofia. Conta-se que enquanto falava a um grupo de pastôres na cidade de Nova York, o Dr. Leslie Weatherhead uma vez disse que “aconselhar é desentrançar uma vida emaranhada.” Para o advenista é muito mais do que isso, a menos que possamos ler nessa definição os resultados eternos. Alguém pode considerar seu trabalho bem feito se puder prover um número suficiente de pílulas psicológicas para estimular uma vida fracassada a seguir avante. O conselheiro adventista tem seus olhos no destino eterno. Seu trabalho não é consertar uma máquina quebrada, mas salvar uma alma.

Considera-se melhor esboçar aqui a obra de aconselhar para indicar o que ela inclui, do que fazê-lo exclusivamente por meio de algumas sentenças de definições. Na minha compreensão, o conselho pastoral é obra do pastor.

  • 1. Inspirando confiança e fé.
  • 2. Apontando aos homens o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
  • 3. Estabelecendo relações corretas.
  • 4. Comunicando positivo pensar, cultivar pensamentos nobres (Fil. 4:8).
  • 5. Substituindo o temor pecaminoso pelo amor divino.
  • 6. Confortando os doentes, desamparados e desanimados.
  • 7. Sendo amigo compreensível do solitário.
  • 8. Conduzindo homens e mulheres a ver a grandíssima pecaminosidade do pecado — ser positivo pelo contraste.
  • 9. Partilhando com outros uma vital experiência cristã.
  • 10. Mostrando que a única maneira de conservar a felicidade está em seguir a justiça.
  • 11. Levando os aconselhados à maravilhosa bênção da amizade com Cristo.
  • 12. Rejeitando o egoísmo para persuadir os homens de que a paz é achada na completa entrega da vontade a Cristo.
  • 13. Reconhecendo o valor real de uma alma.
  • 14. Ensinando a todos que nenhum homem vive para si — precisamos da fraternidade do evangelho.

Podeis dizer que isso inclui todo o ministério pastoral. E esta é a nossa convicção. Podeis pensar num ponto que não é verdadeiramente de conselho pastoral? Vereis ao mesmo tempo que tal trabalho não se limita à entrevista privada, mas é um trabalho do qual o pastor nunca pode estar livre. É um trabalho que será levado a efeito do púlpito, no escritório, no lar, na visita aos doentes, nas comissões e nas reuniões da Mesa. Quando alguém entende que o aconselhar se baseia nas relações e no trato entre indivíduos, sua eficácia é reconhecida.

Talvez devêssemos aqui fazer algumas declarações do que o aconselhar não é.

Não é alguém assumir atitude de autoridade em assuntos que não são de sua competência. O conselheiro não é médico, advogado ou banqueiro. Nem é um sacerdote no confessionário. Não é um psicólogo. Não aceita filosofias racionalistas que tentam ver nos fatôres circunstanciais os estímulos que produzem as várias espécies de reações. O conselheiro adventista aprecia o lugar e o poder da vontade, freqüentemente vencendo as tendências cultivadas e herdadas. Mais do que isso, conhece o poder de Deus em erguer o homem caído. Reconhecendo que o homem não está à mercê de todo o vento de doutrina que sopra, pode inspirar homens a ações resolutas. Temos o registro do nobre exemplo daqueles que se tornaram grandes a despeito das circunstâncias e não por causa delas.

Para acrescentar uma negativa mais, aconselhar não resolve os problemas, mas encontra o senso de impropriedade, frustração, ansiedade e culpa que advêm dos problemas. Um homem pode encarar montanhas de dificuldades ao ver nelas apenas um desafio para sua capacidade. Torna os obstáculos em alpondras para o êxito. O apóstolo Paulo relata uma lista de perseguições que arruinariam muitas pessoas. Há outros que sucumbem diante de poucos problemas e parecem opressos pela ansiedade, indo finalmente à destruição. Êsse foi o caso de Judas. Uma grande tentação e êle estava perdido!

Voltemos agora, porém, à base escriturística para êste modo de aconselhar em nosso meio.

A Entrada do Pecado

Assim que o homem pecou precisou de um conselheiro. Depois do primeiro momento de sensação de repulsa, novas e estranhas emoções tomaram posse dêle. O pecado era uma nova experiência, e suas trágicas conseqüências ainda não eram bem compreendidas. Por issso pode ser muito forte sugerir que êle foi tomado pelo mêdo da ansiedade. Mesmo tendo confessado seu pecado o homem continuou receoso. Êste foi o primeiro resultado direto do pecado. Aquêle mêdo tem crescido com o passar dos meses e anos quando a história da morte e decomposição começou a se desenrolar.

Antes da entrada do pecado, o homem mantinha livre e desembaraçada comunhão com Deus. A relação de amor não deixava nenhum lugar para o câncer da ansiedade estender suas raízes mortais. O pecado trouxe o mêdo, que se fortificou na ansiedade com seus acompanhantes: inquietação, frustração, ciúme e más imaginações. O homem estava em necessidade, contudo dificilmente compreendeu o de que precisava, e tinha mêdo de Deus.

Ao contrário do que muitos psicólogos pensam ser bom método, Deus veio em busca do homem, procurando-o no jardim. Há motivos para pensar nesse ponto. Sem dúvida alguma o conselheiro tem que ser paciente e ganhar a confiança de alguém que esteja em necesidade de ajuda. Êle deve evitar apressar seus serviços, mas deve também considerar aquêles que precisam ser buscados.

Deus teve em vista tornar clara a situação. Ajudando o homem a encarar as realidades da situação, também deu a certeza do plano da redenção. O meio da expiação estava retratado nos sacrifícios vicários. Nêles Adão via as terríveis conseqüências do pecado, que foram cobertas com o amor de Deus ao ser provido o sacrifício subtituinte. Novo meio de comunhão foi estabelecido, e um plano para a restauração da relação perdida. Na revelação do plano pelos anjos comissionados pelo Céu, o homem viu que sua insuficiência própria seria compensada pela provisão da graça divina. Justo aqui está uma importante diferença entre a Bíblia e a filosofia adventista, e os racionalistas. Deus dissipa os temores do homem e dá-lhe conforto e esperança, não pelo crescimento da confiança própria ou isentando-o da repressão, mas ensinando completa dependência do poder divino.

O pecado do homem trouxe mudanças primeiramente no setor das relações e da comunhão. As penalidades do pecado vieram por causa da alteração de relações. Não foi o resultado físico de comer o fruto que trouxe morte e miséria, mas o fato de isto ter feito do homem um transgressor da Lei de Deus e um rebelde contra os Céus. Naquela primeira entrevista Deus providenciou novos meios de comunicação. Êle assegurou a Adão e Eva uma maravilhosa esperança de completa restauração. Revelou o plano do amor que levaria o Calvário a vencer o domínio do mal. Ajudou-os a ver não apenas a situação em suas perspectivas verdadeiras, mas também o meio de escape.

Mêdo

É-nos dito que o primeiro resultado direto do pecado foi o mêdo. É necessário mostrar que por trás de uma grandíssima proporção das dificuldades dêste mundo está a mão ameaçadora do mê-do. Limitaremos nossa análise à relação entre aconselhar sôbre o mêdo e seus mais íntimos aliados: a ansiedade e a aflição.

Antes de começar a tratar com o desafio negativo que o mêdo faz ao conselheiro, não deveriamos deixar de dizer que o mêdo tem valores positivos que produzem um efeito benéfico sôbre o indivíduo.

mêdo pode ser um auxílio. Os valores positivos do mêdo parecem não ser reconhecidos por muitos psicólogos. Contudo, a Bíblia deliberadamente usa o mêdo. Quando Deus disse a Adão: “No dia em que dela comeres, certamente morrerás,” houve sem dúvida uma tentativa de fazer do mêdo das conseqüências um preventivo contra a desobediência. Se nossos primeiros pais tivessem sido tão medrosos quanto a trágica advertência os deveria fazer, não teria havido pecado.

Quando as Escrituras Sagradas pintam graficamente em têrmos assustadores o derramamento das sete últimas pragas e o fim dos ímpios no fogo consumidor, é com a intenção de inspirar mêdo dêsse castigo certo, e garantir ao homem que êle pode escapar dessa penalidade. Coisa agradável é encarar as realidades. Tornar clara a situação não significa dar brilho falso à verdade. A experiência mostra que encarar os fatos tais como são, é muitas vêzes um grande passo à frente para desarraigar o horror da ansiedade.

Uma criança é ensipada a ter mêdo do fogo, para que evite queimar-se. A compreensão de que a água oferece perigos pode prevenir afogamentos. A lei tem que ser temida para fazer bons cidadãos. Com nossa compreensão anuviada por seis mil anos de pecado, o mêdo pode servir para um propósito útil; mas não controlado, êle se torna um monstro na destruição. Dêste ponto, tendo reconhecido êste lado do quadro, discutiremos o mêdo somente em seu senso destrutivo, como a fonte principal de provas que o conselheiro depara.

A fim de dar-nos alguma idéia do dilatado predomínio dos problemas do mêdo, enumeraremos resumidamente as espécies de mêdo.

Há o mêdo do futuro. Caim, quando soube do resultado do assassínio que cometera, protestou: “É maior a minha maldade que a que possa ser perdoada. Serei fugitivo e vagabundo na Terra, e será que todo aquêle que me achar me matará.” (Gênesis 4:13 e 14). Êle temia o futuro.

Também há o mêdo do passado. Davi, pensando no seu pecado passado, clamou em agonia de espírito: “Não me lances fora da Tua presença, e não retires de mim o Teu Espírito Santo.” (Salmo 51:11).

Há o mêdo supersticioso. Era esta espécie de mêdo que freqüentemente levava Israel à idolatria, seguindo as nações vizinhas. Foi êsse mêdo que levou o salmista a recomendar: “Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nÊle, e Êle tudo fará.” (Salmo 37:5).

Outro aspecto do mêdo tem que ver com as crises. Muitas são as lindas promessas de auxílio divino para estas emergências. “Quando passares pelas águas estarei contigo, e quando pelos rios, êles não te submergirão.” (Isaías 43:2).

Uma das formas prevalecentes do mêdo, é o mêdo de ser descoberto. Esta é a fonte das chantagens e de alguns dos mais torpes pecados. Tortura a vítima com tormentos indescritíveis. Há poucas semanas um jovem veio ao meu escritório. Disse-me que era um criminoso foragido. Estava em agonia de espírito, e a cada barulhinho quase saltava da cadeira. Sentia a todo momento que a polícia o tinha descoberto. Não podia estar sossegado. Quão terrível é sempre estar vigilante para não ser descoberto por alguém. O escritor do Salmo 32 conta sua experiência: “Porque de dia e de noite a Tua mão pesava sôbre mim; o meu humor se tornou em sequidão de estio.”

Poderiamos mencionar o mêdo da vida, o mêdo da morte, o mêdo de envelhecer, o mêdo da doença e outros mêdos. Isto nos dá uma idéia apenas do longo alcance dos tentáculos do mêdo.

Não somente é amplo o mêdo em seus fins, mas encontra a maioria das pessoas. O aconselhar precisa de um remédio para o mêdo, mais do que para qualquer outro mal que afeta a mente, a alma ou o corpo. Nesta época êste mal psicológico está prevalecendo de modo especial. Em seu livro Faith Can Master Fear, diz Thomas:

“Temem as pragas futuras quase todos os que vivem nesta geração. Desejamos que a vida possa ser diferente, dizemos, mas o mundo parece estar em trevas. Ricos ou pobres, cultos ou ignorantes, americanos ou russos — todos tememos o futuro. Nestes momentos em que acreditamos no que desejamos seja verdade, sonhamos com um milagre para dissipar as sombras.” — pág. 20.

O conceito adventista da relação íntima entre a mente e o corpo é um grande auxílio para enfrentar o repto do mêdo. Esta compreensão derivada dos ensinos de Cristo ataca não os sintomas mas a cau-sa fundamental. O mêdo produz incapacidade física.

O mêdo causa tensão física até que a tensão se torna insuportável. A Medicina fornece sedativos para aliviar as tensões nervosas. Os psicólogos atacam os aspectos mental e físico. Mas é necessário ao cristão consagrado o pleno conhecimento dos princípios bíblicos para produzir a saúde perfeita do corpo, da mente e da alma. Os adventistas sabem que somente a presença do Espírito Santo pode produzir “a paz que excede todo o entendimento.” Essa o mundo não pode dar, mas uma vez plenamente aceita, ela protege o coração contra êsses assaltos do inimigo.

(Conclui no próximo mês).